Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 125
https://doi.org/10.36311/2358-8845.2023.v10n1.p125-142
is is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License.
Conflitos soCiais: a perspeCtiva de estudantes Com indiCativos de altas
habilidades/superdotação em situação de vulnerabilidade humana
Social conflictS: the perSpective of StudentS with indicativeS of high
SkillS and giftedneSS in a Situation of human vulnerability
Carla Sant’Ana OLIVEIRA
1
Carla Luciane Blum VESTENA
2
Leandro Cordeiro CRISTO
3
RESUMO: o presente artigo traz um recorte de uma pesquisa empírica, com entrevista semiestruturada, baseada no método clí-
nico piagetiano, e objetivou demonstrar como os estudantes com Altas Habilidades/Superdotação em situação de vulnerabilidade
humana usam seu potencial criativo e desenvolvem soluções para responder aos conitos existentes em seu meio. Para a análise
qualitativa dos resultados utilizou-se autores como Saltini (2008), Inhelder e Piaget (1982), Lubart (2007) entre outros. Os resul-
tados obtidos indicam que os estudantes estão sendo prejudicados em seu potencial criativo por falta de desenvolvimento de trocas
interindividuais reais, por conta do contexto existente na Pandemia Covid 19 que limitou a interação interindividual, porém estão
em pleno desenvolvimento cognitivo com o auxílio das ferramentas digitais, também sentem-se frustrados com a forma com que os
professores conduzem as aulas remotas, com a falta de acesso aos esportes e lazer, e a falta de atendimentos adequados a sua condi-
ção com desaos cognitivos e atividades para o desenvolvimento social. Os resultados indicam ainda que mesmo neste contexto de
vulnerabilidade que os limitou a explorarem mais os conitos apresentados neste trabalho de forma criativa, eles ainda trouxeram
respostas complexas para os pares de sua idade, demonstrando autonomia e amplo potencial criativo.
PALAVRAS-CHAVE: Cognição. Criatividade. Pandemia. Piaget. Educação Inclusiva.
ABSTRACT: the present article is an excerpt from an empirical research, with semi-structuredinterviews, based on the Piagetian
clinical method, and aimed at demonstrating how students with High Abilities/Super ability in a situation of human vulnerability
use their creative potential and develop solutions to respond to the existing conicts in their environment. For the qualitative
analysis of the results we used authors such as Saltini (2008), Inhelder and Piaget (1982), Lubart (2007) among others. e results
obtained indicate that the students are being hindered in their creative potential by the lack of development of real inter-individual
exchanges, due to the existing context in Pandemic Covid 19 that limited the inter-individual interaction, however they are in
full cognitive development with the help of digital tools, they also feel frustrated with the way the teachers conduct the remote
classes, with the lack of access to sports and leisure, and the lack of appropriate care to their condition with cognitive challenges
and activities for social development. e results also indicate that even in this context of vulnerability that limited them to further
explore the conicts presented in this work in a creative way, they still brought complex answers for their age peers, demonstrating
autonomy and ample creative potential.
KEYWORDS: Cognition. Creativity. Pandemic. Piaget. Inclusive education.
Doutora em Educação. Professora colaboradora da Universidade Estadual do Centro-Oeste. E-mail: carlasantol19@gmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6262-5749
PhD pela School of Education, Durham University - UK (2016-2017). Doutora em Educação. Professora colaboradora do
Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal do Paraná - UFPR. E-mail: clbvestena@gmail.com. ORCID:
https://orcid.org/0000-0002-8655-7840
Mestre em Educação. Professor Efetivo do Atendimento Educacional Especializado pela Rede Municipal de Ensino de
Guarapuava/PR. E-mail:professorleandro.arte@gmail.com.ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6165-7132
126 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
introdução
No Brasil, muitos educadores e pesquisadores demonstram que existe uma preocupação
em atender às necessidades acadêmicas dos estudantes com Altas Habilidades/Superdotação
4
(AH/SD)
5
. Todavia, há ainda algumas lacunas no atendimento das necessidades relacionadas ao
desenvolvimento emocional e social destes estudantes.
Para atender essas necessidades, deve-se entender que o estudante com AH/SD é uma
pessoa que consegue observar o mundo de maneira diferente dos colegas.
As características peculiares, demandam grandes expectativas de aprendizagem pelos
estudantes com AH/SD. Há ainda, a necessidade que deve ser atendida pelos educadores e salas de
recursos a respeito do processo de aprendizado, que em estudantes com AH/SD é mais ágil do que
seus pares. Isso ocorre porque eles são bons em fazer relações entre diversos eventos e informações,
podem se concentrar em algo por um longo período, bem como despertam interesse por assuntos
abstratos.
Não obstante, os estudos sobre essas necessidades especiais dos estudantes com talentos
criativos apresentam lacunas. O resultado dessa lacuna é o fraco desempenho criativo por parte
destes estudantes e uma diminuição na conquista de produções criativas para seus conitos.
Estudos estadunidenses apontam as necessidades sociais de alunos com talentos
criativos. E a importância do engajamento como componente-chave do sucesso, foi estudada por
McCormick e Plucker (2013), que demonstraram que se não houver programas especícos para o
desenvolvimento do talento criativo em estudantes superdotados, podemos levá-los ao insucesso
educacional, afetivo e social.
Foi pensando neste contexto que o presente artigo traz um recorte de pesquisa empírica
realizada entre 2019 e 2021, cujos resultados fazem parte de tese defendida para o Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná
6
.
Os objetivos desta pesquisa buscavam entender como os estudantes com AH/SD em
situação de vulnerabilidade humana usam seu potencial criativo e desenvolvem soluções para
responder aos conitos existentes em seu meio.
Os dados foram coletados via questionários e entrevistas nas quais usamos dilemas com
conitos reais, criados a partir das próprias vivências dos estudantes, a coleta de dados foi realizada
de modo remoto
7
, foram entrevistados cinco estudantes regularmente matriculados em escolas
estaduais situadas no município de Guarapuava- PR.
A Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I para Altas Habilidades/Superdotação é um espaço organizado com materiais didático-
pedagógicos, equipamentos e prossional(is) especializado(s) onde é ofertado o atendimento educacional especializado que visa
atender às necessidades educacionais dos alunos público-alvo da Educação Especial na Rede Pública de Ensino. Disponível em:<
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=666>. Acesso 02 Set 2018.
O termo Altas Habilidades/Superdotação será usado neste texto, conforme a Resolução nº 4/2009 (BRASIL, 2009), que
estabelece Diretrizes Operacionais para o AEE na modalidade Educação Especial para Educação Básica. Para facilitar a escrita do
texto optamos por utilizar a sigla AH/SD para designar Altas Habilidades/Superdotação, superdotados e superdotadas.
 Pesquisa validada pelo Comitê de Ética.
 Durante a Pandemia Covid-19, por isso utilizou-se recursos como o Google Forms e o Zoom meeting.
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 127
A RESOLUÇÃO DE CONFLITOS EM ESTUDANTES COM INDICATIVO
DE ALTAS HABILIDADES/SUPERDOTAÇÃO
Piaget (1932) indica que o julgamento é um processo de desenvolvimento. Não se trata
apenas de um artifício em que se imprimem regras e virtudes, mas é a capacidade de modelar essas
regras a partir de uma reestruturação cognitiva. Existem condições ambientais e, ou ações adultas
que inuenciam o julgamento e a resolução de conitos.
