ENTRELAÇAMENTO ENSINO, PESQUISA E
EXTENSÃO. O PAPEL DA UNIVERSIDADE
PARA GRUPOS DE MÃES DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA: DA (IN)VISIBILIDADE À
PARTICIPAÇÃO SOCIAL
INTERLINKING TEACHING, RESEARCH AND
EXTENSION. THE ROLE OF THE UNIVERSITY
FOR GROUPS OF MOTHERS OF PEOPLE WITH
DISABILITIES: FROM INVISIBILITY TO SOCIAL
PARTICIPATION
Alessandra Miranda Mendes SOARES
Doutora em Educação. Professora da Universidade Federal Rural do Semi-Árido – UFERSA.
https://orcid.org/0009-0003-4517-5445 | alessandrasoares@udersa.edu.br
SOARES, Alessandra Miranda Mendes. Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos
de mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social. Revista Diálogos e Perspectivas em Educação
Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024.
RESUMO: este artigo tem como objetivo mostrar a importância da articulação entre as ações acadêmicas de ensino,
pesquisa e extensão nas instituições de Ensino Superior. Para tanto, o artigo tem como foco o tripé ensino
-pesquisa-
extensão como um campo de formação e intervenção nos processos sociais. Neste caso em particular, Este artigo
foi elaborado
com base na pesquisa de doutorado que adotou como campo de coleta de dados o Projeto de Extensão
Pró-Mães o qual teve como população 20 mães de pessoas com deficiência. No âmbito do ensino, o projeto contou
com a participação de três estudantes de graduação. A
referida pesquisa tem como objeto de estudo o processo
de empoderamento das participantes. Os resultados da pesquisa revelaram quatro categorias que constituíram as
etapas do Programa Pró-Mães, quais sejam, (1) desvelamento de experiências corrosivas; (2) (re)conhecimento do
coletivo de mães de PcD; (3) (re)conhecimento do poder interno e da expertise materna; (4) participação social e
política de mães de PcD. A pesquisa evidencia que o entrelaçamento da tríade ensino-pesquisa-extensão constitui
papel fundamental na divulgação de conhecimentos científicos para a população, com consequente melhoria na
qualidade de vida para o enfrentamento de barreiras e solução de problemas. Cabe destacar que, ao articular
o tripé ensino-pesquisa-extensão: a) ocorre a produção de saberes científicos fundamentados na vida real das
participantes; b) promove o engajamento na dimensão social e política; c) possibilita a intervenção nos processos
sociais com a finalidade de fortalecer a comunidade em suas questões específicas; d) cria-se um espaço formativo
para universitários/as no que diz respeito à aquisição de competências acadêmicas e de pesquisa.
PALAVRAS-CHAVE: Tripé Ensino-Pesquisa-Extensão. Empoderamento. Participação. Mães
de pessoas com
deficiência.
REVISTA DIÁLOGOS E PERSPECTIVAS EM
EDUCAÇÃO ESPECIAL
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS
https://doi.org/10.36311/2358-8845.2024.v11n3.e0240030
is is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License.
ABSTRACT: this article aims to show the importance of articulation between academic teaching, research and extension
actions in Higher Education institutions. To this end, the article focuses on the teaching-research-extension tripod as a
field of training and intervention in social processes. In this particular case, it is developed based on doctoral research that
adopted the Pró-Mães Extension Project as a data collection field, which had 20 mothers of people with disabilities as a
population. In terms of teaching, the project involved the participation of three undergraduate students. is research
aims to enable the process of empowering participants. e research results revealed four categories that constituted the
Pró-mães Program: 1. unveiling corrosive experiences; 2. (re)knowledge of the collective; 3. (re)knowledge of internal
power and expertise; 4. social and political participation. Likewise, the research shows that the intertwining between the
teaching- research-extension triad plays a fundamental role in disseminating scientific knowledge to the population with
consequent improvements in quality of life, in facing barriers and solving problems. It is worth highlighting that when
articulating the teaching-research- extension tripod: a) there is the production of scientific knowledge based on the real
lives of the participants; b) promotes engagement in the social and political dimension; c) enables intervention in social
processes with the aim of strengthening the community in its specific issues; d) a training space is created for university
students with regard to the acquisition of academic and research skills.
KEYWORDS: Teaching-Research-Extension tripod. Empowerment and Participation. Mothers of people with
disabilities.
