EXPLORANDO DIFERENTES FACES DO CAPACITISMO E DA LUTA ANTICAPACITISTA: CONSIDERAÇÕES SOBRE ALGUNS DISCURSOS MIDIÁTICOS RELACIONADOS COM OS JOGOS PARALÍMPICOS

Autores

DOI:

https://doi.org/10.36311/2674-8681.2023.v24n1.p143-164

Palavras-chave:

Atividade Motora Adaptada, Capacitismo, Anticapacitismo, Jogos Paralímpicos, Mídia

Resumo

Este ensaio visa explorar diferentes entendimentos do conceito de capacitismo e citar alguns exemplos de como a luta anticapacitista vem se expressando no contexto midiático dos Jogos Paralímpicos (JP). A literatura internacional vem denunciando duas faces do capacitismo: uma que pressupõe que as pessoas com deficiência (PCD) são incapazes e outra que elas são capazes de fazer tudo e qualquer coisa. Ambas reforçam o sofrimento, o preconceito e a discriminação das PCD. A literatura nacional vem focando mais exclusivamente na face da incapacidade. Analisamos algumas peças promocionais dos JP tanto no Reino Unido quanto no Brasil e analisamos algumas falas de atletas e produções de jornalistas e verificamos a existência de diferentes abordagens na luta anticapacitista: (1) mostrando as PCD como super-capazes e/ou super-humanas; (2) demostrando o preconceito das pessoas em geral contra as PCD; e (3) mostrando atletas e PCD em geral como quaisquer outros seres humanos treinando e exercendo suas tarefas, enfrentando suas limitações e os desafios que encontram em seu cotidiano. Conforme advertem alguns ativistas e pesquisadores internacionais, a primeira abordagem pode inadvertidamente reforçar o capacitismo. Ela enfatiza o valor de determinadas capacidades e fomenta crenças e expectativas que as PCD são capazes fazer qualquer coisa, o que nem sempre é possível. Ao combater uma das faces do capacitismo,  ela pode reforçar a outra.  Isto nos lembra que precisamos ficar atentos para que, em nossa luta contra o capacitismo também não caiamos inadvertidamente em armadilhas capacitistas.

Recebido em: 30/03/2023
Reformulado em: 17/05/2023
Aceito em: 17/05/2023

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

ÁVILA, E. DE S. Capacitismo como queerfobia. Em: FUNCK, S. B.; MINELLA, L. S.; ASSIS, G. DE O. (Eds.). Linguagens e narrativas: desafios feministas. Tubarão: Copiart, 2014. v. 1p. 131–156.

BARNES, C.; MERCER, G. Disability. Cambridge: Polity, 2003.

BENTES, J. A. DE O. Estudos da deficiência, educação de surdos e atribuições no trabalho docente. Revista Cocar., v. 6, n. 11, p. 87–96, 2012.

BRASIL. Decreto no 6.949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. . 2009, p. 1–23.

BRASIL. Lei no 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). . 2015, p. 1–29.

BRITTAIN, I.; BEACOM, A. Leveraging the London 2012 Paralympic Games: What legacy for disabled people? Journal of Sport and Social Issues, v. 40, n. 6, p. 499–521, 2016.

CAMPBELL, F. K. Inciting legal fictions: “disability’s” date with ontology and the ableist body of law. Griffith Law Review, v. 10, n. 1, p. 42–62, 2001.

CAMPBELL, F. K. Refusing able(ness): a preliminary conversation about ableism. M/C Journal, v. 11, n. 3, 2008.

CAMPBELL, F. K. Contours of ableism: The production of disability and abledness. New York: Palgrave McMillan, 2009.

CAMPOS, B.; LOMBA, G. Entenda por que não é bacana chamar atletas das Paralimpíadas de exemplos de superação. Disponível em: <https://ge.globo.com/paralimpiadas/noticia/entenda-por-que-nao-e-bacana-chamar-atletas-das-paralimpiadas-de-exemplos-de-superacao.ghtml>. Acesso em: 10 mar. 2023a.