Esse desenvolvimento envolve transformações básicas na estrutura cognitiva, ou seja,
trata-se de uma mudança na forma, no padrão e na organização do pensamento. A transformação
das estruturas cognitivas implica na criação de soluções necessárias para os conitos.
É para compreender como ocorrem essas transformações e como é possível
aos estudantes com AH/SD solucionar os conitos cotidianos que tratar-se-á neste
capítulo da resolução de oito dilemas morais. Obteve-se as seguintes respostas:
QUADRO 1 - Violência doméstica
Dilema 1. Um menino brincava em seu quarto, enquanto seu pai trabalhava na cidade. Depois de algum
tempo, teve vontade de desenhar. Mas não tinha papel. Lembrou-se, então, que na escrivaninha
de seu pai havia belas folhas brancas numa gaveta. Foi sorrateiramente procurá-las em uma gaveta.
Quando o pai voltou, vericou que a gaveta estava em desordem e acabou por descobrir que o
menino havia roubado o papel. Foi, logo em seguida, ao quarto do menino e viu no chão todas
as folhas rabiscadas com lápis de cor, então, muito zangado deu uma surra no menino” (PIAGET,
1994, 171). O que você compreendeu sobre a história? O que você achou da atitude do menino?
O que você faria se estivesse no lugar do pai? Diga-me o que você acha sobre isso? Como pode-se
solucionar essa questão?
Mohamed Que não deveria pegar as folhas e, sim, perguntado para o pai. Não daria uma surra, eu teria
conversado com o menino, falaria que se ele quisesse, perguntasse e o pai o teria deixado.
Charles Um menino queria desenhar, ele foi ao quarto e pegou as folhas que estavam à disposição. Na história
não ouvi que o pai falou para ele não pegar as folhas, na minha opinião, não foi bem explicado para
ele que não podia mexer nas folhas. Não, não acho certo, ele só queria desenhar para passar o tempo.
Me parece que era uma criança menor, e só queria desenhar, não estava fazendo nada errado. O pai
poderia ter explicado, não bater.
Harvey Ele estava brincando em seu quarto e teve vontade de desenhar e foi ao quarto do pai e pegou a folha.
Não que eu achei uma atitude errada do pai, mas sem cabimento, não que o menino tenha roubado
ele só pegou. Se eu fosse o pai, primeiro eu perguntaria se ele pegou o papel, aí a gente conversava já
que ele queria o papel para desenhar não para fazer outro tipo de coisa, né.
Michael Ele não deveria pegar as folhas, pelo menos onde eu moro, dá para pegar aquelas pedrinhas pequenas
e desenhar no chão. Não teria batido no menino, são só folhas e tem mais utilidades, porque eram
folhas em branco e se o menino rabiscou só de um lado daria para aproveitar. Daria para aproveitar
as folhas.
Henry Que o menino pegou o papel do pai, a atitude do menino não foi nem um pouco errada. A atitude
do pai também não foi correta. Se eu fosse o pai falaria com o menino e daria um castigo para ele.
Fonte: Piaget (1932).
128 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
Observamos que dois estudantes consideram que o menino não deveria pegar a folha
para desenhar, que teria outra possibilidade para realizar o desenho, como desenhar no chão, com
pedras ou giz. Enquanto três estudantes consideram que o menino deveria pegar a folha, que isso
não foi errado.
Em relação a ação do pai, os cinco estudantes consideram errada a atitude de punir
sicamente o lho. Quatro estudantes disseram que o pai deveria conversar com o lho e explicar o
porquê de não poder usar as folhas, e um achou que o pai poderia dar um castigo. Entre os cinco,
apenas um estudante considerou que as folhas poderiam ser reaproveitadas.
O raciocínio prático envolvido na relação com o bem-estar do menino pressupõe uma
autonomia, o argumento de que o pai poderia conversar e explicar o motivo de o lho não poder
usar as folhas evidenciam o cuidado com o respeito, contrariando o conformismo inquestionável da
heteronomia (PIAGET, 1932).
Neste conito, os estudantes demonstram ser contrários à sanção expiatória, que traga
constrangimento, uma vez que possui caráter arbitrário, principalmente quando traz uma punição
física, sabendo que a ação da criança não trouxe consequências graves, mas apenas danos materiais.
Os estudantes mostram que têm um raciocínio moral que se transforma, adequando-se
para cada situação, num processo de interações entre o organismo e o meio ambiente. As decisões
são tomadas com base no bem-estar comum. De fato, descobriu-se que eles usam a lógica das
proposições (criando hipóteses sobre cada conito), mas também consideram transformações
(inversões e reciprocidades) necessárias para o funcionamento dos mecanismos do pensamento
formal (INHELDER; PIAGET, 1985).
Na adolescência o pensamento formal não consiste apenas em raciocínio verbal (lógica das
proposições), mas também sugere a formação de uma série de esquemas operativos, que aparecem
de forma síncrona: operações combinatórias e proporcionais. Cujas análises sobre os conitos
mostram que eles usam sistemas múltiplos de referência, em que temos: esquema de equilíbrio
mecânico (igualdade de ação e reação), probabilidades multiplicativas (possibilidade de soluções)
e correlações (informações adquiridas no meio) para julgar e solucionar os dilemas (INHELDER;
PIAGET, 1985, p. 18).
Essa proposição julgada na análise do conito considera a preocupação com o bem
comum (reciprocidade), aparece também quando os estudantes repudiam a violência doméstica e
acreditam que a melhor forma de agir é denunciando a agressão, conforme observamos nas respostas
presentes no quadro a seguir:
QUADRO 2 - Violência contra mulher
(Continua)
Dilema 2. Kim era uma menina muito alegre e falante, até que um dia presenciou uma agressão do padrasto
contra sua mãe. A menina cou muito assustada, mas não contou nada a ninguém, pois sua mãe pediu
que não falasse sobre isso com ninguém. Kim tinha medo de que algo de ruim acontecesse com sua
família, então começou a car mais calada e triste. O que você compreendeu sobre a história? O que
você achou da atitude do padrasto? O que você faria se estivesse no lugar de Kim? Diga-me o que você
acha sobre isso? Como pode-se solucionar essa questão?
Mohamed A menina (hum... silêncio) escutou a mãe e não contou a ninguém. Mas se eu fosse ela eu contaria para
uma pessoa mais próxima, para ter mais segurança, se não o padrasto poderia bater na mãe novamente
e a situação seria pior. Ah! Totalmente errado. Não pode bater em mulher nenhuma, não é necessário.
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 129
Charles Parece uma história real que acontece muito, existe muita violência contra a mulher, muita menina
que se esconde por ver a violência com sua mãe, se eu fosse a Kim ligaria para polícia ou para o 189.
Harvey Essa é uma história que no tempo em que estamos vivendo hoje é muito grave. Na verdade, essa
agressão acontece principalmente contra a mulher, o homem perde a razão, na minha opinião o
homem deixa de ser homem. Se eu fosse a Kim denunciaria com certeza.
