BIOGRAFE MA DE MÁRIO DE AN DRADE - DO PLURAL

 

Elisa ANGOTTI KOSSOVITCH[1]

 

RESUMO: Este texto é a primeira parte do terceiro capftulo de minha tese de doutoramento - MÁRIO DE ANDRADE, PLU RAL (Faculdade de Filosofia, L etras e Ciências Humanas - Universidade de São Paulo). Ar, tenta-se a produção de um biografema à maneira de Roland Barthes, de quem é a eprgrafe do caprtulo. O biografema é uma livre-produção textual na medida em que não deriva de significado (como a biografia), mas, enfatizando imagens, cenas, gestos, fragmentos textuais, pulsões, opera significâncias. O biografema não dispensa a biografia - usa-a, desmembra-a, desgasta-a. Disseminação, o biografema não hesita em lançar mão de todos os operadores de linguagem à disposição. Se a biografia opera com dados, instituindo a verossimilhança no biografado, o biografema retém o arbitrário na produção do ser-de-tinta que imprime no papel.

 

UNITERMOS: Verossrmil; arbitrário; doxa; paradoxo; texto; escritura; enunciação; enunciadores; enunciado; biografia; memória; significância; intertextualidade; polifonia; semiologia.

 

Si j'éta is écriva in, et mo rt, co mme j'ai merais que ma vie se réd uisit, pa r les so ins d'un biographe am ica l et dési nvo lte, à quelq ues d éta il s, à quelques go üts, à quelqu es inflexions, diso ns: des "biographêmes", dont la disti nction et la mobilité pou rra ient voya ger hors de to ut destin et ve nir to ucher, à la façon des ato mes épicuriens, quelq ues corps futu r, promis à la même dispersi on". (R. Ba rthes - Sade, Fourier, Loyola , p. 1 4)

 

Exata me nte como a mosca na sopa, o biog rafema é o estra nho: o deslocado. Biog rafe ma, não biog rafia. Esta prese rva o du plo sentido de "g rafia", "gravu ra", pois, como graphein , põe em relação escritura e pi ntu ra. Em graphein, opera perigraphein (ci rcu n scri ção, delim itação, por gravu ra, de conto rno); ainda que aperigraphein (ilim itação, po r gravura, de conto rno, inesgotabil idade) não deva ser excluído, o fecham ento se im põe (um dos eixos pri ncipais da querela biza nti na entre iconódu los e iconoclastas situa-se preci sa me nte nesta oposição, pois é ela que propõe a legitim idade, ou não, da fi gu ração icônica l. O incontornado su bsu mido ao co nto rnado opera, por exem plo, nas Vidas, de Pluta rco: na co mpa ração das de Alexa ndre e Césa r, põe em paralelo escritu ra e pintura, uma vez que fixam ou os traços de um ca ráter (kharakter) ou os de um rosto, respectiva mente. Distingui ndo-se da história, que ex põe os aconteci mentos pormeno rizadamente, sejam eles mag nos ou ínfi mos, Pl uta rco situa a biog rafia em plano disti nto: não se prendendo nem aos grandes eventos nem aos la nces notáveis dos retrata dos, va loriza as pa rticu laridades que lhes evidenciem as vi rtudes e os vícios. Esboça ndo, assim, uma biog rafia de se ntido moral, destaca o anedótico, não porém co mo si ngularida de, porque o miúdo é apenas sign ificativo, pois adequado à visada moral. A biog rafi a constitu i-se, nele, como encenação, ta nto no miúdo qua nto no graúdo (que são atos significativos em si mesm os, pois memoráveis), de fi gura, em que o aperigraphein opera nos parãmetros do perigraphein: o anedótico ou o pito resco não se inscrevem no aleatório, pois efetu ados como sa li ência que reitera a ci rcu nscrição (m icro -sentido que não abala a isoto pia do texto ). Dife rentemente da del im itação biog ráfica, represe ntativa, o biog rafema aciona de modo aleatório eleme ntos qua isquer de um sistema de escritu ra (g rafema), desloca ndo, assi m, o verossím il, a que o próprio pito resco pertence, com a flutuação prod utiva da si gn ificância. Tal distinção entre biog rafia e biog rafema corresponde em grande pa rte à que Roland Barthes opera entre escrevê ncia e escritu ra: enqua nto aquela é reprodução, pois significado delim itado po r reg ras que prescrevem o verossím il, esta é produção; não se deixando ca ptu ra r, como aquela, por doxa , inscreve -se, fl utua nte, no pa radoxo.

O grafema produz significância na dissem inação, posto que não encena origem, de que seria o si nal. O biog rafema não de riva de si gn ifica do (como a biog rafia ), mas, sig nifi cância, faz que os sentidos fl utuem na escritu ra ou nas imagens (fotog rafia, pintu ra, fita , etc.); qua ndo recu pera algum si gn ificado, este é pulsional, pois as inte nsidades vêm com o arbítrio do factício, em que se inclui o gosto (N ota 1 ). O biog rafemador é, assi m, orelhas fl utua ntes e o biog rafema, travessia de escutas pu lsionais. O operador eng ata desejo nos textos que g rafa, atração por algum signo -texto biog rafematizável: am biva lência da sed ução, pois, nela engatada, atra i o leitor. A am biva lência opera como um tru nfo, a ser bem em preg ado: o menor equ ívoco com uta a sed ução em re pu lsa. Por isso, a atenção fl utua nte se ma ntém sob co nsta nte tensão: a do texto -tutor, que engata a do biog rafema, que engata a do operado r (no biog rafema são simu ltâ neas as pu lsões do texto -tutor) e as que engatam, outras dife rentes, no biog rafemador (12 , p. 12 ).

O biog rafema de Mário não se desencadeia co mo discu rso que reitera ou va lida o institu ído (não menos arbitrário no efeito de ve rossi milhança que prod uz), pois, engatando textos, fl utua e faz flutuar, sign ificâ ncia. Plural, o discu rso de Mário suscita leitu ras que o plu ra lizem, como as das fi guras ou enu nciadores múlti plos e tensivos que, desl izando pelo discu rso , insistem na produção de biog rafema. Na escuta de tantas vozes (Nota 2), a co rpoacta ncialidade dispersa o corpo na enu nciação pierrô-arlequinal, entre muitas efe tu áveis.

 

Ped ro Nava vai ti ra ndo do baú escu ltu ras, pi ntu ras, pastéis, fotog rafias, engenhando complexo biog rafema de Mário: biog rafema nos efeitos de biog rafia que produz com a verossi milhança, repa rti dora das imagens entre adeq uadas e inadequa das. Retratos ve rossímeis ora nas pa rtes, postu ra correta do pescoço e do crânio em Anita , mais precisa ainda em Figueira ou Bruno Giorgi, impressiona nte na másca ra mortuária, ora no co nju nto: Po rti nari não pi nta Mário, mas "megaforma" de "Wenceslau Pietro Pietra. É tórax demais e queixo dema is"; Sega ll ca pta bem a miopia, Flávio de Ca rva lho a amargura, Ta rsi l a a resig nação (Nota 3). É Nelson Nóbrega que ati nge a mais exata "pa rece nça e penetração psico g ica", isto é, rea liza os pri ncípios do ve ro sO m il de Pedro Nava (17 , p.26). Na fotog rafia, a distinção entre insta ntâ neo e arte (que tem o tem po da surpresa na eternização psicológ ica do modelo) (17 , p. 26 ). fotos que ca pta m o "jeitão" no Máriosoldado, no Mário-tu rista , no Mário da Avenida Rio Branco (17 , pp. 26-27). Nas fotografias de Bend ito J. Duarte, o Mário aleg re (17 , p. 28); nas de Warchavch ik,- excelente aná lise de metades por Nava (N ota 4) - , os "prodígios de semelha nça física e de pu nção psicológica" (17 , p. 27 ). O verossím il, a rticu lado co mo adeq uação física e psíq uica, refo rçado na "eternidade" e no "futu ro", efetuado como se melha nte (ou idê ntico ) ao presente do biog rafemador (17 , pp. 25 e 28 ), dá -se no fechamento da conco rdância psicofísica e da unifo rmidade temporal. Operação que desfaz a ci rcu nscrição bem co nseg uida: não nos pedaços de Anita, Figueira ou Bruno Giorgi, que implica m convergência, nem no que se ri am as trezentas e ta ntas faces de um mesmo pol ied ro, nem mesmo na convergência igua ladora dos tem pos no presente do enu nciador, mas no aleatório das imagens (nem gené ricas, nem moral istas, nem anedóticas ou pito rescas) que Pedro Nava seleciona; em bora por vezes valorize a convergência de ci rcu nscrição, mostra, na seleção, não um álbum que integ ralize personagem, mas o ca leid oscó pio que dissem ina o biog rafemado (até nas un ificações pa rciais que efetu a). A ênfase na fa la, suas dife renças exte rnas e internas (N ota 5), vai desl oca ndo o biog rafemado pa ra outros la dos. Daí o índice-em blema, "trezentos e cinqüenta" (N ota 6).

