Pessoas com deficiência em Programas de Pós-Graduação Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 2, p. 51-60, Jul.-Dez, 2023 51
https://doi.org/10.36311/2358-8845.2023.v10n2.p51-60
is is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License.
Pessoas com deficiência em Programas de Pós-graduação: falemos de
gestão e acessibilidade
PeoPle with disabilities in Graduate ProGrams: let's talk about
manaGement and accessibility
André Henrique de LIMA1
Leonardo Santos Amâncio CABRAL2
Resumo: a presente pesquisa teve como objetivo geral identificar e analisar fatores que constituem a legitimação do direito de
ingresso (direito formal), de acesso (direito material), de permanência e de titulação de pessoas com deficiências em programas
de pós-graduação – PPGs stricto sensu. Atendendo aos princípios éticos em pesquisa, realizamos um estudo de caso, de caráter
exploratório e qualitativo. A coleta de dados ocorreu na Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, na modalidade online,
e contou com a participação de oito coordenadores de PPGs e de dois gestores da Pró-Reitoria de Pós-graduação – ProPG. Os
dados foram tratados à luz da abordagem da análise de conteúdo e sua análise foi fundamentada nos compêndios da teoria da
Análise Institucional de Gregório Baremblitt. Os resultados desvelam alguns subsídios para o aprimoramento de diretrizes para a
implantação de políticas e práticas para a promoção da acessibilidade em programas de pós-graduação.
Palavras-Chave: Educação Especial. Pessoa com deficiência. Pós-graduação. Acessibilidade. Gestão.
Abstract: the present research had the general objective of identifying and analyzing factors that constitute the legitimation of the
right of entry (formal right), access (material right), permanence and title of people with disabilities in postgraduate programs –
PPGs stricto sensu. In compliance with ethical principles in research, we carried out a case study, of an exploratory and qualitative
nature. Data collection took place at the Federal University of São Carlos – UFSCar, in the online modality, with the participation
of eight PPG coordinators and two managers of the Pro-Rectory of Graduate Studies – ProPG. e data were treated in light of
the approach of content analysis and its analysis was based on the compendia of the theory of Institutional Analysis by Gregório
Baremblitt. e results reveal some subsidies for the improvement of guidelines for the implementation of policies and practices
to promote accessibility in postgraduate programs.
Keywords: Special Education. Disabled person. Postgraduate studies. Accessibility. Management.
introdução
Em 2021, os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira – INEP indicaram que cerca de 18.680 (0,913%) estudantes matriculados nas Instituições
Federais da Educação Superior – IFES declararam possuir algum tipo de deficiência (INEP, 2021).
Mestre em Educação Especial. Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR. E-mail: andrehdelima@gmail.com. ORCID:
https://orcid.org/0000-0002-9554-7150
Doutor em Educação Especial. Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de São Carlos -
UFSCAR. E-mail: leonardocabral@ufscar.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3520-3687
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LIMA, André Henrique de; CABRAL, Leonardo Santos Amâncio
Esse caminho de ingresso (direito formal) tem sido pavimentado, principalmente, por
meio da implantação de políticas de ações afirmativas, as quais têm possibilitado o acesso (direito
material) de pessoas com deficiências em IFES. Esse acesso se dá não só em cursos de graduação, mas
em Programas de Pós-graduação stricto sensu – PPGs, aos quais, particularmente, vem configurando
mais interesse e adesão dessa minoria político-social (ZILIOTTO; JORDÃO, 2017; CABRAL,
2017; 2021; MACHADO, 2022).
O direito formal se refere ao conjunto de respaldos legislativos que as pessoas com
deficiências podem ter para que suas trajetórias educacionais sejam equânimes em detrimento
a outros pós-graduandos sem deficiências. O direito material trata sobre a identificação de
possibilidades e a formulação cooperativa de estratégias legitimem e cumpram os direitos
formais. Esse conglomerado de direitos deve ser concretizado paralelamente com aspectos que se
relacionam a acessibilidade dos contextos pertencentes à pós-graduação das mais diversas áreas do
conhecimento (MACHADO, 2022).
Estamos falando, portanto, da importância de se preconizar o direito cidadão não apenas
em relação ao fomento do ingresso (direito formal) dessa população na Educação Superior, mas de
legitimar o direito de acesso (direito material) e de acessibilidade das pessoas com deficiências que
almejam ingressar em cursos ofertados por PPGs.
