
A Orientação e Mobilidade nas aulas de Educação Física Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 9, n. 2, p. 39-52, Jul.-Dez., 2022 41
cAMinHO MetOdOlÓGicO: A nArrAtiVA AutObiOGrÁFicA
Ao narrar minhas lembranças de um viver, de saberes da experiência, construídos no
afeto, por estar aberto e apaixonado pela prática, busco expressar e compartilhar minha percepção
sobre o que me passou, sobre os aprendizados e as relações sociais estabelecidas, sobre saberes
especícos e singulares que pude construir junto aos estudantes, considerando minhas limitações
enquanto pessoa, professor, pesquisador, minha complexidade humana. “O fato de me perceber
no mundo, com o mundo e com os outros me põe numa posição em face do mundo que não é de
quem nada tem a ver com ele [...] minha presença no mundo não é a de quem a ele se adapta, mas
a de quem nele se insere” (FREIRE, 2011, p.53).
Acreditando que “a experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca.
Não o que se passa, não o que acontece, ou o que toca” (LARROSA, 2020, p. 18). Expresso aqui
não tudo o que se passou, mas o que me afetou, o que me foi signicativo, o que consegui captar
por meio de minhas limitações, parte de um todo em constante movimento de transformação,
permeado por tensões, desejos, anseios, pretensões, medos, receios, sentimentos de quem vive o
agora e a complexidade do cotidiano, que não pode ser controlado ou planejado, que é inesperado
e (des)construído também nas relações sociais, de outros seres humanos complexos, singulares com
características únicas.
Acreditado que não há um estudante com DV universal, que as relações sociais não são
as mesmas, que a construção do conhecimento e o diálogo não são iguais nem com as mesmas
pessoas, que a vida é efêmera e nós estamos em constante (re)construção do que somos. “Somos,
historicamente, o emaranhado de histórias que (ou)vimos/lemos/narramos ao longo de nossas
vidas” (PASSEGGI, 2020, p. 69).
Gai (2009) diz que a narrativa seria a transformação de nossa experiência em uma
linguagem a ser compartilhada. A narrativa de um ambiente é construída por nossa percepção,
o ambiente que percebemos é nossa invenção, considerando o estado emocional e psicológico do
narrador, o que torna a narrativa subjetiva. E a educação escolar se faz em meio às relações com o
outro, com as múltiplas narrativas existentes nos cotidianos escolares.
Nesse contexto, o signicado e sentido que expresso em minhas lembranças são,
agora, minhas percepções de um saber de experiência construído no fazer pedagógico, que aqui
escrevo, (re)signico enquanto me transformo e (re)construo, assim como renovo meus saberes,
compartilhados por meio de minha narrativa autobiográca (PASSEGGI, 2020). Uma narrativa
que expressa minha percepção e (re)signicação do vivido, que assim como eu é limitada e singular,
mas que ao ser escrita e compartilhada, pode contribuir, potencializar e ressoar em outras práticas,
outros saberes, outros cotidianos com a possibilidade de novas (re)signicações de quem as lê.
Uma narrativa, conforme Santos e Torga (2020), contada por alguém que já não é mais
o mesmo, que relaciona a minha memória e escrita, que se caracteriza na (re)signicação de minhas
vivências, do que me marcou e me afetou. Uma memória não retilínea, “[...] não é uma terra
que nos permite decidir plenamente o caminho, cada incursão tem diferentes gatilhos e diferentes
trajetos, ainda que se tratem das mesmas pessoas e/ou dos mesmos acontecimentos” (SANTOS;
TORGA, 2020, p. 137, grifos do autor). Uma narrativa autobiográca, caracterizada também pelo
texto em primeira pessoa (PASSEGGI, 2020), que reforça a escrita de si, de uma prática singular,
de suas vivências. “Narrando de si o sujeito tem por temáticas sua própria vida, aquilo que marca a
sua existência e a singulariza, por consequência” (SANTOS; TORGA, 2020, p. 134).