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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
CATALOGAÇÃO NO DONIO DA SICA:
análise exploratória pela perspectiva da Organização da
Informação
CATALOGING IN THE MUSIC DOMAIN: exploratory analysis from the perspective of Information
Organization
Raquel Juliana Prado Leite de Sousa (1), Tadeu Moraes Taffarello (2)
(1) Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil, raqueljp@unicamp.br
(2) tadeumt@unicamp.br
Resumo
A catalogação é uma atividade usual na Musicologia, podendo ser considerada um indício da
interdisciplinaridade com a Ciência da Informação. Dessa forma, este trabalho visa a explorar a catalogação
na Musicologia e seus pontos de contato com a Organização da Informação. O corpus de análise é
constituído por 38 dissertações e teses defendidas na Música e Artes, levantadas na BDTD e no Catálogo
de Teses e Dissertações da CAPES. O mapeamento bibliométrico permitiu identificar que: a evolução
temporal mostrou um pico de trabalhos defendidos em 2012; a maioria dos trabalhos é de mestrado e foi
defendida na área de Música, sendo a UFMG a instituição de ensino com mais trabalhos realizados; a maior
parte dos mesmos foi feita no Sudeste, tendo Carlos Alberto Figueiredo Pinto o orientador com o maior
número de orientações; apenas dois membros de bancas de defesa possuem formação na área de CI; e os
assuntos “catálogo” e “catalogação” ganham destaque dentre as palavras-chave. A Análise de Conteúdo
revelou que os catálogos objetivam organizar para preservar a memória, reunir, disseminar, funcionar como
ferramenta de pesquisa, além de fazer apreciação crítica e homenagear compositores. Percebe-se que esta
pesquisa, por si só, não pode comprovar a interdisciplinaridade entre Ciência da Informação e Musicologia,
pois se trata de um estudo exploratório. Mesmo assim, foi observada uma proximidade entre as áreas, pela
apropriação da informação enquanto objeto de pesquisa.
Palavras-chave: Catalogação; Musicologia; Ciência da Informação; Informação como objeto de estudo
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exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
Abstract
Cataloging is a usual activity in Musicology, being an indication of interdisciplinarity with Information
Science. Therefore, this work aims to explore cataloging in Musicology and its points of contact with the
Organization of Information. The corpus of analysis consists of 38 dissertations and theses defended in
Music and Arts, collected in BDTD and in the CAPES Catalog of Theses and Dissertations. Bibliometric
mapping made it possible to identify that: temporal evolution showed a peak in works defended in 2012;
the majority of the works are master's degrees and were defended in the Music area, with UFMG being the
educational institution with the most work carried out; most of them were performed in the Southeast of
Brazil, with Carlos Alberto Figueiredo Pinto being the advisor with the largest number of orientations; only
two members of defense panels have training in the IC area; and the subjects “catalog” and “cataloging
stand out among the keywords. Content Analysis revealed that catalogues, in Musicology, aim to organize
to preserve memory, gather, disseminate, function as a research tool, in addition to providing critical
appreciation and honoring composers. It is clear that this research, in itself, cannot prove the
interdisciplinarity between Information Science and Musicology, as it is an exploratory study. Even so, a
proximity between the areas was observed, due to the appropriation of information as an object of research.
Keywords: Cataloging; Musicology; Information Science; Information as an object of study
1 Introdução
De acordo com Harden (2017), nas bibliotecas, durante séculos, não foi necessário ter um
padrão para descrição bibliográfica, pois os catálogos eram elaborados por indivíduos que
trabalhavam sozinhos, em unidades que funcionavam de forma isolada, sendo que apenas
recentemente eles começaram a tomar a forma de um recurso de informação. Em acervos
especializados em música, segundo Krummel, houve uma época em que se podia trabalhar
‘livremente’, com padrões próprios e definidos de acordo com a visão pessoal de cada
‘catalogador’. Entretanto:
Ambos, o mundo da música e o mundo das bibliotecas continuam crescendo fora
de controle. (Então, o que há de novo?). Aquele viu uma proliferação de escritos,
tipos de interesses e comunidades de leitores experientes. O outro tem visto uma
proliferação de práticas para lidar com técnicas bibliotecárias. (A biblioteca de
música era um lugar tão seguro e feliz na década de 1950: diga isso aos veteranos
e veja-os rir!). (Krummel 2004 p. 12 tradução nossa)
Como a explosão informacional não afeta somente as áreas que lidam diretamente com a
informação enquanto objeto de trabalho e pesquisa, pois a informação é um elemento transversal
a todos os domínios (Pinheiro 2014). Assim, lidar com estoques cada vez maiores de registros do
conhecimento é um desafio compartilhado que pode ser analisado de forma transversal entre as
áreas.