As estratégias para a materialização desses direitos referentes à acessibilidade precisam ser
postas em xeque pelas coordenações de PPGs e pela gestão das pós-graduações de IFES, uma vez
que o gerenciamento de subjetividades e de atravessamentos atitudinais precisam estar em pauta
nos diálogos institucionais presentes em ambientes de gestão democrática (reuniões, assembleias,
conselhos, etc.) da instituição (LIMA, 2020; BRANCHER; PIECZKOWSKI, 2022).
É previsto na gestão e nas coordenações que haja uma elaboração cooperativa de projetos
políticos institucionais e de projetos pedagógicos na abordagem democrática, bem como nos
momentos decisórios que considerem a construção de práticas acessíveis em vias de acessibilizar
o ambiente e cumprir com os interesses da comunidade (EBERSOLD, 2021; PEREIRA, 2021;
ALMEIDA; MACHADO; CABRAL, 2022).
A gestão democrática fundamenta a organização de tempos e espaços, tal qual a
construção do corpo gestor e docente sob a abordagem da cooperação e biopsicossocial. Nessa
direção, possibilita a materialização do direito formal frente as articulações de recursos humanos,
materiais, tecnológicos e normativos ao decorrer de todo esse processo. Assim, evitando que os
direitos das minorias sócio-políticas sejam negligenciados ou omitidos no contexto de instituições
tradicionalmente hegemônicas em suas lógicas e culturas (OLIVEIRA; VASQUES-MENEZES,
2018; CARDOZO; COLARES, 2020; MACHADO; CORTE, 2020).
Esse contexto indica que gestão democrática sob a perspectiva da cooperação é uma
temática que deve ganhar força e espaço, principalmente no que tange a acessibilidade de pessoas
com deficiências na pós-graduação.
Assim, é preciso que estudos apresentem como as IFES vêm se organizando para
receberem, no momento do processo seletivo e do ingresso, as pessoas com deficiências. Para, a
partir disto, compreender quais constituintes democráticos dão sustentação para a articulação de
estratégias institucionais que visem trabalhar a permanência e a titulação na pós-graduação dessa
parcela de sujeitos.
Pessoas com deficiência em Programas de Pós-Graduação Artigos
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Nessa direção, a presente pesquisa disserta sobre a gestão democrática dedicada à
promoção da acessibilidade em contextos de programas PPGs, configurando um objetivo geral ao
qual visa identificar e analisar fatores que constituem a legitimação do direito de ingresso (direito
formal), de acesso (direito material), de permanência e de titulação de pessoas com deficiências em
programas de pós-graduação stricto sensu.
método
Atendendo aos princípios éticos em pesquisa (CAAE: 54436221.7.0000.5504),
caracterizamos essa pesquisa enquanto um estudo de caso, de caráter exploratório e qualitativo,
uma vez que nos propomos a reunir, sistematizar, analisar e discutir os dados com a literatura,
primordialmente sob as junções das lentes científicas dos autores Baremblitt (2002) e Franco (2005).
A coleta de dados ocorreu na Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, na modalidade online.
caracterização dos ParticiPantes
A pesquisa contou com a participação de oito coordenadores de PPGs de todas as áreas
do conhecimento e de dois gestores da Pró-Reitoria de Pós-graduação – ProPG, todos vinculados
à UFSCar. Na pesquisa, houve um coordenador legalmente compreendido enquanto pessoa com
deficiência.
Os gestores da ProPG tinham presencialmente seu exercício de trabalho no campus de
São Carlos – isto, não interferindo na pesquisa, por ter sido realizada de maneira online. Enquanto
participantes da pesquisa, haviam coordenadores vinculados tanto ao campus de São Carlos quanto
ao de Sorocaba. Entre todos os participantes, dois eram de Sorocaba e oito de São Carlos.
Os gestores da ProPG foram caracterizados pelas siglas G1 e G2. Os coordenadores
de PPGs foram caracterizados com base na área de conhecimento ao qual o Programa pertence,
totalizando: dois coordenadores da área das Ciências Biológicas (B1 e B2); quatro coordenadores
da área das Ciências Exatas (E1, E2, E3 e E4) e; dois coordenadores da área das Ciências Humanas
(H1 e H2).
instrumentos de coleta de dados
Na intenção de nos aproximarmos dos relatos dos participantes da pesquisa, realizamos
de maneira online: a) três reuniões institucionais com gestores da ProPG e; b) dez brainstorms,
na intenção de investigar discussões que cooperassem com o contexto universitário e que dessem
subsídios para a formulação de diretrizes práticas de acessibilidade para o contexto dos PPGs. Todos
esses momentos foram gravados em vídeo para posterior tratamento e análise.
