Notas sobre a UNiversidade e o CoNCeito de Formação em max HorkHeimer
Stefan Klein[1]
RESUMO: O intuito deste texto pode ser retratado através de duas tarefas principais que se propõe. De um lado, realiza um balanço – limitado e parcial, na medida em que trata de um recorte bastante circunscrito – da reflexão da teoria crítica da sociedade de Max Horkheimer acerca do problema da universidade, notadamente, no período imediatamente posterior ao fim da Segunda Guerra Mundial, e do modo como se relaciona com o conceito de formação (Bildung), bastante caro à tradição da universidade alemã moderna. Completado esse passo, o qual estabelece laços com o papel ocupado pela socialização nessa ótica teórica, visa-se, ao final, delinear algumas reflexões preliminares a propósito da contemporaneidade que, entende-se, podem beneficiar-se do enfoque concedido ao problema, com base na situação singular em que o pensamento de Horkheimer foi formulado.
PALAVRAS-CHAVE: Teoria crítica da sociedade. Max Horkheimer. Universidade. Formação (Bildung). Razão (Vernunft).
Este texto procura contribuir, de maneira preliminar, para compreender como o filósofo e sociólogo Max Horkheimer entende as relações entre a educação superior e a formação, no interior de sua teoria crítica. Tal objetivo abrange, portanto, jogar luz sobre alguns aspectos dos escritos de um período tardio de sua obra, notadamente da década de 1950, em sua grande maioria ainda sem tradução para a língua portuguesa. Horkheimer, que em 1931 se tornou diretor do Institut für Sozialforschung (Instituto de Pesquisa Social, doravante IfS), fundado em 1923, em Frankfurt am Main, na Alemanha, ficou conhecido pelos artigos publicados na década de 1930, na Zeitschrift für Sozialforschung, periódico publicado pelo IfS, em que esboçou os contornos de sua proposta de pesquisa social, a qual visava a congregar a filosofia e as diversas ciências humanas, em um diálogo crítico tanto com as correntes filosóficas do idealismo alemão quanto com o que denominava ciências positivas, ao mesmo tempo em que levou adiante a crítica a diferentes aspectos da cultura da sociedade capitalista de seu tempo. Posteriormente, publicou também dois livros de grande impacto: O eclipse da razão (1947) e, em coautoria com Theodor W. Adorno, a Dialética do esclarecimento (1944), opus magnum desse grupo que influenciou fortemente as humanidades e, em muitos círculos, ficou conhecido pela alcunha “Escola de Frankfurt”.
À luz dessa trajetória, de forma geral, sua preocupação com as questões em torno da educação fica em segundo plano ou sequer é mencionada por grande parte dos intérpretes[2]. Merece destaque, contudo, particularmente na medida em que ele foi eleito reitor da Universidade de Frankfurt por dois mandatos consecutivos (cumpridos no período de outubro de 1951 a outubro de 1953), o que lhe proporcionou um contato bastante próximo, também, com as instâncias administrativas da educação superior, afora a experiência que já detinha como docente e diretor de um instituto científico. É dessa época que datam algumas das falas transcritas ou revisadas para publicação em coletâneas onde se dirige, especificamente, às tarefas da instituição universitária, observando tanto a relevância no contexto singular de reconstrução da Alemanha quanto os objetivos históricos que extrapolam esse viés – sendo esse o norte do meu texto. Evidentemente, este sobrevoo irá apresentar e abarcar somente alguns dos diversos temas suscitados por Horkheimer nos escritos dessa época, na tentativa de instigar o debate dessas questões em sua teoria e para além dela.
Antes de adentrar de pronto a temática propriamente dita da educação, cabe situar brevemente um dos elementos essenciais do quadro conceitual que marca o problema da socialização, na chave de sua proveniência através da aquisição ou perda de determinados elementos constitutivos da experiência. No caso, a teoria crítica, através de um de seus projetos coletivos da década de 1930, Estudos sobre autoridade e família, identificou o desmonte da família burguesa como basilar para a dissolução de uma figura de referência no plano da autoridade. Horkheimer[3], em especial, destaca o fato de as mudanças econômicas, que tiraram a mulher do lar, ao levá-la ao mercado de trabalho, terem concorrido para desestruturar o modelo vigente das relações familiares, dessa feita minando, ao mesmo tempo, o papel de autoridade encarnado pelo pai, no interior da tradicional família nuclear, sem fazer com que aquela figura fosse representada de outra maneira, o que desorientou a etapa da primeira socialização, a qual transmite às crianças os fundamentos da cultura de uma época e de contextos sociais específicos.
Deve-se atentar para o reproche substancial que é feito, no texto citado, referente ao julgamento da participação repressora materializada naquela figura paterna, responsável por determinados traumas que retratam essa humanidade; mas o acento recai, simultaneamente, sobre os efeitos perversos provocados por uma danificação tout court dessa estrutura familiar. Ou seja, influenciado pela psicologia social de Sigmund Freud, reconhecem-se alguns efeitos da espécie particular de repressão representada por aquela família patriarcal; ao mesmo tempo, no entanto, os autores consideram que é vital compreender como essa reestruturação dos laços familiares despe o indivíduo em formação de referenciais que mediavam a socialização, com atenção especial à constituição de determinados valores incorporados pela burguesia.