Michael A menina não fez nada porque tinha medo de que algo acontecesse com a mãe. Já que poderia
acontecer uma variedade de coisas. O que você faria se estivesse no lugar de Kim? Eu acho que deveria
ter denunciado, deveria ter falado com a professora, ou com alguém da direção. Ou tentaria ir direto
na delegacia, não sei se é possível, não sei a idade de Kim. E o que você acha da atitude do padrasto?
Acho errado.
Henry A atitude do padrasto da Kim foi horrenda. E o que você faria se estivesse no lugar da Kim? Eu não
sei, eu poderia contar para alguém, mas poderia ser muito ruim também, então eu não sei o que faria
também. E como poderia resolver essa história? Tem aqueles negócios que foram distribuídos para
mulheres que têm maridos agressores, que é só apertar um botão e a polícia vem. Eu acho que isso é
uma coisa boa, uma espécie de contato direto com a polícia.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Nota-se que no conito sobre a violência doméstica os cinco estudantes dizem que
denunciariam, sendo que quatro estudantes iriam até a polícia, e um buscaria ajuda na escola. Um
dos estudantes lembrou que a melhor solução seria a utilização de um bipe conectado à polícia, ele
fala que com esse dispositivo a mulher vítima de abuso poderia avisar a polícia no momento da
violência, sem que o agressor percebesse a denúncia.
Os estudantes demonstraram diculdade em pensar uma alternativa para resolver o caso
de violência doméstica. Eles indicam sentimento de impotência diante da ação violenta, o que
poderia ser a fonte para paralisia do pensamento e da ação.
Existem acontecimentos que causam mais tensão psicológica, e os estudantes demonstram
que frente a uma situação de estresse, como a violência doméstica, eles se sentem incapazes de agir,
como vemos na resposta do estudante cinco, quando fala que não sabe o que fazer, ele arma que
poderia contar para alguém, mas teria medo do que poderia acontecer. Portanto, o estresse e a
vulnerabilidade impactam diretamente na capacidade de criar soluções para os conitos.
Os processos ligados a criatividade incluem um estilo cognitivo que permite confrontar mais
facilmente a complexidade e a interrupção da reexão durante a resolução de um problema,
a utilização heurística para produzir novas ideias e um estilo de trabalho caracterizado, em
parte, pela perseverança e atenção concentrada para uma tarefa. Considera-se que os processos
criativos se aplicam a todas as tarefas que pedem criatividade, assim como as capacidades se
aplicam a uma área precisa e as motivações são mais especícas para uma tarefa; o nível de
uma pessoa nestes três componentes determina sua criatividade. Se um dos componentes está
ausente, a criatividade não poderá se exercer (LUBART, 2007, p.18).
Os adolescentes mostraram que diante da violência doméstica sentem-se mais ansiosos e
temerosos, declaram que frente a altos níveis de autoritarismo, sentem-se decientes e obrigados a
responder com obediência à autoridade. Isso os torna dependentes de outras pessoas, no caso, eles
citam os professores como sujeitos capazes de os proteger, quando eles se sentem incapazes de agir
frente ao conito, isto é, quando o medo impera a atenção concentrada e a perseverança se dissipam
e a criatividade ca comprometida.
130 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
A coação e a violência inuenciam negativamente no processo de autorregulação que,
ao longo do tempo, gera estruturas qualitativamente distintas de conhecimento e raciocínio. Um
adolescente que enfrenta situações excessivamente coercitivas pode ter um atraso no progresso da
racionalidade (MOSHMAN, 2005, p. 86).
Compreende-se que uma pessoa que responde ecientemente a eventos estressantes é
aquela que possui uma capacidade de reação. Para ser capaz de solucionar problemas há três tipos
diferentes de recursos:
O primeiro é o apoio externo disponível, e especialmente a rede de apoios. O segundo
recurso inclui a inteligência, educação e fatores de personalidade (introversão e extroversão). E,
nalmente, o terceiro tipo de recurso refere-se às estratégias de sobrevivência que uma pessoa utiliza
para se adaptar à situações adversas (CSIKSZENTMIHALYI, 1997).
A adaptação do sujeito ao meio, implica na capacidade de pensar possibilidades e fazer o
exercício de reversibilidade entre a própria ação e a consequência desta ação, frente ao objeto ou ao
conito. Piaget (1972, p.71) lembra que: “[p]ara ser formal, a dedução deve desligar-se da realidade
e assumir a sua posição sobre a plano do puramente possível”.
Pensar hipoteticamente sobre a própria reação diante de uma situação de conito, exige a
reversibilidade de raciocínio, a uência e a exibilidade para julgar e solucionar os conitos virtuais.
QUADRO 3 - Preconceito
Dilema 3. Julia estudava no sexto ano do Ensino Fundamental, Julia era uma menina afrodescendente e por
causa da sua cor de pele, alguns colegas de escola lhe deram vários apelidos ofensivos e excluíram-na
das atividades escolares. Julia sofria com rejeição e preconceito que vivenciou, por isso ela quis parar de
estudar. O que você compreendeu sobre a história? O que você achou da atitude de Júlia? O que você
faria se estivesse no lugar da Julia? O que você acha sobre isso? Como pode-se solucionar esta situação?
Mohamed É, isso de preconceito, eu também me sinto parte desta luta, porque eu também sou afrodescendente.
E mesmo que não tenha afrodescendência, eu não gosto deste tipo de coisa, porque anal de contas é
um ser vivo, são seres humanos. E a gente não vai ter preconceito por causa disso, e a menina é Júlia o
nome dela, não devia parar de estudar por conta do trauma, mesmo que os amigos da escola tivessem
maltratado ela por causa do tom de pele negro, ela acaba tendo um trauma e até inconscientemente
ela pode associar o estudo ao preconceito. A menina deveria ter um acompanhamento psicológico para
superar o trauma.
Charles A menina deve pedir ajuda aos professores e aos pais, não deve parar de estudar, pois isso é racismo,
acontece muito e prejudica muito as pessoas. Poderia existir um grupo de fortalecimento da autoestima
e discussão de temas relacionados ao racismo na escola, para combater o preconceito.
Harvey Esse negócio de preconceito, não que eu tenha já vivido, mas já percebi algumas coisas, sou bem
moreno também, mas... (ca em silêncio por alguns segundos). No seu lugar, primeiramente, como eu
falei, não ligaria para a opinião das outras pessoas. Até que uma vez uma professora me perguntou se
eu tinha uma empresa, que tipo de funcionário eu iria ter, e eu não ligo para a característica da pessoa
eu só ligo para o potencial da pessoa. Na verdade, ninguém é diferente de ninguém, a pessoa que tem
um potencial grande não pode desistir, se você desistir você perde todo o teu potencial. Sempre tem
pessoas que vão achar que você não vai conseguir, tem que saber lidar com isso e por isso eu aprendi
que a gente não pode ligar para a opinião das pessoas.
Michael Ela tem que denunciar, ela não poderia se privar dos direitos dela só por causa de outras pessoas. E qual
atitude poderia tomar para acabar com o preconceito? Ela poderia criar um documentário orientado
pelos professores sobre a cultura africana e assim fortalecer a identidade das pessoas afrodescendentes.
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 131
Henry Eu acho errado. Eu acho que, tipo, deveria ignorar, car com outras pessoas, ir para outra escola, quem
sabe. E o que você acha da questão do preconceito? Eu acho errado, não faz nenhum sentido, uma
pessoa tem a mesma capacidade cerebral e física de qualquer outra pessoa, independente da raça, etnia.