O brainstorm é um modo de compartilhamento de ideias presentes em um diálogo
coletivo, ideias que perpassam por consensos e dissensos. Tais consensos e dissensos são mediados
pela técnica que leva o nome de brainstorm. O brainstorm possui teor e rigor de um procedimento
científico que, a partir de instrumentos norteadores de diálogos em grupos, “(...) busca levantar de
forma bastante livre um conjunto grande e abrangente de opiniões dos participantes em torno de
um tema” (TINÔCO, 2018; BARBOSA et al., 2021, p. 116).
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LIMA, André Henrique de; CABRAL, Leonardo Santos Amâncio
Para esses dois momentos, foram utilizados dois instrumentos: a) durante a realização
das reuniões institucionais, diários de campo para anotações e registros das colocações postas
pelos gestores da ProPG, aos quais foram analisados para subsidiar os resultados e discussões dessa
pesquisa e; b) roteiros norteadores no formato de slides para a mediação da técnica brainstorm com
participantes dos encontros (coordenadores).
Os dez brainstorms foram diluídos em cinco semanas (entre abril e maio), sendo dois por
semana com o mesmo tema. Esses encontros foram realizados duas vezes por semana, na segunda-
feira e na quinta-feira. Esses dois dias continham um montante diferente de participantes, mas com
o mesmo tema-foco. Logo, os participantes ficaram em dois grupos distintos, aos quais, em cada
semana, participavam de encontros com o mesmo tema. Sendo assim:
a) Semana 01 com dois encontros sobre o tema “Processo seletivo e ingresso”;
b) Semana 02 com dois encontros sobre o tema “Permanência”;
c) Semana 03 com dois encontros sobre o tema “Titulação e perspectivas acadêmico-
profissionais”;
d) Semana 04 com dois encontros sobre o tema “Orientação científica com pessoas com
deficiências” e;
e) Semana 05 com dois encontros sobre o tema “Devolutivas e refinamentos da diretriz
de acessibilidade formulada na perspectiva da cooperação” com base nos diálogos dos
encontros 01, 02, 03 e 04.
O brainstorm pertencente à essa pesquisa foi formulado pelos próprios pesquisadores,
e teve a intenção de investigar discussões que cooperassem com o contexto universitário e que
dessem subsídios para a formulação de diretrizes práticas de acessibilidade para o contexto dos PPGs
(BARBOSA et al., 2021).
Procedimento de coleta e tratamento de dados
Para coletar os dados nas reuniões e nos encontros brainstorms, os pesquisadores foram
mediadores, com a função de registrar e sistematizar as ideias de todos os participantes, estimulando-
os a cooperar entre si na partilha de informações. Essa escolha metodológica foi tomada em razão de
que os pesquisadores teriam abordagens apuradas para o problema em foco – logo, evitando que os
diálogos se afastassem do tema alvo e, também, propondo questões que promovessem reflexões que
pudessem favorecer o adensamento de argumentos.
A mediação se deu para nortear temas macro, sendo que os subtemas foram derivados
das vivências e demandas dos coordenadores de PPGs e dos gestores da ProPG da UFSCar. Logo,
não induzindo, mas conduzindo os participantes para que não houvessem desvios dos alvos e
aprofundamentos dos elementos à construção de diretrizes de acessibilidade na Pós-graduação da
UFSCar.
Uma vez que todos os dados foram coletados, foi organizado um tratamento prévio dos
dados por meio de anotações enquanto os participantes emitiam as ideias sobre a temática debatida
(FRANCO, 2005). Essa estratégia foi posta em prática na intenção de haver uma devolutiva dinâmica
e organizada sobre as principais inferências e ideias dos participantes expostas nos encontros.
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Esse tratamento prévio resultou em um tratamento sistematizado por meio dos preceitos
da análise de conteúdo, possibilitando que diretrizes de acessibilidade pudessem ser organizadas e
devolvidas aos participantes da pesquisa no Encontro 05. Nesse caminho, o tratamento dos dados foi
feito a partir de: a) discussões semanais no Grupo de Pesquisa Identidades, Deficiências, Educação e
Acessibilidade – GP-IDEA da UFSCar e; b) consultas com consultores cooperativos (duas pessoas,
um mestrando com deficiência da universidade e uma professora da UFSCar da área da Psicologia).
fundamentos Para a análise de dados
Os dados da pesquisa foram analisados e discutidos com base nos compêndios da Análise
Institucional, de Gregório Baremblitt (2002).
