EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA
INCLUSIVA: UM ESTUDO SOBRE O CASO DE
MIRACEMA/RJ
SPECIAL EDUCATION IN THE INCLUSIVE
PERSPECTIVE: A STUDY ON THE REALITY ON THE
CASE OF MIRACEMA/RJ
Danielle Pereira BARCELLOS
Mestranda em Ensino. Professora da Secretaria Estadual de Educação – SEEDUC/
RJ. Universidade Federal Fluminense – UFF, Rio de Janeiro, Brasil.
https://orcid.org/0000-0002-0732-7773 | danibarcellos2018@gmail.com
Jacqueline de Souza GOMES
Doutora em Filosofia. Professora Adjunta do Programa de pós-graduação em Ensino
da Universidade Federal Fluminense – UFF, Rio de Janeiro, Brasil.
https://orcid.org/0000-0002-8609-5893 | jsgomes@id.uff.br
BARCELLOS, Danielle Pereira; GOMES, Jacqueline de Souza. Educação especial na perspectiva inclusiva: um estudo
sobre o caso de Miracema/RJ. Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024.
RESUMO: este estudo de caso traz reflexões sobre possibilidades de implementação da concepção de escola para todos/as no cotidiano
escolar, reforçando a importância do movimento de luta das pessoas com deficiência em nosso país. Focaliza a situação da Educação
Especial no município de Miracema/RJ a partir de uma análise comparativa entre o Plano Municipal de Educação (2015-2025) e
dispositivos normativos e políticos (o Plano Nacional de Educação, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva) que garantam a educação para todos como um direito humano. Analisa-
se, ainda, o trabalho realizado pelo Núcleo de Atendimento Especializado (NAE) do município. Metodologicamente, o estudo foi
realizado tomando-se por ponto de partida uma pesquisa de cunho bibliográfico e documental. Fundamenta-se teoricamente em
autores/as, como: Paulo Freire, Maria Tereza Mantoan e Rita de Cassia Fumegalli. Conclui-se que o município de Miracema vem
expandindo seus horizontes no que concerne à implementação do que infere a meta 4 do Plano Nacional de Educação e a Política
Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, buscando promover uma ruptura com os preconceitos sociais
relacionados à educação de estudantes com deficiências, traçando um novo caminho, onde o compromisso é com uma educação que
se propõe universal, que deve incluir a diversidade, fugindo de modelos padronizados, que não respeitam a realidade dos estudantes e
de suas famílias e promovem cenários de exclusão e fracasso escolar.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Especial. Educação Inclusiva. Núcleo de Atendimento Especializado de Miracema/RJ (NAE).
ABSTRACT: this case study brings reflections on possibilities for implementing the concept of a school for all in everyday school life,
reinforcing the importance of the struggle movement for people with disabilities in our country. It focuses on the situation of Special
Education in the municipality of Miracema/RJ based on a comparative analysis between the Municipal Education Plan (2015-2025)
and normative and political devices (such as: the National Education Plan, the Law of Guidelines and Bases of Education and the
National Policy on Special Education from the Perspective of Inclusive Education) that guarantee education for all as a human right.
e work carried out by the municipalitys Specialized Assistance Center (NAE) is also analyzed. Methodologically, the study was
carried out taking bibliographic and documentary research as its starting point. It is theoretically based on authors such as: Paulo
Freire, Maria Tereza Mantoan and Rita de Cassia Fumegalli. It is concluded that the municipality of Miracema has been expanding
its horizons with regard to the implementation of what is implied by goal 4 of the National Education Plan and the National
Special Education Policy from the Perspective of Inclusive Education, seeking to promote a break with related social prejudices to the
education of students with disabilities, charting a new path, where the commitment is to an education that proposes to be universal,
which must include diversity, moving away from standardized models, which do not respect the reality of students and their families
and promote scenarios of exclusion and school failure.
KEYWORDS: Special Education. Inclusive Education. Miracema/RJ Specialized Service Center.
REVISTA DIÁLOGOS E PERSPECTIVAS EM
EDUCAÇÃO ESPECIAL
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS
https://doi.org/10.36311/2358-8845.2024.v11n2.e0240014
is is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License.
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 1-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA
INCLUSIVA: UM ESTUDO SOBRE O CASO DE
MIRACEMA/RJ
SPECIAL EDUCATION IN THE INCLUSIVE
PERSPECTIVE: A STUDY ON THE REALITY ON THE
CASE OF MIRACEMA/RJ
Danielle Pereira BARCELLOS
1
Jacqueline de Souza GOMES
2
RESUMO: este estudo de caso traz reflexões sobre possibilidades de implementação da concepção de escola para todos/as
no cotidiano escolar, reforçando a importância do movimento de luta das pessoas com deficiência em nosso país. Focaliza a
situação da Educação Especial no município de Miracema/RJ a partir de uma análise comparativa entre o Plano Municipal
de Educação (2015-2025) e dispositivos normativos e políticos (o Plano Nacional de Educação, a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação e a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva) que garantam a educação
para todos como um direito humano. Analisa-se, ainda, o trabalho realizado pelo Núcleo de Atendimento Especializado
(NAE) do município. Metodologicamente, o estudo foi realizado tomando-se por ponto de partida uma pesquisa de cunho
bibliográfico e documental. Fundamenta-se teoricamente em autores/as, como: Paulo Freire, Maria Tereza Mantoan e
Rita de Cassia Fumegalli. Conclui-se que o município de Miracema vem expandindo seus horizontes no que concerne
à implementação do que infere a meta 4 do Plano Nacional de Educação e a Política Nacional de Educação Especial na
perspectiva da Educação Inclusiva, buscando promover uma ruptura com os preconceitos sociais relacionados à educação
de estudantes com deficiências, traçando um novo caminho, onde o compromisso é com uma educação que se propõe
universal, que deve incluir a diversidade, fugindo de modelos padronizados, que não respeitam a realidade dos estudantes e
de suas famílias e promovem cenários de exclusão e fracasso escolar.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Especial. Educação Inclusiva. Núcleo de Atendimento Especializado de Miracema/RJ
(NAE).