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024. 1-14
Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos de
mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social
Artigos
ENTRELAÇAMENTO ENSINO, PESQUISA E
EXTENSÃO. O PAPEL DA UNIVERSIDADE
PARA GRUPOS DE MÃES DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA: DA (IN)VISIBILIDADE À
PARTICIPAÇÃO SOCIAL
INTERLINKING TEACHING, RESEARCH AND
EXTENSION. THE ROLE OF THE UNIVERSITY
FOR GROUPS OF MOTHERS OF PEOPLE WITH
DISABILITIES: FROM (IN)VISIBILITY TO SOCIAL
PARTICIPATION
Alessandra Miranda Mendes SOARES
1
RESUMO: este artigo tem como objetivo mostrar a importância da articulação entre as ações acadêmicas de ensino, pesquisa
e extensão nas instituições de Ensino Superior. Para tanto, o artigo tem como foco o tripé ensino
-pesquisa-extensão como
um campo de formação e intervenção nos processos sociais. Neste caso em particular, Este artigo foi elaborado
com
base na pesquisa de doutorado que adotou como campo de coleta de dados o Projeto de Extensão Pró-Mães o qual teve como
população 20 mães de pessoas com deficiência. No âmbito do ensino, o projeto contou com a participação de três estudantes
de graduação. A
referida pesquisa tem como objeto de estudo o processo de empoderamento das participantes. Os
resultados da pesquisa revelaram quatro categorias que constituíram as etapas do Programa Pró-Mães, quais sejam, (1)
desvelamento de experiências corrosivas; (2) (re)conhecimento do coletivo de mães de PcD; (3) (re)conhecimento
do poder interno e da expertise materna; (4) participação social e política de mães de PcD. A pesquisa evidencia
que o entrelaçamento da tríade ensino-pesquisa-extensão constitui papel fundamental na divulgação de conhecimentos
científicos para a população, com consequente melhoria na qualidade de vida para o enfrentamento de barreiras
e solução de problemas. Cabe destacar que, ao articular o tripé ensino-pesquisa-extensão: a) ocorre a produção de
saberes científicos fundamentados na vida real das participantes; b) promove o engajamento na dimensão social e
política; c) possibilita a intervenção nos processos sociais com a finalidade de fortalecer a comunidade em suas questões
específicas; d) cria-se um espaço formativo para universitários/as no que diz respeito à aquisição de competências
acadêmicas e de pesquisa.
PALAVRAS-CHAVE: Tripé Ensino-Pesquisa-Extensão. Empoderamento. Participação. Mães
de pessoas com deficiência.
Doutora em Educação. Professora da Universidade Federal Rural do Semi-Árido – UFERSA. E-mail: alessandrasoares@
udersa.edu.br . ORCID: https://orcid.org/0009-0003-4517-5445
2-14 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024.
SOARES, Alessandra Miranda Mendes
ABSTRACT: this article aims to show the importance of articulation between academic teaching, research and extension
actions in Higher Education institutions. To this end, the article focuses on the teaching-research-extension tripod as a field
of training and intervention in social processes. In this particular case, it is developed based on doctoral research that adopted
the Pró-Mães Extension Project as a data collection field, which had 20 mothers of people with disabilities as a population.
In terms of teaching, the project involved the participation of three undergraduate students. is research aims to enable the
process of empowering participants. e research results revealed four categories that constituted the Pró-mães Program: 1.
unveiling corrosive experiences; 2. (re)knowledge of the collective; 3. (re)knowledge of internal power and expertise; 4. social
and political participation. Likewise, the research shows that the intertwining between the teaching- research-extension
triad plays a fundamental role in disseminating scientific knowledge to the population with consequent improvements in
quality of life, in facing barriers and solving problems. It is worth highlighting that when articulating the teaching-research-
extension tripod: a) there is the production of scientific knowledge based on the real lives of the participants; b) promotes
engagement in the social and political dimension; c) enables intervention in social processes with the aim of strengthening
the community in its specific issues; d) a training space is created for university students with regard to the acquisition of
academic and research skills.
KEYWORDS: Teaching-Research-Extension tripod. Empowerment and Participation. Mothers of people with disabilities.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo evidenciar a relevância, ainda pouco explorada,
da articulação entre as ações no âmbito da tríade acadêmica ensino, pesquisa e extensão nas
instituições de Ensino Superior. Neste artigo, adota-se a expressão tripé pesquisa-ensino-
extensão considerando-se a ênfase colocada nas atividades de pesquisa em associação com
a de extensão. Este artigo, portanto, tem como foco o tripé pesquisa-ensino-extensão
como um campo de formação e intervenção nos processos sociais que
visam romper a
invisibilidade de demandas específicas de grupos vulneráveis. Neste caso
em particular, o
foco é desenvolvido com base na pesquisa de doutorado: “
Experiências das Mulheres-Mães
de Pessoas com Deficiência: da (In)Visibilidade à Participação Social”, que adotou como
campo de coleta de dados o Projeto de Extensão Pró-Mães
2
,
o qual teve como população
mães de pessoas com deficiência da comunidade local.