A voz ta mbém pontua o Má rio, de Nino Galo: "aquele seu vozei rão de barítono fa nhoso" (Nota 7). Diferentemente do biog rafema de Ped ro Nava, que sente "de esta lo a im ensa sim patia, a am iza de em estado nascente e a enorme infl uência de sua persona lidade sobre o raro que eu escrevi a" (17 , p. 28 ), o texto de Nino Galo desenvolve o processo, ca ptado em ta ntos sign ifica ntes e referencia is, de conve rsão dos afetos, que engata, além dos signos anti páticos de "dand ismo", outra conversão, a dos efeitos dos sa beres do biog rafado sobre o sujeito do enu nciado: "Eu não gostava de Mário de Andrade (... ). Apenas considerava Mário de Andrade um sujeito que, entrinchei rado atrás daque les seus grossos ócu los de mu itas dio ptrias, se, divertia a solta r paradoxos, pa ra impressionar seus ouvi ntes e a si próp rio" (14, p. 1 63). E uma biog rafia, dirigida por moralismo e doxa censora, que, nada deixando esca pa r, produz, no processo mesmo de sua conversão, sign ificantes soltos de sistema: além da "tri nchei ra", o "postiço" e "i nsi ncero", "todo cheio de unção, el evava aos bios um bojudo copo de vmho fra ncês", as meias "muito ca ras, enxad rezadas de vermel ho e azul" (14, p. 1 63). Corte, outra cena: Teatro Mu nicipal, em no ite de gala (a na rrativa vai moralizando enqua nto opera referenciais exatíssimos): casacas, exi bição de dinheiro, estu pidez humana; fasci nado por Verdi, dirige-se, "sem sa ber por que", a rio, "encosta do na pa rede", só: vaza ndo senti mentos, sofre co rte no imaginário, "horrível, meu ca ro, horrível", compensado por sim patia, "espera -me à sa ída, pa ra irmos ju ntos tomar qualquer coisa", e a lição que lhe co rrige a "formação musica i de secu ndário italiano" (14 , p. 1 64). Depois, a convivência diária com o fu ncionário chefe, "Colona de pés enormes, do Porti nari que enfeitava seu gabi nete de traba lho" (14,p. 1 64). O acúmulo de significa ntes e microrreferenciais te rmina em hino, e os pa radoxos se meta mo rfoseiam em muito saber: "Foi a ânsia de perfeição, a luta co ntra o Vulgar e o Lugar Comum, que fez Mário de Andrade o grande Mário de Andrade" (14, p. 1 65). Não é mais o pa radoxo, mas a su perioridade que co ncebe um fo ra pa ra o lugar-com um e o vulgar, diminuídos com a mai úscu la, inventa ndo pa ra si mesm o mundo à pa rte. A demarcação moral ista dos espaços do vulgar e do su perior, a minu dência refe rencial e a memória exata efetuam uma cl assificação su ma ríssima, na qual se exe rce uma sim patia oceânica, desdobrada em autocrítica di reta , os eq u ívocos dos preconceitos (14, p. 1 63). Esse ca lor hu mano confo rta Mário: em ca rta a Paulo Duarte, vem: "O (... ) Ni no, que é o tipo do sujeito que a gente quer bem e o ti po do óleo ca nforado pra rea nimar" (14 , p. 1 63). Na biog rafia de Nino Galo, a hiper-especificação dos eventos e das cenas, em que se im bricam juízos de va lor sobera nos, tem tudo do fechamento; o efeito de verossi milha nça, nela, contra põe -se à ve rossi milhança de efeito no oiog rafema de Pedro Nava.

 

O biog rafema e a biog rafia, aqui escol hidos arbrita riamente (há -os excelentes de Paulo Dua rte, Oneyda Alva renga, etc.), não se exe rcem apenas a pa rtir de textos, remetem-se à convivência com o biog rafado ou biog rafemado. Conqua nto o biog rafema difira da biog rafia, o ve rossím il pode se r usado como proced im ento de efeito textual, uma vez que o sign ifica nte e o refe rente são operáveis com o texto -tutor. A pa ráfrase, motivada e analógica, não é menos pertinente que a sign ificâ ncia e seu arbítrio: intertexto, o biografe ma pode prod uzir atestado de nasci mento, como na fa lsa citação:

 

São Paulo o vi u primei ro, 9 de outu bro de 1 893. / Na rua Au rora nasceu. / Nome: Mário Raul, digo, Luar, digo Raul, de Maria Luísa e Ca rlos Augusto.

/ Mas que bom se ria si (... ) pudesse ju nta r o nome da (... ) Mãe ao nome do (... ) Pai, sem fica r (se) pa recendo com ni nguém ! (Nota 8)

 

o biog rafema tam bém pode opera r análises ou inte rpretações na flutu ação da significância do próprio texto -tuto r, sem nele intervir. Pode reter, assim, a "Biografia",

 

São Paulo o viu primeiro Foi em 93.

Nasceu, acompanhado daquela estrag osa sensi bilidade que deprime os seres e prejud ica

as existências, med roso e humil de.

E, pa ra a publ icação destes

poemas, senti u- se mais med roso e mais humil de, que ao nascer (5, p. 8),

 

que denu ncia o enu ncia dor na im pessoal idade da tercei ra pessoa ou no dista nciam ento fi ngido, que tudo co nhece do biog rafado, até mesmo seus predicados, "estrag osa sensi bilidade", "med roso e humilde". O biog rafema põe-se à escuta de "Lira Paul ista na", que ressoa autobiog rafias: o enu nciador se pe rsonaliza, denu ncia o lugar de origem ou de nasci me nto e pede à mãe a lua:

 

Na rua Au rora eu nasci Na aurora da minha vida E numa aurora cresci.

(... )

Ma mãe ! me essa lua. (6, p. 298 )

 

Nas crônicas, o biog rafema sur preende o "sueto, a lvula verdadei ra por onde eu me desfatigava de mim" (1 1, p. 9), a brevi dade e o lu dismo no prazer da escritu ra. E "Xará, xa rapim, xêra"; ironizando, como o biog rafemado, a homonímia, deseja heteronímia pa ra que ele não fique se "pa recendo com ning uém" (1 1, p. 1 51 ). Na pista dos homônimos, o biog rafemado ta mbém se personaliza co mo co leção: os xa rás, co mo as figuras da enu nciação e do enu nciado andradi no, fo rmam legião.

O biog rafema pode ocasionar desenco ntro, o livro equ ivoca do. À ag itação su scitada no biog rafemador pelo nome na ca pa: - Um inédito?, seg ue-se a restituição pela contra ca pa: "em ca lma o ser". Nela, a foto e, por trás dos ócul os, o neg ro, "tão átrica" (1, p. 11 4), "apenas mais um xêra, enfim, seu Xa rapim" (11 ,p. 1 50), o homônimo, do outro lado do ocea no.

Quando desenvolve os nomes que vai inscreve ndo no texto, o biog rafema opera motivação nos efeitos de ca usal idade ou de rea lidade que va i produzindo. Lê os nomes, as letras dos nomes, a si gnificâ ncia que produzem, nu nca se fixa ndo nos sign ificados que

. lh es impedem a dissem inação e a deriva. Por isso, a interpretação não opera, aqui, com o

sig n ifica do (que pode ser decri pta do, evidenciado, desocu ltado: fixado) (Nota 9). Em Mário Raul, o biog rafema o anagrama de Maria Luísa e Ca rlos Augusto e ai nda "conjug(a) as memórias de (seu) Pai com (sua) Mãe" (1 1, p. 1 50). Além de de riva r-se de Maria, Mário Raul está em Maria Lu ísa qu ase intei ro, fa lta ndo a Maria Luísa o R de Mário Ra ul. Tam bém, Raul anagramatiza o nome de Carlos Augusto, toma ndo de Carlos o R e o L medianos e de Augusto o A inicial e o U de du pla oco rrência. O anagrama prossegue bri nca ndo na inversão de Raul, Luar, que ilumina Mário, nele assi nalando, embaralhadas as letras, o anagrama MOira , a um tempo "atri bu ição", "desti no", "ma rca". Na multiplici dade dos grafem as, bio ma rca o Moi ra, Luar, derivado biog rafemicam ente: Pierrô Lunar, emblema invertido de Mário Raul, Arlequim, múltiplo como seu s anagramas. Fazendo os nomes prol ifera r, o biog rafema engata a aná lise da heteronímia (N ota 10 ) escritu rai andradina, que, diferentemente da pessoa na , dá-se no intratexto, extravasa ndo-se pa ra o intertexto que dele se deriva. Victo r Knoll desenvolve uma das modalidades dessa "heteronímia", que se co nstitu i, antes, co mo pa rag rama (N ota 11 ) , analisando os "Versos Re-Versejados" (1 5, pp. 75 -99): ve rsos, estrofes, que retomam outros poemas, o mais das vezes em co ntexto diverso, efetuando autocitação, paragram as, intertextu al idade (Nota 12 ). Partindo -se da noção de "paragrama", elaborada po r Saussure (18 , pp. 20, 23, 27, 31 -32, 61 -65), esta beleceu -se co nceito de inte resse no fu ncionamento da ling uagem, o "paragramatismo", que co nsiste na apropriação de textos por outro (N ota 13) que com bina, em pri ncípio indefinidam ente, elementos seus (frases, palavras, etc.), produção. Saussu re tendeu ao pa ragramatismo com a noção de "paragrama", entendido como com bi nação de fonemas, não de letras (18, p. 28), fixa ndo-se na "difonia" (18 , pp. 46 -47 ), combi nação de dois sons, que se constitu i como o pri ncípio que disti ngue entre "anagrama" (forma pe rfeita de assonância do conju nto de sílabas de uma pa lavra, a constitu ir harmonias nicas; Sa ussu re não empregava todos os fo nemas constitutivos de uma palavra ou de um verso, o que prod uzi ria, pa ra ele, um jogo seme lha nte ao sim ples troca dilho) (18, pp. 27 -28) e hipograma (que é o rea lce de um nome ou de uma palavra, "palavra -tema" no hipograma) (18 , p. 31 ). Da difonia passou à "polifonia", combi nação, não de dois, mas de vários sons, que opera no paragrama (18, p. 48 ). A pa rti r da difonia, atingiu as combinações de letras e, enfim, o texto (ai nda que de modo indi reto, pois, co mo su gere Sta ro binski, os estudos sa ussu rianos de poesia não poderiam ci ngir-se à fo néti ca ).

 

Em ca rta a Ma nuel Bandeira, de 1 922, Mário enfatiza a seu modo a modernidade a que também se liga Saussu re; o "ha rmonismo" refuta a im itação:

 

Sei que dizem de mim que im ito Coctea u e Papini. (... ) É verdade que movo, como eles, as mesmas águas da modernidade. Isso não é imita r: é se guir o espírito duma época. As disposições ti pog ráficas dos meus ve rsos co rrespo ndem não às teo rias dos modernistas Baudouin, Aragon ou Soffi ci, mas às minhas próprias teo rias do harmonismo (vertica lidade dos aco rdes) (2, p. 12 ).

