Autoadvocacia de pessoas com deciência inseridas no mercado de trabalho Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 9, n. 1, p. 11-26, Jan.-Jun., 2022 11
https://doi.org/10.36311/2358-8845.2022.v9n1.p11-26
is is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License.
AUTOADVOCACIA DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA INSERIDAS NO MERCADO DE
TRABALHO
SELF-ADVOCACY OF PEOPLE WITH DISABILITIES INSERTED IN THE LABOR MARKET
Luana Fernandes de JESUS
1
Maewa Martina Gomes da Silva e SOUZA
2
Simara Pereira da MATA
3
Resumo: Para minimizar as barreiras sociais encontradas pelas pessoas com deciência, destaca-se a importância que a educação possui
em relação à transformação da realidade desses sujeitos, sobretudo acerca das questões que envolvem a superação dos inú- meros quadros
de desempoderamento. Assim, o presente estudo teve como objetivo descrever o perl de pessoas com deciência inseridas no mercado de
trabalho, bem como analisar a trajetória educacional e prossional desses sujeitos. Participaram do estudo três colaboradores com deciên-
cia, sendo eles: um participante com deciência visual, um participante com deciência física e um participante com deciência múltipla.
Para essa pesquisa qualitativa de natureza descritiva foram realizadas entrevistas tendo como instrumento um roteiro semiestruturado. Os
resultados indicaram que a inserção e participação ativa dessas pessoas no mercado de
trabalho constituiu-se como um fator positivo no
processo de desenvolvimento de habilidades de autoadvocacia.
Palavras-chave: Autoadvocacia. Pessoas com deciência. Mercado de Trabalho.
Abstract: To minimize the social barriers encountered by people with disabilities, the importance that education has in relation to
the transformation of the reality of these subjects is highlighted, especially regarding the issues that involve overcoming the
numerous
situations of disempowerment. us, the present study aimed to describe the prole of people with disabilities in the
job market, as
well as to analyze the educational and professional trajectory of these subjects. ree employees with disabilities participated in the study,
namely: a visually impaired participant, a physically impaired participant and a multiple disability parti- cipant. For this qualitative
research of a descriptive nature, interviews were carried out using a semi-structured script. e results indicated that the insertion and
active participation of these people in the labor market constituted a positive factor in the process
of developing self-advocacy skills.
Keywords: Self-advocacy. People with disabilities. Labor Market.
1 INTRODUÇÃO
Sabe-se que ao longo do tempo, e ainda na atualidade, as pessoas com deciência são
consideradas pela coletividade, sujeitos desviantes, por apresentarem diferenças consideradas
incapacitantes.
¹ Mestre em Educação. Universidade Estadual Paulista – UNESP. E-mail: luanafernandes.jesus@gmail.com. Orcid: https://orcid.
org/0000-0002-2809-2037
Doutora em Educação. Universidade Estadual Paulista – UNESP. E-mail: maewa.martina@gmail.com. Orcid: https://orcid.
org/0000-0003-4322-3100
Doutoranda em Educação. Professora da Educação Básica no município de Rio Claro/ SP. E-mail:.simaraps@yahoo.com.
br.Orcid: https://orcid.org/0000-0001-9178-3749
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JESUS, L. F.; SOUZA, M. M. G. S.; MATA, S. P.
Em contrapartida, com o movimento inclusivo, cada vez mais as sociedades vêm
se conscientizando de que essas pessoas para além das limitações impostas pelas deciências
possuem condições de se desenvolver e ter uma vida ativa e autônoma.
Desse modo, a partir do rompimento da atribuição de incapacidade, abrem-se as
possibilidades de minimização e até mesmo da superação das barreiras encontradas pela pessoa
com deciência.
Para tanto, a pessoa com deciência deve ser empoderada para ter consciência da sua
condição social e desse modo ter as ferramentas para conquistar melhores condições de vida.
Contudo, para que a emancipação das pessoas com deciência se concretize, a educação desses
sujeitos não pode ser esvaziada de sentido, muito menos desprovida de intencionalidade, a
qual manifesta-se em práticas que valorizam a repetição de ações que supostamente constroem
competências.
Segundo Mota Rocha e Oliveira (2017, p. 4):
Relevante função social da escola contemporânea é a construção de uma formação crítico-
emancipatória, o que pressupõe conceber e atuar na educação como ação política envolvendo a
apropriação de diversas estratégias de inserção social/escolar: afetivas, culturais sociais, estéticas
e
metacognitivas, importante condição para a ressignicação de subjetividades.
Nesse sentido, há a necessidade em se abordar conceitos que buscam pensar nessa
educação libertadora que pode ser a chave para a tomada de consciência de sujeitos livres e
autônomos, sendo eles o conceito de autoadvocacia.