ABSTRACT: this case study brings reflections on possibilities for implementing the concept of a school for all in everyday
school life, reinforcing the importance of the struggle movement for people with disabilities in our country. It focuses
on the situation of Special Education in the municipality of Miracema/RJ based on a comparative analysis between the
Municipal Education Plan (2015-2025) and normative and political devices (such as: the National Education Plan, the
Law of Guidelines and Bases of Education and the National Policy on Special Education from the Perspective of Inclusive
Mestranda em Ensino. Professora da Secretaria Estadual de Educação – SEEDUC/RJ. Universidade Federal Fluminense –
UFF, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: danibarcellos2018@gmail.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0732-7773
Doutora em Filosofia. Professora Adjunta do Programa de pós-graduação em Ensino da Universidade Federal Fluminense
– UFF, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: jsgomes@id.uff.br. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-8609-5893
2-18 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024.
BARCELLOS, Danielle Pereira; GOMES, Jacqueline de Souza
Education) that guarantee education for all as a human right. e work carried out by the municipalitys Specialized
Assistance Center (NAE) is also analyzed. Methodologically, the study was carried out taking bibliographic and documentary
research as its starting point. It is theoretically based on authors such as: Paulo Freire, Maria Tereza Mantoan and Rita de
Cassia Fumegalli. It is concluded that the municipality of Miracema has been expanding its horizons with regard to the
implementation of what is implied by goal 4 of the National Education Plan and the National Special Education Policy from
the Perspective of Inclusive Education, seeking to promote a break with related social prejudices to the education of students
with disabilities, charting a new path, where the commitment is to an education that proposes to be universal, which must
include diversity, moving away from standardized models, which do not respect the reality of students and their families and
promote scenarios of exclusion and school failure.
KEYWORDS: Special Education. Inclusive Education. Miracema/RJ Specialized Service Center.
INTRODUÇÃO
Vivemos em uma sociedade onde persistem demandas por qualidade na educação,
por melhores condições de trabalho para os/as profissionais da educação e por uma escola que
eduque para a vida, respeitando subjetividades e características pessoais, sejam elas intelectuais,
físicas, culturais, sexuais, sociais, linguísticas, etc. O Brasil é um exemplo frutífero em situações
de exclusão escolar, de pessoas que não podem ir às aulas porque trabalham, ou de pessoas
que, de tanto passarem por processos de reprovação escolar, param de estudar, reflexos de uma
escola que ainda tece tramas de desigualdades sociais em seu interior (Almeida, 2018).
Ratificando o que estabelece a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948,
a Conferência Mundial sobre Educação para Todos (conhecida também como Conferência
de Jomtien, realizada na Tailândia no ano de 1990) postula que a “educação para todosé
um compromisso mundial e que devem ser estabelecidas garantias para que todas as pessoas
tenham acesso à educação inclusiva, direito conexo com outros e que é condição insubstituível
para uma sociedade mais humana e mais justa (Mreck, 2015). No mesmo sentido, nossa
Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (2008) aponta
para o momento de se debater e para se tomarem providências no intuito de se construir um
sistema escolar inclusivo:
Ao reconhecer que as dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam
a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para
superá-las, a educação inclusiva assume espaço central no debate acerca da sociedade
contemporânea e do papel da escola na superação da lógica da exclusão. A partir dos
referenciais para a construção de sistemas educacionais inclusivos, a organização de
escolas e classes especiais passa a ser repensada, implicando uma mudança estrutural
e cultural da escola para que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas
(BRASIL,2008, p.50).
Com potência a partir da década de 1980, os movimentos sociais em diferentes
contextos pressionaram para que houvesse avanços sociais e legais, tanto internacional quanto
nacionalmente, para a inclusão de pessoas com deficiência em vários segmentos da vida social,
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 3-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
como trabalho e educação. Estes movimentos de luta das pessoas com deficiência basearam-se
no princípio de igualdade de oportunidades. Materializavam a luta para que todos/as os alunos/
as tivessem o direito de frequentar a escola regular e que a diversidade devesse ser valorizada,
zelando pela construção de práticas que garantissem a aprendizagem e as singularidades de
todos/as, no mesmo espaço escolar. O movimento pela inclusão é uma ação política, cultural,
social e pedagógica, desencadeado em defesa do direito de todos/as os/as alunos/as de estarem
juntos/as, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação (BRASIL, 2008,
p.5). Este estudo reflete nosso entendimento de que seguem a necessidade de reconhecermos
que a discriminação persiste, mesmo em condutas veladas, que frustram, negam ou restringem
o acesso a direitos e igualdade de oportunidades a pessoas com deficiência, e a necessidade de
cooperarmos para que todos/as tenham seu espaço garantido na escola, um espaço que acolha
a cada pessoa com suas particularidades (Machado; Cazini, 2019).
METODOLOGIA
Neste trabalho, por meio de um estudo de caso embasado numa pesquisa bibliográfica
e na análise documental, refletimos sobre o cenário municipal de implementação da Educação
Especial a partir da leitura do Plano Municipal de Educação do município de Miracema/RJ e
de outros dispositivos legais sobre a educação para todos/as. Para desenvolver tal análise sobre
a situação da Educação Especial realizamos uma pesquisa de natureza qualitativa exploratória.
Segundo Vilelas (2009), a pesquisa de abordagem qualitativa está direcionada à descoberta,
à descrição aprofundada, à identificação, à significação e à intencionalidade, bem como às
relações. Por intermédio da abordagem qualitativa, trazemos a pesquisa do tipo documental
e a pesquisa bibliográfica para compreendermos como a Política de Educação Especial na
perspectiva inclusiva tem sido implementada no município de Miracema/RJ, sobretudo
ressaltando o trabalho multidisciplinar do Núcleo de Atendimento Especializado (NAE).