É precisa mente essa "vertica lidade de aco rdes" que está, sonora, na base do pa rag ra matismo de Ju lia Kristeva; co mbinando-se textos que devem ser lidos "simulta neamente", mas operando -se ta mbém com a noção de sentidos que se mod ifica m mutuamente, re duplicados, exclu ídos, etc. (16 , pp. 256-7), efetu a-se a sucessividade da cadeia fônicotextual:

 

Ha rmonia: combi nação de sons si multâ neos / Exemplo: / Arrou bos... Lutas... Setas... Cantigas... / Povoa r!..... (... ) / Si pronu ncio "Arrou bos", co mo faz pa rte / de frase (melodia), a palavra chama a atenção / pa ra seu insu lamento e fica vibrando, à espera / duma frase que lhe faça adquirir significado e / QUE N ÃO VEM (... ) / Mas, si em vez de usar palavras soltas, uso / frases soltas: mesma sensação de su perposição, não de palavras (notas) mas de frases / (melodias). Portanto: polifonia poética" (lO, p. 23).

O exe rcício da polifonia poética inscreve Mário na cadeia de produção do parag ramatismo, que, devido ao ca ráte r dialógico - polifônico de paráfrase parodística , apaga fronteiras, elimina códig os, efetua co nstelações de si gn ifica ntes na sign ificâ ncia, movência aberta de pe rmutações, ou ain da, intertextu alidade.

 

Produção, a inte rtextu al idade insta ncia desti natá rio, que pode ser o próprio pa ra gramatizado r efetuado em situação de fa la distinta, na qual não passa de enu nciador que poé em relação texto -tuto r e texto produzido. Em ta l fa la, afloram parâmetros co mparatistas, co mo por exem plo, o plágio, que denu ncia enu nciado r moralizado; pois, na co mpa ração, efetua -se consciência un ificadora, que ca ptu ra o aleató rio do pa rag ra matismo; 'efeito do enu nciador, a consciência denu ncia a identidade dissi mu lada (plágio) que anula o texto prod uzido su bsu mindo-o ao tutor. Mesmo quando se ex pl ica e se justifica , pretexta ndo "lacu nas da mem ória" (Nota 14 ), não va i além de racionalização das relações dos dois textos (que podem se r legião). Ora program ática (limitadora das possibil idades de permutação) ora arbitrária (prod uto ra de aleatório lúdico, sem pa râmetros assi nalados), a produção é sempre motivada; a motivação não entra em co nflito co m a sign ificância: nos anagramas de Mário, a perm utação de letras, síla bas, sentidos, pa lavras desloca se por co mbi nações e recombinações em pri ncípio inacabadas ao mesmo tempo que motivadas nos nexos que reconduzem ao texto -tutor. Operando lingü isticame nte, a motivação é, no enu nciador co mpa ratista, rem otivada na atri buição à consciência, memória, imagi nação (sujeito) do processo combi natório. Institu i- se nesses efeitos su bjetivizado res uma espécie de razão reco rre nte, tida por ino bse rva da (em bora opera nte) no processo: meca nicismo, que transfi gura a ratio em causa do texto produzido e a sim ultaneidade em sucessivi dade tem poral. Anulam-se, assi m, intertextual idade e ope rações dispa rata das, insta lando-se, ao mesmo tempo, o enu nciador na situação de descobridor de nexos, su bjetiva mente motiva dos, ou na de justifica do r de analogias, a serem salvas do plágio. Tal justifica dor rem otiva a motivação lingüística nos efeitos de consciência, que atesta (e é irônico) a anterioridade do intertexto relativa mente à consci ência (no caso, confusa e obscu ra) que pretexta ser.

O seu "Noturno" é uma das coisas de você que eu gosto mais. Muito li e me lembrava mu ito dele. Foi ce rta mente por isso que ficado no su bconscie nte, eu me encontra ndo num caso mais ou menos idêntico (o "Assombração" é verda dei ro), criei pela analogia do caso um poema id êntico, mesm o processo técnico, mesmo am biente psicológico, em última anál ise, mesma idéia. Mas criado o poema, "me esq ueci" imediata mente do de vo cê, o seq üestrei, até o nome dele seq ü estrei (2, p. 338 ).

 

O seqü estro qu ase absoluto co mprovado pelo enu nciador va loriza o paragrama enquanto encena os momentos dos diversos modos da consci ência, correlatos ao que diz da produção textu al. Enu nciado sem elha nte ao do Cea rense, que diz o intertexto e, não o ex plicita ndo em chave erudita, mais se aproxima da produção (Nota 15 ).

 

O parag ramatismo su scita compu lsão de procu ra: em todo texto, o intertexto, o intra texto, o su btexto (o bsessão dessa espécie se nos ca dernos de Sa ussu re). Prod utiva, tal pulsão al heia so rtes de neses ideais, adamismos, criacionismos, niilismos de ca rências a suprir ou de vazios a encher; co mbi natório e deslocador, o pulsional é lúd ico o mais das vezes nos eng ates e prol iferações que efetu a. O caleidoscó pio exem plifica o movi mento incessa nte de com bi nações de fragmentos, cujos reg istros ta m bém prol iferam: análises, figu rações, juízos, etc., engatadas no texto -tutor. Nisso, a intertextualidade andradina não tem fi m, cujo contrapo nto teórico, a abertu ra e o in aca bado, constitu i-se co mo emblema co nceitu al do parag ra matismo. Ta m bém as ca rtas (éd itas, inéditas, lacradas) operam intertextu alidade quer na mu lti pl icidade em que se acham, quer no parag ramatismo que remete umas às outras, retomando-se, reelaborando-se, engata ndo poemas, contos, crôn icas, fontes po pulares: intertextu alidade ilimita da, ca leidoscópio.

 

Intertextualidade epistolar: neste exem plo, grifam -se os termos retomados; a intertex tua li dade, aqui, efetua pa rag ram ati smo de repetição tota l ou de fa lsa citação (perma nece o contexto ).

A desagradá vel e a meu ve r errada co mparação entre criação artística e dor física da parturição feminina. A criação artística é um momento sublime , uma ejaculação abso rvente, extasia nte, um desl um bramento tota l inco mparável, maravi lhoso, divino (... ). Pela nossa experiência masculina a criação pode se r co mparada com o momento do êxtase sexual (7, p. 290 ).

o momento da criação é um prazer sublime , e estou completamente em desacordo com os que o consideram um parto (... ). O momento de criação é gostosíssimo, verda deiramente aquela sublimidade de integ ração e dad ivosi dade do ser, em que a gente fica na ejaculação sexual (3, p. 35).

.Rilke, você viu, chega a comparar a produção da poesia ao trabalho sublime e penoso do parto. A aproxi mação aliás é revelha e me desagrada mu ito. Antes de mais nada, é feia po rque evoca as imagens do parto que por sublimes e respeitáveis que sejam, nada têm positivamente de bonito. Além disso, e o que é pior, não quer dizer nada, não assi mi lação p ossíve l, ta nto mais imagi nada por um homem (8, p. 38 ).

 

Intertextualidade poética I:

Folclore ou refrões popu lares

 

"O meu boi morreu O que será de mim, Manda buscar outro, Morena, no Piauí "

(Mea rim) varo

 

" por Seca e Meca!" "O dote que ele me dava Oropa, França e Bahia"

(Cf. Ascenso Fe rrei ra, Poemas, p. 201 )

 

"Bata!' assat ô fôm!"

(fu rn) varo

 

" Yayá, fruta do conde, Castanha-da-Pará!"

 

Poesia

 

"Si um deus morre , irei no Piauí buscar outro!"

( Poesias Completas, p. 1 57) Paragrama de repetição parci al (co m reelaboração de co ntexto )

 

"Morali dade, lei sêca, -se Embora! por Seca e Meca! Darei Seca, Meca e Bahia".

( Poesias Completas, p. 171 ) Paragrama de repetição pa rcial (com reelaboração de co ntexto )

 

"Bata!' assat' ô fum!" (Poesias Completas, p. 44 )

Paragrama de repetição tota l ou fa lsa cita ção (com reelaboração de co ntexto )

 

" Yayá, fruta do conde, Castanha-da-Pará!"

( Poesias Completas, p. 11 8)

Paragrama de repetição tota l ou fa lsa cita ção (com reelaboração de contexto )

Intertextualidade poética ":

 

PO ESIA

"Quoth the Raven, 'Ne vermore' "

. (E dgar Allan Poe, "The Rave n")

 

 

 

"Pedro, antes que o galo cante, três vezes me negarás"

(M ateus, 26, 34; Ma rcos, 14 , 30; Lucas,

22, 34; João, 13 , 38)

 

"Kennst du das Land wo die Zitronen blühen ?"

(Goethe, "Mignon", Balladen )

 

 

"As armas e os barões assinalados Que da Ocidental praia lusitana "

(Camões, Os Lusíadas, Ca nto I, 1 )

 

POESIA

 

"Material ização da Canaan do meu Poe !

Never more!"

(Poesias Completas , p. 47 )

Parag rama de repetição pa rci al ou fa lsa citação (com reela boração de contexto )

"Tia Mi séria ta lvez antes que o galo cante Me negarás três vezes Tia Mi ri a"

(Poesias Completas , p. 223) Paragrama de repetição pa rci al (com reelaboração de co ntexto )

"Kennst du das Land

Wo die Zitronen blühen?"

(Poesias Completas , pp. 1 00-10 1 ) Paragrama de repetição tota l ou fa lsa citaçã o (com reelaboração de co ntexto )

" - 'Sen hores, as armas!'

... e os barões assinalados

Que da ocidental praia lusitana...