No que se refere à autoadvocacia, ressalta-se a necessidade de dedicar certa atenção e
cuidado na abordagem conceitual. Sendo assim, abordar tal conceito signica mais do que dizer
em autodefesa ou ser advogado de si próprio. Representa dizer que a autoadvocacia concebe
a capacidade do sujeito em falar ou agir por si mesmo, escolhendo o que é melhor para si e
assumindo a responsabilidade de consegui-lo (DANTAS, 2014).
Dessa forma, pretende-se então romper com o ciclo de desempoderamento que
acomete as pessoas com deciência ao tornar audíveis as opiniões, escolhas e pensamentos
dos sujeitos emudecidos socialmente e dando-lhes a possibilidade de obterem a vivência da
autonomia, não dependendo exclusivamente de terceiros e se tornando autores de suas próprias
vidas (DANTAS, 2014).
Nesse sentido o presente estudo teve como objetivo descrever o perl de pessoas
com deciência inseridas no mercado de trabalho, bem como analisar a trajetória educacional
e prossional destes participantes com base nos conceitos de autoadvocacia, empoderamento
e inclusão social.
1 MÉTODO
1.1 PARTICIPANTES
Participaram do estudo três sujeitos, todos funcionários públicos municipais de uma
cidade do interior do Estado de São Paulo.
No Quadro 1, é possível encontrar a caracterização de cada um dos participantes.
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Quadro 1 – Perl dos participantes segundo o gênero, idade e tipo de deciência
PARTICIPANTE GÊNERO IDADE DEFICIÊNCIA
P1 Feminino 28 anos
Deciência Física (osteogênese
imperfeita)
P2 Masculino 51 anos
Deciência Visual (cegueira)
P3 Masculino 30 anos
Deciência Múltipla (deciência física e
visual / cegueira)
Fonte: Elaboração própria.
2.2. MATERIAL
Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os participantes com base em
um roteiro previamente elaborado cujas questões estavam relacionadas às características
pessoais, à trajetória escolar, ao mercado de trabalho e a atuação prossional, autoadvocacia,
empoderamento e inclusão social e a expectativas futuras.
O roteiro foi elaborado e enviado a juízes (MANZINI, 2003) que eram experientes
em entrevistas semiestruturadas. Após as considerações feitas pelos juízes, chegou-se à versão
nal do roteiro que cou composto de cinco eixos temáticos: 1- características pessoais; 2 –
trajetória escolar; mercado de trabalho e atuação prossional; 3 - autoadvocacia, empoderamento
e inclusão social; 5 – qualidade de vida e expectativas futuras.
2.3 PROCEDIMENTOS DE COLETA E ANáLISE DE DADOS
O procedimento de coleta de dados adotado nesta investigação foi de entrevista
semiestruturada, com um roteiro com perguntas abertas.
Após a transcrição, na íntegra, os dados passaram por adequações e ajustes ortográcos
(MANZINI, 2012; 2014). Os relatos dos prossionais na apresentação dos resultados, quando
no corpo do texto, seguiram as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)
para citação direta de autores, no entanto, com a utilização de itálico para as falas. Utilizou-
se nas transcrições, os seguintes sinais: reticências entre colchetes, para indicar supressões no
início, meio e/ou nal dos trechos; parênteses, para observações e comentários feitos pelas
pesquisadoras; e aspas, para os momentos nos quais o participante empregou a fala de outra
pessoa em sua própria fala.
Após a transcrição, os dados foram tratados a partir de seu conteúdo, com base em
Bardin (2011). Para tanto, foram selecionados trechos das falas dos participantes de acordo
com os eixos apresentados. Foi escolhida a análise de conteúdo do tipo categorial:
Entre as diferentes possibilidades de categorização, a investigação dos temas, ou análise temática,
é rápida e ecaz na condição de se aplicar a discursos diretos (signicações manifestas) e simples
(BARDIN, 2011, p. 201).
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2 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para apresentação e discussão dos dados, serão utilizadas as categorias pré-denidas
no roteiro das
entrevistas.
2.1 EIXO TEMáTICO 1: CARACTERÍSTICAS PESSOAIS
Neste eixo serão abordadas as características pessoais dos participantes em relação à formação,
atuação prossional e recursos necessários para a atuação. Os dados estão disponíveis
no Quadro 2.
Quadro 2 Características pessoais
PARTICIPANTE FORMAÇÃO ATUAÇÃO RECURSOS
P1
Graduação em
Serviço
Social
Assessora técnica de
incubação (Centro
Municipal de
Economia
Solidária)
Cadeira de rodas
P2
Curso Técnico de
Radialista
Cursando graduação
em
Gestão Pública
- Radialista
Assessor Municipal dos
Direitos da Pessoa
com
Deciência
- Auxiliar de Corretor
de
Imóveis
Braille e aplicativos/
softwares de
voz para celular
e computador
P3
Graduação em
Gestão de
Recursos
Humanos
Graduação em
Pedagogia
Professor de Educação
Básica I
Cadeira de rodas,
computador com
software
de voz (NVDA) e uma
professora assistente.