Poderia fazer avaliações para fortalecer o reconhecimento da inteligência dos alunos afrodescendentes
e melhorar a autoestima.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Os alunos reconhecem o trauma da menina, mas concordam que não é motivo para
parar de estudar, ela precisa reconhecer o valor de ser afrodescendente, para isso entre as medidas
pensadas por eles estão o acompanhamento psicológico, grupos de debate, produção de informação
sobre a cultura afro, avaliações para reconhecimento de habilidades cognitivas e fortalecimento da
autoestima.
Piaget (1985) sugeriu que a racionalidade precisa ter coerência lógica, reside em formas
correspondentes de equilíbrio psicológico. Ao reconhecerem o sofrimento causado à menina pelo
preconceito, os estudantes mostram como relacionam-se com os seus ambientes, assimilando
aspectos desses ambientes às suas estruturas cognitivas.
Quando julgam as consequências implicadas pela prática do bullying, eles mostram que
as estruturas de raciocínio lógico estão adequadas, por isso podem adaptar-se e posicionar-se frente
ao assunto em questão. Contudo, quando eles não conseguem pensar as consequências de um ato
preconceituoso, experimentam um estado de desequilíbrio, como defende Piaget (1985).
O estudante precisa compreender que as ações dele impactam diretamente em um mundo
real, por isso a capacidade de resolver conitos está no centro da atividade intelectual. Sendo assim,
as possibilidades de resolução (criativa) são concebidas e avaliadas em relação a cada realidade. Para
o estudante que se encontra no período operatório formal, as possibilidades tomam sobre uma
vida própria. São propositada e sistematicamente formuladas como uma parte de rotina da
cognição. A realidade é entendida e avaliada como a realização de uma possibilidade
particular (MOSHMAN, 2005, p.32).
Nota-se que os estudantes que responderam a esta pesquisa, vivem uma
assincronia no desenvolvimento moral e afetivo. A organização afetiva corresponde ao
desenvolvimento intelectual, e o adolescente relaciona as duas formas de organização
para se enquadrar no corpo social. Ao mesmo tempo o adolescente busca armação
da autonomia. Frequentemente essa armação é plenamente conquistada quando ele
se torna capaz de julgar e solucionar os conitos como os adultos, de modo que se
constitui com a maturidade afetiva, essencial para uma personalidade que se dispõe a
enfrentar a vida. Isso pode ser visto no quadro sobre o preconceito religioso.
132 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
QUADRO 4 - Preconceito Religioso.
(Continua)
Dilema 4 Tom é judeu, sua família é ortodoxa, por isso segue rigidamente as tradições do judaísmo. Tom vai
regularmente à sinagoga e usa o “kipá” quando vai ao templo. E por isso, sofre com o preconceito dos
colegas de escola, que não compreendem as tradições da religião da família de Tom. Por isso, Tom
começou a agredir os colegas na escola. O que você compreendeu sobre a história? O que você achou
da atitude dos colegas de Tom? O que você faria se estivesse no lugar do Tom? O que você acha sobre
isso? Como pode-se solucionar esta situação?
QUADRO 4 - Preconceito Religioso.
(Conclusão)
Mohamed Os colegas dele não foram nada legais, porque é como se ele fosse obrigado a utilizar o chapeuzinho,
e eu nunca vi esse chapeuzinho, mas mesmo que fosse feio é a religião dele, e ele usaria o chapeuzinho
de qualquer forma. E os colegas, como eles não têm esse tipo de tradição, eles podem usar a roupa que
eles quiserem. E é isso, eles estão fazendo errado em julgar ele pela roupa que ele usa, mas a atitude do
tom de agredir os colegas pela atitude que eles fazem, eles deviam ser levados à direção, para chamar a
atenção deles. O Tom poderia convidar os colegas para ir até à sinagoga para conhecer um pouco da
cultura dele.
Charles Tom não deve ligar para os colegas, uma hora vão esquecer e parar de incomodar, deve também pedir
ajuda aos professores para explicar um pouco mais como funciona a sua religião, e tudo com conversa
se resolve.
Harvey Assim, algumas pessoas sofrem com isso e tem o temperamento um pouco mais alto, e elas não
conseguem aguentar isso e agridem. Algumas se escondem e algumas tentam combater isso, é errada
a atitude do Tom, e é errada a atitude dos colegas que zombaram dele porque eles não entenderam as
suas tradições, e ele (Tom) podia ter resolvido de outra forma. Eu tentaria falar com os professores, eu
falaria com meu pai e resolveria isso. Eles poderiam fazer uma noite das nações com exposições sobre
diferentes tradições, assim o preconceito acabaria.
Michael Que talvez ele esteja se exaltando demais, já que os colegas não entendem a tradição judaica e a
quantidade de ritos que ela tem. Eu conversaria com meus pais. E por que você acha que existe o
preconceito? Acho que é coisa do ser humano, diferenças existem, não devem car se exaltando por
basicamente nada.
Henry Olha, o Tom teria capacidade, não seria uma pessoa fraquinha e baixa, ele teria capacidade de
argumentar contra, não precisava fazer isso. Podia fazer um blog com os colegas sobre isso e divulgar
suas tradições.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Os estudantes compreendem que o preconceito é fruto da falta de conhecimento acerca
da religião de Tom, dizem que é fundamental o trabalho conjunto entre professores, família e
estudantes. E assim buscar romper com a violência, seja ela por causa do preconceito, ou seja, como
reação do aluno ao bullying sofrido.
Piaget (1972) demonstrou que a forma de interpretar as questões morais, como por
exemplo ter reciprocidade quanto ao sofrimento alheio, depende da forma como o adolescente
considera a intenção e a consequência dos atos, esse processo depende da maturação das estruturas
matemáticas abstratas. Trata-se de uma relação entre a construção da própria identidade, articulação
da negação de si, num processo de descentração para que haja reciprocidade. Para saber se posicionar
adequadamente é preciso raciocinar sobre as correlações em um conjunto associado de relações
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 133
lógicas, tais como implicação e compatibilidade das ações e suas consequências (INHELDER;
PIAGET, 1985, p. 283).
Neste caso, os adolescentes relacionam a intenção do agressor em decorrência do bullying
sofrido, no entanto, para eles não houve a reciprocidade por nenhuma das partes, e a falta de
conhecimento a respeito de tradições diferentes é a verdadeira causa da violência retratada na
história.
A descentração é o que permite aos adolescentes e adultos elaborarem combinações e
permutações de elementos sistematicamente, para identicar correlações, e para manipular variáveis
de forma independente de modo a determinar os seus efeitos individuais. As operações formais
deste processo de resolução de conitos envolvem uma estrutura lógica de ordem mais elevada,
que permite uma compreensão e um raciocínio impossível ao nível das operações concretas
(INHELDER; PIAGET, 1985).
Em suma, as aquisições afetivas fundamentais da adolescência são paralelas às suas
aquisições intelectuais. A m de compreender o papel das estruturas formais de pensamento na
própria vida do adolescente, tivemos nalmente de as inserir em toda a personalidade, e no caso
dos estudantes desta pesquisa há uma prevalência de introversão, mesmo quando eles mostram
solidariedade com outros.
