preservar aliados com a fidelidade.
A
crítica abranda mais ainda quando o assunto é a política para
os súditos. Descartes já havia elogiado a idéia de que "o amor do povo
vale mais que as fortalezas" (referência a Maquiavel, 1987, capo 20).
Agora ele vai concordar com a classificação maquiaveliana de dois
tipos de súditos
-
os "grandes" e o "povo" (cf. P, capo 9). E a
definição de cada tipo não parece muito diferente: "grandes" são
"todos aqueles que podem formar partidos contra o príncipe";
"povo" é o resto, a maioria quantitativa. Mas Descartes deixa de
considerar o conflito
entre
os dois grupos (implicíto na própria
definição maquiaveliana desses termos: "grandes" são os que
querem oprimir o "povo"; "povo", os que não querem ser
oprimidos), que é um dos pontos centrais da análise de Maquiavel
em todo o livro, para apenas considerar o conflito potencial de
cada
grupo contra o soberano. E, por esta ótica, Descartes dá preceitos
quase idênticos aos do pensador florentino: quanto aos "grandes",
"todos os polítiCOS estão de acordo que se deve empregar todos os
cuidados para rebaixá-los" (comparar com P, capo
3);
mas no que toca
ao "povo", "deve-se sobretudo evitar seu ódio e desprezo" (comparar
com P, capo 20).
Agora, quanto à maneira de evitar o ódio, o filósofo, mesmo ao
estar em sintonia
com Maquiavel, parece raciocinar mais
linearmente, retirando a sinuosidade dos conselhos deste: por
exemplo, quando diz que o prínCipe sempre deveria observar a
"justiça à moda deles" (dos súditos), o que Maquiavel admite para
o caso dos
"principados mistos" (cf. P, capo 3, 5), mas não quando o
prínCipe é inteiramente novo e é obrigado a refundar o Estado (cf. P,
capo 6). De qualquer forma, Descartes retém a idéia da reputação do
prínCipe perante os súditos, e é em tal medida que diz que vale até
mesmo o sacrifício da transparência de suas ações: assim, o soberano
deve recorrer a seus ministros e auxiliares, encarregando-os "das
condenações mais odiosas", reservando para si "suas ações mais sérias