Fonte: Elaboração própria.
Observa-se que os três participantes apresentam formação especíca, em nível médio
(P2) ou superior (P1 e P3) e atuam em funções correlatas à área de formação.
Sobre este aspecto, infere-se que P1, P2 e P3 podem ser considerados “privilegiados”,
já que estudos como o de Tanaka e Manzini (2005) apontaram que uma das diculdades
encontradas para inserção da pessoa com deciência no mercado de trabalho é a baixa
escolaridade. De acordo com dados do Censo (BRASIL, 2010), apenas 6,66% de pessoas com
deciência têm ensino superior.
Em relação aos recursos apontados como necessários pelos três participantes, ressalta-
se a importância do ambiente acessível para plena participação da pessoa com deciência nos
diferentes espaços sociais.
Observa-se que P3 elencou, além de recursos materiais, a necessidade de um recurso
humano (professora assistente) para sua atuação prossional. Tal recurso, compreendido como
um apoio é regulamentado na Lei 13.146 de 2015 denominada “Lei Brasileira de Inclusão
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que garante às pessoas com deciência provisão de suportes individualizados que atendam a
necessidades especícas da pessoa com deciência.
2.2 EIXO TEMáTICO 2: TRAJETÓRIA ESCOLAR
Neste eixo serão apresentados aspectos da trajetória escolar dos participantes desde a
Educação Básica até o ingresso e permanência no curso de formação prossional. Para tanto,
os dados serão dispostos nos Quadros 3 e 4, divididos com as temáticas “Educação Básica” e
“Formação prossional”.
Quadro 3 – Educação Básica
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Eu entrei na escola com muita diculdade, porque, hoje meus ossos não são tão
mais frágeis como antes[...] eles se quebravam por qualquer coisa, e por diversas
vezes eu estava escrevendo a matéria da lousa e meu dedo quebrava
ou meu punho
se deslocava. Eu estudava em uma escola particular, então, o diretor tinha muito
cuidado na hora do intervalo, porque eu não poderia
brincar como as demais
crianças, descer no escorregador, brincar no balanço.
Eu precisava de um cuidado
diferenciado [...]
Ah, a minha mãe ela é professora, então ela sempre instruiu os meus
professores
a terem um tratamento igual. Diferenciado somente no cuidado, mas eu sempre fui
tratada de igual para igual na sala de aula [...]. Eu acredito que foi realizado de fato
a inclusão na minha sala de aula, eu era tratada como
os demais, eu participava dos
grupos. Era só mesmo esse cuidado, para eu não me quebrar.
P2
Eu fui alfabetizado com 12 para 13 anos de idade período que eu já precisava do
método braille e aqui ainda não tinha cursos especícos para braille. Em 1982 eu
fui para uma escola comum o (parece que falta alguma coisa na frase)
método braille.
Eu z cursos supletivos para ganhar tempo. Com 14 anos então eu concluí, na
época era o segundo grau.
P3
[...] eu estudei até o sétimo ano, que foi quando eu quei doente. Desenvolvi
a
Síndrome de Devic, eu tive que parar de estudar. Fiquei um tempo sem
estudar e
quando eu retornei aos estudos tive que fazer supletivo, a EJA. Fiz a sétima e o oitavo
ano nessa escola (EJA) e depois eu retornei no ensino médio
para uma escola regular.
E nessa escola, que foi onde eu tinha estudado, eu z o supletivo também, que
foi o primeiro, o segundo e o terceiro ano (Ensino Médio).
Fonte: Elaboração própria.
De acordo com as falas dos participantes, mesmo com as diculdades enfrentadas
diariamente no contexto escolar, muitas das vezes com dores físicas, no caso da P1, todos
conseguiram se desenvolver, seja na Educação Básica ou posteriormente na Educação de Jovens
e Adultos. Contudo, esses relatos expressaram algumas fragilidades deste período educacional
dos participantes: a formação dos prossionais, disponibilização de recursos adequados e o
próprio acesso ao ensino comum.
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JESUS, L. F.; SOUZA, M. M. G. S.; MATA, S. P.
Por outro lado, os mesmos relatos expressaram aspectos positivos como o cuidado
dos prossionais com a integridade de P1, a articulação e parceria entre família e escola com
a participação da mãe de P1 em seu processo de escolarização, a disponibilização, ainda que
tardia, do Braille para P2 e a permanência e concretização dos estudos por P3 ainda que na
modalidade de Educação de Jovens e Adultos.