Para o desenvolvimento deste estudo, são analisados o Plano Municipal de Educação
(2015-2025), o Plano Nacional de Educação (2014), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
e a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Lüdke e
André (1986) destacam que a investigação documental é compreendida como o estudo e a
análise de documentos na busca de informações para encontrarmos as relacionadas à resolução
do problema da pesquisa. Já a pesquisa bibliográfica é um instrumento que possibilita a
avaliação do conhecimento produzido em pesquisas e estudos já realizados, nos favorecendo a
destacar conceitos, procedimentos, resultados e discussões que sejam também relevantes para
nossa própria pesquisa.
4-18 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024.
BARCELLOS, Danielle Pereira; GOMES, Jacqueline de Souza
RESULTADOS E DISCUSSÕES
UMA “EDUCAÇÃO PARA TODOS/AS”: JORNADA RUMO à EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Neste tópico, problematizamos a educação em relação a seu caráter inclusivo, ainda
um desafio nos dias atuais, considerando que se trata não apenas de incluir fisicamente, mas
também de estabelecer diretrizes que contemplem um processo de ensino e aprendizagem
dinâmico, capaz de reconhecer as necessidades de estudantes, oferecendo condições pedagógicas
para aprendizagem e desenvolvimento singulares. A Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva no Brasil ainda caminha a passos lentos, conforme explicam Pertile e
Rossetto (2016), porém, consideramos que se trata de um processo em construção, a ser
fortalecido em diferentes frentes de luta, quer na representação da comunidade política, quer
na sociedade civil.
Facion (2009, p. 203) menciona que “incluir não é simplesmente levar uma criança
com deficiência a frequentar o ensino regular, é mais, a inclusão é uma conquista diária para a
escola, para a criança e para seus pais”. As contradições inerentes à natureza humana trazem,
de um lado metas e ideais expressos pelas disposições normatizadas e, de outro, a escassez de
destinação orçamentária à educação, uma cultura enraizadamente capacitista e tantas outras
incongruências que acompanham a mesma. Conforme explicam Veiga Neto e Lopes (2011),
excluídos/as são aqueles/as que, de alguma forma, não possuem igualdade de oportunidades
nas políticas estabelecidas pelo Estado e nas práticas da vida em sociedade. A exclusão é
uma situação que leva à luta pela possibilidade de participação nos espaços públicos e pela
expressão da autorrepresentação, com focalização de demandas específicas pelas políticas
públicas planejadas e executadas pelo Estado.
De acordo com os preceitos da Lei nº 9.394/96, todas as pessoas possuem o direito
de frequentar uma escola regular, podendo conviver com outras crianças e demais membros/
as da comunidade escolar, se socializando e assimilando todo o conhecimento que for capaz
de obter naquele momento, dentro de suas possibilidades (Brasil, 1996). Nesse cenário
embasado por marcos legais importantes, reconhece-se que as crianças com deficiências se
beneficiam ao participarem de uma escola regular, recebendo os conhecimentos necessários ao
seu desenvolvimento integral, ainda que, para isso, a escola utilize de adequação pedagógica
e curricular a ser realizada por profissional capacitado para a Educação Especial. Vale dizer
que escola pode colaborar na desconstrução de estigmas, como a errônea ideia de que nem
toda pessoa aprende, e nesse processo de desconstruir preconceitos, a escola beneficia a todos/
as por meio do convívio em um ambiente escolar comum. Ressaltamos a importância da
presença de docentes especialistas em Educação Especial que, em cooperação com docentes
da sala regular, poderão transformar as práticas pedagógicas de uma escola nessa direção.
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 5-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
Para Bourdieu e Passeron (1998) a escola pode ser considerada como reprodutora
das desigualdades sociais, simbolizando e dividindo-se em “escola do acolhimento social
para os pobres” e “escola do conhecimento para os ricos
3
. Nesta direção, a educação
brasileira traz como legado uma escola que foi se organizando entre os interesses de grupos
economicamente empoderados, que almejavam ingressar no ensino superior, e a destinação
da falta de oportunidades às classes populares, às quais tende a ser destinada uma educação
profissional e técnica, que lhes insira no mercado de trabalho. Essa divisão ainda persiste,
mesmo que veladamente, em muitos discursos alinhados à precarização da educação pública.
Tal lógica reforça uma ruptura entre grupos sociais, com segregação na ocupação de funções
na estrutura social e dificuldade na mobilidade social.
A escola tende a ser cenário favorável para a exclusão, ao segregar estudantes que
não acompanham um currículo categorizado em disciplinas, ao excluir aqueles/as que
apresentam dificuldades de aprendizagem, estudantes com deficiências, pessoas mais pobres,
pessoas negras, pessoas indígenas, ou seja, ao excluir todos/as aqueles/as que não estão tendo
os resultados que são considerados adequados segundo os padrões sociais. Urge que uma escola
inclusiva seja organizada política e pedagogicamente para compor ações que favoreçam uma
aprendizagem centrada na diversidade e não na uniformidade, que valorize a multiplicidade
de experiências de sermos e estarmos no mundo, como escreve Mantoan (2006):
A exclusão escolar manifesta-se das mais diversas e perversas maneiras, e quase sempre o
que está em jogo é a ignorância do aluno diante dos padrões de cientificidade do saber
escolar. Ocorre que a escola se democratizou abrindo-se a novos grupos sociais, mas
não aos novos conhecimentos. Exclui, então, os que ignoram o conhecimento que ela
valoriza e, assim, entende que a democratização é massificação de ensino e não cria a
possibilidade de diálogo entre diferentes lugares epistemológicos, não se abre a novos
conhecimentos que não couberam, até então, dentro dela (Mantoan, 2006, p.13).
