Percepções de profissionais do sexo sobre o cuidado recebido no contexto assistencial à saúde

Autores/as

  • Beatriz Guerta Pastori aUniversidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), Uberaba, MG, Brasil.
  • Andrei Biliato Colmanetti bUniversidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), Uberaba, MG, Brasil
  • Cláudia de Azevedo Aguiar cDepartamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), Uberaba, MG, Brasil

DOI:

https://doi.org/10.36311/jhgd.v32.10856

Palabras clave:

Profissionais do Sexo, Assistência à Saúde, Sistema Único de Saúde, Discurso do Sujeito Coletivo

Resumen

Introdução: as profissionais do sexo se configuram como um grupo historicamente marginalizado por se desviarem do padrão de comportamento moral e social ditado pelos dogmas conservadores sobre os quais o Brasil foi erguido. Tal exclusão está expressa também nas políticas públicas de saúde, nas quais o grupo é citado apenas em ações e programas voltados às infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), o que fere os princípios doutrinários e organizativos propostos pelo SUS. O presente trabalho objetiva analisar o cuidado recebido no contexto assistencial à saúde a partir da ótica das profissionais do sexo.

Método: Trata-se de um estudo descritivo e exploratório, de abordagem qualitativa, que teve como referencial de análise o Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), construído a partir de entrevista semiestruturada realizada com o grupo em questão. O DSC é um método que reúne as opiniões e expressões individuais semelhantes em um depoimento único, redigido em primeira pessoa do singular, que dá voz a essa coletividade. A coleta foi auxiliada pelos agentes comunitários de saúde (ACS) da Unidade de Saúde da Família que abrange o território das casas de prostituição do município.

Resultados e Discussão: Foram entrevistadas 22 prostitutas, sendo 19 mulheres cis e 3 mulheres trans ou travestis, as quais, em sua maioria, encontravam-se em situação de vulnerabilidade social – raça preta ou parda, pouca escolaridade e baixa renda. Identificou-se nos discursos a existência de uma assistência em saúde que não atende as demandas específicas dessa população, além da presença de um cuidado fragmentado e centrado na saúde sexual e ginecológica. As entrevistadas trans ou travestis relataram, além disso, forte resistência quanto à identidade de gênero e respeito ao nome social por parte da equipe. Ademais, houve expressões de medo em revelar a profissão durante as consultas, devido ao estigma e preconceito recaídos sobre elas. Ainda assim, essas profissionais entendem que suas necessidades em saúde são supridas no SUS, o que conota uma visão resignada frente às lacunas da rede de atenção, requerendo ações, programas e políticas de saúde voltadas a esta população.

Considerações Finais: As profissionais do sexo fazem parte de um recorte da sociedade que sofre diariamente com estigma sobre seu padrão de comportamento sexual, vivendo em importante condição de vulnerabilidade social. Isto se reflete em medo de buscar atendimento médico e de revelar a profissão, acarretando lacunas no acesso e direito à saúde desta população. Faz-se necessário, portanto, criação de programas e políticas de saúde específicas e (re)qualificação das equipes de saúde para o manejo destas pacientes.

Referencias

Leitão EF, Costa LLS, Brêda MZB, Albuquerque MC dos S de, Jorge JS. A prática cotidiana de saúde das profissionais do sexo. Revista Brasileira em Promoção da Saúde 2012; 25: 295–304. https://doi.org/10.5020/18061230.2012.2259

Moraes MLC de, Costa PB, Aquino PDS, Pinheiro AKB. Educação em saúde com prostitutas de Fortaleza: relato de experiência. Rev Eletr Enf 2008; 10. https://doi.org/10.5216/ree.v10.46823

Aquino P de S, Ximenes LB, Pinheiro AKB. Políticas públicas de saúde voltadas à atenção à prostituta: breve resgate histórico. Enfermagem em Foco 2010; 1. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2010.v1.n1.4

Centro de Documentação do Ministério da Saúde. Assistência integral à saúde da mulher: bases de ação programática. Brasília: Ministério da Saúde; 1984.

Brasil, editor. Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: princípios e diretrizes. 1a. ed., 2a. reimp. Brasília, DF: Editora MS; 2011

Villela WV, Monteiro S. Gênero, estigma e saúde: reflexões a partir da prostituição, do aborto e do HIV/aids entre mulheres. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24: 531–40. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000300019

Sousa FR de. Educação Popular em Saúde e participação de prostitutas: contribuições para a gestão participativa do SUS. Interface (Botucatu) 2014; 18: 1568–1568. https://doi.org/10.1590/1807-57622013.0406

Szwarcwald C. Taxas de prevalência de HIV e sífilis e conhecimento, atitudes e práticas de risco relacionadas às infecções sexualmente transmissíveis no grupo das mulheres profissionais do sexo: relatório de pesquisa. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.