QUADRO 5 - Crise na saúde pública – Roubo
Dilema 5. Joana é uma menina pobre, tem três irmãos pequenos, seus pais são operários de uma fábrica. Joana
tem um tipo raro de leucemia e precisa de um remédio importado, o tratamento é muito caro, não
é fornecido pelo SUS. Os pais de Joana não podem pagar pelo tratamento. Por isso o pai de Joana
roubou o remédio do hospital para ajudar a menina. O que você compreendeu sobre a história? O que
você achou da atitude do pai de Joana? O que você faria se estivesse no lugar da Joana? Quem deveria
ajudar a Joana? O que você acha sobre isso? Como você solucionaria essa questão?
Mohamed Então, esse tipo de doença eu não sei qual é, mas já ouvi falar. E o SUS devia fornecer esses
medicamentos, porque querendo ou não, é o único jeito de as pessoas que não têm como pagar o
remédio, conseguirem ele de forma gratuita para conseguirem se tratar, porque senão elas podem
morrer, ou car gravemente doentes. Não, ele não deveria ter feito isso, até porque assim, pessoas que
forem utilizar os medicamentos depois, até porque o hospital tem uma contagem de medicamento,
o hospital compra uma certa quantidade de medicamento para durar um tempo, aí vai car sem um
medicamento e as pessoas não poderão usar. Então aí ele deveria tentar conseguir o dinheiro emprestado
de alguém ou do próprio banco, mas na verdade o remédio deveria ser fornecido gratuitamente pelo
SUS.
Charles O pai da menina fez o possível na hora do desespero para salvar a lha, e para a menina o seu pai estaria
certo, mas pela sociedade pensar na questão do roubo, ele não está certo, o pai deve buscar ajuda nos
jornais para conseguir o remédio que deveria ser doado pelo SUS.
Harvey Primeiramente ele teve pensamento de pai, para querer ajudar a sua família, mas desse jeito, na verdade,
ele não quis ajudar, porque ele roubou, e tudo que a pessoa rouba é errado, mas eu entendo a atitude
dele. Ele só queria ajudar sua família, ajudar sua lha. Acho que seria culpa do governo, porque esse
remédio seria muito caro, eles não conseguem pagar e sem o remédio ela sofreria mais danos.
Harvey Primeiramente ele teve pensamento de pai, para querer ajudar a sua família, mas desse jeito, na verdade,
ele não quis ajudar, porque ele roubou, e tudo que a pessoa rouba é errado, mas eu entendo a atitude
dele. Ele só queria ajudar sua família, ajudar sua lha. Acho que seria culpa do governo, porque esse
remédio seria muito caro, eles não conseguem pagar e sem o remédio ela sofreria mais danos.
134 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
Henry Olha, eu não sei, eu sou uma pessoa muito desesperada, eu caria muito desesperado se isso
acontecesse comigo, e talvez eu zesse a mesma coisa. E por que você acha que o governo não fornece o
medicamento? Falta de investimento. O governo denitivamente tem dinheiro para investir, o governo
desvia verbas, que era para saúde vai para outro lugar. É difícil, no Brasil isso já está marcado, ou você
não é político ou é um político corrupto. Você não tem muita opção a não ser que você tenha muito
dinheiro já, para bancar eleição, e é isso aí.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Os estudantes enfatizam que é errado roubar, mas consideram que deixar a criança
morrer por falta de medicamento é inconcebível, e diante da falta de intervenção do governo e de
tentativas de emprestar o dinheiro e não conseguir, eles acreditam que seria justicável o roubo.
Segundo eles, o Brasil dispõe de recursos sucientes para a manutenção do Sistema
Único de Saúde, responsável por fornecer os medicamentos que a menina da história precisava
para sobreviver. Os estudantes chamam a atenção para o fato de que a carga tributária brasileira,
que é bastante elevada, deveria servir para o bem da população, principalmente em relação à saúde
e educação.
O poder de abstração reexionante que os estudantes demonstraram não só serviu para
explicar a realidade, mas também para transformar. Ao mesmo tempo em que compreendem a
complexidade do problema, como vemos na fala do estudante Mohamed
8
:
[e]ntão, esse tipo de doença eu não sei qual é, mas já ouvi falar. E o SUS devia fornecer esses
medicamentos, porque querendo ou não, é o único jeito de as pessoas que não têm como pagar
o remédio, conseguirem ele de forma gratuita para conseguirem se tratar, porque senão elas
podem morrer, ou car gravemente doentes. Não, ele não deveria ter feito isso, até porque
assim, pessoas que forem utilizar os medicamentos depois, até porque o hospital tem uma
contagem de medicamento, o hospital compra uma certa quantidade de medicamento para
durar um tempo, aí vai car sem um medicamento e as pessoas não poderão usar. Então aí ele
deveria tentar conseguir o dinheiro emprestado de alguém ou do próprio banco, mas na verdade
o remédio deveria ser fornecido gratuitamente pelo SUS”.
A capacidade de realizar coordenações entre os conhecimentos prévios e o conito que
busca solução, nisto se vê a equilibração resultante da abstração reexiva e da tomada de consciência.
O estudante estrutura as informações sobre o conito, busca entender o que é certo
e o que é errado e normatiza qual é o grau de complexidade, não roubar ou manter a vida. Na
concepção dos estudantes, o problema central é manter a vida, e o motivo dela estar em perigo
é a corrupção, isto é, não tem o remédio por causa do desvio de recursos públicos, e diante deste
cenário o roubo do remédio é aceitável.
O conteúdo da análise contém características da abstração reexionante. Piaget (1978)
analisa esses progressos como dependentes do desenvolvimento da inteligência, que constituem a
tomada consciência, fruto das operações lógico-formais.
Observa-se aqui, que na análise dos estudantes as desigualdades que têm sido
extremamente difíceis de eliminar, a injustiça social, segundo eles é quase impossível de resolver,
enquanto houver um sistema político corrupto no Brasil, como observa-se na fala dos estudantes,
presentes no quadro dezesseis.
 Estudante entrevistado em 2020.
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 135
QUADRO 6 - Crise na saúde pública (falta de remédios)
Dilema 6 Mauro é um médico muito competente e dedicado, ele trabalha em um posto de saúde em uma
comunidade muito pobre. Certa vez, uma jovem paciente faleceu, pois no posto não havia o
medicamento que ela precisava tomar para se recuperar de um problema cardíaco, e Mauro cou
muito bravo. O que você compreendeu sobre a história? O que você achou da atitude do médico? O
que você faria se estivesse no lugar do médico? Quem deveria suprir as necessidades do posto de saúde?
O que você acha sobre isso? Como você solucionaria essa questão?
Mohamed Este tipo de local devia ter o medicamento para tratar essas doenças, e se o posto não tem esse
medicamento as pessoas vão acabar morrendo. Foi um erro que eles cometeram. O SUS deveria
fornecer o medicamento, às vezes o medicamento pode ser importado e a demora em comprar o
medicamento pode prejudicar as pessoas doentes, e podem car muito graves.
Charles O médico está certo de que o medicamento deve ser distribuído pelo SUS. E na falta do medicamento
o médico deveria buscar em outro posto de saúde ou levar a paciente para outro posto de saúde ou
hospital que tivesse medicamento, e assim salvaria o paciente.