A metodologia Pesquisa Participante foi adotada porque é um tipo de
investigação que se compromete com a plena participação de todos/as os/as envolvidos/
as, ou seja, a população de mães de PcD, analisando-as no contexto de sua realidade
(Brandão, 1999). Grossi (1981), Brandão (1999) e Demo (2004). Cabe ebfatizar que a
pesquisa participante abre oportunidades para a participação social de grupos oprimidos
e marginalizados, portanto, constitui “atividade educativa de investigação e ação social”
(Brandão, 1999. p. 238) a partir da qual “constrói-se a emancipação [das participantes
no
caso desta pesquisa, as mulheres-mães de PcD] usando o melhor conhecimento possível
A referida tese foi desenvolvida em regime de cotutela, no período de 2015 a 2018, entre o Programa de Pós-Graduação
em Educação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB/Brasil) no âmbito do Programa CAPES/DGU 040/2012 (Projeto
303/13: Gênero e educação superior: políticas, narrativas e currículo, NIPAM/PPGE/UFPB) e o Programa de Doutorado
Educação e Sociedade da Universidade de Barcelona (UB/Espanha) dentro do Programa Hispano-Brasileño de Cooperación
Interuniversitaria Género y educación superior: políticas, narrativas y curriculum (Ministerio de Educación, Cultura y
Deporte Programa PHB2012-0149-PC). Número do parecer do Conselho de Ética em Pesquisa - CEP Protocolo 0345/15,
CAAE: 45800715.5.0000.5188.
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024. 3-14
Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos de
mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social
Artigos
(Demo, 2004, p.13). Assim, é “um processo de pesquisa no qual a comunidade participa
na
análise de sua própria realidade, com vistas a promover uma transformação social em
benefício dos participantes que são oprimidos” (Grossi, 1981, p. 126).
O Projeto de Extensão Universitário Pró-Mães
3
contou com uma população de
20 mães com filhos e filhas com deficiência. Durante a coleta de dados no campo foram
adotados os seguintes procedimentos: (a) questionário inicial visando a caracterização da
história de vida de cada mãe, (b) observação sistemática com registro escrito, fotos
e vídeos de
todas as atividades, (c) entrevista individual a partir de questões estruturadas, (d) diário
de bordo da pesquisadora e (e) linha do tempo para observação das mudanças antes e
depois do nascimento do filho com deficiência e,
posteriormente, mudanças resultantes a
partir da participação no projeto de extensão universitária. A atuação de três estudantes de
graduação foi indispensável, tanto no processo de coleta e organização dos
dados colhidos no
campo, como na sistematização e processo de análise dos dados.
É importante destacar que, a cada encontro do grupo de mulheres-mães de PcD
, a
equipe de pesquisa registrava as atividades ao mesmo tempo em que realizava a coleta de
dados relevantes para a organização do próximo encontro. Durante as atividades ocorria
um processo de negociação sistemática e a construção coletiva dos temas abordados,
objetivos, datas e horários em função das demandas das participantes. Os encontros
previstos do Projeto de Extensão e também as atividades de Pesquisa eram
planejados
regularmente com antecedência envolvendo as três monitoras graduandas, ou
seja, antes
do próximo encontro acontecer havia uma reunião entre a coordenação do projeto, a
pesquisadora e as estudantes para analisarem os dados do encontro anterior e
planejarem
o encontro seguinte. Dessa forma, havia uma articulação consistente e efetiva
entre os
elementos do tripé pesquisa, ensino e extensão.
A fundamentação teórica que embasa a análise dos dados e achados da pesquisa
de doutorado é constituída por teorias: do empoderamento (Deere; Leon, 2002;
Gohn,
2004; Ferreira, 2007), de gênero (Carvalho; Rabay, 2015; Montané,
2015; Cornwall, 2013;
Meyer, 2003) e dos direitos humanos (Bobbio, 2004; ONU, 2006). O empoderamento é
definido por Gohn (2004, p.23) como um “processo de mobilizações e práticas destinadas
a promover e a impulsionar grupos e comunidades no sentido de seu crescimento,
autonomia, melhora gradual e progressiva de suas vidas”, processo esse que diretamente
impacta de forma positiva a inclusão social dos participantes de um projeto de extensão
universitária na medida em que favorece seu fortalecimento com a aprendizagem, a
compreensão e a aplicação prática de exercícios de poder e de
autonomia pessoal e coletiva.
Deere; León (2002) entendem que, para ser eficiente, esse
processo mobiliza componentes
individuais e coletivos, os quais se caracterizam pela tomada de decisão sobre a vida dos
Coordenação da Profa. Dra. Windyz Ferreira, professora do Centro de Educação, Departamento de Habilitações
Pedagógicas da Universidade Federal da Paraíba.
4-14 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024.
SOARES, Alessandra Miranda Mendes
sujeitos e contribuem para que haja mudanças nos âmbitos social, cultural, político e
econômico em contextos diversos. A seguir, as evidências de como o tripé pesquisa-
ensino-extensão contribui para que a universidade tenha a possibilidade de articulação
com a sociedade.