Marco a cadência com versos de Camões". ( Poesias Completas , p. 97 )

Paragrama de repetição tota l ou fa lsa citação (com reelaboração de contexto )

Nota: Todos os assi na lados efetu am, rel ativa mente ao texto de referência, além de novo contexto, em que a i ronia é a nota predo mina nte, desloca mento de sentido, como tam bém flutuação na leitu ra si mu ltâ nea

 

Exemplo de intertextualidade pol ifônica e híbrida (impl ícita e explícita ) é o poema "Quando eu mo rrer...". Na leitura, produzem -se isotopias (d isseminação, mu lti pl icação, etc.), intratextual idade ( referência a outros textos de mesmo enu nciador) ex plícita de tu tores lti plos: Macunaíma , primeiro poema de "O Ca rro da Miséria", primeiro de "Remate de Males", etc., como ta mbém implícita do a rtigo "Amor e Medo". Na leitu ra ta m

bém se produz intertextualidade im plícita na referência a poemas de Álva res de Azevedo, como por exem plo, "Se eu morresse amanhã !" ou "O poema moribu ndo", os qua is, por

sua vez, intertextualizam poemas de Byron e Boca ge. Ta nto em Álva res de Azevedo co mo em Mário de Andrade, a inte rtextu al idade efetua corpoacta ncial idade desmembrada

(arlequinal) e co mentário irôn ico do senti mento româ ntico da morte; a i ronia descontex tualiza a produção de Álva res de Azevedo do Romantismo brasi lei ro e o co mentário co ntextualiza a produção de rio de Andrade na modern idade. A inte rtextu al idade se faz como leitu ra simultânea:

 

MÁRIO DE ANDRADE

 

Macuna(ma

 

(p. 43 ). "O herói picado em vinte vezes trinta torresminhos"

(p. 1 43). "Sem perna direita, sem os dedões sem os cocos-da-Bahia sem orelhas

sem nariz sem nenhum dos seus tesou ros (            ). As piranhas tinham comido também o beiço dele e a muiraquitã!"

 

Poesias Completas

 

("O Ca rro da Miséria")

(p. 217).... "Aos pedaços me vim - eu ca io! -

aos pedaços disperso / Projeta do em vitra is nos joel hos nas caiça ras".

("Remate de ma les")

(p. 1 57) "Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cincoenta ".

Aspectos da Literatura Brasileira

("Am or e Medo")

(pp. 1 98- 229). (A intertextu ali dade é motivada não pelo o bjeto do enunciado, o medo do amor, mas pelo sujeito do mesmo enu nciado )

 

ÁL VARES DE AZEVEDO

 

"O poeta moribu ndo"

"Poetas! A manhã ao meu cadá ver Minha tripa cortai mais so no rosa !...

Faça m dela uma corda e ca ntem nela

Os amores da vida esperançosa!"

 

MÁRIO DE ANDRADE

 

"Quando eu morrer"

"Quando eu morrer quero ficar, Não co ntem aos meus inim igos, Sepultado em minha cidade,

Sau dade.

 

Meus pés enterrem na rua Aurora, No Paissa ndu deixem meu sexo, Na Lopes Chaves a cabeça

Esqueçam.

 

No Pátio do Colégio afundem O meu coração pa ul ista no: Um coração vivo e um defunto

Bem ju ntos.

 

Escondam no Correio o ouvido Direito, o esquerdo nos Telégrafos , Quero saber da vida al heia,

Sereia.

o nariz guardem nos rosa is, A língua no alto do Ipiranga Pa ra ca nta r a liberdade

Saudade...

Os olhos no Jaraguá Assistirão ao que de vi r, O joelho na Universidade,

Saudade...

As mãos atirem por

Que desviva m como vivera m, As tripas atirem pro Dia bo, Que o espírito será de Deus.

Adeus."

 

(Dos mu itos versos de Álva res de Azevedo que fa lam da mo rte como perda e partida e que i ronizam o se ntimento româ ntico da mesma morte, retêm -se, aqui, apenas alguns exemplares).

 

ÁL VARES DE AZEVEDO

 

"Se eu morresse amanhã !"

"Se eu morresse amanhã, viria ao menos

Fecha r meus ol hos minha triste irmã;

C. }

Qua(1ta glória pressinto em meu futuro! Que aurora de porvir e que amanhã!

Eu perdera chorando essas coroas Se eu morresse amanhã!"

"O poeta moribu ndo" e em pa rte "Quando eu morrer" efetuam isoto pias disseminação e/ou multiplicação , prod utoras de inte rtextu al idade. "Se eu morresse amanhã !" e em pa rte "Quando eu mo rrer" efetuam isotopias partida-perda (Álva res de Azevedo) e ficarganhar (Mário de Andrade). As isotopias disseminação e/ou multiplicação têm nas isotopias partida-perda e ficar-ganhar co rrespondências e entrecru za mentos, ou seja, a disseminação da co rpoacta ncialidade arlequinal, que ta mbém é multiplicação , possi bilidade única de ficar, e, além disso, perda de unidade e ganho em multipl icação. Qua nto ao "eu" româ ntico, enu ncia a morte como perda em "Se eu morresse amanhã !" - "ao menos", "triste", "Qua nta glória pressi nto", "eu pe rdera chorando" - e em pa rte de "Qua ndo eu morrer",

"saudade", e co mo desm embramento em "O poeta moribu ndo" e em pa rte de "Quando eu morre r". Apenas o "minha tri pa co rta i" perm ite ao enu nciado r ficar no ca nto, "uma co rda e cantem nela". A corpoacta ncialidade azevediana efetua a morte co mo partir, sepa ração da vida, ao passo que andradina a efetua co mo ficar ("sepu ltado", "enterrem", "deixem", "esq ueça m", "afu ndem", "escondam", "guardem", "assistirão", "atirem", "será", co rpoacta ncial idades insta nciadoras, em graus diversos, do ficar pla ntado na vida).

 

A intertextu al idade co mo processo é arlequinal na disseminação e multipl icação do brinq uedo vário da produção textu al; é apenas ar lequinal, pois não se faz com projeto tra nsce nde nte, que se encena das prescrições e cla ssificações da fi gura oposta à multiplicidade, Pierrô. É convencional o plano que divide o Padre Jesuíno do Monte Carmelo em duas pa rtes, vida e obra. Contudo, protegendo o ficcional ("Vida") da primeira pa rte co m refo rço docu menta i em apênd ice de notas ou com anál ises exa ustivas ("Obra") na seg unda pa rte, o Bióg rafo dissolve os limites esta belecidos para texto de in stituição docu mental (SPHAN). Pois a própria partição em dois, com que se defende, osci la: admitindo a adequ ação à "cientificidade" req uerida, o enu nciador das ca rta s a Rodrigo Mello Fra nco de Andrade insiste, todavia, em textu al idade diversa da ca nôn ica; a pretextação, vista , de se r poeta é di rig ida menos pelo apuro da redação do que pela pa ixão do biog rafado (4, p. 1 83). A va lorização do "l iterário" da biog rafia, recusa ndo o modelo textual im posto, dilui a própria pa rtição: di sseminam -se pela pa rte anal ítica sign ifica ntes de paixão (Nota 16 ). Essa explosão de lim ites, quer os da ca nôn ica instituciona l por biografia co ncebida co mo "tom ficção" (4, p. 1 83), "conto" (Nota 17 ), "novela ro manesca " (N ota 18 ), quer os da próp ria divisão do texto, não configura biog rafema, in adequado, por ser dissem in ado, ao fechamento preesta belecido. À circunscrição do texto é devida à preva lência do se ntido so bre a si gn ificâ ncia: não decorre, assi m, apenas da anal iticidade, que articu la conceito e senti do, deve -se, pri ncipa lmente, à ci rcu nscrição de ca ráte r (o biog rafado); em bora o tutor, lacu na r (o docume nto é ra ro ), enseje a disseminação, o bióg rafo cerca o seu objeto. O Padre Jesuíno é em blem ático: a efetuação psicológi ca que marca o texto opera ta nto a circu nscrição da personagem qua nto o mapea me nto eco nômico, po l ítico, re ligioso, etc., que especifica a a rte da São Paulo colo nial. Fech ame nto de ca ráter e de ca rtog rafia, req ui sitos de emblema (que represe nta um outro, a que co rrespo nde por ide ntificação de predica dos reco rta dos no rep resenta nte e no representa do). Essa co rrespond ência é dife rencial; esta belecendo -se em vérios níveis, o emblema "Padre Jesu íno" pode ser relacionado com outro emblema, "Aleijadin ho". Emb lemático, este rep resenta a Colônia ( referida a um primeiro a que transgride como deform ação ex pressionista nos dois sentidos da amplificaç ão) co mo sua síntese; ta mbém emblemático, o Padre Jesuíno rep resenta, não co mo o Aleija din ho, a Colônia toda, mas a ca pita nia de São Paulo: o Aleijadinho corresponde harmon iosamente ao co nju nto, o Padre Jesuíno co rrespo nde, espedaçado, ao su bconju nto espedaçado. En quanto o Aleij adinho é emblema si ntético, o Padre Jesuíno é em blema heterócl ito (e re p resenta pobreza malesta renta , diáspo ra de hom ens, estagnação econôm ica, etc.) (N ota 19 ). Assi m, hete rócl ito, o Padre Jesu íno classifica -se entre os inclassificáveis; espremido entre o erud ito, a que não alcança, e o folclórico, de cuja energia ca rece, não pe rte nce a nenhum dos dois: emblema, ma is, emblema porque fratu ra do, do di spe rso, não engata, represe ntativo, biog rafema (pois a di spersão é sign ificada, mas não efetu ada).

Apesa r de pi ntor lti plo, enca rnador de imag ens, ca ntador de sicas, riscador de arqu itetu ras: Jesuíno não é uma síntese. E sta síntese a rea liza, bastante ha rmoniosa mente, outro a rtista um pouco seu contem porâ neo, e de maior gên io, o Aleijadin ho. Jesu íno não. Jesuíno não rep resenta síntese nenhuma. É um co nju nto desesperado de espécies co ntra ditórias (9, p. 200 ).