De acordo com a Declaração de Jomtien (UNESCO, 1990), cada país signatário
deverá rumar para uma educação que contribua para a construção de um mundo mais
seguro, próspero e sadio, favorecendo o progresso social, cultural e econômico, bem como a
cooperação e a tolerância. A escola, portanto, não pode se esquivar de firmar um compromisso
fundamental com a formação social dos indivíduos, tornando-se promotora da diversidade,
garantindo a convivência e a inclusão de todos/as no ambiente educacional.
Bourdieu e Passeron (1998) afirmam que a escola se constituía no instrumento mais acabado do capitalismo para reproduzir
as relações de produção e ideologia do sistema. Desta forma, qualquer ação pedagógica já é uma violência imposta pela cultura
dominante, isto é, a classe dominante que decide como a escola deve se apropriar da pedagogia em decorrência da divisão
social. Percebe-se que, para a classe dominante, a educação é uma forma de perpetuar sua posição na sociedade, já para a classe
dominada, a educação é uma perspectiva de conquista, pois é por meio dela que o dominado sonha em se ascender socialmente.
Para a classe dominante, a educação é uma forma de perpetuar sua posição na sociedade, já para a classe dominada, a educação
é uma perspectiva de conquista, pois é por meio dela que o dominado sonha em se ascender socialmente.
6-18 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024.
BARCELLOS, Danielle Pereira; GOMES, Jacqueline de Souza
Após a Declaração de Salamanca na Conferência Mundial sobre Necessidades
Especiais, no ano de 1994, houve vários avanços que se traduziram em políticas públicas de
inclusão, como a matrícula em salas comuns e a implementação do Atendimento Educacional
Especializado, cujas diretrizes foram instituídas pela Resolução nº 4/2009, além de um conjunto
de ações como o Programa Nacional de Formação Continuada de Professores na Educação
Especial, a implantação de Salas de Recursos Multifuncionais, adaptações arquitetônicas das
escolas, o Programa Incluir, entre outros avanços considerados importantes. Por força da norma,
propostas que incentivassem e materializassem a Educação Inclusiva foram sendo implementadas
nas redes de educação e nas escolas do nosso país, no intuito de ofertar uma educação que seja
para todos/as. Com isso, incluir estudantes na escola regular significa proporcionar a todos/as
um aprendizado que seja expressão da convivência com a diversidade, sem anulá-la, o que nem
sempre vemos na prática (Rocha; Menezes, 2020).
Adotar a inclusão como valor social consiste em encampar propósitos que garantam
o acesso igualitário à educação. Endossamos o que nos diz Santos (1999, p. 15): “temos o
direito à igualdade, quando a diferença nos inferioriza; temos o direito de sermos diferentes,
quando a igualdade nos descaracteriza”. Nesta perspectiva, incluir, respeitar e trabalhar com
as diferenças num processo de igualdade de oportunidades é meta da escola inclusiva. Na
prática, as possibilidades de uma escola inclusiva dependem de uma complexidade de fatores,
donde está o comprometimento com o que se demanda em cada fase do aprendizado por
cada criança (Fumegalli, 2012).
Numa escola inclusiva, docentes desempenham, pois, papel fundamental, o
que deveria vir com grande investimento para que o trabalho pedagógico inclusivo possa
ser desenvolvido adequadamente (Carvalho, 2004). Afinal, como promover uma reforma
estrutural e organizacional em nossas escolas sem recursos e investimentos? Responder a
esta questão nos leva à necessidade de verificarmos este debate no microcosmo do plano
municipal com vistas a incentivar outras reflexões locais que ofereçam subsídios para
se construir ambientes capazes de oferecer condições diversas de aprender, que valorizem
a heterogeneidade de alunos/as, promovendo igualdade de oportunidades a todos /as,
considerando que o processo de aprendizagem é único a cada pessoa.
Esta investigação é apenas parte de uma jornada rumo ao objetivo de se construir
uma educação para todos/as, onde as diferenças não são ignoradas, onde as injustiças são
superadas e os medos dão lugar à ousadia de transformar, de ir à procura de caminhos, mesmo
que ainda não saibamos exatamente por quais estradas iremos trilhar. A meta está traçada,
que é assumir o papel insubstituível de defensores/as de uma escola inclusiva, aliando-nos a
outras forças sociais e às inúmeras vozes dos movimentos sociais que seguem em luta por uma
educação inclusiva.
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 7-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA INCLUSIVA: PRESSUPOSTOS E DESAfIOS
Educação Inclusiva e Educação Especial estão intrinsecamente relacionadas, mas
não são sinônimas. No Brasil, a atual Política Nacional de Educação Especial na perspectiva
da Educação Inclusiva (2008) foi construída a partir de um movimento de política interna,
iniciado com a Constituição Federal de 1988 e que se expandiu com o Estatuto da Criança
e do Adolescente de 1990 e com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, bases
importantes para que as discussões internacionais ganhassem aderência nas políticas
educacionais e nas reformas educacionais ocorridas no Brasil. Como já citado, no plano
internacional, a Declaração de Jomtien (1990), dentre tantos outros pontos importantes, traz
à pauta direcionamentos para a superação das disparidades educacionais em todos os âmbitos.
Anos depois, a Declaração de Salamanca (1994) traz à discussão que escolas regulares com
orientação inclusiva são os meios mais eficazes de se combater a discriminação, embora que
a educação voltada para a inclusão escolar de todos/as ainda represente um desafio na prática
atual das escolas.