EMPODERAMENTO, GÊNERO E DIREITOS DAS MULHERES-MÃES DE
PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
A noção de empoderamento está em sintonia com os atuais movimentos sociais
em prol
dos direitos humanos em geral e, em particular de grupos vulneráveis, os quais
defendem a participação e o engajamento político individual e coletivo, a fim de garantir
os próprios direitos (autoadvocacia)
4
, sem a tutela de terceiros que estão em posição de
poder, e também garantir os direitos de outros por meio de ações coletivas ou individuais
(Deere; Leon, 2002; Gohn, 2004). Nesse sentido, a participação sociopolítica consolida
o acesso a informações relevantes para o grupo social e a interação social sistemática
por meio dos encontros regulares no projeto de extensão, a partir dos quais ocorre a
troca contínua de experiências, reflexões críticas e aprofundadas sobre temas e situações
cotidianas comuns em suas vidas.
A relevância da articulação efetiva entre os elementos do tripé pesquisa-ensino-
extensão
é demonstrada neste artigo e evidenciada na apresentação das atividades
planejadas e implementadas pelas acadêmicas envolvidas nas ações. Para
as mães,
participantes do Projeto de Extensão, população da pesquisa, estar no espaço universitário,
acessar conhecimentos científicos e conviver com as acadêmicas
cria oportunidades
de compreenderem suas experiências como comuns a todas, além de vivenciarem
coletivamente profundas mudanças em suas vidas, contando com a escuta e o apoio
mútuo. Por exemplo, um dos achados da pesquisa evidencia que as exigências
nos cuidados
contínuos com seus/suas filhos/as com deficiência demandam intensa força
emocional, pois
para além das preocupações naturais maternas com o bem-estar de qualquer filho/a,
essas mães precisam lidar continuamente com profissionais da área de saúde, educação
ou outros que tendem a negligenciar ou ignorar seu sofrimento cotidiano, sua continua
4
Na dissertação de Mestrado (Soares, 2010), da autora deste artigo, intitulada: Nada sobre nós sem nós: estudo sobre a formação
de jovens com deficiência para o exercício da autoadvocacia em uma ação de extensão universitária e o link: https://repositorio.
ufpb.br/jspui/handle/tede/4919, elaborada a partir do Projeto de Extensão Pró-líder: Autoadvocacia de jovens com deficiência,
ficou latente a necessidade de colaborar com essas mulheres cuidadoras, por meio do contato sistemático com suas demandas,
ao constatar que os limites experimentados pelos/as jovens reverberavam em suas famílias, particularmente em suas mães. Dessa
experiência, surgiu o interesse de compreender como essas mulheres-mães vivenciam suas experiências de (des)empoderamento,
conceito que será explorado adiante. Além disso, ao fazer uma busca bibliográfica inicial, em 2014, constatou-se a escassez de
trabalhos relativos a esse grupo. Assim, foi criado um projeto de extensão com o intuito de compreender suas necessidades,
demandas e aprendizagens no cuidado com seus filhos e filhas com deficiências e, ainda, oportunizar trocas de experiências, o
desenvolvimento de competências e novos conhecimentos na vida dessas mulheres.
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024. 5-14
Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos de
mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social
Artigos
sobrecarga de tarefas e
compromissos, dúvidas e, em particular, seu conhecimento e saberes
acerca dos filhos/as.
Soma-se à esta realidade o fato de que a população de mães de PcD experiencia,
com frequência, atitudes capacitistas e preconceituosas. O capacitismo se caracteriza
pelas formas de discriminação instituídas na sociedade. Segundo Sassaki (2014, p. 10),
“o
capacitismo está focalizado nas supostas ‘capacidades das pessoas sem deficiência’ como
referência para mostrar as supostas ‘limitações das pessoas com deficiência”. O
preconceito
é definido como um conceito formado antes de se conhecer que é demarcado
por fronteiras
socias, e não por impossibilidades individuais (Ribas, 2007). Ambas atitudes provocam
profundo desgaste emocional às mães de pessoas com deficiência.
No geral, são as mulheres que estão sempre atarefadas nas atividades domésticas
(ex.
cuidar da casa, dos filhos, da alimentação, etc.), nas idas e vindas aos médicos, especialistas,
clínicas e laboratórios, assim como lidar com questões escolares, entre outras. Dependendo
da patologia, idade e tamanho do/a filho/a com deficiência, assim como das condições de
vida (exemplo: meio de locomoção disponível), muitas vezes o esforço físico é também
significativo e, portanto, sobrecarrega e desgasta a rotina
materna. A estas atividades
femininas associam-se outras também estressantes, quando o casamento é desfeito, incluindo
perdas financeiras. Os achados da pesquisa mostram que
das vinte mães participantes do
projeto de extensão, apenas seis permaneciam casadas, enquanto as demais viveram a
experiência da separação; duas tornaram-se viúvas e duas não declararam sua situação.
A tendência à separação, inevitavelmente, sobrecarrega as inúmeras responsabilidades
maternas diárias. Como consequência, por falta de disponibilidade, com o passar do
tempo, os achados revelaram que todas as mães passam a viver isoladas, sem apoio ou
relacionamentos preenchedores.
Não ter tempo para nós infelizmente é algo normal, criar expectativas futuras para as
nossas necessidades parece um sonho (Juliana, E2 06/05/2015).