 

Jesuíno fica nesse entrem eio malesta rento entre a a rte folcló rica legíti ma e a a rte erud ita legítima. um quê de ir reg ula ridade, de... de ba ixeza mesma na obra dêle, que não tem nada das rças, fo rmas e fata lidades da a rte folcl órica. Mas Jesuíno não chega a erudito. E um po pula resco (... ). Também nisto êle se reconfi rma no gru po dos a rtistas brasi leiros da Colônia, e representa com mais agu deza que a maioria dêles, o que era a cu ltu ra artística nacional de seu tempo (9, p. 202 ).

 

Cl assificação que disti ngue com va lores, "legíti mo"; é biog rafi a, pois opera como se ntido. O em blema fraturado circu nscreve a biog rafi a, ta nto do Padre Jesuíno qua nto da correspo ndência qu e, entre 1 941 e 1 945, Mário desenvolve a seu respeito com Rod rigo Mello Franco de Andrade (em dois registros, ínti mo e oficial). São textos si mu ltâneos: enq ua nto a co rrespondência in siste em desco bertas, dificu lda des, recom eços, o li vro se esc reve várias vezes (ci nco, seg undo o di reto r do SPHAN) (N ota 20 ). Nenhum dos dois é tutor do outro, nem seu espelho: passos de ca rtas são desenvo lvidos no livro, que é resu mido consta ntemente por relatórios ou co rrespo nd ência pessoa l: a rel açã é de trabalho, em que os textos são retoma dos nos dois sentidos, in defin idam ente. E na ca rta de dois de feve rei ro de 1 943 que o bióg rafo enfatiza o sentido da produção do Padre Jesuíno, que o livro desenvolve. É a ênfase que põe o Padre Jesuíno em relação com o Aleijadin ho; enqua nto este, pe rmanece ndo nos quadros iconog ráficos esta belecidos, transg ride a forma, deformando-a, aque le, preso aos pad rões formais assentados, viola a iconografia bra nca com a mão parda. Com o Padre Jesuíno, o mu lato ir rompe co ntra a co nvenção, ideal, da pi ntu ra hag iog ráfica; introd uzindo o pa rdo, - anjos, bispo, sa ntos - , desidea liza o modelo co m a observação (N ota 21 ). O retrato é o espaço do pa rdo: em quadros ou forros, a observação se intromete na idealidade branca, que é, de longe, predominante em Jesuíno. Nessa intromissão, a relação cruzada nos anjin hos: qua ndo seus ca belos são pixaim, bran queamento; quando a pele é parda, os ca belos se alisam. Dissi mu lação que ta mbém opera o hiera rca, bra nco e neg ro:

Ê sse sa nto é um mulato. E é um mu lato mu ito nosso co nh ecido, muito da nossa prática, de qua ntos de nós co nviveram ainda larga me nte na infâ ncia, com ex- escravos e neg ros vel hos. Di r-se-ia mesmo que é um neg ro, ape

sa r da r disfa rça da. É um haussá de' nariz aqu ilin o, maçãs salie ntes, que

os outros sa ntos não repetem, olhinhos so rride ntes, e uma bondade geral derivada de muita obed iência, mu ita ignorância e mu ito sofrim ento (N ota 22)

 

Este haussá branqueado é constituído po r dissi mul ação eleme nta r (cor); os anjin hos, qu atro, são pi ntados co m co r e cabelo entrecruzados. Das quatro deze nas de convenciona is, são os ún icos pousados em algum piso; dos qu atro, apenas um não se disfa rça, é pa rdo tanto na pele qua nto no pixaim do ca belo:

Não deixa de ser impressi ona nte a maneira com que o a rtista mulato maltrata os ca belos dos seus anjos. Ele desconhece, ig nora, os ca belos crespos à eu ro péi a, fofos e leves, flexuosa me nte encrespados. Se os faz, po r essa época , de anjos positiva mente brancos, são cabelos lisos, duma lisu ra ríspida dura, por vêzes, sem nen huma ex periência sensível de observação.

Mas se os faz crespos, logo os encrespa em cachos go rdos, muito da nossa ex periência e da nossa vida brasi leira. E até, se observa rmos o anjinho que (... ) seg u ra uma flor (... ) topamos qu ase que garantidam ente com uma fi gura qu e, além de neg róide no ti po, traz uma cabelei ra pouco menos que

pixai m ! E fáci l a objeção: Mas por que êste anjinho é branco de pele, e o anjo mulato se disfa rça? Não é ve rdade que êste últi mo se disfa rce, êle é fra nca mente mulato na côr da pele. (N ota 23)

É o céu que o dissi mul a, operação do co nju nto:

 

que o seu bodi nho foi ca rmelitanam ente disfa rça do, recebendo aquêle ba nho de luz celesti al que provàvelmente no outro mundo nos tornará to ­

dos igua is. Mas entre a profusão das quatro dezenas de anjin hos, o artista mu lato conq uistou o di reito de apenas um exem plar mu lato. Êste porém de franca mu lata ria (9, p. 1 88-9).

o disfa rce por entrecru zamento de características im pl ica o retrato. Os quatro quadros de sa ntos, do 'conju nto exta nte de oito, - Sa nta Teresa de Jesus, São Simão Stock, Sa nto

Anido e São Jo ão da Cruz - , são retratos pois fogem à convenção. Fil hos do pi nto r, e o bióg rafo va i motiva ndo o arbitrá rio e to rnando ar bitrário o motiva do, incessa ntem ente. Motivação no nome: o retrato de São Simão Stock tem por modelo o fi lho de mesmo nome; o de Sa nta Teresa, a fi lha Maria Teresa (N ota 24 ). Arbitrário do nome: o biog rafa do dissi mula a motivação, fazendo do homem Simão modelo de outro Sa nto (no que rem otiva a motivaçã o: o disfa rce é motivado) (cf. 24 ). o São João da Cruz tem o fi lho

El ias po r modelo (o que é asseg urado pela aquarela do patria rca dos Dutra, que o retrata ) (9, pp. 178-9). Mas: os qu atro anjin hos dissi mula dos (menos um, até ce rto po nto ) e os qu atro sa ntos (assim co mo o Menino Jesus de Praga que repete um dos anjin hos) (9, p. 185; 4, p. 17 1 ) são retratos dos fi lhos. En quanto a ca rta in siste na ideal idade das sa ntas,

o Padre Jesuíno do Monte Carmelo reco rta deste co nju nto feminino Sa nta Te resa, cujo modelo é a fi lh a (Nota 25) o retrato difere da im agem idealizada porque a ci rcu nscreve com o ca rater, não menos pa rdace nto do que o dos fi lh os va rões:

A adesão que êle ti nha para co m êsse retrato da Sa nta Te resa era outra, derivada de outro amor, de outra preferênci a. Jesuíno retratava alguém. A meu ver, a fi lha. E ra a adesão de um pai. E êsse rosto diferente ta mbém sugere o seu ta l ou qual mu latismo (9, p. 1 84).

O retrato é ci rcu nscrito pela obse rvação e excl ui a idealidade repetitiva da co nvenção; a general idade e a ind iferenciação desta são opostas ao in divid ual, não são si ngular, pois são perig rafia do sentido. A extensão do retrato a um co letivo qualqu er, "mu lata ria", opera resse ma ntização, efetuada psicologicamente nos textos; as descobe rtas vão, assi m, ex pl icita ndo o sentido ded utivo da investi gação: indiciada por uma "pulga atrás da orelha" (Nota 26), opera com co rrel ações entre a pi ntu ra e a psicologia (in divid ual, coletiva ). Assi m, o ca ráter ci rcu nscrito pelo retrato opera ressema ntização dive rsas com co nstelação de relações de bran co e pa rdo, que se ex pl icita m em pelo menos três oco rrências: as figuras pa rdas inva dem o forro bra nco de Itu, dissimu ladas entre figuras tam bém branca s da co nvenção (Nota 27); o pa rdo casa -se com bra nca em cidade ca rente de homem

(Nota 28); apesa r de esti ma e res peito dedicados ao pa rdo por Feijó (Nota 29) e outros brancos, ele não co nsegue ser adm itido na Ordem Terceira de Nossa Senhora do Ca rmo, de bra ncos, ing ressa ndo na Confra ria da Boa Morte, li gada ao Ca rmo, e desti nada a pretos e mulatos (N ota 30 ). O bióg rafo rea rticula essas rel ações entre o pa rdo e o branco, resse ma ntiza ndo a pi ntu ra do Padre Jesu íno; nas três espécies de relação, o pa rdo é defi ciente, pois o próprio casamento com a alvu ra é atri buído à ra reza de va rões; ma is, a dissim ulação dos pardos pelas figuras alvas e pela luz branqueadora (em que opera a excl udência de ca racterística por outra: tez e traços faciais neg róides ali sam os cabelos; ca belo pixaim alveja a pele e os traços) é dram atizada com diá logo:

Por ce rto que um prior Lou renço de Almeida Prado nu nca poderia imaginar que o a rtista de co nd ição humi lde tivesse a audácia de botar um pa rdo nos orgulhosos céus ca rmel ita nos.

- Que é aquilo, Jesu íno Fra ncisco? Por que aquele anjo está me sa in do tão escu ro?

-Fa ltou tinta, se nhor Lou renço, fa lto u ti nta (9, p. 1 89).

As relações entre bra nco e pa rdo não disseminam nada, pois operam opositiva mente circunscrição. O seq üestro na pintu ra de Jesuíno é ressema ntizador, pois seq üestra seqüestro por dissi mulação; não sendo macu na ímico, ta l seq ü estro não produz linh as de fu ga, antes se apropria sorrateiramente na pi ntu ra dos valo res esta belecidos. Absorção que resgata o pa rdo na própria cena em que é seq ü estrado, co m os bra ncos, de que se aprox ima, no céu branco que a todos iguala (Nota 31 ): a pi ntu ra, que rese rva cantinho de céu pa ra a fa mília, ressema ntiza -se alegoricamente ao estender -se à redenção da co leti vidade mulata. Mas a redenção pelo retrato, individual (e fa milial) , alego riza a de todo o grupo: dispositivo sa lváfico que tem a vinga nça por princípio. O seqü estro de seq üestro jesuín ico não leva ao céu macunaím ico; incapaz de mudar sítio, "estrelin ha", reafi rma os va lores que o seq ü estra m, dissi mula ndo-se, resse ntido, em seu céu de pi ntura (9, p. 1 90). Como questiona a repressão (9, p. 200 ), iguala com disfa rces os brancos que no céu têm assento e, alego rica mente, os pa rdos que, reiterando os va lo res, po r eles são su bidos.

