democrática. O Príncipe deve governar, tomar decisões relativas à vida social. Embora
Hardt e Negri explicitem a função do novo Príncipe como constituidor do comum, parece-
nos uma escolha arriscada optar pelo uso da terminologia monárquica tão saboreada por
Maquiavel. Por essência, um principado nunca está arrancado do eixo vertical do poder e
de suas práticas de captura da vida humana, tanto quanto nunca se constitui sem a
propriedade. A propriedade garante ao Príncipe a força necessária para se proteger e para
lutar contra os inimigos. Ainda que o Príncipe seja uma multidão pobre de propriedades,
mesmo assim, há uma carga política que resta em sua condição monárquica.
2. A conceituação do comum como “[...] estrutura social e uma tecnologia social para o
compartilhamento” (HARDT; NEGRI, 2018, p. 132) cria certa confusão, porque essa é, em
boa medida, atribuída à comunidade. A comunidade como uma organização coletiva da
multidão pode cuidar do comum, e esse é o seu verdadeiro desafio. Sob esse prisma, as
comunidades – entendo-as não somente como um agrupamento de indivíduos, mas como
modelos éticos de vida – protegem o comum contra a apropriação ou a privatização. Essa
leitura crítica se estende à proposição dos “direitos do comum” (HARDT; NEGRI, 2018,
p. 132). Como sublinham os próprios autores, o direito é atravessado pela ótica da
propriedade, e isso justifica, por exemplo, a capilarização dos direitos sociais. Dois pontos
convergem aqui em torno da relação entre direito e comum. O primeiro foi dito antes, e o
segundo segue em decurso dele. Se o direito é um modo de proteção formal da propriedade,
qual tipo de relação estaria pressuposta entre ele e o comum? Ainda importante, quais são
os direitos do comum? A menos que o comum seja pensado aqui como um ente com
personalidade humana, seria praticamente impossível atribuir-lhe direitos.
3. Criar uma moeda comum é uma imagem sólida do comum, afirmam Hardt e Negri. O
dinheiro se torna um problema, por causa da relação social que o sustém. Uma nova relação
social, igualitária e livre no comum, pode alterar a concepção negativa do dinheiro.
Todavia, “[...] como conceber um dinheiro fundamentado no comum, em vez de constituído
por relações de propriedade?” (HARDT; NEGRI, 2018, p. 370), questionam os pensadores.
Esse dinheiro não seria um título anonimizado, mas um título social provindo de dívidas
no comum. Em termos concretos, uma renda básica comum seria a pedra angular para o
desenvolvimento dessa moeda. Essa proposição muito se assemelha com as teses do
multilateralismo capitalista, as quais defendem a criação de uma moeda comum de
circulação global. Sem embargo, essa proposta não comunga do argumento da renda básica
comum, mas sim da liberdade de circulação comum capaz de promover riquezas ao social.
Essas duas perspectivas se tocam, porém. O ponto de partida é a economia como prisma