Estresse, a luta é diária, contínua. Ficar sozinha, refletir... é difícil com a criança
chorando, com estereotipias, o marido, o corre-corre da vida. Não podemos só investir
na criança, precisamos nos cuidar para poder cuidar da criança. Porque quando estamos
estressadas a criança sente. Tenho um filho autista e ele fica agitado quando estou estressada
(Cristiana, E2 06/05/2015).
Tem muitas ocupações, tem muitas terapias para a pessoa com deficiência nas
instituições especializadas, mas para a família? Fico cansada com tudo para resolver
(Graciane, E2 06/05/2015).
Eu preciso descansar... eles são pesados e dependem de nós para locomoção, e não é fácil
dar banho em dois rapazes com paralisia cerebral sozinha, vou ter que fazer uma cirurgia
no ombro, por esforço repetitivo (Graciane, A8 15/11/2015).
6-14 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024.
SOARES, Alessandra Miranda Mendes
Sempre estamos atarefadas com muitas tarefas domésticas e visitas a médicos e terapias
(Alcione, E2 06/05/2015, Grifos da autora).
A conexão e proximidade propiciada pelos encontros realizados no âmbito do
projeto de extensão universitária e mediados pelas contribuições teórico-reflexivas das
acadêmicas e pesquisadoras envolvidas, incluindo convidadas, fortalece o sentimento de
pertencimento social e de autodeterminação, que se caracteriza pelo ato de decidir por
si mesma, ou seja, ter a liberdade de escolha sobre o próprio destino sem a interferência
externa (Ryan; Deci, 2008; Soares, 2010). A autodeterminação se caracteriza como resistência
ao assujeitamento (Soares, 2010), o qual segundo Foucault (1979, 1999,
2001), é uma
condição que determina e é determinada pela vulnerabilidade, impressa socialmente na
condição de “deficiência”. Para tanto, assujeitamento caracteriza-se pela invisibilidade
social da pessoa com deficiência, pela exclusão (social, relacional e educacional) e pelas
restrições colocadas ao acesso a experiências em novos espaços sociais. O senso de
pertencimento a um grupo de mulheres com demandas semelhantes cria bases para o
desenvolvimento de identidade enquanto coletivo social, uma vez que “a participação
ativa [...] constitui uma oportunidade significativa para o desenvolvimento da sua
identidade pessoal e social, por oferecer a oportunidade de ser reconhecida como pessoa
humana e social” (Cussianovic; Marquez, 2002, p. 25).
Paralelo à teoria do empoderamento feminino, o conceito de gênero (Carvalho;
Rabay, 2011; Soares, 2018) caracteriza-se como a construção social das feminilidades e
das masculinidades, que problematiza as particularidades atribuídas às mulheres e aos
homens como “natural” na sociedade, situandos/as e reconhecendo-os/as em lugares
socialmente diferentes, mas que, todavia, favorecem os homens (Carvalho; Rabay,
2015;
Montané, 2015; Meyer, 2003). Cabe enfatizar a complexidade subjacente à
noção de
gênero, que é um conceito polissêmico, estigmatizado por contextos históricos,
culturais
e estruturais dinâmicos, interseccionado por outros marcadores, tais como classe, raça,
geração e deficiência (Carvalho; Rabay, 2015; Montané, 2015; Meyer, 2003), ou seja,
extrapola o simplesmente “feminino”.
A mobilização em defesa dos direitos é um recurso necessário para a promoção
de mudanças sociais e individuais. O exercício da autoadvocacia atua, portanto, como
um propulsor na vida das pessoas que passam a lutar por seus sonhos, desejos, objetivos e
direitos
(Soares, 2010). Aplicado o conceito à realidade das mulheres-mães de PcD, a
autoadvocacia oportuniza “o reconhecimento dos seus direitos e de sua
capacidade de lutar
para conquistar espaços sociais de forma proativa” com base no acesso
aos conhecimentos
e informações adquiridos por meio do projeto de extensão sobre direitos e legislação,
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024. 7-14
Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos de
mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social
Artigos
elementos fundamentais ao processo de empoderamento individual e coletivo (Soares,
2018, p. 171).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) é um documento
central nesse contexto, estabelecendo normas que guiam a proteção dos direitos humanos
globalmente. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU, 1948) os direitos
humanos constituem em “garantias jurídicas universais que protegem os indivíduos ou
grupos contra ações ou omissões dos governos que atentam a dignidade humana”. Os
direitos humanos são essenciais para o desenvolvimento de sociedades justas e igualitárias
e estão na base das constituições modernas pelas garantias fundamentais a todos os
indivíduos independente dos marcadores de classe social, etnia, gênero, nacionalidade,
entre outros (Bobbio, 2004).