O retrato, a um tempo individ ual e fa milial (e, alegoricamente, col etivo), é ci rcu nscrição que recebe, em Jesuíno, senti do genea lóg ico (Nota 32).

Tal genealogia é um si mulacro: desce ndente dos Voado res, Jesuíno é excrescê ncia de ra mo pa rdo, a que om ite por supressão do so brenome, apenas g rafando "Gusmão" em docu mentos que o exigem im pe rativa mente (9, p. 1 90) ignorada a do nome, defende a da salvação, com intenso sentido afetivo, dos seus e, alego rica mente, do grupo, ge nea logia que reci rcu nscreve o retrato co mo seqüestro resse ntido de seq ü estro escravista na imagem sag rada. Insisti ndo-se na biog rafia, que se imbrica na genea logia, a pi ntu ra jesuínica se retra i, pois reduz o dife rente ao mesmo, a si mesmo (Nota 33 ). Nova ci rcu nscrição que to rna hi pe r-perig ráfica a pi ntu ra, efetu ada por biog rafi a que se ma ntiza o significado, hipertrofiando-o à medida que o desenvolve. Pois, co mo o retrato que interpreta e reinterpreta , a biog rafia é, d ramatica m ente, sua re presentação em abismo. À medida que cerca o biog rafa do, mesmo na al egoria que o co letiviza, ci bióg rafo, enu ncia ndo os di reitos do poeta, vai operando em otiva mente, nova ci rcu nscrição; é do bióg rafo a tese de que os documentos devem ser person ifica dos, dramatiza ndo-se o emblema Jesu íno (o que, em certa medida, ta mbém ocorre com o Aleija dinho (N ota 34 ). A literatu ra, co mo ficçã o, conto, novela ro ma nesca, predetermina o sentido, pelo menos enqua nto ca ptu ra da significã ncia; o mesmo se pode dizer das imag ens, quer das fotog rafias ou das de Migu el Arca njo Dutra, a rticu ladas no senti do do cerco do biog rafado. Nem os mu latos da pi ntu ra constituem si ngularidade textual, pois opera m, antes, co mo foco di retor de emoções ("curiosíssimo", "im po rta ntíssimo" se diz de sua desco berta ), hi pérbole que figura no texto, não uma desco nti nuidade, mas o máximo de relevo (também, em nen hum mome nto a fi gura é desconstruída por outra, ironia, paródia, etc. ). Hiper-perig ráfica, a biografia, operada por sema ntizações e resse mantizações, não adm ite o biog rafema.

Leia-se a última ca rta dirigida a R odrigo Mello F ranco de Andrade, que fa la na mão pa rda. Mão parda, mão ladra: o manucristo enviado pa ra o Rio é objeto de arrepend imento,

A pa rte da biog rafia é que me ata neza , preciso reler, mod ifica r. É preciso. Tive, com a fu ga do livro pra aí, o que quer dizer que em bora ai nda não publi cada, a obra principiou vivendo por si, se m minha autorização nem co ndescendência, tive a noção exata de que, se o tom ficção está ce rto pro caso, me deixei leva r às vezes pra uma, co mo dizer, pra uma li berdosidade, uma lice nciosidade literária, uma imodéstia no trata mento do tom. Sobretudo naquele refrão de Jesu íno tomar co nsciência de seu mulatismo, olhando na frente a mão mu lata dele, pinta ndo, toca ndo nos órg ãos. É ter feito disso um refrão que to rnou licenciosa a análise psicológ ica. E u podia fazer disso um refrão se tivesse apoio bibliog ráfico (4, p. 1 87).

 

A mão parda, que manipula o Padre Jesuíno , é efetu ação psicológica que, fi guralm ente, segu ra o texto, ta nto como sinédoq ue da pi ntu ra (tam bém da música e da arqu itetu ra), quanto co mo metáfo ra alegoriza nte da a rte mulata e, po r exte nsão, da co lonial pa ul ista.

Nos efeitos de gên ese psicológi ca que o texto produz, a mão parda é o ve rossímil de to dos os ve rossím eis que dele esco rrem. No enta nto, a mão é inverossím il, não está apoiada em docu mento. Produz-se com a mão efeito de fragmentação e disseminação dos efe itos de ve rossi milhança, que a rticu lam o siste ma, anu lando-se o trabalho inte rpretativo do bióg rafo. Porque destitu ída de fu ndamento docu menta l, a inte rpretação em seu co nju nto fica escritu ra lmente comprometida. A mão:

 

Na sua fre nte enxerga aquela mão pi nta ndo. Ele era um pa rdo (9, p. 45 ). Jesuíno F ra ncisco não perde vista a sua mão, essa mão que na frente dêle pinta nas pi ntu ras e nos órgãos, a pele de um dos anjin hos lhe sempre a olhar de dedil hando nos órgãos (... ). Na revoada de anjin hos que êle despertou e fêz voar pelo alvíssi mo fôrro da Ca rmo, enxergan do aquela mão que êle é ta nto força do a olhar na pintura e nos órg ãos, a pele de um dos anji nhos lhe sa iu exata mente da r da mão (9, p. 49).

Sign ificâ ncia, a mão desconstrói o si stema co nstru ído com sign ifica dos (a pesa r dos protestos do poeta ). Figura a rticu ladora de figu ras, não é verossím il. In screve, por isso, o biog rafema na biog rafia, ou melhor, faz da biog rafia efeito verossím il de biog rafema. Pois até a motivação da mão parda e dos anjin hos mulatos na citação é ar bitrária e, assi m, a motivação é ela mesma efeito de arbítrio, dissemi nação de efeitos de senti do sistem ático. Desa rticulado e, assi m, a rticu lado, o biog rafemador- bióg rafo diz arre pender-se . dos excessos, seu eq u ívoco. Promete emenda r o texto, mas a correspondência se inter- ro mpe.

 

ANGOTTI KOSSOVITCH, E. - Bi ographeme de Mário de Andrade: du pluriel.                                                                           Trans/Form/Ação, 

São Pa ulo, 9/1 0: 55- 84, 1 986/87.

 

RÉSUMÉ: Ce texte est une partie du troisieme chapitre de mon Doctorat de 3 eme Cycle - Mário de Andrade: Pluriel (Faculté de Philosophie, Lettres et Sciences Humaines - Université de São Paulo). li s'agit d'un essai de production d'un biographeme, à la façon de Roland Barthes. Le biographeme c'est de la production textuelle à la dérive des signifiants. Ne s 'inquiétant point de la vérité, le biographeme joue à la vraisemblance tout en la déjouant. Dissémination, un biographeme n'hesite pas à metre en oeuvre tous les opérateurs de langage a sa porteé. Agissant de la sorte, il fait usage de la biographie, I'écartelle en la rendant autre à I' éca rt Si la biographie tra vaille a vec des faits en vue de I'établissement du vraisemblable du biographé, le biographeme retient I'arbitraire de la production de cet "être-en-encre" qu 'il imprime sur le papier. Son enjeu c'est donc le jeu des images, des scenes, des gestes, des fragments textuels, des pulsions, c'est-à-dire, des signifiances.

UNITERMES: Vraisemblable; arbitraire; doxa; paradoxe; texte; écriture; énonciation; énonclateurs; énoncé; biographie mémoire; signifiance; intertextualité; polyphonie; sémiologie.

 

NOTAS

 

1.         BARTH ES, Roland - Roland Barthes par Roland Barthes. Pa ris, Seuil, 1 975. p. 11 4: " Le biographeme n' est rien d'a utre qu'une anamnese factice: ce lle que je prête à I'auteur que j'aime".

2.         "L'auteu r qui vient de son texte et va dans notre vie n'a pas d'unité, il est un sim pie plu riel de 'ch armes', le li eu de quelques d éta il s tén us, so u rce cependant de vives lueurs ro manesq ues, un chant disconti nu d'amabilités L.. ); ce n' est pas un e personne (civile, morale), c'est un corps" (1 2, p. 1 3)

 

3.         " Mário de Andrade" - Introd ução de Ped ro Nava a Correspondente Contumaz. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1 982, p. 25- 26: "O retrato de Porti nari, obra- pri ma de pi ntu ra não uma idéia perfeita de Mário. E I El é ex pressionalizado numa meg afo rma que caberia melhor ao gigante We nceslau Pietro Pietra. E tó rax demais e que ixo demais. Fo ra isto e fa lta rem os óculos -:- a semel hança é quase tota l. O de Lasar Segal aprox ima-se mais e idéia perfeita da mi opia e do que ela adiciona à ex pressão. Trata -se de um retrato de mocidade e os ol hos de Mário ainda não tinham adquirido a amargura que tra nspa rece no óleo de Flávio de Carvalho, nem a resi gnada sa nti dade que está no pastel de Tarsi la. Outro paste l, o de An ita Ma lfatti é dessemel hante e bem a noção de sua postu ra de pescoço e crânio. E sta ainda apa rece melhor nas ca beças escu lp idas de Joaq uim Fig ueira e Bruno Gi orgi e mesmo na imobil idade terrível da másca ra mo rtuária de Marioenorme de Andrade".