Nesse sentido, tal vertente da teoria crítica marca os efeitos de uma das principais mudanças observadas na passagem de um capitalismo de espírito livre para o que seria denominado “capitalismo organizado”. Assim, a condição social do indivíduo, se de modo algum é determinada pelo contexto econômico, resulta da interação contínua com este, fazendo com que, sob a égide de uma crescente administração das esferas, inclusive da vida econômica, a antiga autonomia individual fosse fraturada.
Enquanto, ainda na economia livre, o todo social se reproduzia através do jogo de forças de sujeitos econômicos relativamente independentes, enquanto uma numerosa camada de empreendedores médios, livres, ocupava posições-chave com as suas próprias decisões, o cultivo do indivíduo, no qual a filosofia, a literatura e as belas artes desembocavam de modo cada vez mais exclusivo, possuía um sentido real. (HORKHEIMER, [1949] 1985b, p. 363).
Como se vê, por essa citação de um texto de 1949, o diagnóstico esboçado nos anos 1930 estava mantido e, agora, era posto em relação com o desmonte das condições de possibilidade de uma personalidade que, dotada de razão, havia sido – outrora – capaz de lidar com as transformações da realidade, conquanto essa falta de estrutura provocada pela reconfiguração das relações sociais no interior da família, bem como no ambiente de trabalho, obnubilou essa capacidade. Por ora, basta reter essas ideias, as quais serão retomadas adiante, no intuito de estabelecer um nexo com o problema da formação.
Foi esse o pano de fundo que motivou Horkheimer a retornar de seu exílio nos EUA à Alemanha, após o final da Segunda Guerra Mundial, quando considerou como a melhor maneira de contribuir para a luta contra as formas de vida totalitárias retomar as atividades docentes no país do qual teve de emigrar e que cassou seu cargo de professor universitário[4]. É explícita, portanto, a presença desse horizonte de uma prática educacional, em sentido amplo, que constituiu o pano de fundo de seus objetivos teóricos desde então. Se ela também compreende a preocupação com o ensino básico, concentra-se, predominantemente, sobre o de nível superior, o que se justifica, para ele, em virtude de sua participação estrutural nas variadas esferas da sociedade, incluindo a própria instrução dos educadores. Assim é que, por ocasião de uma fala comemorativa de promulgação da constituição estadual de Hessen, ocorrida em 1950, afirma:
Se precisamos conter a desumanização e o desmonte da cultura na escola [Volksschule], para cuja defesa fomos convocados, então isso vale ainda mais para a escola superior, a universidade. Aqui são formados os professores, com os quais os outros deverão aprender, aqui amadurecem os políticos, que em algum momento servirão à sociedade. Nesses tempos de construção ela necessita da mais forte proteção. (HORKHEIMER, [1950] 1985c, p. 50).
É perceptível, em todo o seu discurso, a orientação dessa tarefa como guiada a partir do horizonte político e histórico no qual se encontrava a Alemanha daquele tempo: um país destruído em todos os níveis, tendo sido amplamente bombardeado durante os últimos anos de guerra e, também, com a sua tradição cultural humanista colocada em xeque, em virtude da ascensão e do domínio da ideologia totalitária nacional-socialista, durante a década posterior a 1933.
Ainda que de modo algum advogue uma relação determinante, o trajeto que desembocou nesse momento histórico esteve, em sua interpretação, ligado à reorganização da sociedade alemã como um todo, no período que sucedeu à perda de hegemonia da filosofia hegeliana na Alemanha[5]. Essa última se fez sentir para muito além dos círculos propriamente acadêmicos, visto que a reforma que levou à criação da moderna universidade alemã foi concebida através da participação vital de grandes nomes da filosofia, com destaque para Wilhelm von Humboldt, Friedrich Schleiermacher e Johann Gottlieb Fichte. É no esteio desse argumento que se deve entender a orientação de Horkheimer, ao pronunciar um discurso sobre a relação entre a filosofia e os estudos universitários (Studium). O giro ocorrido esteve embasado pelo seguinte processo:
Na segunda metade do século dezenove a indústria adentrou a Alemanha. Primeiramente, ela em grande medida desalojou a filosofia da universidade. Sob o seu domínio, a orientação do estudo universitário passou a distanciar-se não apenas da formação [Bildung], mas do pensamento social, e adequou-se, de maneira cada vez mais inequívoca, às ciências naturais e ao aperfeiçoamento [Durchbildung] técnico para as profissões modernas. A filosofia desapareceu como o órgão da auto-determinação humana. (HORKHEIMER, 1985b, p. 364).
O texto continua com a interpretação de que o ideal da ciência livre de valores, como defendido por Max Weber, obteve uma elevada disseminação nos círculos acadêmicos, ao preconizar a distinção radical entre o contexto de elucidação das relações causais, objetivas, e o julgamento axiológico, subjetivo, das consequências de determinadas escolhas e processos, juízo este que escaparia à esfera da atividade científica. Deve-se, portanto, lembrar o fato de que Weber, em sua palestra “Ciência como profissão” ([1917] 1992), na qual expõe esse diagnóstico a partir do olhar comparativo que lança sobre os pressupostos das trajetórias acadêmicas nos EUA e na Alemanha naquele período, o faz seguindo seus próprios preceitos: apresenta os condicionantes dessa transição e aponta algumas consequências perceptíveis, com destaque para a crescente instrumentalização do ensino e da aquisição de conhecimento, sem se engajar no embate referente às possíveis implicações deletérias associadas a esse desenvolvimento.
