Qual o papel das experiências subjetivas na crítica social? Distinguindo entre justiça de primeira e de segunda ordem

Autores

  • Filipe Augusto Barreto Campello de Melo UFPE

DOI:

https://doi.org/10.1590/0101-3173.2023.v46esp1.p183

Palavras-chave:

Narrativa, Experiência, Crítica, De(s)colonialidade

Resumo

Nas últimas décadas, diferentes abordagens ligadas à tradição de(s)colonial têm movido o pêndulo da crítica de pretensões de universalidade para relatos e experiências particulares. Contudo, nisso que podemos chamar de virada narrativa, não são sempre evidentes as justificativas morais de perspectivas em primeira pessoa. A questão que se gostaria de explorar neste artigo é se seria possível encontrar relevância epistêmica de relatos e experiências subjetivas na crítica de injustiça. Começa-se por inverter a questão, partindo do problema da objetividade na crítica, diante da particularidade das experiências. A questão, nesse caso, é de onde fala o filósofo ou a filósofa, na sua intenção de descrever experiências de sofrimento de outras pessoas. Se falamos sempre em primeira pessoa, e se existe algum limite cognitivo ou epistêmico de experiências, de onde viria a capacidade de criticar experiências que não são as nossas? Afinal, como podemos compartilhar experiências de injustiça? Em seguida, defende-se que podemos avançar, se distinguirmos duas dimensões de justiça. Seguindo distinções conhecidas de teorias de primeira e segunda ordem, defende-se que reivindicações ligadas à virada narrativa se referem a demandas de justiça de primeira ordem: trata-se de reconhecer moralmente a pretensão epistêmica dos sujeitos, vendo-se ali a possibilidade de confrontar noções falhas de universalidade e pontos cegos em teorias da justiça. Contudo, essas pretensões não possuem em si próprias critérios de justificação, requerendo dependências normativas, as quais são externas às próprias experiências – essas, sim, situadas em justiça de segunda ordem. Propõe-se que esse modelo tem a vantagem de incorporar as vantagens teóricas de teorias de(s)coloniais, sem negligenciar os potenciais da crítica da injustiça.

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Biografia do Autor

  • Filipe Augusto Barreto Campello de Melo, UFPE

    Professor Adjunto no Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, PE – Brasil e pesquisador do CNPq. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1954-0421.

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Recebido: 01/09/2022

Aceito: 16/01/2023

Publicado

19-05-2023

Como Citar

CAMPELLO DE MELO, Filipe Augusto Barreto. Qual o papel das experiências subjetivas na crítica social? Distinguindo entre justiça de primeira e de segunda ordem. Trans/Form/Ação, Marília, SP, v. 46, p. 183–206, 2023. DOI: 10.1590/0101-3173.2023.v46esp1.p183. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/transformacao/article/view/13696.. Acesso em: 3 dez. 2024.