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No domínio da Música, ou então, mais especificamente, da Musicologia, a necessidade de
organizar as obras para que pudessem ser executadas e estudadas sempre foi uma preocupação
constante e que exigia certo nível de detalhamento. Se um quarteto de cordas quiser fazer a
apresentação de uma fuga barroca, não lhe serviuma partitura de uma obra para fagote e piano
da era clássica. Se alguém está estudando violino, não lhe servirão exercícios para o contrabaixo.
Quando um regente de orquestra precisa montar um espetáculo, necessita não somente das partes,
que serão disponibilizadas aos músicos instrumentistas, mas também da partitura geral, contendo
toda a música a ser tocada. Portanto, tal organização deve dar conta de estabelecer um mínimo de
dados sobre autoria, períodos, performance etc., sempre a depender da função da unidade de
informação.
Segundo Harden (2017 p. 6), os catálogos de biblioteca possuem três funções: 1) atuar
como um inventário do que o acervo possui; 2) fornecer uma ‘chave’ para descoberta e acesso a
um determinado recurso; e 3) estabelecer uma fonte que fornece informações diretamente.
Na rotina de trabalho em uma biblioteca de música erudita, é muito comum ver e ouvir os
termos catálogo e catalogação, tanto em publicações científicas como na conversa corriqueira de
alunos e pesquisadores, o que nos levou a pensar se tais expressões têm sido utilizadas de modo
indiscriminado. Isso nos remeteu a algumas questões, que se transformaram em problemas de
pesquisa: o que os profissionais da Música querem dizer com a palavra catalogação? Quais
ferramentas, processos e produtos estão envolvidos na criação de catálogos musicais? Utiliza-se o
conhecimento da área da Ciência da Informação? Em caso afirmativo, quais são esses
conhecimentos e quais seus autores? Partindo dessa problemática, esta pesquisa tem como objetivo
fazer uma exploração inicial para levantar pontos de contato existentes e/ou potenciais da
catalogação na Música e na Biblioteconomia, como forma de embasar hipóteses para futuras
pesquisas. Assim, observar-se o processo de descrição de dados de recursos bibliográficos
musicais, tendo como ponto de partida um termo comum entre Biblioteconomia e Música:
catalogação.
Antes de prosseguir, é importante elucidar que esta pesquisa utiliza a palavra catalogação
por ser a expressão mais conhecida fora do domínio da Ciência da Informação (CI) quando se trata
de descrever registros do conhecimento e também segue a concepção de Ortega (2011, p. 45),
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segundo a qual esse termo indica “[...] a área que se ocupa dos princípios e métodos de produção
de bases de dados bibliográficas (termo mais amplo que catálogos de bibliotecas) [...]”. Dessa
forma, não nos prendemos à representação descritiva unicamente, mas a todo o processo de
Organização da Informação (OI), que também engloba a representação temática.
Como metodologia, empregamos a Bibliometria para a identificação do perfil das
dissertações e teses publicadas no Brasil entre 2001 e 2022, a fim de realizar uma exploração
inicial que dasuporte a futuras pesquisas para a identificação do quadro teórico dos trabalhos do
domínio da Música no país que se debruçam sobre a catalogação e de suas frentes de pesquisa.
Também utilizamos a Análise de Conteúdo para propor uma categorização inicial do corpus.
Quando se fala em interdisciplinaridade, preconiza-se, no mínimo, uma influência mútua.
A CI foi buscar na Música referenciais teóricos e práticos para o tratamento de acervos musicais,
mas uma real interdisciplinaridade exige, também, a via da contribuição:
Compreende-se que, decorrente de sua insuficiente maturidade disciplinar, a
produção científica interdisciplinar na Ciência da Informação é, por vezes,
construída de forma unidimensional, podendo ser realizada, muitas vezes, a partir
de apropriações ou análises ligeiras, sem considerar a contribuição que esta tem
dado às disciplinas com as quais pretensamente constrói relações
interdisciplinares e, mais grave ainda, as efetivas contribuições destas no seu
processo de consolidação epistemológica. (Souza 2011 p. 20)
São mais comuns pesquisas que observam como os diversos domínios se manifestam no
campo da Ciência da Informação do que sua influência. Portanto, este trabalho se debruça a
explorar, de forma inédita, como e se a CI tem se manifestado na Musicologia. Pretende-se, assim,
lançar um novo olhar sobre a contribuição epistemológica da CI, tendo como ponto de
convergência o núcleo duro da Biblioteconomia: a Organização da Informação.