Os fundamentos para a Análise Institucional possibilitam um caráter analítico dos
elementos que integram uma instituição. A Análise sugere às comunidades acadêmico-científicas
ferramentas que contribuam para conhecer a estruturação, evolução, organização e óticas que
transversalizam diversas realidades sociais. Quando elencamos os compêndios da Análise com
preceitos da alteridade e das subjetivações, podemos compreender melhor os facilitadores inclusivos
e os mecanismos excludentes institucionais (BAREMBLITT, 2002).
Os compêndios da Análise Institucional notoriamente têm a potencialidade de desvelar de
forma material o campo da acessibilidade na pós-graduação, uma vez que possibilitam analisarmos
criticamente os elementos que compõem os objetivos e as atribuições de um PPG.
resultados e discussões
O presente artigo se fundamenta em dois princípios da área do direito, o direito formal
e o direito material. Logo, os resultados e discussões são atravessados por esses dois elementos
fundamentais, principalmente pelo fato de termos nos proposto a desvelar e, posteriormente,
discutir sobre alguns subsídios para o aprimoramento de diretrizes que podem implantar políticas e
práticas para a promoção da acessibilidade em PPGs.
As presentes diretrizes fundamentam princípios inerentes à gestão democrática na
perspectiva da acessibilidade, subsidiando, assim, a concretização de práticas que visem superar
eventuais barreiras e/ou identificar facilitadores que possam se apresentar nos diversos tempos,
espaços, relações e trajetórias acadêmicas, de formação e de atuação profissional.
Isso foi possível a partir do mapeamento dos direitos formais das pessoas com deficiências
na pós-graduação, direcionando a busca de subsídios práticos inerentes às possibilidades de
materialização dos direitos materiais dessa parcela da população.
Os subsídios de acessibilidade advêm de demandas e questionamentos empíricos de
atores institucionais vinculados à UFSCar a nível de pós-graduação.
Para essa pesquisa, as subjetivações dirimidas de relatos de gestores da ProPG e de
coordenadores de PPGs serão sistematicamente dialogadas com a literatura e apresentadas.
Isso porque, parte dos participantes elucidaram alguns preceitos que podem ser elencados
com a gestão democrática enquanto ferramenta para a compreensão coletiva dos direitos
formais e para a concretização dos direitos materiais (LIMA; CABRAL, 2020; BRANCHER;
PIECZKOWSKI, 2022).
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LIMA, André Henrique de; CABRAL, Leonardo Santos Amâncio
Entre esses princípios, os participantes B2, E3, G1 e H1 consideram que os diálogos intra
são fundamentais. Apesar de dificultosos de serem realizados, os diálogos intersetoriais também
foram destacados pelos participantes da pesquisa, principalmente os que objetivam construir
cooperativamente estratégias que efetivem a participação da maior parcela de atores institucionais
no processo de legitimação dos direitos cabíveis às pessoas com deficiências, estejam elas na posição
de discentes ou de gestores, coordenadores, docentes ou técnicos administrativos (AGUIAR, 2016;
ROTHEN; GOMES; OLIVEIRA, 2022).
A gestão democrática na perspectiva da acessibilidade deverá envolver grande parte dos
atores institucionais durante os planejamentos das ações para a superação de barreiras, bem como a
atuação dos recursos humanos, a gestão dos tempos, dos espaços e das relações, além das estratégias
e instrumentos avaliativos (OLIVEIRA; VASQUES-MENEZES, 2018; LIMA, 2020).
Conforme E3, H1 e H2, é importante, ao nos referirmos sobre envolvimento, considerar
a maior parte dos atores institucionais (se possível, todos), inclusive os com deficiências. As pessoas
com deficiências devem estar envolvidas nos processos decisórios. Não necessariamente de modo
exclusivo, mas de uma forma que as demandas e responsabilidades não sejam somente centralizadas
na pessoa com deficiência. Afinal, apesar de funções muitas vezes distintas, todas as unidades e setores
da universidade possuem e precisam exercer suas responsabilidades institucionais (ZILIOTTO;
JORDÃO, 2017; OLIVEIRA; ANDRADE, 2018).