 

4.        So bre as foto g rafi as de Warchavch ik, Mário-pluralíssimo nas quatro meta des do rosto: "Muito de ind ústria deixei pa ra o fi m as melhores foto grafias de Mário de Andrade. As tiradas por Warchavchik. Qua lquer del i,ls é foto grafia de a rte princi pa lmente difíci l de rea lizar porque apanha o modelo de frente. L.. ) E o retrato de um homem em plena fo rma e sem apresenta r certos sinais de mag reza fo rçada e de queda de traços traduzindo reg ime, moléstia e ve lhice. Mas que retra to... Dividido por uma ho rizo nta l que passasse pela po nta do nariz te mos embaixo o queixo vo lu ntarioso e possa nte dum dionísio so rride nte. a meta de de cima é a de uma gorgona míope ato rmentada pelas próprias serpe ntes. Se fizermos o mesmo jogo co m uma vertica l, o lado esq uerdo é o dum fri o e lúcido obse rva dor, o olhar agudo e cortante se esgu eirando de dentro da deformação ha bitualm ente aca rreta da pelas lentes dos ócu los. A meia boca é irôn ica e altiva. Mas a metade di reita mostra um olhar mo rto de sofredor e rtir enqua nto o resto de sua boca tem o heroísmo e a endu rãncia de co ntinuar sorri ndo apesa r de tudo". In Andrade, rio de. Correspondente Contumaz: Cartas a Pedro Nava, 1 925 - 1 944 , o.c. I ntrod ução de Ped ro Nava, p. 27.

 

5.          Ib idem, pp. 28- 29; as mesmas diferenças externas e inte rnas observa das na ima gem são enfati zadas na fa la: " E como é? que fa lava esse granganzá do Mário. Com a melhor voz e o modo

mais macio. Como que lubrificava as palavras baba ndo as síla bas que sa íam no seu sotaque provi nciano, separadas feito cu bos de gelo cujos ângu los e arestas fossem émoussés por de rreter. Suas sílabas e pal avras se arredon davam e esco rreg avam so bretu do nos seus CH H. Marcha. Marchar, Warchavchik. Ch ique. Meschick. E ti nha a propriedade de fa lar se rindo - e ria, como ele ria! riaté sem razão. E era nessa mesma fa la de pa ul ista no sem se im posta r nem se im portar que ele era um intérprete adm irável de poesia e prosa. Lemb ro de tê- lo visto e ouvido ler coisas suas em casa de Rodrigo. Sua construção oral ti nha, então, modulações de frase musical. E não era que decl am asse, Deus me livre! O que ele era é um dizedor fa bu loso até de frase de co nversa. Deg ustava a pal avra e essa sua volúpia palatal é que deve ter in spirado seu Congresso de Língua Nacional Ca ntad a".

 

6.         Ib idem, p. 31: "Ti nha nada que co mpreendê-lo mais do que ele estava se mostra ndo na sua fa ntástica diversidade (trezentos! trezentos e cinqü enta !)".

 

7.         A rti go enviado pa ra publ icação em O Estado de São Paulo; recu sado, é divulgado pela se nsi bilidade de Paulo Dua rte. Cf. DUARTE, Pa ul o. Mário de Andrade por Ele mesmo. São Pa ulo, Eda rt, 1 971.

 

8.          O primeiro seg mento está em " uma Gota de Sangue em cada Poema", in Obra Imatura , p. 8; o seg un do, em "Lira Pa ul ista na", in Poesias Completas, p. 298; o terceiro seg mento está em "Xará, xarapim, xêra", in Os Filhos da Candinha , p. 151.

 

9.          BARTH ES, Roland. S/Z. Paris, Seuil, 1 970, p. 1 2: interp reta r um texto , "ce n' ést pas lui donn er un sens (plus ou moins fo ndé, plus ou moins li brel. c' est au co ntra ire, appréci er de quel pluriel il est fait. (... ) Ce texte est une galaxie de si gnifi ants, non une structu re de sign ifiés".

 

1 O. Alguns dos primeiros escritos de Mário de Andrade são publ icados sob nomes diversos: Mário Sobral assi na "Há uma Gota de Sangue em ca da Poema" e a rtigos da época, Mário Raul assi na outros, M. S. ou M. R. ou M. de A. ou M. A., e outros... As perso nagens em que proliferam os índ ices da enu nci ação: Juca, de "Vesti da de Negro" e de "Frede rico Paci ência"; Menino da Camisolin ha; Pa ulin o; Menino Trele nto, de "Reconhecimento de Nêmesis"; o na rrador- perso nagem de "Peru de Nata l"; Janjão, Siomara Ponga, Pasto r Fido, Sarah Lig ht, de O Banquete; no Diário Nacional escreve com o pseu dônimo de Lu ís Pinho (Entrevistas e Depoimentos, p. 9); neste mesmo texto , p. 7, outros pseu dôni mos: J. H. de A. e G. de N.

 

11. Julia Kristeva disti ngue, em Séméiotiké, (Pa ris, Seuil, 1 970), pp. 256- 257, três espécies de paragrama, fazendo valer o negativo: 1. Negação tota l: " La séq ue nce étra ng êre est tola lement niée et le se ns du texte référenti el est inversé"; 2. Negação simétrica: " Le sens général logique des fragme nts est le même; il n'em pêche que le paragramme (... ) donne au texte de référence un novea u sens"; 3. Negação parci al: "Une seu le pa rtie du texte référe nti el est niée". Para essas espécies (o utras poderiam ser eventu alm ente esta belecidas), a simulta neidade de leitu ra é conditio sine qua non de efetu ação de paragramatismo. Destaqu e-se que, na cl assificação de Kristeva , opera -se a inversão ou a mudança de sentido do novo texto ou do texto de referência (ou da re lação que a leitu ra simu ltâ nea produz). Afi rm ar, na efetuação paragramática ou na intertextu ali dade, o sentido , ainda que novo, é reto rn ar ao que este trabalho recusa, um sentido. Pelo co ntrá rio, propor plural idade de sentidos e dissem iná- los na simulta neidade da si gn ificâ ncia que os prod uz. Além disso, o paragramatismo (ou a intertextu ali dade) opera tanto dial6 gica quanto pol ifon icamente ( s'endo a dual apenas a re lação mínima, mero.caso entre os possíveis). To davia, dois textos no mínimo constitu em referência do texto produzido. Na re lação lti pla entre a referência e o texto prod uzido infri ngem -se os princípios que se apl icam às ling uagens enquanto as defi nem operaci onal me nte. Por isso , o intertexto pode efetu ar, sem ca usa r espécie, ta utologias, repeti ções, fa lsas citações, em que os mesmos texto , trec ho, verso , frase, palavra não são os mesmos em novo seg mento; ta mbém pode efetu ar, sem estra nh eza, contradições (o texto de refe rência é contrad ita do pelo novo: paradoxo, inadm issível nas ling uagens da doxa ); pode efetu ar, ainda, incom pati bi lidade ou incom possi bil idade, em que o prod uzido e o texto -tuto r não podem co nceber-se como coex iste ntes e nem mesmo co mo com possíve is (idealm ente); pode efetu ar, enfi m, desarticu lação de palavras, sons, ou até de senti do, na produção do texto; consid erem-se ainda os paragramas ex pl ícitos e implícitos, aque les ta mbém opera ntes na repetição ou na fa lsa cita ção e estes, disfa rçados de toda espécie, que masca ram a referê ncia. Exem plo de paragramas ex plícitos: "Se nos mictórios públ icos flo resce a a rte propriam ente 'i moral", as latri nas públ icas são uma enciclo péd ia de desen hos, quadrin has, frases" (Namoros com a Medicina , p. 89) e o verso: "Num mictó rio de São Pa ulo 1 Po uco depois li uma vez, 1 Sobre o desenho dum pênis, 1 Rei dos Re is" ("Li ra Paul ista na", p. 30 1); de implícitos: O Ateneu e "Frederico Paciênci a", cujo índ ice está no a rtigo "O Ateneu"; o engate que efetu a o paragrama é a isotopia adolescência. O intertexto , poético, critico, etc., é prod ução textu al que fratu ra a sign ificação co mo possibili dade, ta lvez ún ica, de sign ificâ ncia. Exem plo: Foto e legenda de rio de Andrade, re produzidas por Telê P. A. Lo pez - "Rou pas freudia nas 1 Fo rta leza 1 5-V II-27 1 Foto grafia refoul enta IRefou lement", in Mário de Andrade: Ramais e Caminho, p. 79. Aqui, a sig n ificã ncia não é operada pelo contraste do branco e do preto , oposição óbvia de sign ificação, mas pelo interva lo da imagem e da legenda, o seu "sentido obtuso", que resi ste à interp retação. Além disso, a intertextu al idade atiça a prod uti vidade lúd ica, em que, por exemplo, dadas certas reg ras, efetu am -se co mbinações.

 

1 2. Cavalcanti Proença expõe mu itos elementos intertextu ais de Macunaíma em seu elaboradíssi mo estu do das apropriações do fo lclore, provérb ios, adivi nhas, canti gas de ro da, etc. Cf. o seu Roteiro de Macunaíma , Rio de Janeiro, Civi l ização B rasi leira, 1 969, pp. 26- 50 e 145-1 54. Também rio Chamie chama a ate nção, em Intertexto , pp. 427- 478, para a intertextu ali dade em Macunaíma. João Pacheco, em Poesia e Prosa de Mário de Andrade, São Paulo, Ma rtins, 1 970, pp. 50- 54, insiste na referência popu lar em versos de Mário de Andrade, a que denom ina "rem in iscências" e "contaminações". Telê P. A. Lo pes anal isa em pormenor os processos de aproveita me nto (semelha nças e tra nsfo rmações) do Vom Roraima zum Orinoco , de Theodor Koch -Grünberg, em Macunafma (Cf. o seu Macunafma: a Margem e o Texto , São Paulo, Hu citec/S ecreta ria de Cultura, 1 974, pp. 27- 72). Nites Therezinha Feres e Maria He lena G rem becki arrolam as anotações margi nais de Mário, ressa ltando as que fo ram posteriormente ree la boradas em textos e contextos diversos. (Cf. FE RES, N. T. Leituras em francês de Mário de Andrade. São Pa ul o, I. E. B. IUSP, 1 969, pp. 56- 76; GREMB ECKI, M. H. Mário de Andrade e "L 'Esprit Nouveau". São Pa ulo, I. E. B. IUSP, 1 969, pp. 23- 42).