Especicamente sobre a continuidade dos estudos por pessoas com deciência
na Educação de Jovens e Adultos, Rosa e Denari (2013) descreveram uma considerável
porcentagem de matrículas nesta modalidade, ressaltando assim, a existência de alguns entraves
ainda em relação ao acesso e permanência deste público no ensino regular.
Quadro 4 – Formação prossional
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Daí eu ingressei na faculdade em 2012 e embora seja uma faculdade que é
referência na cidade, o banheiro era lá embaixo, então, muitas coisas
foram se modicando no decorrer desses quatro anos de curso, a faculdade foi se
adequando diante das necessidades. [...] na faculdade eu tinha uma diculdade,
por exemplo, no anteatro, a professora marcava uma palestra no anteatro que
não tinha acessibilidade. Sempre foi a questão do acesso, nunca essa questão de
preconceito, de diferença não, sempre o que pegou para mim foi o acesso, esse
sempre foi muito restrito. Ah, quais as maiores diculdades encontradas nesse
percurso? Foi sem dúvida foi o acesso, a acessibilidade que sempre foi muito
restrita, muito precária, e essa foi a maior diculdade.
P2
Sobre as diculdades enfrentadas, a falta de conhecimento das pessoas para
com uma
pessoa com deciência.
P3
Em relação as diculdades na graduação (dos dois cursos?), não foram muitas,
porque as duas instituições eram acessíveis, tinham rampas, tinham banheiros
adaptados e em uma delas tinha piso tátil. [...] para poder da conta dos conteúdos,
fazer as anotações, as provas e tudo mais eu levava meu notebook. Um notebook
que tem um software de voz com adaptação. Eu ia acompanhando as aulas com
os materiais que os professores deixavam disponíveis na sala de aula virtual.
Então, todo o conteúdo que era trabalho na sala de aula, eu os tinha baixados no
meu computador[...] Em relação as diculdades, eu não tive tantas. Eu senti um
pouco de diculdade as vezes
com o livro, com as leituras recomendadas pelos professores. Alguns livros eu
busquei na internet, eu consegui baixar, mas, outros não [...].
Fonte: Elaboração própria.
Referente a formação prossional, P1 e P3 relataram diculdades de acesso aos
espaços, tendo como limitadoras as barreiras arquitetônicas dos espaços de formação, no caso
as universidades. Por outro lado, as barreiras atitudinais foram relatadas na fala de P2 como a
maior diculdade enfrentada nesse período.
Sabe-se que a formação prossional de pessoas com deciência no Brasil ainda ocorre
majoritariamente em instituições especializadas e em programas segregados, o que implica em
restrição de escolha, já que a maioria dos programas são voltados para o desenvolvimento de
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habilidades manuais, como de artesanato. Deste modo, a primeira barreira encontrada pela
pessoa com deciência no processo de formação prossional é o acesso, visto que as opções
destinadas a ela são limitadas e desconsideram a sua possibilidade de ampla escolha, como
acontece com as
pessoas sem deciência.
Assim, quando a pessoa com deciência opta por esta formação em um espaço
comum, não segregado, as barreiras de acessibilidade, de caráter arquitetônico, atitudinal e/ou
outros, são evidenciadas.
Sobre este aspecto, Rocha e Miranda (2009, p. 28) descrevem que:
A sociedade, no seu dia-a-dia, precisa se adaptar às necessidades das pessoas com deciência,
dividindo espaços com igualdade e, principalmente, com respeito e aceitação às diferenças. As
formas limitadas como as escolas e instituições ainda atuam, têm levado parcela considerável
dos alunos à exclusão, principalmente das minorias - sejam elas sociais, sexuais, de grupos
étnicos ou de pessoas com deciência. A base da inclusão consiste no conceito de que toda
pessoa tem o direito à educação e que esta deve levar em conta seus interesses, habilidades e
necessidades de aprendizagem.
As autoras ressaltaram ainda que, embora existam avanços em relação à regulamentação
de uma educação inclusiva, é preciso que as escolas e universidades passem por grandes
transformações e estabeleçam medidas práticas que eliminem as barreiras que impedem ou
restringem o acesso e a permanência de pessoas com deciência nestes espaços.
2.3 EIXO TEMáTICO 3: MERCADO DE TRABALHO E ATUAÇÃO PROFISSIONAL
Neste eixo serão apresentados aspectos da trajetória dos participantes no mercado de
trabalho, bem como a atuação prossional. Para tanto, os dados serão dispostos nos quadros 5
e 6, divididos com as temáticas “Escolha da prossão e tempo de atuação” e “Preconceito no
mercado de trabalho”.
Quadro 5 – Escolha da prossão e tempo de atuação
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Eu escolhi o serviço social porque quando eu cava internada tive muito
contato com a assistente social [...] Por exemplo, assim, eu estou com as
minhas
duas pernas quebradas, a gente tinha o contato das assistentes
social e elas
liberavam o carro especial para me levar, para não precisar ir
no carro da minha
mãe sentada.