Lefèvre F, Lefèvre AMC. O discurso do sujeito coletivo: um novo enfoque em pesquisa qualitativa; desdobramentos 2003.

Lefevre F, Lefevre AMC. Discourse of the collective subject: social representations and communication interventions. Texto Contexto - Enferm 2014; 23: 502–7. https://doi.org/10.1590/0104-07072014000000014

Lima FS da S, Merchán-Hamann E, Urdaneta M, Damacena GN, Szwarcwald CL. Fatores associados à violência contra mulheres profissionais do sexo de dez cidades brasileiras. Cad Saúde Pública 2017; 33. https://doi.org/10.1590/0102-311X00157815

Hankel J, Dewey S, Martinez N. Women Exiting Street-Based Sex Work: Correlations between Ethno-Racial Identity, Number of Children, and Violent Experiences. Journal of Evidence-Informed Social Work 2016; 13: 412–24. https://doi.org/10.1080/23761407.2015.1086718

Clarke RJ, Clarke EA, Roe-Sepowitz D, Fey R. Age at Entry into Prostitution: Relationship to Drug Use, Race, Suicide, Education Level, Childhood Abuse, and Family Experiences. Journal of Human Behavior in the Social Environment 2012; 22: 270–89. https://doi.org/10.1080/10911359.2012.655583

Juliano D. El trabajo sexual en la mira: polémicas y estereotipos. Cad Pagu 2005: 79–106. https://doi.org/10.1590/S0104-83332005000200004

Santos OP dos, Ramalho RC, Oliveira CFD, Lima RCD, Arantes AA, Filho IM de M. Perfil sociodemográfico e avaliação do conhecimento das profissionais do sexo acerca das ISTs em um município na região metropolitana de Goiânia. Revista de Iniciação Científica e Extensão 2019; 2: 81–8.

Figueiredo R, Peixoto M. Profissionais do sexo e vulnerabilidade. BIS, Bol Inst Saúde (Impr) 2010: 196–201.

Cruz NL da, Ferreira CL, Martins E, Souza M. O cuidado com a saúde das mulheres profissionais do sexo: uma revisão narrativa. Disciplinarum Scientia | Saúde 2016; 17: 339–52.

Platt L, Grenfell P, Meiksin R, Elmes J, Sherman SG, Sanders T, etal.. Associations between sex work laws and sex workers’ health: A systematic review and meta-analysis of quantitative and qualitative studies. PLoS Med 2018; 15: e1002680. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002680.

Brito-Silva K, Bezerra AFB, Tanaka OY. Direito à saúde e integralidade: uma discussão sobre os desafios e caminhos para sua efetivação. Interface (Botucatu) 2012; 16: 249–60. https://doi.org/10.1590/S1414-32832012005000014

Paiva LL de, Araújo JL de, Nascimento EGC do, Alchieri JC. A vivência das profissionais do sexo. Saúde debate 2013; 37: 467–76.

Silva RS. O entendimento do direito à saúde: uma abordagem dos usuários do SUS no Distrito Federal. Cad Ibero Am Direito Sanit 2015; 4: 56–74. https://doi.org/10.17566/ciads.v4i3.156.

Benoit C, Jansson SM, Smith M, Flagg J. Prostitution Stigma and Its Effect on the Working Conditions, Personal Lives, and Health of Sex Workers. The Journal of Sex Research 2018; 55: 457–71. https://doi.org/10.1080/00224499.2017.1393652

Bungay V, Kolar K, Thindal S, Remple VP, Johnston CL, Ogilvie G. Community-Based HIV and STI Prevention in Women Working in Indoor Sex Markets. Health Promotion Practice 2013; 14: 247–55. https://doi.org/10.1177/1524839912447189

Ministério da Saúde (Brasil). Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT. Brasília: Ministério da Saúde, 2013.

Ferreira B de O, Nascimento EF do, Pedrosa JI dos S, Monte LMI do. Vivências de travestis no acesso ao SUS. Physis 2017; 27: 1023–38. https://doi.org/10.1590/S0103-73312017000400009

Muller MI, Knauth DR. Desigualdades no SUS: o caso do atendimento às travestis é ’babado’! Cad EBAPEBR 2008; 6: 01–14. https://doi.org/10.1590/S1679-39512008000200002

Paim JS, Silva LMV da. Universalidade, integralidade, equidade e SUS. BIS - Bol Inst Saúde 2010.

Publicado

2022-06-23

Número

Sección

ORIGINAL ARTICLES