Ressalta-se que os resultados obtidos nesta pesquisa, per se, não permitem mensurar ou
caracterizar a interdisciplinaridade entre a Musicologia e a Ciência da Informação, mas servirão
de guia para futuras investigações que se guiarão por esse objetivo.
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2 Referencial teórico
Os catálogos de biblioteca, assim como a própria Biblioteconomia, foram construídos sob
a égide da interdisciplinaridade. A representação descritiva, durante séculos de história, recebeu
influências de livreiros, como Andrew Maunsell, advogados como Paul Otlet e Henry de La
Fontaine, matemáticos como Shiyali Ramamrita Ranganathan, zoólogos como Conrad Gessner,
sem mencionar os religiosos dos monastérios que organizaram suas coleções seguindo princípios
próprios (Ortega 2011; Harden 2017; Ferraz 1991). A representação temática também foi buscar
teorias e métodos na Linguística, Terminologia, Lógica, entre outros, para embasar a elaboração
de linguagens documentais, critérios de indexação e de recuperação da informação (Kobashi
2019).
Para se tornar tal como a conhecemos atualmente, a catalogação percorreu um caminho de
muitas transformações práticas e teóricas, sempre influenciadas pelo contexto histórico, social e
científico da história da humanidade.
Os primeiros catálogos surgiram com as primeiras bibliotecas, que acima de tudo
funcionaram como museus de livros por cerca de 2000 anos. Seus catálogos eram,
então, simples relações ou inventários das obras existentes em seus acervos.
(Ferraz 1991 p. 92)
As fichas catalográficas foram criadas na França no século XVIII no contexto pós
Revolução Francesa, os catálogos em formato de livro impresso se popularizaram no século
XIX, apesar da coexistência com fichas e catálogos de livros manuscritos ou de maços (Harden
2017). O final do século XX viu nascer o catálogo on-line, o qual, atualmente, “[...] está prestes a
se transformar em uma entidade amigável à Web, com funções bastante diferentes de seus
predecessores imediatos” (Harden 2017 p. 8, tradução nossa).
Foi a partir do século XVIII que a catalogação começou a se preocupar com a recuperação
da informação, sob a influência do desenvolvimento da ciência na Europa à época (Ortega 2011),
voltando suas atenções às necessidades de localizar não somente dados descritivos dos recursos,
mas também às demandas dos usuários.
A partir da segunda metade do século XIX, diferenças de orientação pragmática e
epistemológica fizeram surgir novas abordagens de pesquisa e prática voltadas à representação
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temática, como a catalogação de assunto, de matriz norte-americana e embasada na ordenação
alfabética, a indexação, de origem inglesa e focada no binômio documento-usuário e no apoio à
pesquisa, e a análise documental, proveniente da França e voltada a questões procedimentais de
identificação do conteúdo das obras (Guimarães 2009). Entretanto, apesar do recorte especializado
no tratamento temático, tais abordagens ainda fazem parte de um processo maior conhecido como
Organização da Informação (OI).
Foi a partir do século XIX que a catalogação compartilhada ganhou vez, com catalogadores
trabalhando em um lugar, o que exigia um conjunto de regras que garantissem o mínimo de
uniformidade (Harden 2017), com destaque para as 91 regras de Antonio Panizzi, segundo o qual
o catálogo deve ser visto como um todo e enfoque na obra e não no objeto livro em si, ressaltando
a necessidade de revelar detalhes do que hoje concebemos como expressões, manifestações e itens,
inclusive relacionando-os (Ferraz 1991).
Um pouco mais tarde, mais especificamente em 1961, foi estabelecida a Declaração de
Princípios Internacionais de Catalogação, ou Princípios de Paris, o que trouxe medidas para a
internacionalização dos fundamentos da catalogação, inclusive com diretrizes quanto a funções e
a estrutura de códigos de catalogação (Machado e Zafalon 2019).