De modo inverso, Horkheimer externa justamente sua inquietação face a esse desenrolar histórico, o qual se manifestaria, em especial, no pensamento científico, que em seus primórdios cumpria uma função de mediação com o mundo, indo além da explicação pura e simples.
O produto do progresso no quadro da contemporaneidade é a atomização, a divisão do ser humano. As ciências particulares [die einzelnen Wissenschaften], em sua refinação e especialização levadas ao extremo, entendemse, cada vez mais, como um mero aparato [Apparatur], que nada tem a ver com as questões da conduta de vida [Lebensführung] ou com juízos essenciais. (HORKHEIMER, 1985b, p. 368).
Se, de fato, compartilha a interpretação weberiana, distancia-se das conclusões ou dos passos que derivam dessa constatação. A seu ver, é condição sine qua non recuperar a abordagem de uma orientação unificada para a ciência, fomentando-a como referência para que a humanidade seja capaz de lidar com o seu entorno, mesmo que, em virtude do teor da modificação histórica ocorrida, esse papel tenha de ser realizado sob outros parâmetros. Logo, o problema deve balizar a importância de haver valores objetivos que se encontrem subjacentes à ação humana onde quer que ela se dê, o que não significa propor a implosão das fronteiras disciplinares, mas interditar a possibilidade de que suas intenções se autonomizem, face à realidade social comum visada pelos seres humanos.
Tal aspecto foi continuamente expresso na prática intelectual horkheimereana, na qual se nota o empenho para que fosse levada a cabo a disseminação dos métodos das ciências sociais em paralelo ao fortalecimento dessas disciplinas. Rejeitava, por conseguinte, a substituição desses ramos por um estudo geral vago, semelhante a um ciclo básico, em cujo contexto tais saberes teriam sua faculdade crítica dissolvida, por constatar que os benefícios de um determinado grau de independência dos domínios de produção do conhecimento seriam necessários para que dessem frutos. Outrossim, esse engajamento pode ser identificado durante ampla parte de sua trajetória, em que, fosse na Alemanha, ainda como um jovem e desconhecido docente, fosse nos EUA, após ganhar notoriedade como teórico, suas propostas originais quanto aos temas e às formas de realizar pesquisa tivessem vínculos e fizessem referência às categorias estabelecidas, em alguns casos, para desenvolvê-las, e, em outros, para recusar sua utilização com base em justificativas de cunho científico e epistemológico.
O diálogo crítico de Horkheimer também converge com Weber, na medida em que, ao retomar os fundamentos da teoria social de Karl Marx, coloca em perspectiva a importância de se pensar o andar da história e, consequentemente, dar-se conta de que condenar essa orientação precisa ter o seguinte horizonte: “[...] voltar para o passado é impossível não apenas com vistas à antiga espiritualidade, mas também com vistas às condições sociais, das quais aquela se originou. Não se pode girar a roda da história no sentido contrário” (HORKHEIMER, 1985b, p. 376)[6]. Com isso, tem-se que a tarefa primordial consiste em tentar preservar certos traços daquela cultura esmorecida que ainda estejam presentes, e conceber modos de incorporá-los ao movimento histórico, sem dobrar-se à ideologia do progressivismo despido de limites, o qual, na adequação e na submissão ao aparecimento do novo, se esquiva de refletir acerca do horizonte de possibilidade contido nessa guinada. É, portanto, um trabalho que inclui reivindicar a necessidade e o esforço para moldá-lo de acordo com os preceitos capazes de possibilitar a organização de uma sociedade racional, que esteja pautada por oferecer as condições de uma vida livre de exploração.
Decorre desse imperativo a suma obrigação que os membros da comunidade universitária, em geral, e o docente e o pesquisador acadêmico, em particular, têm de se defrontar com as condições e as implicações objetivas de suas práticas de pesquisa, que, em virtude de sua ligação com a existência concreta, de modo algum constituem uma entidade descolada, a qual possa levar adiante seu trabalho sem atentar para esses limites. Isso posto, faz-se primordial a tarefa de buscar uma alternativa à dualidade da subserviência sem reservas a esse processo histórico versus a proposição de uma postura idealista que se furte a partir da realidade posta.
Os senhores devem saber que a divisão do trabalho das ciências, que é uma expressão da divisão do trabalho social como um todo, e que está ligada às questões sociais fundamentais, não pode ser eliminada por síntese alguma. Não há nenhuma espécie de organização superior [Dachorganisation] da ciência que possa, através de mais um passo de racionalização, fazer convergir novamente, de modo artificial, o que foi separado pelo processo de racionalização. Mesmo um Studium Generale reformado, quaisquer que sejam as qualidades que possa ter sob outro ponto de vista – eu mesmo não sou um de seus defensores – é incapaz, aqui, de nos ajudar. (HORKHEIMER, [1952] 1985d, p. 388).