Então, eu sempre vi a assistente social como uma pessoa boa, de fazer
o
bem para as demais pessoas. Por eu ter tido esse contato e como eu
comecei
a ter essas diculdades com a acessibilidade, isso começou a gerar em mim
também uma inquietação, uma indignação pelas relações de direito, por
exemplo, então foi por isso que eu optei em ser assistente
social. Depois que eu
terminei a faculdade, eu fui convidada a assumir
esse cargo de assessora e estou
trabalhando no atendimento na secretaria
municipal de desenvolvimento
social. Eu trabalho numa incubadora pública.
(3 anos de atuação)
18 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 9, n. 1, p. 11-26, Jan.-Jun., 2022
JESUS, L. F.; SOUZA, M. M. G. S.; MATA, S. P.
P2
Fiz o curso técnico de radialista no Senac, porque, entre muitas vocações e
dons, eu acredito que eu fui agraciado com esse dom de comunicação,
rádio
e televisão, então eu resolvi me especializar na área que eu tinha uma certa
facilidade para trabalhar.
(20 anos de atuação)
P3
A minha primeira graduação foi tecnólogo, um curso de gestão de recursos
humanos, eu gostei bastante do curso, mas eu não trabalhei na área. Depois
de um ano e meio de formado eu fui fazer licenciatura em pedagogia. Eu
escolhi pedagogia porque eu trabalhava em uma
instituição que atende
crianças e jovens com deciência e eu dava aula
para crianças com deciência
visual.
(6 meses de atuação)
Fonte: Elaboração própria.
Com relação a escolha da prossão, os participantes P1 e P3 atribuíram a trajetória
de vida, em função inclusive das experiências vivenciadas em função da própria deciência.
Já o participante P2 atribuiu a escolha a uma vocação pessoal, não relacionando a própria
deciência.
Ivatiuk e Yoshida (2010) ao realizar um estudo de revisão de literatura sobre a
temática orientação prossional de pessoas com deciência, observaram o restrito número de
pesquisas que abordaram a escolha prossional da pessoa com deciência.
De acordo com Valore (2008) a vocação prossional, longe de ser algo inato, é
construída ao longo da vida do sujeito, a partir de suas experiências e relações com os outros.
Neste contexto, observa-se que o sentido atribuído por P1 e P3 à escolha prossional está
diretamente ligada às experiências de vida e suas relações sociais.
Quadro 6 – Preconceito no mercado de trabalho
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
[...] infelizmente, aconteceu uma situação bem chata, quando eu estava à procura
de estágio na minha área fui a um CRAS, onde tinha um processo
seletivo,
eu participei e a assistente social me tratou de uma forma bem diferente
colocando vários poréns. Falando ah, mas o banheiro não é
adaptado” “mas
aqui tem degrau” e colocando em mim obstáculos, tanto
que na entrevista
ela foi bem ríspida no seu modo de tratar. Parecia que estava duvidando da
minha capacidade, como se a minha deciência
de alguma forma pudesse
atingir o meu prossional, sabe? E, eu quei muito chateada, porque eu estava
me formando para ser uma prossional
que ela é. Fiquei indignada! Como eu
sempre tive conhecimento dos
meus direitos, eu denunciei a assistente social.
Ela foi chamada a atenção
pela diretoria do seu trabalho.
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P2
Sim, sim, já fui tratado por um ex-gerente. Quando eu fui apresentar o
meu
primeiro programa de rádio, com um amigo da época que meu deu
uma grande
ajuda, ele falou que não ia chutar o cachorro por causa do dono. Teve uma
outra pessoa falou que não poderia dar emprego para mim, porque ele não
conseguia imaginar como uma pessoa que não
enxergava podia desempenhar
aquela função, porque se ele perdesse a
visão naquele momento, ele não ia
conseguir fazer nada na vida.
P3
Foi uma novidade, tanto para a equipe, para escola, quanto para os
alunos
e a comunidade escolar de modo geral. Foi uma novidade ter um
professor na
rede com deciência, com duas deciências, aliás, cadeirante
e cego. No início
as crianças eram tímidas, mas depois elas começaram
a se soltar, porque elas
viram que não tinham diferença nenhuma, que a minha deciência era
só um mero detalhe, não tinha importância nenhuma. [...] Em relação a
equipe de trabalho, eu também não tive
nenhum problema, inclusive, eu dei
uma formação para eles também, no
HTPC. Então eu não tive nenhum tipo
de problema nesse sentido, nem
com a equipe, nem com os pais dos alunos, e
nem com os alunos, foi um
trabalho sensacional.
Fonte: Elaboração própria.