Harvey Eu já vi histórias como essas, que os hospitais não conseguem manter os medicamentos e as pessoas
sofrem com as consequências dessa falta. E o governo é quem tem a responsabilidade por manter esse
medicamento. Eu não poderia solucionar a não ser que tivesse como comprar o remédio, mesmo assim,
salvaria uma vida, mas não todas as vidas de pessoas que precisam de remédios caros e que não são
fornecidos pelo SUS.
Michael Eu acho que é basicamente roubo do governo, já que o imposto no Brasil é bem alto e dá para manter
perfeitamente o SUS, porque os hospitais particulares têm medicamentos e medicamentos de sobra,
e mesmo que o governo tenha que arcar com os medicamentos para muito mais postos, ainda assim
ele tem muito dinheiro para arcar com isso. Eu acho errado o governo não manter os medicamentos
em comunidades pobres, porque eles também pagam impostos e o Mauro está certo de car bravo
com isso.
Henry Não tinha remédio, então eu não poderia fazer nada, se ele tivesse salvado ela teria faltado para outra
pessoa e talvez tivesse morrido, neste caso iria faltar remédio por culpa da falta de investimento do
governo. Esse é um problema de saúde pública, a não ser que fosse um hospital privado.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
No quadro 6, nota-se que os estudantes acreditam que o governo é responsável pela falta
de recursos para a saúde pública, e que não há muito o que fazer em relação à falta de medicamentos
em hospitais e postos de saúde mantidos pelo Poder Público. Uma vez que, os estudantes acreditam
que essa precariedade advém do desvio de verbas, pelos governantes corruptos, um dado interessante
na fala deles é que não acreditam que possam fazer algo para mudar a situação, pois a corrupção é
um processo histórico e muito difícil de ser rompido, eles não se veem como parte deste processo,
por isso creem que nada pode ser feito.
Os estudantes demonstram novamente o sentimento de impotência diante do conito. E
isto deve-se ao fato de eles próprios sofrerem com a falta de atendimento médico, por dependerem
do Sistema Único de Saúde, os estudantes 2, 3 e 4 relataram que já passaram por isso, precisaram
de remédios e não conseguiram ter o atendimento adequado.
Se o desenvolvimento cognitivo se constitui a partir da vivência e das trocas com o meio,
então a experiência deles os ensinou que há pouco o que fazer diante deste conito, e o sentimento
de vulnerabilidade impera, anal a motivação para solucionar um conito emerge da capacidade
humana de organizar a experiência em estruturas signicativas de crescente complexidade, em
razão de uma interação ativa com o ambiente. A teoria piagetiana demonstra que o valor de uma
136 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
experiência para o desenvolvimento requer não apenas capacidade de resposta à experiência ou
internalização de conceitos, mas um processo de organização ativa pela qual objetos e conceitos são
percebidos sob nova ótica (PIAGET, 1994).
Sobre isso, Carpendale (2010) lembra que o potencial de certas formas de raciocínio se
desenvolve apenas dentro de trocas interindividuais. As interações interindividuais são fomentadas
pela autorregulação do sujeito ao meio e ao outro. Neste caso, Piaget (1932, 1994, 2011) nos leva a
compreensão de que a autorregulação do sujeito em relação ao meio em que vive será mais renada
quanto mais o sujeito for capaz de privilegiar a cooperação, ou seja, para os estudantes se sentirem
autônomos diante da resolução deste conito, eles precisam entender e saber explicar e justicar seu
papel enquanto sujeito de direito, diante de uma sociedade cheia de desigualdade social.
Piaget (1994) indica que o adolescente só chega ao nível de autonomia moral quando
entende que o conceito de justiça e injustiça é baseado em pessoas sendo igualmente valorizadas.
Esta é uma propriedade emergente das relações de cooperação com os outros que tem base no
respeito mútuo. Há uma tendência natural de passar das relações de coerção para relações mais
cooperativas, porque a coerção (restrição) é instável e a cooperação (trocas) é o equilíbrio ideal para
o qual as relações tendem.
À medida que as relações fundamentam no respeito mútuo, percebe-se quão equilibrada
é a interação. Nota-se que os estudantes entendem que há muita injustiça no mundo e que todos os
relacionamentos são baseados em coerção, e isso gera o sentimento de impotência (PIAGET, 1994,
p. 90).
O mesmo pensamento de inecácia diante das situações de conitos é percebido em
relação à escola pública, conforme verica-se no quadro número quinze e dezessete.
QUADRO 7 - Precariedade da Escola Pública
(Continua)
Dilema 7 Cristina é estudante de uma escola no interior do Paraná, na escola só existem duas salas de aula que
podem ser usadas, porque as outras quatro salas estão sem luz e o telhado tem goteiras. Para chegar na
escola Cristina tem que caminhar uma hora por uma estrada de terra, não existe transporte público
na região. Cristina divide a carteira com outra criança. A professora não consegue tirar as dúvidas da
Cristina quando precisa, porque são muitos alunos na mesma sala. O que você compreendeu sobre a
história? O que você achou da atitude da professora de Cristina? O que você faria se estivesse no lugar
da Cristina? Quem deveria suprir as necessidades da escola? O que você acha sobre isso? Como você
solucionaria essa questão?
Mohamed É uma escola ruim para estudar, não tem condições mínimas de aprendizagem, os alunos já chegam
cansados na escola, precisaria dividir as turmas e colocar um auxiliar na sala para ajudar os professores
a tirar dúvida dos alunos, na minha sala eu faço isso, ajudo os professores explicando os conteúdos para
os colegas que têm diculdade. A Cristina tem razão de não querer ir para a escola, pode aprender mais
em casa, estudando sozinha. A escola deveria ser reformada, a prefeitura deveria pagar pela reforma,
mas como não está fazendo, os pais poderiam ajudar a arrumar a escola, eles mesmos poderiam fazer
um mutirão e cada um arruma uma parte, poderiam arrecadar materiais para arrumar o telhado na
própria comunidade, às vezes as pessoas têm resto de material de construção e podem doar.
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 137
QUADRO 6 - Crise na saúde pública (falta de remédios)
Charles Acho que os pais e professores poderiam fazer uma festa ou uma vaquinha on-line para arrecadar o
dinheiro que precisa para consertar a escola. A Cristina não deve desistir de estudar, ela pode junto com
os colegas fazer uma campanha nas redes sociais e pedir ajuda para a escola, fazer vídeos das condições
da escola e postar para chamar a atenção dos políticos e do povo para que arrumem o que está estragado
e construam novas salas de aula.
Harvey A escola está bastante estragada e que o Governo deveria consertar. Para isso as famílias e os alunos
devem exigir que o prefeito conserte a escola. É injusto que os alunos quem sem aula, por exemplo, eu
tenho facilidade para aprender, mas quando quei sem aulas presenciais tive diculdade para aprender
inclusive as matérias que eu gosto, como matemática.
Michael Método mais dinâmico, alguma coisa que dê para fazer em grupos maiores, quem sabe, ensinar tanta
gente na mesma sala é impossível. E, bom, devia fazer alguma coisa com a comunidade e ver se alguém
na comunidade tem um pouco de dinheiro para tentar resolver o problema das goteiras do telhado e
da luz. Porque já que o governo estava negligenciando completamente a escola, eles não podem deixar
de receber os alunos e tem que achar outra forma.