Segundo Guimarães (2008), em estudo junto à Procuradoria de Justiça da Pessoa
Idosa e da Pessoa com Deficiência
5
, que teve como objetivo analisar as formas sobre como
os cuidados com as pessoas com deficiência ocorrem, os achados revelam que a mulher é
a principal cuidadora de pessoas com deficiência. Por isso, quando a figura materna está
ausente nesses cuidados, cabe ao Estado a responsabilidade de assumi-los
em instituições
e/ou abrigos. Dessa forma, fica explícita a importância de reconhecimento
do papel materno
no caso de filhos/as com deficiência e a urgência de políticas públicas que considerem as
desigualdades de gênero.
As mulheres cuidadoras enfrentam o dilema de conciliar trabalho fora do lar e
cuidado da pessoa deficiente [com deficiência]. Atualmente, as mulheres cuidadoras
encontram-se desprotegidas. Se optam por deixar o trabalho para cuidar de um
familiar, não recebem por isso, e se a pessoa com deficiência vem a falecer, por exemplo,
elas não têm direito a garantias previdenciárias. Se tentam conciliar o trabalho com
o cuidado, frequentemente se sentem sobrecarregadas e pedem auxílio ao Estado ou
terceiros. É necessário romper o silêncio criado em torno do cuidado na deficiência,
reconhecendo que todos necessitam de cuidados e têm o dever de cuidar e, também,
é necessário incluir no debate a importância da transversalidade no tocante ao gênero
na elaboração de políticas públicas (Guimarães, 2008, p. 236).
Visibilizar esse coletivo de mulheres-mães, portanto, é condição sine qua non no
contexto atual das políticas públicas de inclusão e de gênero, pois suas demandas como
cuidadoras, suas necessidades maternas e humanas de cuidados e, principalmente, de seu
direito de ter uma vida pessoal e profissional dignas estão continuamente presentes em
suas vidas. A pesquisa associada à extensão universitária torna evidente a importância e
o poder potencial da pós-graduação da instituição de ensino superior para romper com a
invisibilidade das demandas de grupos sociais, cujas vulnerabilidades mantem-se social
5
Órgão do Ministério Público do Distrito Federal Territorial (MPDFT)
8-14 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 3, e0240030, 2024.
SOARES, Alessandra Miranda Mendes
e politicamente invisíveis, como é o caso da população da pesquisa (Soares, 2018; Farias,
2011).
O valor do entrelaçamento entre as atividades acadêmicas do tripé pesquisa-
ensino-extensão configura-se a partir dos achados da pesquisa que conduziram à
identificação de quatro categorias do processo de empoderamento. O conceito de
categoria
é crucial aqui porque permite a descrição e a análise de fenômenos de maneira estruturada
e compreensível. Particularmente, nas ciências sociais, o conceito de categoria auxilia
na compreensão de fenômenos complexos através de uma abordagem multifacetada.
Constitui, portanto, uma medida essencial que ajuda a descrever, compreender e explorar
as características de diversos fenômenos em diferentes áreas do conhecimento (Soares,
2018).
Quatro categorias foram identificadas na pesquisa de doutorado e estruturadas na
forma do Programa Pró-Mães: empoderamento de Mães de Pessoas com Deficiências
(Soares, 2018, p. 172-176):
1. desvelamento das experiências corrosivas: esta fase tem como objetivo o
compartilhamento de experiências das participantes ao mesmo tempo em que
refletem sobre o significado de ser mulher e, ao mesmo tempo, mãe de pessoa
com deficiência, conhecem as experiências corrosivas comuns e iniciam o
processo de criar identidade de grupo social. Segundo Farias (2011, p. 10)
experiências corrosivas são “barreiras socioculturais originárias nas condições
de gênero e deficiência”.
2. (re)conhecimento do coletivo: nesta fase, as mães passam por processo de
conscientização acerca do papel de ser mãe de pessoas com deficiência, pois,
para muitas, esse papel parecia ser somente dela. Porém, com a troca de
experiências, percebem que outras vivem experiências semelhantes. Assim, o
compartilhamento possibilitou o início da ruptura do isolamento, que se tornou
um elemento-chave para pensar em outras práticas e geri-las desde uma nova
perspectiva.
3. (re)conhecimento do poder interno e da própria expertise: durante esta fase torna-
se evidente às mães a necessidade de conhecer mais sobre o tipo de deficiência
do/a filho/a e sobre seus direitos e necessidades. Como consequência uma
gama de novos temas e aprendizagens são compartilhadas, por exemplo, estilo
de vida, alimentação para autistas, direitos das pessoas com deficiência e
direitos das mulheres. Nessa fase, houve o fortalecimento da capacidade de
discernimento, identificação de alternativas, criação de propostas e decisões
sobre desejos e sonhos pessoais até então apagados na memória dessas mães.
Aprender a lidar com suas demandas pessoais e coletivas ajudam as mães
no processo de romper com o isolamento, a invisibilidade social de suas
demandas e o reconhecimento de suas potencialidades latentes.
4. participação social e política: esta última fase do programa caracterizou-se pelo
processo de participação em atividades externas com o objetivo de visibilizar
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Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos de
mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social
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demandas e necessidades das mães nos contextos político e social.
O acesso à
informação para solucionar questões pessoais e coletivas fortalece-
se nessa fase.