Logo, a especialização dessa atividade intelectual constitui, no esteio do processo de racionalização, além de uma constatação teórica, um ganho para o seu exercício, dado que a complexidade dos fenômenos que as ciências procuram interpretar e/ou explicar obriga o pesquisador a circunscrever seu foco a um âmbito deveras demarcado.
Em sua abordagem, Rafael Cordeiro Silva compreende as plenas implicações do que Horkheimer visava, ao esboçar esse ponto de vista:
Os argumentos de Horkheimer parecem defender o retorno a um conceito de formação que foi suprimido pelo desenvolvimento tecnológico. [...] Vale ressaltar que o contexto que dá origem a essas digressões não é a recusa ingênua do progresso proporcionado pelo desenvolvimento tecnológico, mas o temor de que a prevalência de especialização tosca, requerida pelo atual estágio das forças produtivas, contribuísse para suprimir ainda mais os valores endereçados ao fortalecimento da autonomia do indivíduo [...] (SILVA, 2009, p. 221).
Intervinha, assim, no debate que dava à atividade intelectual da pesquisa, da prática científica, um papel central na individuação, o qual permitiria a cada pessoa que nela tomasse parte alavancar ou, ao menos, reter a relevância que deveria ser conferida à manutenção de uma concepção de indivíduo. Extrapola, portanto, toda possibilidade de limitação do trabalho conceitual e pensativo implícito nessa divisão do trabalho para, antes, enfatizar de que forma a existência de novas condições e pressupostos da ciência precisa ser levada em consideração, a fim de compreendê-la em sua relação com o quadro social específico em que se insere.
Nessa medida, naquele contexto singular, a socialização intrínseca à atividade educacional escancarava o seu contorno político constitutivo. Parte dos intelectuais que haviam sido obrigados a recorrer ao exílio, para fugir da perseguição sofrida em decorrência de suas crenças ou de sua etnia, considerou, assim, ter a obrigação de se engajar na recuperação de um estado democrático na Alemanha dividida, esforçando-se para entender o fenômeno do holocausto e da participação, tanto ativa quanto passiva do povo alemão, e, além disso, para evitar a sua repetição. Ou seja, o objetivo estava longe de ser o de politizar essa esfera de ação, pois “[...] bem entendido, todo ensino, até mesmo o de matemática, é ensino político, a saber, no que se refere a dar forma à relação entre os professores e os alunos” (HORKHEIMER, [1960] 1985g, p. 153). Depreende-se dessa afirmação o teor central da teorização horkheimereana acerca desse objeto de estudo: responsável por moldar as formas de interação social, detém – ambiguamente – as possibilidades de tornar os indivíduos mais suscetíveis à manipulação ou de, contrariamente, proporcionar-lhes as ferramentas para exercer a resistência. Note-se, sobretudo, que o aspecto destacado aqui é o tipo de relação que se fomenta no ensino, sem adentrar o debate sobre a politização do conteúdo da matemática – o que, certamente, seria romper o que é característico àquele tipo de conhecimento – tendo por objetivo, efetivamente, refletir sobre o processo educacional e seu caráter político, sempre no sentido forte do termo, na socialização distintiva que fundamenta.
É a última afirmativa que aponta o curso a ser tomado, bem como o valor de criticidade que se precisa transmitir ao estudante. Deve-se provocar nele o interesse pelo questionamento, e isso vale, inclusive (ou melhor, a começar), para a atitude em sala de aula. Se dar ouvidos aos argumentos do docente é um passo indispensável, faz-se também mister renunciar à aceitação passiva de certos juízos ali apresentados. “Os senhores devem tentar contrapor, de maneira incessante, a sua própria experiência de vida àquilo que lhes surge em meio ao trabalho científico. Os verdadeiros pensadores sempre o fizeram, e é justamente através disso que tornaram a disciplina científica fecunda” (HORKHEIMER, 1985d, p. 389). Quer dizer, o método científico ao qual tanto se faz referência, o cuidado na elaboração dos problemas de pesquisa e, igualmente, o rigor no tratamento dos dados, todos esses constituem elementos fundamentais para a prática científica – mas eles apenas poderão dar origem a interpretações significativas, quando conjugados aos atributos da imaginação prolífica e do inconformismo, capazes de ir além de uma submissão cega ao rol de estágios que, historicamente (porém não teleologicamente), constituem essa atividade. Essa inclinação exprime um dos aspectos da chave de interpretação materialista da teoria crítica, ao recolocar a centralidade da experiência concreta, sem deixar de atentar para a dialética que lhe está subjacente e que exige a mediação entre tais dimensões.