Henry É uma escola com pouco recurso e muito defeito. Precisaria de mais investimento ainda, mas eu
acredito que deveria ter mais recursos em educação do que em outras áreas, como saúde, por exemplo,
porque com educação você pode criar médicos. A educação deveria ser muito mais valorizada. Eu
estudaria em outra escola, talvez em outra cidade. E como pode solucionar essa situação. Poderia
resolver, mas gastaria bastante. Poderia fazer merenda, poderia tirar de outros lugares para arrumar o
telhado, que era o mais importante.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Todos os estudantes compreenderam que a falta de intervenção do Estado é a causa de a
escola estar em situação precária, eles dizem que os alunos não podem car sem aula. Eles admitem
que algumas ações são possíveis com a inuência da comunidade escolar, que pode arrecadar
investimentos e materiais para reformar a escola por conta própria, também entendem que uma
maneira eciente de resolver a situação seria os professores repensarem seus métodos de ensino
com uma dinâmica mais prática, aproveitando diferentes espaços que não aquele da sala de aula
especicamente.
Becker (2011) demonstra que a troca com o meio é a essência do conhecimento na medida
em que, operando sobre o meio, o sujeito transforma o objeto por meio da assimilação e, diante da
transformação, transforma a si mesmo num processo de acomodação, podendo operar num nível de
maior complexidade. É por isso que os estudantes têm mais facilidade de pensar soluções para
conitos sobre a qualidade da educação escolar, do que nos conitos sobre saúde pública.
Uma operação não é apenas a interiorização das ações, mas a composição de ações reversíveis.
O sujeito pode constituir uma classe e desfazê-la, organizar uma série e reordená-la em sentido
oposto, armar uma proposição e em seguida negá-la, somar e, em seguida, subtrair, multiplicar
e, logo adiante, dividir, etc., sem precisar agir materialmente (BECKER, 2011, p. 230).
Para ter sucesso na resolução de um conito é preciso saber realizar uma operação abstrata
sobre ele. Muitas vezes os estudantes desta pesquisa reconhecem a situação dos conitos virtuais
apresentados pela pesquisadora, pois operam sobre ela, várias vezes eles relatam que a condição
de precariedade da escola é muito próxima da realidade que eles vivem, com professores pouco
didáticos, escassez de recursos e espaços.
138 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
O progresso na resolução de conitos é motivado pela troca interindividual, mas é
fundamentalmente um processo cognitivo em desenvolvimento. Kohlberg (1984) sugeriu que a
elevada capacidade cognitiva leva a um desenvolvimento moral mais rápido, mas que todos têm
acesso a todos os níveis dentro de uma vida inteira. Assim, aqueles que trabalham com jovens e
adolescentes superdotados podem esperar ver níveis mais elevados de julgamento dos conitos, pela
sua capacidade de operar abstratamente sobre o meio em que vivem. Como podemos vericar nos
conitos que seguem:
QUADRO 8 - Precariedade da Educação Pública
Dilema 8. Lucas é um garoto muito estudioso, mas esse ano cou mais de trinta dias sem aula, porque na escola
que ele estuda faltaram muitos professores por falta de pagamento. Lucas cou muito triste, pois além
de não aprender coisas novas, também perde a oportunidade de brincar com os colegas na hora do
recreio. O que você compreendeu sobre a história? De quem é a culpa pela falta de aula? O que você
faria no lugar de Lucas? O que você acha da atitude dos professores? O que você acha sobre isso? Como
você solucionaria essa questão?
Mohamed É ruim car sem aula, mas é pior ir para a escola com professores ruins que não querem ou não sabem
ensinar. A escola tinha que ser diferente, tinha que ter mais aulas práticas, não deveria ter salas de aula
e a gente que deveria fazer nosso horário e escolher o que vamos aprender. Não deveria depender do
professor pra dar aula, é errado eles carem sem salário, mas da forma com que a escola é, a gente não
aproveita muita coisa.
Charles Os professores precisam receber, a cada ano que passa o governo paga menos e muitas vezes atrasa
os pagamentos, porque tem muita corrupção, mas eles também precisam fazer aulas mais dinâmicas
para que os alunos tenham vontade de aprender, o governo não investe na escola, não tem materiais
interessantes, os laboratórios são ruins, a biblioteca também, os professores estão desanimados pela
falta de respeito dos alunos e pelos salários baixos. E não tem opções de cursos diferentes na escola,
por exemplo, poderia ter aulas de robótica, música, produção de jogos. Deveria ter uma quantidade
maior de recursos para a escola e as famílias, alunos e professores deveriam escolher como investir os
recursos. Por exemplo, podia pegar dez por cento do dinheiro dos pedágios e dividir entre as escolas
de cada cidade como uma renda extra, para melhorar as condições de trabalho dos professores e assim
eles cariam mais felizes, também poderiam ganhar um incentivo no nal do bimestre quando as
notas dos alunos saem e os professores que conseguissem melhores resultados ganhariam um prêmio
em dinheiro.
Harvey Não é justo que os professores trabalharem sem pagamento, mas eles precisam sobreviver, acho que a
culpa da precariedade da educação é do governo e como na história passada não supre as necessidades
da escola. Achei injusto os alunos carem sem aula e acho que os professores poderiam tirar dúvidas
dos alunos mesmo sem pagamento.
Michael Se fosse escola particular o Lucas também não deveria pagar a escola, se fosse escola pública não
teria muito o que fazer, é culpa do governo. Acho que o melhor a fazer seria a greve mesmo, já que
os professores precisam de salário. Acho o sistema de eleição falho e o fato de qualquer pessoa poder
entrar lá só pelo voto, daí uma pessoa humilde, mas bastante conhecida pode ter bastante votos e é
fácil de ser manipulada. E alguns muito manipuladores podem conseguir comprar votos e não fazem
o investimento na saúde ou na escola, porque a taxa de impostos é muito alta e dava para manter uma
educação de qualidade.
Henry A culpa é do governo por não pagar o salário dos professores. Às vezes a greve nem vale a pena, só
atrapalha os alunos. Para resolver essa situação seria importante mudar a distribuição dos recursos
públicos, com consulta popular, pra isso as pessoas precisariam conhecer o sistema político, mudar a
forma de eleger os governantes e punir os corruptos como em outros países.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Os estudantes consideram que a greve de professores os prejudica no processo de
aprendizagem. Contudo, eles destacam que os professores também possuem condições desfavoráveis
de trabalho, precisam ser mais valorizados e respeitados. Vimos no decorrer destas falas dos
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 139
estudantes, que muitas vezes eles mesmos não se reconhecem como parte fundamental do processo
de tomada de decisões. Freire (2005, p. 15) chama a atenção para a importância de fazer uma
educação para formação da consciência política, para ele “o que fundamentalmente importa é que
estes homens particulares e concretos reconheçam a si próprios, no transcurso da discussão, como
criadores de cultura”.
Eles entendem que o governo possui os recursos necessários para manutenção de uma
educação de qualidade, mas a corrupção e o desvio de verbas é a causa dos baixos salários dos
professores e da falta de infraestrutura do ambiente escolar.