Diferentemente do exposto no período da fase escolar e no processo de
prossionalização, os participantes P1 e P2 relataram momentos em que vivenciaram
preconceito no ambiente de trabalho. O participante P3 descreveu situações de estranhamento
dos alunos no início da jornada de trabalho, mas não atribuiu a essas situações signicado de
discriminação e preconceito.
Ressalta-se que uma das principais barreiras para a consolidação de uma sociedade
inclusiva, é a descrença na potencialidade do outro – por qualquer motivo que o caracterize
como diferente - e consequentemente a externalização desta descrença por meio de atitudes
discriminatórias e preconceituosas.
Tanaka e Manzini (2005) ao tratarem da temática de cotas para inserção da pessoa
com deciência no mercado de trabalho inferiram que o preconceito em relação à capacidade
da pessoa com deciência para desempenhar diferentes funções, faz com que mesmo que a
pessoa tenha a qualicação prossional e habilidades compatíveis com a função, acabe sendo
destinada a funções menos reconhecidas.
2.4 EIXO TEMáTICO 4: AUTOADVOCACIA, EMPODERAMENTO E IN-
CLUSÃO SOCIAL
Neste eixo serão apresentados aspectos das concepções de autoadvocacia,
empoderamento e inclusão social vivenciados pelos participantes. Para tanto, os dados serão
dispostos nos quadros 7, 8 e 9.
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JESUS, L. F.; SOUZA, M. M. G. S.; MATA, S. P.
Quadro 7 Concepção
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Entendo que a autoadvocacia é um rompimento desse ciclo das
impossibilidades e que possibilita uma volta para a pessoa com deciência.
O empoderamento desenvolve poder, dignidade, e principalmente
a
liberdade da pessoa decidir o seu próprio destino. É como se as pessoas
começassem a olhar que elas são protagonistas de sua própria história.
P2
O primeiro ponto é a gente se reconhecer como pessoa. Não fugir
da nossa realidade. Somos pessoas e temos diculdades, temos uma
deciência. É não fugir dela e dentro dela buscar o nosso valor do jeito
que nós somos e nos capacitar no dia a dia para aquilo que queremos.
Empoderamento, eu vou falar o que eu sinto, tá? Eu acho assim, não sou
eu quem me dá o poder, o poder, na minha opinião, a graça, vem
de Deus.
Deus não desampara, nenhum daqueles que são seus. [...] acho que a melhor
maneira de se empoderar é saber que nós somos lhos de Deus e estamos aqui
para cumprir uma missão, independentemente da
situação que estamos.
P3
Eu entendo que são dois conceitos diferentes, mas que estão interligados.
O
empoderamento eu acredito que é a capacidade que o ser humano tem de
viver de acordo com os seus ideais, com os seus valores. É viver de acordo
com aquilo que você acredita e não com aquilo que a
sociedade impõe para
você. Por exemplo, a gente sabe que as pessoas com deciências viveram
muito tempo fora da sociedade, então, você
se empoderar é viver aquilo
que é o seu ideal, mesmo você tendo uma deciência ou sendo excluído ou
reprimido. E a autoadvocacia eu
entendo que é você se empoderar daquele
seu ideal e lutar por isso. [...]
eu entendo que você precisa estudar aquilo que
você quer lutar, aquilo
que você quer buscar. Você precisa primeiramente ter
um conhecimento
sobre aquilo e você lutar por meio de leis, de conselhos
e de reuniões. Então, é você buscar esse seu ideal, mas por um meio legal,
um meio honesto, um meio que você não saia /.../dos seus valores, daquilo
que você acredita, dos valores morais e da ética.
Fonte: Elaboração própria.
Todos os participantes demonstraram nesse eixo uma concepção adequada dos
conceitos questionados, considerando-os como os verdadeiros protagonistas de suas próprias
histórias, independente das crenças que norteiam essas concepções.
Vale ressaltar que para Dantas (2014), compreender o conceito de empoderamento,
possibilita entender a obtenção de poder individual ou coletivo, ao ser mediado por uma
educação libertadora e conscientizadora, tornando o sujeito apropriados de si, capazes
de questionar a normalidade, a legitimidade do tratamento inferiorizado e a cultura que o
incapacita. (DANTAS, 2014, p.20).
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Quadro 8 Autorreconhecimento
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Eu sempre tenho defendido a causa da pessoa com deciência, porque
historicamente a pessoa com deciência ela vem sendo excluída. Eu me
lembro que os médicos sempre falavam para mim /.../ que eu sempre ia ser
uma bebezinha /.../ uma pessoa que deveria sempre ser cuidada por
alguém,
por uma outra pessoa. E hoje eu quero mostrar que não, que
eu posso ser
aquilo que eu quiser, eu ajo com responsabilidade comigo
mesma.
P2
[...] nada acontece por acaso, basta apenas a gente saber o que vai fazer
da missão que foi conada na gente. Uns tem a missão de receber uma
determinada situação e receber a libertação daquilo, o outro é conviver
com
aquilo, com aquela situação, mas não se entregar.