A matéria do elo entre a formação e a experiência existe, ademais, na constatação e na referência aos traços do movimento intrínseco a essa relação. O argumento de Horkheimer se volta para a origem histórica e semântica dos termos formação (Bildung) e cultura (Kultur). Explicita o fato de estar implícita a modelagem de algo novo, no caso do primeiro, e a analogia ao semear, plantar e dar frutos, no segundo, derivado da perspectiva do cultivo. Procura, assim, matizar a noção de que se trataria, essencialmente, de um aperfeiçoamento com vistas a algo superior, orientado sobremaneira para o indivíduo, deslocando, antes, a ênfase para a dinâmica constituinte desse processo. Além disso, aproveita para assinalar a mutação à qual esteve submetida a formação moderna, notadamente na Alemanha, associada à prática científica, ao exercício da razão e, portanto, ao desvelamento das contradições que marcam a realidade. Dessa maneira, ao destacar a contribuição de Georg Wilhelm Friedrich Hegel e de Johann Wolfgang von Goethe para o seu tempo, chega à seguinte conclusão:
Estes dois sabiam que o caminho da formação é o do estranhamento [Entäußerung]; também poder-se-ia dizer simplesmente: da experiência. Ninguém se torna culto [gebildet] pelo que “faz de si mesmo”, mas apenas pela dedicação à coisa, no trabalho intelectual bem como na prática [Praxis] consciente de si. (HORKHEIMER, [1952] 1985e, p. 415, aspas no original)[7].
Contrapõem-se, desta feita, ao espírito do idealismo alemão que havia, de início, concebido essa atividade formativa num sentido predominantemente único, voltado para o indivíduo, descuidando de conceder a devida relevância aos efeitos que esse processo tem, também, sobre o mundo. De igual pertinência é a noção basilar desse tipo de estranhamento, o qual abarca a expressão da prática do ser humano, ou seja, a necessidade de refletir sobre as formas de exteriorizar-se a si mesmo; a ausência dessa etapa reflexiva coíbe a aquisição de uma consciência crítica.
A atitude crítica contempla tanto o posicionamento negativo diante da realidade dada quanto a prática visando à preparação – para falar com Horkheimer – do que escolhe denominar o inteiramente outro [das ganz Andere], o que permanece distinto de defender um acoplamento de ambos momentos ou, então, de reivindicar uma conversão imediata da teoria em prática. Consequentemente, essa reconstrução leva à noção de que esse processo expressaria um duplo movimento.
Formação é tanto formação do todo exterior quanto, precisamente através disso, formação de si mesmo. Ninguém é formado sem que reconheça, na dedicação ao seu próprio objetivo, o nexo com o todo, e que, contra o espírito do tempo [Zeitgeist], empregue, também publicamente, aquela mesma liberdade – que se deve adquirir na profissão acadêmica de sua ciência – face aos motes, clichês e preconceitos. (HORKHEIMER, 1985e, p. 416).
O gênero de razão do qual o ser humano pode ser dotado nesse viés crítico tem como fim livrá-lo da obtusidade inerente a uma racionalidade instrumental que se propõe a estrita adequação entre meios e fins, restringindo, nesse mesmo processo, o apoio e o estímulo ao debate e à contestação daqueles fins. Como se viu, ele precisa ser estendido a todos os âmbitos da vida, fornecendo as balizas para impedir a reprodução de uma estrutura social calcada sobre a repressão e a exploração humanas. Deve-se entender que, se Horkheimer via o conceito de uma instituição universitária forte como um dos pilares desse projeto, então esse rumo detinha importância ainda maior, quando se considera o contexto histórico específico da Alemanha no qual ele se inseria.
Optei, aqui, por expressar o conceito de Entäußerung como “estranhamento”; mas ele poderia, da mesma forma, ser traduzido como “alienação” ou “exteriorização”, para citar dois exemplos. Para um breve comentário acerca dessa questão na literatura acadêmica marxista no Brasil, remeto, entre outros, ao texto de Jesus Ranieri: “Alienação e estranhamento: a atualidade de Marx na crítica contemporânea do capital” (2006).
Pode-se, porventura, avançar a hipótese de que, em sua interpretação desse quadro de crise dos valores e da autoridade, de certa maneira, a escola superior precisaria, se não substituir, pelo menos auxiliar a família na reativação dos valores democráticos, ocupando, parcialmente, o vazio deixado pela reconfiguração da divisão do trabalho social de modo geral e que se expressa na mediação que o âmbito escolar faz com a vida diária. O diagnóstico está centrado, simultaneamente, sobre a constatação de que se está face de um problema generalizado, que abrange, também, os estratos sociais detentores das condições de acesso a uma educação formalizada e, portanto, mais facilmente aptos a proporcionar uma vasta gama de experiências como base para a socialização. E esses valores democráticos tomam como um dos pressupostos – talvez até mesmo aquele de maior relevância – a garantia de espaços para o debate de ideias, para a argumentação, através dos quais se poderia erigir processos cujo alcance seria significativamente maior do que aquele primariamente atribuído ao treinamento ou à preparação que caberia às instituições escolares.
A nova disposição social permite entender, outrossim, que a existência sob a ótica de uma sociedade administrada, em que resta menos espaço para aquela experiência no sentido amplo, seja capaz de ofuscar o significado antigamente atribuído à Bildung, visto que o tipo de instrução e de aprendizado instrumentais agora exigidos são, frequentemente, definidos como prescindindo da capacidade de fazer uso de uma razão crítica. Essa interpretação está embasada, por exemplo, pelo trecho a seguir, extraído de seu arquivo referente à família:
Ela preenche, cada vez menos, sua função de instituição educadora e de formação. Quando, na Alemanha de hoje, recorrentemente se ouve, também de crianças das camadas elevadas, que elas “nada trouxeram” de casa, e quando o docente da escola superior observa o quão pouco de uma formação realmente experienciada e substancial pode ser pressuposto, então isso decorre do fato de a formação ter perdido a sua utilidade prática. Mesmo que a família ainda se empenhasse na formação, tal tentativa teria de fracassar[8].