Na perspectiva inclusiva, a Educação Especial se associa à ideia de uma educação
que acolhe a todos/as, considerando as particularidades de cada aluno/a com vistas a serem
eliminadas barreiras que impeçam a aprendizagem, buscando possibilitar que todos/as
usufruam em igualdade de condições de aprendizagem no cotidiano escolar. Florian (2010)
menciona que a Educação Inclusiva não constitui a eliminação da Educação Especial, mas sua
reorganização e ressignificação. No mesmo sentido, a Política Nacional de Educação Especial
na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) esclarece:
Na perspectiva da educação inclusiva, a educação especial passa a integrar a proposta
pedagógica da escola regular, promovendo o atendimento às necessidades educacionais
especiais de alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação. Nestes casos e outros, que implicam em transtornos
funcionais específicos, a educação especial atua de forma articulada com o ensino
comum, orientando para o atendimento às necessidades educacionais especiais desses
alunos (Brasil, 2008, p.9).
Importantes avanços foram logrados no Brasil nas últimas décadas, rompendo
com um período em que a educação era voltada para a exclusão e segregação de alunos/as
com algum tipo de deficiência
4
. Houve profundas mudanças nas práticas educacionais que
deixaram de segregar e integrar para incluir, visando à garantia do acesso e permanência de
estudantes com deficiências nas escolas, através da oferta de matrícula a esses/as estudantes
que são público-alvo da Educação Especial nas classes comuns da modalidade regular de
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência –CDPD, da Organização das Nações Unidas – ONU, reforça
que: Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdades de condições com as demais pessoas (ONU, 2009, p. 26).
8-18 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024.
BARCELLOS, Danielle Pereira; GOMES, Jacqueline de Souza
ensino, e disponibilizando, ainda, o Atendimento Educacional Especializado (Rodrigues;
Macedo, 2020).
A integração escolar pode ser entendida como o “especial na educação”, ou seja, a
justaposição do ensino especial ao regular, ocasionando um inchaço nessa modalidade,
pelo deslocamento de profissionais, recursos, métodos e técnicas da educação especial
às escolas regulares. Quanto à inclusão, esta questiona não somente as políticas e a
organização da educação especial e da regular, mas também o próprio conceito de
integração. Ela é incompatível com a integração, pois prevê a inserção escolar de forma
radical, completa e sistemática. Todos os alunos, sem exceção, devem frequentar as
salas de aula do ensino regular (Mantoan, 2003, p. 16).
De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva (2008):
A educação inclusiva constitui um paradigma educacional fundamentado na
concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores
indissociáveis, e que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar
as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola (Brasil,
2008, p.5).
Este marco político-normativo reestrutura a concepção de Educação Especial,
não a desvencilhando de uma orientação inclusiva, para preconizar ações que valorizem o
sujeito em sua pluralidade, respeitando e reconhecendo a diversidade enquanto característica
distintiva, própria de cada indivíduo (Silva, 2011). Percebe-se, que de um modo geral, o
objetivo inclusivo da educação corresponde em minimizar os efeitos da inserção social de
pessoas que experimentam algum tipo de exclusão, seja na escola, no mercado de trabalho e/
ou qualquer outro espaço social, devido a sua condição socioeconômica, de gênero, de raça
ou de possuir algum tipo de transtorno ou deficiência.
A partir desta ressignificação, as práticas pedagógicas, pois, necessitam se adequar às
diferentes demandas e potencialidades dos/as estudantes, demandando também a atualização
dos Projetos Políticos Pedagógicos, do direcionamento de investimentos e da organização do
cotidiano escolar, com a valorização da construção de relações mais democráticas, respeito ao
trabalho docente e às necessidades de ensino e aprendizagem de cada estudante. Importante,
ainda, fomentar o diálogo na escola como forma de promover a integração entre profissionais
da educação e a família dos educandos/as, principalmente com aqueles/as que possuem
deficiências, assim como, documentar tais condutas como compromisso no Projeto Político
Pedagógico da escola. demonstra a legitimidade das propostas voltadas para a Educação
Especial na perspectiva inclusiva, não deixando de salientar que o tripé escola-família-
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 9-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
comunidade é de grande importância para impulsionar a troca de informações que em muito
pode melhorar o aprendizado discente (Silva, 2010).
Não nos esquivamos de atentar para o fato de que há inúmeros desafios a serem
vencidos quando se trata de lidar com estudantes com deficiência no ambiente de ensino
regular. Identifica-se um problema estrutural, entre o que leis e orientações políticas
determinam e o que acontece na prática. A escola inclusiva, de acordo com Mantoan (2006),
não pode mais ser aquela de estrutura rígida, onde o/a aluno/a precisa se adaptar a ela. Agora,
é a escola que passa a ter que se adequar ao/à aluno/a, tanto em relação à estrutura física dos
ambientes, quanto ao trabalho pedagógico e curricular, com vistas a respeitar particularidades,
a priorizar o/a aluno/a e seu processo de aprendizagem individualizado.
Políticas pedagógicas voltadas para a formação de profissionais da educação alicerçadas
nos preceitos da educação inclusiva são indispensáveis para a promoção de práticas dinâmicas
que se coadunem com a multiplicidade de sujeitos que ocupam os espaços das nossas salas
de aula. Nesse interim, a Resolução CNE/CP nº 1/2002 estabelece as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica e determina que as instituições
de ensino superior devem incluir em sua organização curricular a formação docente voltada
para a atenção à diversidade e que contemple conhecimentos sobre as especificidades
dos/as alunos/as com necessidades educacionais especiais (BRASIL, 2008).
A Educação Especial é modalidade transversal a ocupar-se com recursos e estratégias
didáticas que colaborem com o ensino regular, selecionando e desenvolvendo ferramentas
úteis ao processo de ensino e aprendizagem dentro do ambiente escolar comum, quer sejam
insumos, equipamentos, linguagem e códigos que possibilitem a transposição de barreiras
impostas para a aprendizagem e/ou que causem prejuízo ao processo educacional. Desta
forma, entende-se que a inclusão de estudantes com deficiência ocorre no espaço da sala
de aula regular, que passa a se comprometer com a igualdade de oportunidades de acesso
aos conteúdos, às práticas pedagógicas, aos ambientes escolares, etc. No Brasil, a Educação
Especial oferecida atualmente conta com o apoio criação das Salas de Recursos Multifuncionais
(SRM) que desenvolvem o atendimento pedagógico por meio de intervenção mais direta,
com funções próprias do ensino especial, sendo oferecida no contraturno, não substituindo
o ensino regular, mas sobretudo atendendo as necessidades e as especificidades de cada
estudante, público-alvo da Educação Especial (Brasil, 2008).