 

1 3. KRISTEVA, Júlia - Séméiotiké, p. 255: O paragramatismo é ''I'absorption d'une multi pl icité de textes (de sens)".

 

1 4. STAROB INSK I, Jea n. Les mats sous les mots. Pa ris, Gallim ard, 1 971, pp. 1 8-1 9: "Mais Imagi nation sur lacune de mémoire est le principal facteur de changement avec volo nté de rester autrement dans la tradition. Dans le domaine lingu isti qu e, on voit fleu rir, exactement de même, toute un e catégorie de fo rm ati ons in génieuses provoq u ées par le défaut de mémoire ".

1 5. O Anônimo diz com propriedade, em Memórias de ditos do sertão do Ceará: "As fa las do fa ladô co mpõem-se de ta ntas fa las 1 que nem pode si alem brá 1 mas que agora eu vou contá".

 

1 6. Cartas de Trabalho , p. 1 53, em que a paixão é sign ificâ ncia ("tresler"): "De ta nto estu dar e ver Jesuíno, aca bei amando Jesu íno e desco nfio que esto u treslendo um bocado. As coisas dele me arrebatam e preciso adquirir mais eq uilíbrio". Sign ifica ntes disseminados: " 'meu' padre Jesu íno" (pp. 1 40, 145, 1 50); à p. 1 83, caem as aspas, anula -se o mínimo de afasta me nto re lativa me nte à posse, "meu Jesu íno". Dois sign ifica ntes, não-pronomina is, mas adjetivq: "o nosso íncl ito padre" (p. 1 64); ou su bsta nti vo: "esse pera lta do padre Jesu íno" (p. 1 47).

 

17.      Padre Jesuíno do Monte Carmelo. p. 27: "Eu sei mu ito bem que a vida. do padre Jesuíno do Mo nte Carmelo. fo i concebida quase como um 'co nto ' biog ráfico. Interpretei biografica mente".

 

18.      Cartas de Trabalho. p. 147; a paixão operando a novela: "Estava di sposto a escrever mais uma biog rafia do padre Jesu íno. estrita mente cie ntffica. o que não me custa nada. Serão apenas uns dois dias de trabalho. pega ndo no escrito e red uzindo a equação. E mandaria as duas versões pa ra você esco lh er. Nem perderei meu trabalho lite rário com isso. pois o desenvo lvia numa nove la ro manesca basta nte dese nfrea da. que a vida do padre bem pra isso".

 

1 9. Padre Jesuíno do Monte Carmelo. p. 31. O deslocamento do marido da mãe de Jesu íno é exem plo dessa di áspora. ausência de home ns; sabe-se da mãe que "era casada. mas quando Jesu íno lhe nasceu. de mu ito que não vivia com o marido. o qual se ausenta ra para o Cuiabá - a obsessão au rígera dos paul istas daqueles tem pos".

 

20.  Cartas de Trabalho. p. 177: qua rta versão; p. 178: quinta versã o. No Prefácio ao Padre Jesuíno do Monte Carmelo. que não assi na. Rodrigo Mello Fra nco de Andrade in siste em cinco versões (p. 1 6).

 

21.  Padre Jesuíno do Monte Carmelo. pp. 177- 178; Cartas de Trabalho. p. 171; a qu estão é. aqui. proposta de modo si ntético: " A procu ra de 'africa nismos' nas fisionomias. me levou a um desco brimento novo. mu ito gracioso. É que entre as várias deze nas de anjos desse céu ituano. uma cari nha Jesu íno re petiu integ ralmente no medal hão do Sr. Jesus de Praga que pi nto u para essa mesmo Carmo de Itu. Ora com esta verifi cação. o problema do retrato. da re produção de uma pesso a viva e apreci ada se impunha ãs min has pesq uisas. E fo i ela que me levou a desco bri r na tão dramática fase fi nal da obra do a rtista. a existência de um retrato inco ntestáve l. E um retrato de fa mllia. que poderá mu ito bem ser um auto- retrato ! (... ) Se hoje um docu mento ou trad ição

nos dissesse que este El ias e os dos santos de Jesu íno eram retratos de irmãos. ou de pai e filho. ou mesmo de uma s6 pessoa. não haveria ni nguém bem -i ntencionado (... ) a pôr em dúvida a tradição".

 

22.  Padre Jesuíno do Monte Carmelo. p. 189; Cartas de Trabalho. p. 170: "Nesse mesmo céu carmelitano de Itu. um dos sa ntos po ntífices co nsagrados. se de tez disfarça damente arianíssi ma. não deixa de ser. como tipo. bel et bien um mulato velh o. Isto para não dizer. com mais fra nq ueza. um negro ve lho. desses que fo ram 'escravo de meu avô' mu ito do nosso co nh eci mento ".

 

23.  Padre Jesuíno do Monte Carmelo. p. 1 88; Cartas de Trabalho. p. 1 69: "O caso del icioso dele ter pintado um anjo mu lato no teto da ca pela-mor da Carmo ituana".

 

24.  Ib idem. pp. 179- 180: " O mais provável é pois que o São Si mão Stock seja o fi lho Si mão Stock. que seri a mu ito pa reci do com o padre El ias. ao passo que o. fisionôm ica me nte discrepa nte. espigado Sa nto Anido fôsse o outro fi lho El iseu. Ou quem sabe se o co ntrá rio pra despistar... E a Santa Teresa seria a fi lha. irmã Maria Teresa do Monte Carmelo. por seu nome todo".

 

25.  Padre Jesufno do Monte Carmelo. pp. 1 83- 1 84; na ca rta de 2 de fevereiro. as sa ntas são conceb idas sem exceção nos pad rôes da idealidade: "Nas sa ntas. não; não apa rece nen hum ·africa nismo·... bi oti pol6g ico. Dir-se-ia que na conti ngência de pi ntar a mul her. um impedimento qua lquer o fazia se esqu ecer de sua mestiçagem" (Cartas de Trabalho. p. 1 70).

 

26.   Cartas de Trabalho. pp. 1 69- 1 70: a interrelação pi ntu ra-psicologia e o senti do ded utivo da pesquisa ex pl icita-se no passo: "No meu estudo da obra dele (Jesu íno) veio se fi rm ando aos poucos em minha con vicçã o o mulatismo revo lta do do a rtista. um verdadeiro 'complexo de infe rioridade' converti do em afi rmação orgulhosa o eu. prova do em várias afi rmações cu riosíssimas (ou seja. as irru pções pardas na iconografia) (... ). Com se melha nte pulga atrás da o relha. me botei a estu dos mais atentos a respeito dos ti pos pi nta dos por Jesu íno e fiz desco brimentos que, dado esse elemento inicial eram fáceis de fazer, mas que não deixam de ser uma curiosidade e interesse impo rta ntíssimos no gera l da pi ntu ra re lig iosa brasi leira". Segue-se a pa rtir deste po nto a exposição da pi ntu ra de fi guras mulatas.

 

27.  Padre Jesufno do Monte Carmelo, p. 1 88, qua nto ã citaçã o exem plar, tirada de lu ís Gama: " E ntre o côro dos anjin hos 1 Ta mbém mu itos bod inhos". A exposição pormenorizada da irru pção mulata nos céus bra ncos, cf. pp. 1 74 ess.

 

28.  Ib idem, pp. 44- 45: "Não se adm ite solteiro em Itu. Algun s pais so nhariam Jesuíno Francisco pa ra marido das fi lh as, esq uecendo sem qu erer o ondul ado dos cabelos do mu lato claro, fi lho de parda, neto de parda, mu ito alvejado pelos sa bôes das Ilh as ( ••.l. Maria Fra ncisca , a no iva

prometida era tão branca, rosto red ondo, liso, duma alvura im passíve l".

 

29.   Ibidem, pp. 74- 78. Traz a oração ne bre de Feijó, às pp. 205- 21 3.

 

30.  Padre Jesufno do Monte Carmelo , p. 66: " A Ven erável Ordem Terceira de N. S. do Mo nte Carmelo da vila de Itu , consciente das 'vi rtudes do postu la nte, im petrou da Sa nta um breve mandando admitir em seu g rêmio o padre Jesu íno do Mo nte Carmelo'. Mas ou o breve nu nca veio ou fo i negado, e a vitória de Jesu íno term inou nessa bofeta da. Pardo, fi lho de parda, neto de parda. Negro". (Cf., ta mbém, pp. 1 80, 1 99).

 

31.  Padre Jesufno do Monte Carmelo , p. 1 97: "Jesuíno é um mestiço e se revo lta co ntra as cond ições sociais que o abatem. Jesu íno se vi nga e faz ju risprudência co ntra as leis da soci edade em que vive. Cria na sua pi ntu ra , para os mulatos e os negros, um lugar de igua ldade - seria de igualdade? •• - no re ino dos céus. Essa a fase mais original da obra do a rtista ".

 

32.  Padre Jesurno do Monte Carmelo , p. 1 90: "O processo genea lóg ico da pi ntu ra é o retrato. Por certo sem consci ência determ in ada dêsse lado genealóg ico do retrato , numa aparência apenas de ca rícia afetiva e paternal, o mu lato cria para os seu s a trad ição fam ilial, retrata ndo alguns dos fi lhos em anjin hos".

 

33.   Ibidem, p. 1 98: "A sua (de Jesu íno) perso nalidade a rtística e o seu dogmatismo re lig ioso não tinham a menor ca pacidade pa ra a biografia.•• dos outros. Jesuíno sabia, e sem querer, se biografa r a si mesm o".

 

34.  Padre Jesufno do Monte Carmelo , p. 27: " lendo Á lvaro Li ns, vi George Santaya na reco nhece ndo que a Histó ria, se por um lado é ciência na trad ução dos documentos, é ta mbém uma 'a rte dramática' pelo em que é obrigada a personalizar as idéias e as paixões dos mo rtos".

 

 

 

REFER Ê NCIAS BIBLIOGR Á FICAS

 

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[1] Depa rtam ento de Ciências Sociais Aplicadas à Educação - Facu ldade de Ed ucação - UN ICAMP -13100 - Campi nas - SP.