Considerando-se que o processo de empoderamento implica participar de
mobilizações e práticas que tem como finalidade promover e impulsionar coletivos a fim
de promover crescimento, autonomia e desenvolvimento da qualidade de vida (Gohn,
2004), a participação das mães em espaços políticos de poder, com voz e segurança para
falar em nome do coletivo, constitui o exercício do empoderamento na vida real. Duas
mães
6
em
particular, participantes do projeto de extensão, tiveram papel chave nesta fase
porque já possuíam alguma experiência como ativistas em defesa dos direitos de seus filhos/as.
Elas contribuiram de forma significativa quando compartilharam com o coletivo
informações
sobre eventos na área que iriam ocorrer na cidade, assim como contribuiram com palestras
proferidas junto com seus filhos durante as atividades do projeto de extensão. Ter no
grupo, mulheres-mães ativistas favorece, portanto, oportunidades de participação em
eventos relevantes, na orientação sobre como participar e, em especial, na importãncia de
estar presente e ter voz durante os mesmos.
O depoimento de uma das mães após participação no Fórum de Intérprete de
LIBRAS
7
, revela a qualidade de aprendizagens relevantes ao processo de empoderamento:
Para mim, foi relevante participar, afinal sempre tive interesse em Libras, já fiz um curso
básico. Ter a compreensão das necessidades das pessoas surdas e dos intérpretes... [...] nesse
fórum ampliei meus conhecimentos sobre a Libras e os direitos dos intérpretes e das pessoas
com deficiência auditiva, além de aprender como é importante estar engajada nos eventos
de luta para que nossos filhos tenham os direitos assegurados, como bem colocou a mãe que
é intérprete (Graciane, A1 17/07/2015).
Aqui, cabe enfatizar a importância de parceria com a Associação de Deficientes
e
Familiares - ASDEF
8
, que aconteceu pela necessidade de um espaço para os encontros do
Projeto Pró-Mães porque a universidade entrou em greve. Esta parceria possibilitou o
local para as aprendizagens e exercício de empoderamento durante a fase da greve e, no
decorrer das atividades, se caracterizou como um recurso de extremo valor para o grupo
de mães. (Soares, 2018). A importância do acesso a estas informações está registrado nas
suas narrativas:
 Jéssica, mãe de um adulto surdo e Alcione, mãe de um adulto com Síndrome de Down. Nomes Fictícios.
 O Fórum de Intérpretes de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinas) foi realizado em 2015.
ASDEF - Associação de Deficientes e Familiares - é uma organização não governamental. João Pessoa, Paraíba. A referida
associação foi fechada, após morte do presidente.
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Ter participado dessa ação com a ASDEF e as pessoas com deficiência foi muito importante
para mim, especialmente para perceber que somos todos capazes de vencer, o entusiasmo e
determinação de todos me motivam, sem falar que são tantas coisas para resolver na vida
que terminamos deixando para depois o que é do nosso interesse. Preciso sair do aluguel
e ter minha casa própria, sou sozinha para resolver tudo (Clarice, A2, 17/07/2015,
grifos da autora).
Por ser um espaço comprometido com a promoção e defesa dos direitos da pessoa
com deficiência, a conexão casual com a ASDEF caracterizou-se como fator chave
para avanços mais significativos do coletivo das mães porque elas passaram a receber
informações sobre questões atuais acerca da luta pelos direitos de seus filhos/as e também
porque estavam em contato regular com pessoas com deficiência jovens e adultas atuando
na associação, experiência que possibilitou uma nova perspectiva sobre a capacidade da
pessoa com deficiência, a inclusão social e a inclusão no mercado de trabalho, assim
como as possibilidades reais de autorrealização de seus filhos/as na vida adulta.
Em uma das atividades realizadas pela ASDEF, as mães foram convidadas a
visitar a Secretaria de Habitação do Estado
9
durante a qual conheceram os direitos da
pessoa com deficiência à casa própria de acordo com a legislação
10
. O depoimento a
seguir revela a importância de tal oportunidade:
Estou feliz por estar aqui, preciso resolver isso, a oportunidade de tentar resolver
é um sonho antigo. Com o corre-corre do dia a dia, deixamos para depois. Precisamos
aproveitar a oportunidade. Queremos ter o nosso espaço, mas sabemos que conseguir pelo
Governo Federal é difícil (Emily, A2, 17/07/2015, grifos da autora)
Frente à ocorrência imprevista da greve da universidade, as equipes do projeto
de extensão e da pesquisa reuniram-se para avaliar eticamente se seria o caso de continuar
com as atividades do projeto em outro local. Considerou-se que, em respeito às mães,
população sob extrema vulnerabilidade e pressão, cujas demandas são invisíveis porque
negligenciadas pelo poder público foi decidido que mesmo com a universidade em
greve, o projeto de extensão se manteria em atividade fora do campus. Dessa forma, a
presidência da ASDEF foi contatada para uma possível parceria. Pelo fato de a pesquisa de
doutorado estar vinculada a um projeto de extensão acadêmica, a conexão com a ASDEF
foi facilitada, a pesquisa viabilizada dentro dos prazos e todas participantes acolhidas
Casa doada pelo Governo Federal, no Programa Minha Casa Minha Vida, cujo objetivo é de proporcionar ao cidadão
brasileiro, através da parceria com empresas, estados, municípios e entidades, o acesso ao financiamento de moradia com
condições especiais.