Dessa forma, nota-se de que maneira, em um primeiro momento, a família alavancou esse processo de desestruturação cujos condicionantes lhe haviam sido externamente impostos e, agora, se mostra inapta a recuperar o status quo ante. Permanece em aberto, porém, em que medida o restabelecimento de algum ideal de formação, ainda que sob outras bases e com o conteúdo modificado, constitui uma alternativa concreta.
A tentativa feita aqui foi trazer à frente alguns traços da teorização de Horkheimer referente à relação entre a universidade e um modo de ser da educação o qual, ainda que ele raramente se expresse nesses termos, poderia, a meu ver, ser denominado de formação para a razão. Se existe um consenso cada vez mais perene acerca do fato de o ideal de formação alemão, traduzido no conceito da Bildung, estar aquém das suas condições de realização, pareceme que, não obstante, resta manter em voga o debate em torno do papel que o raciocínio crítico pode assumir, na atualidade. Voltando a um dos textos citados acima, Horkheimer afirmava, em 1949, diante da direção tomada pela educação superior:
Contudo, a tecnicização do estudo ainda não progrediu tanto a ponto de a espiritualidade do conteúdo a ser apreendido tê-lo deixado por inteiro. Desenvolver o discernimento numa ordem razoável [sinnvolle Ordnung], à qual o estudo outrora levou, ainda não se tornou mera apropriação de macetes intelectuais de modo que, em vez de educação para a ciência, tivéssemos de falar apenas na aquisição de práticas de dominação. Ainda persiste um parentesco interno entre o objeto da aula, o conhecimento organizado e a teoria, de um lado, e as forças específicas do ser humano como ser de razão [Vernunftwesen], de outro. Por isso, entre ambos ainda ocorre uma interação produtiva. (HORKHEIMER, 1985b, p. 373).
Nota-se o componente central a se reter daquele ideal dissolvido: manter em voga a peculiaridade associada a uma razão científica, reflexiva, que seja discernível de um treinamento profissional estreito, com a intenção de evitar que a educação tome o rumo do reducionismo, que acabe por limitá-la a inculcar conhecimentos prontos ao ser humano. Esse prisma constitui, como se observou, o norte da proposta que Horkheimer procurou demarcar durante esse período, e que visava, por conseguinte, a culminar em uma espécie de reabilitação dessas capacidades singulares associadas à compreensão científica da realidade. A maior dificuldade dessa posição foi, ao enfrentar a propensão ao direcionamento que propiciasse um locus para o aprendizado “prático” – que deveria, para ser mais fiel ao seu conteúdo, ser denominado “aplicado” – estabelecer o grau em que seria necessário distanciar-se dessa tendência a uma instrução voltada exclusivamente ao exercício de profissões do dia a dia, sem pressupor a necessidade de dotar as pessoas de uma razão ampliada.
Sua ressalva ao descaminho tomado pela especialização desmesurada da atividade científica permanece distinta de uma condenação pars pro toto de todas as ciências particulares. O que mantém sua relevância, sob esse viés, é a busca de uma conexão entre os diferentes domínios do saber, com vistas a evitar a rendição a uma espécie de miopia intelectual.
Se o humanismo consiste em que a vida se oriente de acordo com a ideia, e não a ideia de acordo com a vida, então, hoje, voltar-se aos problemas políticos e sociais é uma tarefa verdadeira e urgentemente humanística da universidade. Penso, com isso, nem tanto na pronta adoção de todos e quaisquer métodos e técnicas das ciências sociais, que se desenvolveram em tão rica medida e em países tão variados durante as últimas décadas, embora o conhecimento crítico desses procedimentos não represente um elemento desimportante da auto-afirmação pensante na contemporaneidade. Ainda mais importante que tal conhecimento crítico é, no entanto, a análise impersuadível e a compenetração [Durchdringung] teórica das forças sociais. A teoria social e da sociedade [Gesellschafts- und Soziallehre] precisa, na universidade de hoje, ocupar um lugar mais importante do que em qualquer outra época. (HORKHEIMER, 1985b, p. 376).
Dessa maneira, a teorização deve assumir um papel que vá além daquele repreendido ao início deste texto, de uma mera busca por explicações e relações causais, para desempenhar a forma por excelência de exercício da reflexão. É justamente a rígida submissão aos preceitos dos métodos investigativos, sem estender o olhar para a realidade mais ampla, que, de certo modo, minou a capacidade crítica outrora encarnada no arcabouço da ciência.