CAMPOS, B.; LOMBA, G. Vocabulário da Diversidade: atletas paralímpicos explicam termos que devemos evitar. Disponível em: <https://ge.globo.com/paralimpiadas/noticia/entenda-por-que-nao-e-bacana-chamar-atletas-das-paralimpiadas-de-exemplos-de-superacao.ghtml>. Acesso em: 10 mar. 2023b.

CHANNEL 4. Meet the Superhumans. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=tuAPPeRg3Nw>. Acesso em: 10 mar. 2023.

CHANNEL 4. We’re the superhumans. Disponível em: <https://vimeo.com/174791717>. Acesso em: 10 mar. 2023.

CHANNEL 4. Super. Human. Disponível em: <https://www.paralympic.org/news/channel-4-s-tokyo-2020-campaign-transports-viewers-brutal-world-super-human>. Acesso em: 10 mar. 2023.

COMITÊ ORGANIZADOR DOS JOGOS PARALÍMPICOS DE TÓQUIO. Yui Wago representa “A Pequena Monoasa”, a menina que mostra que todos podem voar, na Cerimônia de Abertura. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/9795155/editorial/12e2f241-e6e6-4407-9117-2a29709e53a2/?s=0s>. Acesso em: 10 mar. 2022.

COMITÊ PARALÍMPICO BRASILEIRO. O treino que muda opiniões . Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1b4PvmMCy2Y>. Acesso em: 10 mar. 2023.

DIAS, A. Por uma genealogia do capacitismo: da eugenia estatal à narrativa capacitista social. Anais do I Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência–SEDPcD/Diversitas/USP Legal. Anais...São Paulo: Universidade de São Paulo, 2013.

ENCONTRO COM FÁTIMA BERNARDES. Brasil volta dos Jogos Paralímpicos de Tóquio com a mala cheia de medalhas. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/9833300/>. Acesso em: 10 mar. 2023.

GESSER, M.; BLOCK, P.; HENRIQUE NUERNBERG, A. Participation, agency and disability in Brazil: transforming psychological practices into public policy from a human rights perspective. Disability and the Global South, v. 6, n. 2, p. 1772–1791, 2019.

GESSER, M.; BLOCK, P.; MELLO, A. G. DE. Estudos da deficiência: anticapacitismo e emancipação social. Em: GESSER, M.; BÖCK, G. L. K.; LOPES, P. H. (Eds.). Estudos da deficiência: anticapacitismo e emancipação social. Curitiba: CRV, 2020. p. 17–36.

GOODLEY, D. Dis/ability studies : theorising disablism and ableism. London: Routledge, 2014.

HARDIN, M. Disability and Sport: (Non)Coverage of an Athletic Paradox. Em: A.RANEY, A.; BRYANT, J. (Eds.). Handbook of Sports and Media. [s.l.] Lawrence Erlbaum Associates, 2012. v. 33p. 625–634.

HARDIN, M.; HARDIN, B. The “Superscrip” in sport media: Wheelchair athletes discuss hegemony’s disabled hero. SOSOL: Sociology of Sport Online, v. 7, n. 1, p. 14, 2004.

HIPÓLITO, V. Verônica Hipólito fala de dúvidas que ainda existem sobre as pessoas com deficiência e a importância da inclusão. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/9795005/editorial/12e2f241-e6e6-4407-9117-2a29709e53a2/>. Acesso em: 11 mar. 2023.

INTERNATIONAL PARALYMPIC COMMITTEE. WeThe15: A global human rights movement for the 1.2 billion persons with disabilities. Disponível em: <https://www.paralympic.org/news/wethe15-global-human-rights-movement-1-2-billion-persons-disabilities>. Acesso em: 5 mar. 2023a.

INTERNATIONAL PARALYMPIC COMMITTEE. Andrew Parsons, presidente do Comitê Paralímpico Internacional, discursa na cerimônia de encerramentos dos Jogos Paralímpicos. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/9831765/>. Acesso em: 10 mar. 2023b.

IVANOVICH, A. C. F.; GESSER, M. Deficiência e capacitismo: correção dos corpos e produção de sujeitos (a)políticos. Quaderns de psicologia, v. 22, n. 3, p. e1618, 2020.

JACKSON, D. et al. Reframing Disability? Media, (Dis)Empowerment, and Voice in the 2012 Paralympics. New York: Routledge, 2014.