A descentralização das demandas de uma só figura não fragiliza a construção da
acessibilidade em IFES, pelo contrário. A descentralização distribui demandas e responsabilidades
cabíveis para cada um dos atores institucionais, estimula a distribuição de afazeres e a cooperação,
podendo, assim, dar margem para o envolvimento não só do estudante e do professor, mas também
do gestor, coordenador, técnico administrativo e colegas de classe (RAMOS; RIBEIRO, 2019;
CABRAL, 2021).
Nesse sentido, tudo o que tange a cidadania de estudantes com ou sem deficiências na
universidade deve ser tratado em cooperação por um conjunto de atores, aos quais precisam exercitar
e articular preceitos de alteridade diante das tomadas de decisões e ações inerentes à acessibilidade
de modo ético (KÖCHE, 2017).
O conceito da corresponsabilização se mostrou em necessidade de estar conjunto ao
conceito da ética. Todos os participantes da pesquisa pontuaram como primordial a conexão e
a coerência entre o que os atores institucionais propõem e se dispõem a fazer sobre a inclusão de
pessoas com deficiências na pós-graduação. Nessa direção, então, a acessibilidade deve ser movida
mais por um interesse coletivo do que por um interesse advindo de campos políticos ou burocráticos
ou advindo de concepções caritativas ou capacitistas (SPINOZA, 2009; CABRAL; PICCOLO,
2021; OMOTE; CABRAL, 2021).
Por meio dos relatos dos participantes B1, E1, E2, E4 e G2, desvelamos que um interesse
coletivo acerca de uma demanda institucional pode fortificar princípios da gestão democrática na
perspectiva da acessibilidade, como os diálogos intra e intersetoriais, o envolvimento de grande parte
dos atores institucionais, a descentralização de demandas / distribuição de afazeres, a alteridade,
a corresponsabilidade e a ética (KÖCHE, 2017; CARDOZO; COLARES, 2020; MACHADO;
CORTE, 2020; MACHADO, 2022).
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Diante esse escopo da materialização da acessibilidade, conseguimos registrar alternativas
empíricas de gestão democrática. Contudo, tivemos a viabilidade de também reunir questionamentos
e barreiras institucionais que coordenadores e gestores possuem no cotidiano de IFES.
Parte dos desafios podem derivar, com base na Análise Institucional de Baremblitt
(2002), de culturas tradicionais de funcionamento da instituição. Prova disso é que identificamos
que parte dos participantes já tiveram desafios em gerenciar, por falta de oportunidades ou de
especializações na área, caminhos institucionais a serem traçados para materializar os direitos
formais do alunato com deficiências. Isso impacta na cooperação, no envolvimento coletivo e na
participação diária para a construção dialogada da acessibilidade (OLIVEIRA; ANDRADE, 2018;
RAMOS; RIBEIRO, 2019).
Esse cenário de não haver um diálogo estreitado no dia-a-dia pode impactar no
planejamento, desenvolvimento e gerenciamento de recursos materiais, humanos e financeiros, que
acabam por ficar ausentes na realidade dos PPGs de coordenadores e na própria gestão da ProPG
(CABRAL, 2017; LIMA; CABRAL, 2020).
Uma vez que esses e outros elementos são identificados, nota-se indícios de que algumas
mudanças nas práticas gestoras são precisas para uma melhor orquestração da acessibilidade no
cenário institucional de IFES (EBERSOLD, 2020).
Nesse sentido, algumas práticas que compõem a engrenagem representativa da gestão
democrática precisam ser revistas de modo propositivo, em vias de materializar a acessibilidade,
de potencializar as práticas já existentes e de criar alternativas para desvelar as práticas ainda não
tão comuns. Logicamente, considerando que isso é de modo paulatino e que cada universidade
possui suas particularidades no que diz respeito a mudanças estruturais, atitudinais e culturais
(BAREMBLITT, 2002; AGUIAR, 2016).
Os próprios participantes dessa pesquisa, coordenadores de PPGs e gestores da ProPG,
pontuaram essa necessidade de mudança e de aproximação com uma abordagem social da deficiência,
se propondo a trabalhar coletivamente em possibilidades futuras, se colocando à disposição para
apoiarem premissas de equidade e alteridade, visando a promoção da autonomia e da legitimação
de direitos dessa minoria sócio-política (OMOTE; CABRAL, 2021).