Horkheimer procura, no esteio desse seu diagnóstico, fornecer alguma concretude à linha-guia da prática a ser fomentada no interior da universidade. O seu diferencial consistiria, para além da produção de juízos científicos acerca da realidade, da natureza e da vida social, antes, no apoio ao desenvolvimento e na difusão de uma forma singular de pensar e de se relacionar com o mundo exterior, encarar o entorno e ponderar os possíveis destinos que se poderia dar a ele. Ou seja, é, em primeira linha, o intuito de levar os indivíduos a uma participação ativa e reflexiva na produção diária da realidade tangível em que se inserem, o que, por si só, constituiria uma forma de resistência a uma existência (aparentemente) pacificada em um mundo marcado por contradições. Tal esboço de uma educação política abrange um amplo trabalho reeducativo, que difere prima facie do papel que o IfS procurou assumir, no período imediatamente posterior à sua criação, tendo se deslocado da ênfase sobre a edificação de uma proposta que visava renovar a prática de pesquisa, em determinados domínios científicos, para o acento voltado, de forma significativa, a metas em torno da constituição de uma sociedade democrática – sem, no entanto, abdicar de levar a cabo aqueles debates de cunho intelectual considerados necessários para tanto. O que une esses diferentes momentos é, ainda, a conservação de uma visada política face à realidade concreta, a qual acabou por refletir a interpretação histórica de cada uma dessas épocas.
O que transparece como visada política deve ser entendido, primordialmente, como a tentativa de problematizar a forma social, o tipo de sociedade vigente, tomado enquanto uma prática intelectual, isto é, como sustentação do pensamento científico tal qual concebido, em sentido lato, tanto no período em que Horkheimer escreve quanto contemporaneamente. Deve-se ter por horizonte o fato de que a continuidade e o aprofundamento do processo de especialização, nas mais diversas disciplinas, de modo algum colocam em questão a reivindicação que ele faz, de associar-se a atividade reflexiva da prática intelectual e o processo de formação tomado enquanto constituição do indivíduo.
Saliento, sobretudo, que uma das preocupações delineadas por ele é igualmente válida atualmente, a saber, o problema da dicotomia entre a preparação para o mercado (de trabalho, supõe-se) e o exercício do pensamento, da reflexão. No limite, trata-se aqui de uma falsa dicotomia, ao menos da perspectiva do intelectual, do educador, pois é certo que existe um amplo reconhecimento quanto à importância que cabe ao desempenho diário e abrangente do trabalho intelectual, de maneira bastante independente do tipo concreto de atividade que se exercerá futuramente. Assim, o desafio consistiria em mostrar as raízes dessa (falsa) dicotomização para, em seguida, garantir os alicerces que manteriam o sentido relativo ao pensamento crítico, concebido – no que diz respeito ao seu papel constitutivo da formação educacional em nível superior – como a tendência a refletir a respeito dos assuntos abordados e a colocar em questão as respostas apresentadas, e pautado pela necessidade de uso rigoroso de conceitos para sustentar as interpretações teóricas.
Por sua vez, ao frequentemente tornarem independentes essa preparação profissional, de caráter predominantemente formal, da constituição e formação de um indivíduo, ou seja, de uma pessoa com determinadas características, tem-se um reducionismo das implicações dessa questão científico-formativa. E, novamente, a ênfase de Horkheimer, ao fazer referência ao Vernunftwesen, a um ser dotado de razão, visa retomar como a divisão do trabalho, marca da produção acadêmico-científica, precisa ser respeitada em seu contexto específico, sem que ocorra uma hipérbole ou uma saturação quanto à inexorabilidade dessa tendência, a qual, de certo modo, deve sua necessidade à exigência concreta do trabalho científico “profissionalizado”, e há de ser distinta dos contornos que este adquire, na transmissão enquanto debate de ideias no contexto intelectual-formativo da educação.
O quão profícua pode ser a reflexão acerca desses entraves indicados a partir de um tipo de desdobramento que, como busquei apresentar, é característico de certa modernidade, porém se alastra e também ocupa ou fundamenta debates para além daquela moldura inicialmente delimitada, está em aberto. A intenção subjacente a essa exposição foi a tentativa de esclarecer alguns aspectos teóricos que envolvem o modelo de inserção da universidade como instituição, idealizada em grande medida por um debate europeu que repercutiu em outro(s) lugar(es), e de uma de suas principais tarefas, a formação e disseminação de determinada lógica do pensar e, portanto, também de um tipo ou concepção aproximada de indivíduo, para que porventura possa subsidiar criticamente investigações futuras dirigidas às questões em voga nesse(s) debate(s).
Agradecimentos: O autor agradece ao CNPq e ao DAAD pelos auxílios financeiros e bolsas de pesquisa, os quais permitiram a estadia que proporcionou acesso ao Max-Horkheimer-Archiv (Archivzentrum der Universitätsbibliothek - Goethe-Universität Frankfurt am Main), bem como a textos relevantes de Max Horkheimer.
ABSTRACT: This text sets itself two main tasks. First, it offers a limited evaluation of Horkheimer’s reflections, especially in the period directly after the end of the Second World War, on the problem of the university and how it relates to the concept of formation (Bildung), a concept fundamental to the tradition of the modern German university. Second, the role exercised by socialization in this viewpoint is examined. The objective is to elaborate reflections on contemporaneity that benefit from the focus conceded to the problem in the singular situation in which Horkheimer’s thinking was formulated.