Observa-se que o trabalho dos profissionais de educação na Sala de Recursos
Multifuncionais (SRM) requer certa afinidade com o uso da tecnologia, além de conhecimentos
específicos sobre as práticas envolvidas em sua operacionalização, o que, por sua vez, demanda
busca e oferta de capacitação ao profissional (inicial e continuada) para a Educação Especial
e Inclusiva. Destaque-se a importância que envolve a formação continuada e atualização dos
conhecimentos por parte dos atores envolvidos/as na escolarização em um contexto inclusivo,
tendo em vista que é o/a profissional que o recebe que se torna o/a multiplicador/a de tais
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conhecimentos para os/as demais profissionais da escola, assim como para a família e para a
comunidade escolar (Rodrigues; Macedo, 2020).
De acordo com o Censo da Educação do ano de 2021, as matrículas de estudantes
com deficiência em classes comuns passaram de 54%, no ano de 2008, para 92% em 2021.
Contudo, o mesmo censo aponta que cerca de 60% das escolas brasileiras ainda não possuem
qualquer medida de acessibilidade, o que exemplifica algumas das inúmeras barreiras ainda
existentes, mesmo com legislações específicas que garantem acessibilidade para as pessoas
com deficiência. Trata-se de um movimento ainda em desenvolvimento no Brasil, cujas
pesquisas apontam que a principal causa da falta de acessibilidade é a ausência de observação,
cumprimento e fiscalização da legislação (INEP, 2021).
Em 2020, o governo de Jair Bolsonaro publicou o Decreto nº 10.502, que instituía
a Nova (era, em verdade, um retrocesso) Política Nacional de Educação Especial, estimulando
alunos/as com deficiências a frequentarem escolas e salas especiais. Neste ínterim, houve
mobilização por parte da sociedade, de modo que o Supremo Tribunal Federal formou
maioria pela inconstitucionalidade do referido decreto. A norma foi revogada como uma das
primeiras ações do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A luta dos movimentos sociais
se fez para defender a relevância da Educação Especial na perspectiva Inclusiva e, dentre
outros, para a garantia de matrícula em escolas comuns, o combate aos retrocessos de direitos
e segregação de estudantes público-alvo, a produção e divulgação de dados e indicadores
de exclusão, evasão e aprendizagem na Educação Especial, garantias de acessibilidade a
estudantes com deficiências, investimentos para a formação continuada para docentes com
a perspectiva da inclusão, adequações curriculares visando melhoria no processo de ensino-
aprendizagem buscando aperfeiçoar e desenvolver valores, conhecimentos, habilidades,
comportamentos e competências a todos/as estudantes e investimento na infraestrutura das
escolas comuns, visando a transição para um modelo educacional inclusivo.
De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde - PNS do IBGE (2019), 17,3 milhões
de pessoas no Brasil possuem algum tipo de deficiência, o que nos leva a considerar que, na
trajetória de construção das políticas de inclusão, avanços significativos foram conquistados
e a perspectiva para o futuro é de que os governos em âmbito nacional, estadual e municipal
continuem buscando o aperfeiçoamento de tais políticas públicas a fim de atender a demanda
da população brasileira. O Brasil dispõe de um aparato regulatório voltado para a garantia
de um sistema educacional inclusivo e a transição do modelo segregado para o inclusivo
representou um avanço considerável nos últimos anos, mas é importante salientar que apenas
formulação de leis não representa a efetividade e eficácia de direitos, daí a importância de se
analisar os impactos e resultados destas políticas públicas no caso concreto, como o fazemos
na seção a seguir, de forma a ir adequando-as de forma a superar os desafios que ainda existem
no sistema educacional.
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Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
INCLUSÃO NA PRáTICA: A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA CIDADE DE MIRACEMA/RJ
O município de Miracema, situado na região Noroeste Fluminense do estado do
Rio de Janeiro, a 21° 24’50” de latitude sul e 42º11’52” de longitude oeste, está à margem
das Rodovias Estaduais RJ 116 e RJ 200, tendo como municípios limítrofes Itaperuna e
Laje do Muriaé ao Norte, Santo Antônio de Pádua ao Sul, São José de Ubá a Leste e Palma
(MG) a Oeste. Com uma área de extensão de aproximadamente 306 km² e altitude média
de 137 metros acima do nível do mar, o município é composto por três distritos, sendo o
primeiro distrito a sede, o segundo distrito de nome Paraíso do Tobias e o terceiro distrito
chamado Venda das Flores. Miracema passou à categoria de município em 07/11/1935 e,
com sua emancipação político-administrativa, conseguiu se recuperar da derrocada do café e
iniciou a cultura do algodão com o objetivo de abastecer a fábrica de tecidos São Martino e,
concomitantemente, desenvolveu a cultura da cana-de-açúcar em ação conjunta com a Usina
Santa Rosa. As culturas de milho, feijão e café eram consideradas de subsistência. Com o
tempo, foi crescendo também a cultura do arroz irrigado, juntamente com a pecuária leiteira,
que é a principal atividade rural do Município até os dias atuais (Miracema, 2022).