KEARNEY, S.; BRITTAIN, I.; KIPNIS, E. “Superdisabilities” vs “disabilities”? Theorizing the role of ableism in (mis)representational mythology of disability in the marketplace. Consumption Markets & Culture, p. 1–23, 11 jan. 2019.

MAIKA, M.; DANYLCHUK, K. Representing Paralympians: The ‘other’ athletes in Canadian print media coverage of London 2012. International Journal of the History of Sport, v. 33, n. 4, p. 401–417, 2016.

MELLO, A. G. DE. Gênero, deficiência, cuidado e capacitismo: uma análise antropológica de experiências, narrativas e observações sobre violências contra mulheres com deficiência. Tese—[s.l.] Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis., 2014.

MELLO, A. G. DE. Deficiência, incapacidade e vulnerabilidade: do capacitismo ou a preeminência capacitista e biomédica do Comitê de Ética em Pesquisa da UFSC. Ciência & Saúde Coletiva, v. 21, n. 10, p. 3265–3276, out. 2016.

MOREIRA, M. C. N. et al. Gramáticas do capacitismo: diálogos nas dobras entre deficiência, gênero, infância e adolescência. Ciencia & saude coletiva, v. 27, n. 10, p. 3949–3958, 2022.

OFFICE FOR DISABILITY ISSUES. HM GOVERNMENT. London 2012: a legacy for disabled people London 2012. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://webarchive.nationalarchives.gov.uk/ukgwa/20130812104657/http://odi.dwp.gov.uk/docs/wor/leg/legacy-full.pdf>. Acesso em: 5 mar. 2023.

OLIVER, M. Understanding disability: from theory to practice. 2. ed. London: Palgrave McMillan, 2009.

PEREIRA, A. M. B. A. Viagem ao interior da sombra: deficiência, doença crônica e invisibilidade numa sociedade capacitista. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2008.

SASSAKI, R. K. Capacitismo, incapacitismo e deficientismo na contramão da inclusão. Disponível em: <https://www.sociedadeinclusiva.com.br/2020/05/01/capacitismo-incapacitismo-e-deficientismo-na-contramao-da-inclusao/>. Acesso em: 4 nov. 2022.

SILVA, C. F.; HOWE, P. D. The (In)validity of Supercrip Representation of Paralympian Athletes. Journal of Sport & Social Issues, v. 36, n. 2, p. 174–194, 2012.

SILVA, C. F.; HOWE, P. D. The Social Empowerment of Difference: The Potential Influence of Para sport. Physical Medicine and Rehabilitation Clinics of North America, v. 29, n. 2, p. 397–408, 2018.

SILVA, M. L.; RUBIO, K. Superação no esporte: limites individuais ou sociais? Revista Portuguesa de Ciências do Desporto, v. 2003, n. 3, p. 69–76, 2003.

UNITED NATIONS GENERAL ASSEMBLY. Resolution adopted by the General Assembly on 13 December 2006. 61/106 Convention on the Rights of Persons with Disabilities. New York: [s.n.].

VERÔNICA HIPÓLITO. Verônica Hipólito: “Especial é aquela pessoa que você paga uma pizza”. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/9794932/editorial/12e2f241-e6e6-4407-9117-2a29709e53a2>. Acesso em: 10 mar. 2023a.

VERÔNICA HIPÓLITO. Com dancinha no pódio, Gabriel Araujo recebe o ouro dos 200m livre S2. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/9810964/>. Acesso em: 11 mar. 2023b.

WOLBRING, G. The politics of Ableism. Development, v. 51, n. 2, p. 252–258, 2008a.

WOLBRING, G. Why NBIC? Why human performance enhancement? Innovation, v. 21, n. 1, p. 25–40, 2008b.

WOLBRING, G. Ableism and energy security and insecurity. Studies in Ethics, Law, and Technology, v. 5, n. 1, 2011.

WOLBRING, G. Expanding Ableism: Taking down the Ghettoization of Impact of Disability Studies Scholars. Societies, v. 2, n. 3, p. 75–83, 2012.

Downloads

Publicado

2023-06-13