P3
Eu acredito sim que eu sou um autodefensor das pessoas com deciência,
até
porque eu também tenho uma deciência, mas não só por isso. Eu já
estudei muito a respeito da história da pessoa com deciência
então eu sei
o que é que as pessoas que têm algum tipo de deciência já
passaram e o que
passam atualmente, porque eu vivo na pele. A gente tem que provar a todo
momento que você tem o potencial, que você
pode trabalhar e que você
pode estudar, que existe um ser humano antes da deciência. Então eu luto
pelos nossos direitos sim e eu defendo esses nossos direitos, porque nós somos
cidadãos iguais as outras pessoas, não existe nenhuma diferença. A deciência
não nos faz ser diferentes dos outros, o olhar tem que ser para a pessoa, para
o ser humano e não para
a deciência que ela tem.
Fonte: Elaboração própria.
Observa-se neste eixo alguns fatores que merecem destaque, a saber: o auto
reconhecimento enquanto sujeito, no qual a deciência é uma característica como outras que o
constitui, mas não como a sua própria denição de ser; a superação diante do olhar e concepção
dos outros; e a deciência como impulso para um enfretamento social. Sabe-se que atualmente,
tais concepções têm emergido nos diferentes contextos sociais e por meio da participação ativa
de
pessoas com deciência, colaborado para a transformação de paradigmas.
Cordeiro (2009) ao estudar a temática deciência e movimentos sociais, destacou que
a participação das pessoas com deciência em movimentos sociais, como o “Movimento
Vida
Independente”, contribui para uma nova forma de compreender a deciência, na qual as pessoas
independem de suas condições, buscam ser reconhecidos como atores sociais, participantes
ativos da sociedade e responsáveis pelo controle de suas vidas.
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Quadro 9 – Perspectivas para inclusão
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Eu acredito que as melhores formas de propiciar inclusão da pessoa com
deciência, tanto no meio escolar e no prossional é dele se sentir pertencente
como um todo. O que eu observo é que muitas vezes o
preconceito não está
nas demais pessoas, está no próprio deciente. Ele que se sente o extraterrestre,
ele que sente não pertencente daquele meio. Então eu sempre falo, eu sempre
falo que a inclusão está sendo feita num
local quando o deciente passa
despercebido.
P2
O primeiro ponto é a pessoa querer, ela querer se incluir. Quando ela
quer, partindo do “agora estou aqui, tenho que cumprir esta missão, esse
chamado, eu não vou me acovardar, eu não vou ter medo, eu vou
enfrentar”. Segundo ponto, quando a família também recebe esta
libertação
de que quem está ali com direito de viver, direito de ser alguém na vida, porque
dessa maneira nós vamos romper os preconceitos, romper as barreiras que vem
da sociedade. Agora quando a pessoa não quer, se a
pessoa pára no meio do
caminho, a inclusão ca muito difícil.
P3
Primeiramente é quebrar essa questão de preconceito. O seu olhar tem que
ser para pessoa como um ser humano, com o potencial que ela tem e você
explorar esse potencial [...]. É não olhar para deciência em si,
para aquilo
que ela não consegue fazer, para a incapacidade, o olhar tem que ser sempre
para o potencial e para o ser humano que existe ali antes da deciência. Eu
acredito também que são necessárias adaptações no
ambiente de trabalho,
rampas, adaptações no banheiro. A inclusão vai acontecer de acordo com
a deciência daquela pessoa, então não tem
um meio certo, um meio
especíco, vai ser de acordo com a deciência
da pessoa. E tem uma coisa
muito simples que eu falo sempre, é o
prossional que vai lidar diretamente
com essa pessoa, a equipe que vai lidar diretamente com essa pessoa com
deciência. É preciso perguntar para ela “como eu posso te ajudar” e a pessoa
com deciência vai falar
para você “olha eu preciso de tal recurso para fazer tal
coisa” ”eu preciso de
uma rampa de acesso aqui”“eu preciso de uma adaptação
no banheiro”.
Fonte: elaboração própria.
Concernente à inclusão de modo geral, os participantes expressaram as seguintes
perspectivas: desejo individual da pessoa com deciência em ocupar os espaços sociais;
autoaceitação e acessibilidade, especialmente a arquitetônica.
P3 destacou a importância da participação da pessoa com deciência nas tomadas
de decisões, inclusive para adaptação ou adequação do espaço e dos recursos. Mais uma
vez, ressalta- se a potencialidade da pessoa com deciência, como sujeito autônomo e não
deliberadamente passivo às decisões de outros.
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3. 5 EIXO TEMáTICO 5: QUALIDADE DE VIDA E EXPECTATIVAS FUTURAS
Neste eixo serão apresentados nos próximos quadros, os aspectos da qualidade de
vida e
as expectativas futuras dos participantes.