10
Lei nº 11.124, de 16 de junho de 2005, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS,
cria o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social – FNHIS e institui o Conselho Gestor do FNHIS.
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Entrelaçamento ensino, pesquisa e extensão. o papel da universidade para grupos de
mães de pessoas com deficiência: da (in)visibilidade à participação social
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pela diretoria. Evidenciou-se, portanto, que tal imprevisto possibilitou a compreensão
da relevância da
articulação e parceira entre as atividades acadêmicas e as organizações da
sociedade civil
pois é nestes espaços de mobilização política e de luta pelos direitos sociais
que a vida real acontece e as mudanças sociais se desenrolam.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da pesquisa e do valioso conhecimento oferecido por estas vertentes
teóricas aplicado à realidade desta população, no decorrer das atividades realizadas no
âmbito do Projeto de Extensão Pró-Mães, campo da pesquisa em tela, gradualmente
evidencia-se o papel-chave da universidade na divulgação de conhecimento científico
com linguagem acessível à população local e na valorização das experiências das mães-
participantes, as quais a partir das aprendizagens adquiridas ao longo do projeto de
extensão
universitária aprimoraram os cuidados com seus filhos/as agora alicerçadas pelo
processo de
auto-empoderamento e fortalecidas pela rede de apoio e ajuda-mútua construída com
base na convivência contínua durante o referido projeto.
O papel da universidade para a promoção de mudanças sociais a partir da
indissociabilidade da atividade de pesquisa às atividades de extensão e ensino evidencia-
se de forma indiscutível nesta pesquisa, base deste artigo. Ao articular, de forma
efetiva e coordenada o tripé pesquisa-extensão-ensino cria-se um espaço formativo
significativamente efetivo na aquisição de competências acadêmicas e de pesquisa durante
a graduação e a pós-graduação. Todavia, cabe destacar, as pesquisas que não integram esse
tripé porque falta a conexão com a realidade social local pode resultar na produção de
um conhecimento acadêmico desvinculado das demandas práticas e sociais de diferentes
coletivos.
O entrelaçamento entre os elementos constitutivos do tripé pesquisa-extensão-
ensino possibilita: (a) a produção de saberes científicos fundamentados na vida real e nas
demandas emergentes das participantes. O entendimento da contradição entre ter poder,
isto é, “estar empoderada” ou não ter poder, isto é, “estar assujeitada” tornou-se um lema
na
busca constante de informações e conhecimentos para solucionar situações que antes as
atemorizavam e faziam recuar; (b) o engajamento realístico na dimensão social e política,
uma
vez que ter acesso a informações e conhecimentos relevantes sobre as questões emergentes
individuais e coletivas modifica gradualmente a percepção da dimensão social e política
dentro da qual a população da pesquisa se insere; (c) a intervenção nos processos sociais
ocorre em tempo real, no aqui e agora da vida das participantes do projeto. Assim, há
o fortalecimento do coletivo e o desenvolvimento de uma nova compreensão sobre
questões específicas, o poder de ter sua voz ouvida e seu poder de intervenção direta com
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sucesso; e (d) a criação de um espaço formativo significativamente efetivo na aquisição de
competências acadêmicas e de pesquisa durante a graduação e a pós-graduação.
Os espaços formativos são indispensáveis para explorar novas aprendizagens. Então,
quando se articula o tripé pesquisa-extensão-ensino à realidade dentro da qual o fenômeno
estudado se insere, o processo de formação acadêmica se expande e se consolida com mais
propriedade, qualidade e aprofundamento. Os projetos de extensão incorporam uma
´mistura´ de incertezas, de resoluções ou não de situações problemas emergentes e reais,
sendo indispensável âncoras de apoio como o conhecimento científico que cria novas formas
de agir, fazer e construir novos saberes a partir dos saberes já existentes.
No âmbito da pesquisa, os achados mostram que as mães participantes do projeto
de extensão transitaram da submissão e isolamento à participação social, movimento
favorecido pela articulação entre projeto de extensão e pesquisa. Além disso, a pesquisa
sistematizou conhecimento relevante sobre o fenômeno social do (des)empoderamento
das mães de filhos e filhas com deficiência a partir do qual foi elaborado o Programa
Pró-mães de Empoderamento para Mães de Pessoas com Deficiência, favorecendo a
replicação em outros espaços sociais e políticos, portanto, caracterizando-se como uma
contribuição significativa para o papel da academia na articulação com a sociedade, assim
como a indissociabilibade inerente ao tripé pesquisa-extensão-ensino.
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