A Secretaria de Educação do município foi criada no ano de 1988, em função de
exigências legais, pelo então prefeito, sendo criado um núcleo de educação, que funcionava no
prédio da prefeitura do município. Atualmente, a Secretaria Municipal de Educação, Esporte
e Lazer possui sede própria, localizada no Centro do município. A estrutura educacional
municipal está em conformidade com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDBEM nº
9.394/96, sendo estruturada por etapas e modalidades de ensino, englobando a Educação
Infantil, o Ensino Fundamental obrigatório, de nove anos, e o Ensino Médio. Segundo o
Censo Escolar de Miracema (2021), há 21 (vinte uma) unidades ativas e 35 (trinta e cinco)
paralisadas no município. Em áreas urbanas, são 16 (dezesseis) escolas ativas e 6 (seis)
paralisadas. Em áreas rurais, são 5 (cinco) escolas ativas e 29 paralisadas.
É válido lembrar que as duas primeiras etapas são de responsabilidade da gestão
municipal, estando o Ensino Médio sob responsabilidade do Governo Estadual do Rio de
Janeiro. O número de estudantes matriculados/as na Rede Municipal de Educação no 1º
semestre de 2022, segundo o Censo Escolar de Miracema (2021), é de 3.207 estudantes,
divididos entre as 21 (vinte e uma) unidades ativas, conforme disposto na tabela abaixo.
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TABELA 1 - Quantitativo de Matrículas em Miracema/RJ
Escolas Ativas
Total
Áreas Urbanas Áreas Rurais
Matrículas na Educação
Infantil
985 131 1.116
Matrículas no Ensino
Fundamental
1.853 238 2.091
Total Acumulado 2.838 369 3.207
Fonte: Dados compilados do Censo Escolar de Miracema, 2021.
De acordo com o estudo socioeconômico do Tribunal de Contas do Estado do Rio
de Janeiro (TCE-RJ), a rede municipal de Miracema respondeu por 91% das matrículas
na creche em 2020, apresentando evolução de 18% entre 2015 e 2020, na pré-escola foi
responsável por 81% das matrículas, no ensino de jovens e adultos foi responsável por 47%
e, no Ensino fundamental, foi responsável por 71% do volume de matrículas (Rio de Janeiro,
2021). Convém mencionar que, segundo o referido estudo, Miracema ocupou o 1º lugar no
Índice de Oportunidades da Educação Brasileira (IOEB, 2021) no estado do Rio de Janeiro,
apresentando uma nota de 5,4, que supera as médias estadual (4,9) e nacional (5,0) pelo
IOEB, que tem a função de analisar as oportunidades fornecidas para crianças e jovens desde
a Educação Infantil até o Ensino Médio em todas as suas redes educacionais.
Nos anos de 2019 e 2021, Miracema obteve o melhor resultado no Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) no estado do Rio de Janeiro, alcançando a nota
de 6.9 nos anos iniciais da rede municipal de educação e 6.1 nos anos finais, ultrapassando as
metas projetadas para o mesmo ano. Além das modalidades de ensino descritas anteriormente,
a educação do município de Miracema oferece ainda, a Educação de Jovens e Adultos e
a Educação Especial, modalidades de educação, que são oferecidas em espaço comum de
aprendizagem. As Salas de Recursos Multifuncionais (SRM), preconizadas pela LDB, estão
em processo de implantação, uma vez que as verbas para sua instalação foram percebidas pelo
município a partir do fim do ano de 2021 (Rio de Janeiro, 2021).
O Plano Municipal de Educação da cidade de Miracema para o decênio 2015/2025
foi aprovado por meio da Lei nº 1.602 de 18 de junho de 2015, estando em consonância com
as diretrizes previstas no Plano Nacional de Educação – PNE (2014), em sua meta 4:
Universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso
à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente
na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 13-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou
conveniados (Brasil, 2014, p.24).
O Plano Municipal de Educação, na seção 4.1.2, traz uma preocupação, ainda
tímida, com as crianças com deficiência (denominadas “crianças especiais” no documento),
tanto que como objetivo citou-os da seguinte forma: “f. adequação às características das
crianças especiais” (Miracema, 2015, p.35) e listou os seguintes tópicos:
Criação de mecanismos de colaboração entre as secretarias de educação, saúde e
assistência social na manutenção, expansão, administração, controle e avaliação
das políticas públicas de atendimento às crianças de 0 a 3 anos de idade e seus
familiares;
Aprender a conviver e relacionar-se com pessoas que possuam habilidades e
competências diferenciadas, respeitando uns aos outros, valorizando a igualdade,
equidade e a solidariedade (Miracema, 2015, p. 35).
Especificamente sobre a modalidade de Educação Especial, a mesma é oferecida por
meio de mediação escolar, com o acompanhamento no Núcleo de Atendimento Especializado
- NAE e das Salas de Recursos Multifuncionais, presentes em algumas poucas escolas da rede
municipal. De acordo com o Plano Municipal de Educação vigente:
A Educação Especial, destinada aos alunos portadores de deficiências, tem duração
variável, de acordo com o desenvolvimento do educando no processo ensino
aprendizagem e que poderá ser oferecida preferencialmente através da inclusão em
classes de ensino regular com serviços de apoio e através de atendimento em salas de
recursos, oficinas pedagógicas e educação precoce (Miracema, 2015, p. 48).
Conforme prevê o Plano em vigência, o Atendimento Educacional Especializado
(AEE) do município de Miracema/RJ se dá por meio do Núcleo de Atendimento Especializado
(NAE), que foi criado em fevereiro do ano de 2017, como um órgão da Secretaria de Educação
em trabalho de parceria com a Secretaria de Saúde, atuando com uma equipe multidisciplinar
que conta com profissionais na área de Nutrição, Psicologia, Pedagogia, Fonoaudiologia,
Psicopedagogia, Terapia Ocupacional e professores de sala de recursos multifuncionais
(Miracema, 2022).
A Lei nº 9394/96, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em seu art. 58, prevê que
o Atendimento Educacional deve ser realizado em centros de serviços especializados:
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§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular,
para atender às peculiaridades da clientela de educação especial.
§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados,
sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua
integração nas classes comuns de ensino regular (Brasil, 1996).