Quadro 10 – Expectativas futuras
PARTICIPANTE TRECHOS DOS RELATOS
P1
Tenho conquistado aos poucos. Hoje já tenho meu próprio apartamento e
estou em processo de habilitação. Meu desejo pessoal é comprar um carro
zero,
fazer uso dos míseros descontos que tenho quanto PCD. Acredito que assim
terei mais liberdade e independência. Casar e constituir uma
família e crescer
prossionalmente sempre me qualicando para melhor
contribuir com o
bom desempenho da minha prossão.
P2
Eu acho que faltam algumas coisas ainda na minha vida. Conquistei uma
família maravilhosa, ter a luta do dia a dia, tenho mulher e lha, educar
uma lha, ser tratado pela minha esposa de igual para igual, são conquistas.
Poder sonhar, planejar, o sonho da casa própria, o sonho do
carro, a viagem
em família. Tudo isso são conquistas que a gente tem.
P3
Eu tenho uma, uma ambição muito grande, de continuar os meus estudos
na
área da pedagogia, principalmente na área da Educação Especial,
então eu
pretendo fazer um mestrado. [...] Essa é a minha ambição, fazer
um mestrado
na área de Educação Especial e estudar a minha prática, a
prática do professor
com deciência na sala de aula. Fazer uma pesquisa se existem mais professores,
como que eles fazem dentro da sala de aula, se os mesmos métodos e recursos
que eles utilizam são os mesmos que eu utilizo na sala de aula durante as aulas.
[...] Seria interessante fazer uma
pesquisa dos professores com deciência visual
na área da educação. Seria
bem bacana. Essa é a minha ambição, não sei se ainda
eu vou conseguir esse ano, porque eu preciso estudar bastante, fazer inglês.
vou começar
o inglês o mês que vem. E minha ambição pessoal é terminar a
reforma
do meu apartamento esse ano, deixá-lo de acordo com o que eu tenho
em mente para o meu conforto e no nal do ano que vem comprar uma casa.
E também me casar, construir uma família, ter uma vida comum, como a
de qualquer outra pessoa. Eu sempre quis ter lhos, uma esposa e acho
que
tudo se encaminha para isso. Já estou deixando tudo organizado, minha
casa organizada, tenho um bom emprego, estou estudando,
fazendo alguns
cursos de formação para que isso agregue no meu salário,
para que eu tenha
uma renda relativamente boa para conseguir manter uma casa e cuidar da
minha saúde.
Fonte: Elaboração própria.
Além de tecerem sugestões e considerações apresentadas no eixo anterior e no atual
sobre como repensar os processos de inclusão, os participantes apresentaram que independente
da trajetória muitas vezes marcadas por diculdades e enfrentamentos em virtude da deciência,
tiveram condições de desenvolvimento e conquistas ao longo da vida. As expectativas futuras
expressaram sonhos e ambições comuns a qualquer sujeito, o que reforça a discussão tecida
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em todo o capítulo: a deciência em si não é o que dene a trajetória e as perspectivas de uma
pessoa, mas as condições de acesso, permanência e desenvolvimento nos diferentes âmbitos
sociais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com as vivências relatadas foi possível observar a participação ativa das pessoas com
deciência no mercado de trabalho, rompendo com o entendimento de incapacidade e a,
consequente, segregação desses sujeitos.
Entende-se que empoderamento e a autoadvocacia não se trata de um processo
natural, em que a pessoa com deciência aprende sozinha a questionar a sua condição social
e administrar por si só as suas escolhas, pelo contrário, é um processo que passa pelo trabalho
intencional de emancipação do homem, mediante a incorporação cultura humana constituída
ao longo da história pelo do sujeito.
Além disso, não pode ser descartado o papel fundamental que a educação possui para
que os as pessoas com deciência superem as limitações orgânicas e se tornem sujeitos sociais.
Dessa forma, para Martins (2012), a educação é um processo do qual não se pode suprimir
do desenvolvimento humano, pois constitui-se como requisito fundamental para aquisição
dos atributos basilares do desenvolvimento dos sujeitos, como conhecimento, costumes,
signicações etc.
Importante ainda salientar que as pessoas com deciência, sujeitos desta pesquisa,
não caram acomodadas em suas situações, tão pouco aceitaram certas imposições sociais que
as sobrepuseram no decorrer de sua trajetória, zeram-se personagem principal de sua própria
história. Ainda, o ser sujeito decisivo de sua vida, autoconhecendo suas capacidades, sua
condição e assumir-se merecedor de suas expectativas, anseios e fazer ser real as oportunidades,
foram destacados como sendo um dos principais fatores para a inclusão, estando esta decisão
focada na pessoa com deciência também, e não somente em atitudes passivas dos outros.
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