KEYWORDS: Critical theory of society. Max Horkheimer; University. Formation (Bildung). Reason (Vernunft).
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______. Philosophie und Studium. In: SCHMIDT, A.; SCHMID-NOERR, G. (Orgs.). Horkheimer Gesammelte Schriften. Frankfurt am Main: Fischer, 1985b. v. 8, p. 361-377. Publicado originalmente em 1949.
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Recebido em: 23/02/14
Aceito em: 10/03/14
[1] Professor do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (SOL/UnB). Bacharel em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). E-mail: sfk@unb.br.
[2] Para uma pequena amostra dos temas recorrentes nos estudos sobre esse autor, cf. Benhabib et al. (1993) e Schmidt (1977). Também a relevância da teoria crítica no universo acadêmico no Brasil, no decorrer, ao menos, da última década e meia, está posta pela publicação de coletâneas que abordam essa corrente teórica (cf., entre outros, Loureiro e Musse (1998); Souza e Mattos (2007); Nobre (2008), ainda que em todas elas esteja expressa a ausência da temática educacional.
Uma exceção notável, nesse sentido, é a obra de fôlego de Alex Demirovic (1999), fruto de sua Habilitationsschrift, de título Der nonkonformistische Intellektuelle, em que aborda a concepção do intelectual que chama de “não-conformista” nas atividades docentes e de pesquisa da teoria crítica praticadas por Horkheimer e Adorno, após seu retorno à Alemanha, no período pós-1949. O leitor brasileiro também pode ter acesso à problemática educacional em Horkheimer, através do ótimo artigo de Rafael Cordeiro Silva (2009). Saliento que, dado o recorte deste trabalho, permanecerá além de seu alcance expor os nexos entre os textos aqui abordados e a ampla obra de Horkheimer.
[3] Cf. Horkheimer (1985a), em especial “III. Família”, p. 383 e segs.
[4] Essa referência aparece em diversas de suas cartas, como pode ser observada naquela dirigida ao ministro de educação estadual de Hessen, em 1961, quando faz o pedido para ser emeritiert (aposentado), onde se lê: “Quando, há mais de onze anos atrás, decidi aceitar a nova nomeação como professor na Universidade de Frankfurt, o fiz para tomar parte, na Alemanha, na educação de uma juventude progressista, livre dos arroubos de tendências totalitárias”. Cópia desta carta encontra-se no Max Horkheimer-Archiv, com a referência: MHA IV 2.209.
Direcionamento similar é observado por ele quando trata, em outra fala pública, da maneira pela qual se poderiam fortalecer os valores subjacentes a uma Europa unificada: “Talvez poucos entre vocês saibam que, em viradas decisivas da história europeia, foi a universidade que preservou as grandes ideias contra as forças destruidoras, e que foi, também, a universidade que, outrora, representou a ideia de democracia na Europa” (HORKHEIMER, 1985f, p. 88-89). O olhar sobre a educação como elemento central nessa tarefa política implícita na teoria já está presente nos trabalhos do IfS, desde a estadia nos EUA, como pode ser observado pela leitura do “Memorandum on the elimination of German chauvinism” (MHA IX 172.37), redigido em agosto de 1942.
[5] Estabelece, por conseguinte, a ligação – primeiramente apresentada por ele em um curso de 1926 – entre o movimento que diagnosticou ter ocorrido no âmbito do pensamento na Alemanha, no qual localiza, posteriormente à influência exercida pelo idealismo de Hegel, Schelling e Fichte, um período de perda de relevância da filosofia que, historicamente, coincide com a morte de Hegel (Cf. HORKHEIMER, 1990, p. 187-212). A reconstrução que Herbert Schnädelbach faz desse período, no intuito de introduzir sua obra a respeito da história da filosofia alemã nos cem anos posteriores à década de 1830, tem o seguinte entendimento: “A universidade humboldtiana buscou um compromisso integralmente produtivo: liberdade acadêmica e simultânea responsabilidade pelas exigências do estado e da sociedade; unificação das tarefas de preparação com a assistência livre de valores da ciência”. Essa concepção, influenciada pela filosofia hegeliana, passará a ser combatida já a partir da década de 1840, decorrente da ascensão da história e, posteriormente, do historismo. Ver Schnädelbach (1999, p. 38; e ibidem, p. 35-42; a referência à relevância da história e do historismo encontra-se às p. 49 e segs., em especial nota 96).
[6] Para a referência em Marx e Engels, cf. 1972 [1848], parte primeira, intitulada “Burgueses e proletários”.
[7] Para o ponto anterior acerca da origem e transformação histórica do conceito, cf. Horkheimer (1985e, p. 409-415). “Formação” traduz o alemão Bildung.
[8] Horkheimer, Item Familie, contido nas anotações preparatórias das disciplinas oferecidas por ele de nome Einführung in die Theorie der Gesellschaft [Introdução à teoria da sociedade] e Soziologische Grundbegriffe [Conceito sociológicos fundamentais] (1956). MHA VIII 42.3, p. 15, aspas no original.
Trata-se de um manuscrito datilografado com correções e observações feitas à mão.