ciências humanas se enraízam e, ao mesmo tempo, apresenta a instabilidade do objeto, isto é, o
homem – “[...] aquela invenção recente e que está em vias de se encerrar” (FOUCAULT, 2007,
p. 536) – sobre o qual essas ciências se constituem, é o campo onde os pensadores brasileiros
discutem. Por isso, os dois filósofos tupiniquins concordam que Foucault não tem interesse
algum por um tipo de arqueologia das ciências humanas que busque pelo estatuto primeiro de
uma cientificidade destas mesmas “ciências”. Pela perspectiva do pensador francês, a
arqueologia pretende desvelar que seu “[...] objeto, o homem, é um acontecimento instável na
ordem do saber.”
Já se vão quase 58 anos da publicação de As palavras e as coisas, e a obra ainda suscita
a reflexão e aproxima pensadores, como é o caso de Domingues e Candiotto, cujo interesse é o
debate rigoroso e respeitoso entre filósofos brasileiros, os quais, tradicionalmente, não
costumam se citar, como o próprio Ivan destaca, em uma entrevista: “[...] continuamos com o
complexo de vira-latas e conforme viu o diretor do Scielo, ao comentar a constatação de colegas
dos países centrais segundo a qual brasileiro não cita brasileiro.” (DOMINGUES, 2018, p. 90).
Por essa linha, concordamos com o professor Cesar Candiotto, que escreveu sobre o seu colega
e a sua obra: “Ciente de diversas incursões realizadas acerca do Opus Magnum de Michel
Foucault, não tenho dúvidas de que estamos diante de um dos mais significativos esforços de
análise crítica sobre a arqueologia do saber realizados no Brasil.”
Sobre este comentário, quero deixar mais uma vez dito que Foucault é crítico ao
comentário, porque, na Idade Clássica, ele mantém uma identidade com a representação. Por
essa razão, o comentário é uma forma de explicitar a representação e fixar a linguagem, no
interior do discurso e a sacralizar. A atividade crítica, portanto, é uma maneira de profanar o
comentário e libertar a linguagem dos limites do discurso, conforme registrou Foucault: “Desde
a idade clássica, comentário e crítica opõe-se profundamente. Falando da linguagem em termos
de representações e de verdade, a crítica a julga e a profana.” (FOUCAULT, 2007, p. 111).
Sacudir o solo onde os discursos ficam sedimentados e a linguagem petrificada é a tarefa de
uma filosofia que se instaura com e a partir da arqueologia foucaultiana e faz da atitude crítica
o seu modo de ser e fazer.
Referências