Destacam ainda que os professores podem sentir-se desanimados pelas condições de
trabalho e a maioria não se esforça para fazer uma boa aula, também vemos que mesmo diante
de um cenário de falta de pagamentos eles entendem que os professores deveriam permanecer
trabalhando, ou pelo menos “tirar dúvidas” dos alunos, o Henry destaca ainda que muitas vezes a
greve não traz resultado positivo para as demandas dos professores e só prejudica os alunos.
Entende-se que é necessário que haja a formação pautada na reciprocidade, na qual o
estudante não se distancie do seu papel de protagonista nas decisões cotidianas. Os dados da pesquisa
mostram uma assincronia neste processo de desenvolvimento dos estudantes, com desenvolvimento
precoce do raciocínio lógico-matemático, mas pouco avanço em relação a autonomia moral, o que
pode ser resultado de práticas educacionais restritivas. Quando é indispensável,
Uma pedagogia que estrutura seu círculo de cultura como lugar de uma prática livre e crítica
não pode ser vista como uma idealização a mais da liberdade. As dimensões do sentido e da
prática humana encontram-se solidárias em seus fundamentos. E assim a visão educacional não
pode deixar de ser ao mesmo tempo uma crítica da opressão real em que vivem os homens e
uma expressão de sua luta por libertar-se (FREIRE, 2005, p.12).
Os estudantes defendem que a escola é precária e que o professor é tradicional e por isso
pouco dinâmico no processo de ensino, eles se colocam como objetos alheios, no próprio processo
educativo, não experimentam a realidade mais ampla e profunda da experiência existencial, anal:
“[a]o descobrir o homem o que sou, terei descoberto o outro como ele é” (SALTINI, 2008, p.15).
Quando a escola privilegia a coação e o individualismo, isto é, cada um é responsável
pela sua tarefa, pelo seu material, pelo seu aprendizado, não promove a troca em uma relação
de cooperação, solidariedade, ou mesmo de resolução de conitos, o resultado é este que vemos
nas respostas dos estudantes, que embora sejam altamente talentosos, cognitivamente bem
desenvolvidos, ainda assim, não se percebem como parte fundamental da construção social que
consideram ideal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nos dados previamente analisados, foi possível compreender que os estudantes
conquistaram a autonomia, característica de uma capacidade de perceber detalhes e combinar
informações em cinco de oito dilemas, isso ocorreu devido às poucas trocas interindividuais que
eles têm realizado devido ao isolamento social.
Infere-se que os estudantes estavam mais comprometidos com a questão da escola e da
saúde pública, embora não tenham gerado muitas ideias durante todos os meses em que foram
140 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.
acompanhados, voltavam várias vezes nestes aspectos. Porém, demonstraram estar desmotivados a
pensar soluções, disseram que na atual dinâmica não se sentiam hábeis a mudar os conitos, eles
demonstravam frustração e cansaço mental por estarem gastando muita energia para aprender os
conteúdos escolares de forma autônoma.
Porter (2002) defende que para que o estudante com AH/SD tenha sucesso em seus
processos criativos, ele precisa ser destinatário de relacionamentos pautados em justiça - o que
signica dar a todos aqueles com quem convive um tratamento igual e justo, tanto no sentido de
não discriminação dos indivíduos por causa da sua cultura, gênero, descendência, religião etc.,
como no sentido de equilibrar os direitos e interesses. Eles precisam vivenciar diversas experiências,
conviver com diferentes grupos para ter trocas ricas em possibilidades.
Sternberg (2005) lembra que a inteligência analítica necessária para criar soluções
criativas requer um pensamento crítico, para avaliar as próprias ideias e as soluções possíveis. E
essa é a habilidade chave para um processo criativo eciente. Os estudantes precisaram analisar
as implicações de suas propostas. Para tanto, precisaram ter a capacidade operatória de sintetizar
as ideias e enfrentar as situações desaadoras. É nessa fase que devem ressignicar seus sistemas
simbólicos, para interpretar as situações extraordinárias.
REFERÊNCIAS
BECKER, Fernando. Aprendizagem: reprodução, destino ou construção. In: DONGO, Adrián Oscar.
Montoya (org.). Jean Piaget no século XXI: escritos de epistemologia e psicologia genéticas [et al.].
São Paulo: Cultura Acadêmica; Marília: Ocina Universitária, 2011.
CARPENDALE, Jeremy. I. M. No relationship, however, is pure constraint or cooperation. In:
Cambridge Collections Online. Cambridge University Press, 2010. Disponível em: https://doi.
org/10.1017/CCOL9780521898584.012. Acesso em: 23 Out 2017.
CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. Creativity: ow and the psychology of discovery and invention.
New York: Harper Perennial, 1997.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 1. ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.
KOHLBERG, Lawrence.Essays On Moral Development-Vol. II. e Psychology Of Moral
Development.São Francisco: Harper & Row, 1984.
LUBART, Todd. Psicologia da criatividade. Trad. Márcia Conceição Machado Moraes. Porto Alegre:
Artmed, 2007.
MCCORMICK, Kimberly M.; PLUCKER, Jonathan A. (2013). Connecting Student Engagement
to the Academic and Social Needs of Gifted and Talented Students. In: Kim, K.H., Kaufman, J.C.,
Baer, J., Sriraman, B. (eds) Creatively Gifted Students are not like Other Gifted Students. Advances
in Creativity and Giftedness, vol 5. SensePublishers, Rotterdam. Disponível em:<https://doi.
org/10.1007/978-94-6209-149-8_9> Acesso em: Jun, 2021.
MOSHMAN, David. Adolescent Psychological Development: Rationality, Morality, and Identity.
University of Nebraska, 2 Ed. New Jersey – London: Lawrence Erlbaum Associates, Publishers, 2005.
PIAGET, Jean. A Relação da afetividade com a inteligência no desenvolvimento mental da criança.
Vol 26, n 3, 1962. Tradução e organização: Cláudio J. P. Saltini e Doralice B. Cavenaghi. Rio de
Janeiro: Wak, 2014.
Conitos Sociais Artigos
Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023 141
PIAGET, Jean. e Moral Judgment of the Child. Glencoe, Illinois: Nabu Press, 2011. (Ed. Original
1932).
PIAGET, Jean. O juízo moral na criança. Trad. Elzon Lenardon. São Paulo: Summus, 1994. (Ed.
Original 1932)
PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
PIAGET, Jean. Problemas de psicologia genética. São Paulo: Abril Cultural, 1972.
PIAGET, Jean; INHELDER, Barbel. e Psychology of the Child. Basic Books, New York, 1969.
PIAGET, Jean. Play, dreams and imitation in childhood. London: Routledge and Kegan Paul Ltd,
1999.
PORTER, Louise. Educating young children with additional needs. Austrália: Allen & Unwin,
2002.
SALTINI, Cláudio João Paulo. Afetividade e inteligência. 5 ed. Rio de Janeiro: Wak Ed., 2008.
STERNBERG, Robert J. e eory of Successful Intelligence. In: Revista Interamericana de
Psicología/Interamerican Journal of Psychology, 2005, Vol. 39, Num. 2 pp. 189-202. Disponível
em: <http://www.actef.es/sternberg.pdf> Acesso em: 10 Jan 2018.
142 Revista Diálogos e Perspectivas em Educação Especial, v. 10, n. 1, p. 125-142, Jan.-Jun., 2023
OLIVEIRA, C. S.; VESTENA, C. L. B.; CRISTO, L. C.