Em Miracema, no entanto, o NAE realiza um trabalho na prática de serviço
especializado, ocupando um ambiente externo ao da instituição de ensino regular, e com
isso, nos leva a pensar que há a ruptura de um dos pilares que sustentam a Educação Especial
na perspectiva inclusiva, que é a inserção do estudante com deficiência, de forma completa
e irrestrita, no ambiente escolar regular. A promoção da socialização, por sua vez, é uma das
bases da noção do desenvolvimento integral da criança, que entendemos restar prejudicada
a partir do momento em que este/a estudante/a é segregado/a num outro espaço, ainda que
parcialmente (no contraturno).
O NAE funciona, ao tempo deste estudo, como um suporte de atendimento
multidisciplinar, com profissionais da saúde e da educação de diversas áreas, o que lhe
tem conferido características mais inerentes a um estabelecimento de saúde do que a uma
instituição voltada para o Atendimento Educacional Especializado (AEE), trazendo-nos
dúvidas quanto ao seu objetivo institucional dentro do que preconiza a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008):
Em todas as etapas e modalidades da educação básica, o atendimento educacional
especializado é organizado para apoiar o desenvolvimento dos alunos, constituindo
oferta obrigatória dos sistemas de ensino e deve ser realizado no turno inverso ao
da classe comum, na própria escola ou centro especializado que realize esse serviço
educacional (Brasil,2008, p.16).
O compromisso da Administração Municipal em relação ao processo de inclusão de
estudantes com deficiência se apresenta através da disponibilidade de mediadores/as escolares
para alunos/as atendidos/as pelo NAE e pelo investimento de recursos em melhorias na
estrutura física e na contratação de profissionais que trabalham no Núcleo de Atendimento
Especializado (NAE), que atende à mais de 150 crianças com transtornos e/ou deficiências.
Consoante os ensinamentos de Fumegalli (2012), bem como de Rodrigues e Macedo (2020),
entendemos que não é o bastante. Seria preciso investimento na capacitação para a lide com
as tecnologias mais atualizadas, para a atuação com práticas pedagógicas alicerçadas pelos
preceitos da Educação Especial e Inclusiva bem como a promoção de ações que rompam
com valores capacitistas arraigados socialmente, desafios a serem vencidos no município
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 11, n. 2, e0240014, 2024. 15-18
Educação especial na perspectiva inclusiva Artigos
de Miracema, que ainda não dispõe de profissionais qualificados para o uso das Salas de
Recursos, por exemplo.
A literatura aponta para a necessidade do trabalho dinâmico e integrado entre os
sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem (Fumegalli, 2012; Rocha; Menezes,
2020; Mantoan, 2006). Sendo o Atendimento Educacional Especializado (AEE) realizado
fora do ambiente escolar, através do NAE de Miracema, forma-se uma lacuna quanto à
comunicabilidade entre os sujeitos envolvidos nesse processo, escola-família-NAE. Segundo
o Plano Nacional de Educação:
O atendimento educacional especializado identifica, elabora e organiza recursos
pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos
alunos, considerando as suas necessidades específicas. As atividades desenvolvidas no
atendimento educacional especializado diferenciam-se daquelas realizadas na sala de
aula comum, não sendo substitutivas à escolarização. Esse atendimento complementa
e/ou suplementa a formação dos alunos com vistas à autonomia e independência na
escola e fora dela. O atendimento educacional especializado disponibiliza programas
de enriquecimento curricular, o ensino de linguagens e códigos específicos de
comunicação e sinalização, ajudas técnicas e tecnologia assistiva, dentre outros. Ao
longo de todo processo de escolarização, esse atendimento deve estar articulado com
a proposta pedagógica do ensino comum (BRASIL, 2008, p. 16)
Conforme ponderações até aqui tecidas, entendemos que o diálogo e a articulação
entre os/as personagens envolvidos/as no atendimento multidisciplinar preconizado em um
contexto inclusivo, ainda representa um desafio a ser vencido no município de Miracema/RJ.
Ainda assim, percebemos existir um esforço da gestão municipal no sentido de disponibilizar
apoio para que a Educação Especial seja ofertada a todos/as que dela necessitarem, mesmo
que entendamos serem necessárias adequações nos processos adotados atualmente, para que
se coadunem às orientações da vigente Política Nacional de Educação Especial na perspectiva
da Educação Inclusiva.
CONSIDERAÇÕES fINAIS
Inclusão na educação é tema amplamente debatido nos últimos anos, com a
promulgação de leis, criação de políticas públicas e tratados internacionais, buscando-se
garantir que a educação seja acessível a todas as pessoas, em igualdade de oportunidades, como
direito humano. No mesmo sentido, o debate sobre a Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva reforça a necessidade de investimentos financeiros e no capital humano,
sobretudo no âmbito municipal, como visto neste estudo. Não nos esquivamos de reconhecer
os inúmeros desafios para a implantação da Educação Especial na esfera local, mas também
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BARCELLOS, Danielle Pereira; GOMES, Jacqueline de Souza
reconhecemos esforços empenhados pela Administração Municipal a fim de minimizar
barreiras à educação como direito.
No caso do município de Miracema, identificamos que a criação do Núcleo de
Atendimento Especializado (NAE) materializa um importante atendimento multiprofissional
e multidisciplinar para o desenvolvimento global dos/as estudantes, particularmente os/as
com deficiências, mas ainda demanda ajustes com vistas a efetivar as orientações previstas
pela Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (2008).
Concluímos que o avanço é gradativo e que o atendimento a estudantes com deficiências
realizado pelo NAE, embora inovador no que se concerne à oferta de serviços voltados
para a inclusão, precisa de maior alinhamento com os dispositivos normativos, nacionais e
internacionais, a fim de não se transformar num futuro próximo em uma política pública
ineficaz e despropositada quanto aos interesses e necessidades dos/as estudantes com
deficiências.
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