Dentre as possibilidades levantadas, existe a de orquestrar ações institucionais que visem
conscientizar e ressignificar parte das práticas de acessibilidade individuais e, processualmente,
coletivas, dirimindo eventuais barreiras estruturais e sociais na universidade. Isso porque, fomentar
estratégias coletivas para a formação inicial e continuada de servidores e alunos com e sem
deficiências pode refletir em uma formação de uma ou mais redes de contatos, que sirvam de
apoio cooperativo, podendo valer para os momentos de ingresso, de permanência e de titulação das
pessoas com deficiências na pós-graduação (EBERSOLD, 2020; 2021).
Dessa maneira, compreende-se que é preciso que sejam discutidas proposições e
possibilidades de como construir uma engrenagem que possa promover, processualmente, o
envolvimento e a corresponsabilização entre recursos humanos da pós-graduação. Pois, são esses
direcionamentos rumo a mudança que apoiam a materialização da acessibilidade dos contextos
das IFES, ainda mais quando são analisados processualmente pelos próprios atores institucionais.
É essa auto-organização institucional que pode ser um passo inicial para a paulatina construção e
concretização de espaços e atitudes acessíveis. Não é uma ciência exata a execução das mudanças,
e sim um exercício frequente de ponderação, o qual revisa constantemente as práticas que fazem e
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LIMA, André Henrique de; CABRAL, Leonardo Santos Amâncio
que não fazem sentido para o contexto da instituição, bem como para as vivências e demandas de
seus atores (BAREMBLITT, 2002; EBERSOLD, 2021; CABRAL, 2021).
Dentro de todo esse contexto, precisamos, então, enfatizar a importância da utilização das
políticas de ações afirmativas já existentes e a necessidade de elaborações de novas políticas internas
por parte dos PPGs, da ProPG, para que o contexto da pós-graduação se torne um local acessível e
acessável, ao qual considere as subjetivações presentes em sua comunidade, bem como a alteridade e os
preceitos de equidade (CABRAL, 2017; ALMEIDA; MACHADO; CABRAL, 2022).
É compreensível pensar que talvez não esteja tão próximo um funcionamento que lance
mão de uma organização interna que discuta a criação de novas políticas e a materialização das já
existentes. Mas, enquanto os esforços institucionais não estiverem voltados para isso, mais distante
isso ficará da realidade das IFES (PEREIRA, 2021; ROTHEN; GOMES; OLIVEIRA, 2022).
considerações finais
O estudo procurou conhecer e compreender fenômenos relacionados a gestão democrática
para a acessibilidade em PPGs, a qual se mostrou uma filosofia de trabalho que pode identificar e
organizar aspectos que tangenciam o ensino e a formação de pós-graduandos com deficiências para
a ciência.
O conhecimento científico que esse estudo ofereceu foi o de identificar que práticas
coletivas, realmente, potencializam as discussões de diretrizes internas. Essas práticas de diálogos
coletivos entre os coordenadores de PPGs resultaram em um espaço de partilha de informações
sobre perspectivas e potencialidades acessíveis e acessáveis.
Então, podemos propor ulteriores possibilidades de investigação, as quais busquem
compreender mais ainda esse contexto brasileiro tão pouco explorado que é a acessibilidade na
pós-graduação. Atinente a isto, a área da Educação e da Educação Especial precisam se debruçar
mais sobre a acessibilidade na pós-graduação, investigando seus planejamentos, desenvolvimentos,
implementações, gerenciamentos e avaliações a um curto, médio ou longo prazo. Isso, em benefício
da equidade no ensino e na formação de pessoas com deficiências.
É um estudo que, dentro do contexto ao qual foi desenvolvido, contribuiu com o
aumento da discussão sobre gestão democrática para a acessibilidade no âmbito da pós-graduação.
Nesse escopo, podemos compreender que os discursos podem se aproximar de uma perspectiva
biopsicossocial cada vez mais, e parte disso se dá com a produção de pesquisas aplicadas as quais,
academicamente, contribuam não só com a instituição, mas também com o sujeito com deficiência,
professores, técnicos administrativos, coordenadores e gestores de pós-graduação.
Concluindo, endossamos a importância de preconizarmos trajetórias acadêmicas dignas e
cidadãs, de modo a garantir as suas formações, profissionalizações e titulações. Isso, com a cooperativa
participação das gestões, das coordenações e dos estudantes universitários com deficiências.
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