No mesmo período, o Machine Readable Cataloging (MARC), sob a liderança de Henriette
Avram, foi criado para ser um formato de transmissão de dados entre bibliotecas, os quais podiam
ser impressos como catálogos de livros, listas de referências ou fichas. Somente nos anos 1970
surgiu a noção de MARC como um formato de recuperação (Harden 2017).
Os anos 1960 e 1970 ainda viram o surgimento e o crescimento de instituições, comissões,
conferências e ferramentas, como International Federation of Library Associations and
Institutions (IFLA), International Standard Bibliographic Description-Monographies - ISBD(M),
o Anglo American Cataloguing Rules (AACR) etc., os quais abriram debates mais intensos sobre
os princípios de catalogação a partir dos anos 1990, abrindo espaço para um modelo conceitual
que define requisitos funcionais para registros bibliográficos, o Functional Requirements for
Bibliographic Records (FRBR) (Ortega 2011), e posteriormente os Functional Requirements for
Authority Data (FRAD) e os Functional Requirements for Subject Authority Data (FRSAD), bases
para criação das novas diretivas de catalogação: o Resource Description and Access (RDA), o qual
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pretende ser um padrão para descrição que abrange todas as mídias e a diversidade de comunidades
de salvaguarda do patrimônio cultural (Machado e Zafalon 2019).
Hoje, muita catalogação vai para bancos de dados mantidos em comum por
milhares de bibliotecas. Em teoria, a catalogação produzida em uma biblioteca
pode ser utilizada em qualquer outra biblioteca da face do planeta. Para que esse
cenário funcione, um núcleo comum de regras ou diretrizes deve estar em vigor.
(Harden 2017 p. 6, tradução nossa)
Se, por um lado a formação de uma comunidade especializada em estudar e normalizar a
descrição bibliográfica apresenta oportunidades de trazer soluções para a representação do
universo bibliográfico, por outro lado, pode criar uma linguagem de especialidade tão
idiossincrática que chega a ser incompreensível a outros domínios do conhecimento.
No início do século XXI constata-se que o conhecimento científico está, no seu
processo de desenvolvimento, cada vez mais subdividido em setores numerosos
e especializados. Evidencia-se que cada segmento da pesquisa científica perdeu
a capacidade de se comunicar com o exterior e adotou uma linguagem que, muitas
vezes e ainda, apenas é compreensível a seus colegas especialistas mais próximos.
(Teixeira 2004)
Teixeira (2004) explica que a integração disciplinar é preocupação antiga do Ocidente
desde os sofistas e que, na atualidade, por razões de ordem prática, epistemológicas, éticas,
econômicas etc. têm levado os cientistas a extrapolarem as fronteiras de sua especialidade rumo à
interdisciplinaridade. Entretanto, em um campo científico como a Ciência da Informação, não
houve a criação de um arcabouço teórico-metodológico preliminar para posterior busca fora de
seu domínio, e sim uma gênese de integração entre áreas diversas, assumindo, segundo o autor,
discursos teóricos que dificultam o delineamento de suas fronteiras, o que pode colocar em risco
seu próprio status enquanto disciplina. “O discurso interdisciplinar, nesse sentido, cai no vazio
teórico-metodológico” (Souza 2011 p 22).
Tomando a noção de campo científico de Bourdieu (1983 p. 7), ainda é possível pensar que
a interdisciplinaridade é uma oportunidade de inovar e conquistar novos espaços em áreas
canônicas que já possuem autoridades estabelecidas, uma vez que “existe assim, a cada momento,
uma hierarquia social dos campos científicos − as disciplinas − que orienta fortemente as práticas
e, particularmente, as ‘escolhas’ de ‘vocação’”.
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Para esta pesquisa, partimos do conceito de interdisciplinaridade de Teixeira (2004),
segundo o qual são necessárias ao menos duas disciplinas que compartilhem um discurso
recíproco. Também incorporamos a concepção de Japiassu (1976 p. 32), o qual defende que a
interdisciplinarização não é um simples intercâmbio de dados entre especialidades, de modo a
constituir um “empirismo compósito”, e sim a incorporação de várias disciplinas, “[...] tomando-
lhes de empréstimo esquemas conceituais de análise a fim de fazê-los integrar, depois de havê-los
comparado e julgado”. Sendo assim, a interdisciplinaridade deve corresponder à própria
constituição da ciência, frente à crescente fragmentação do saber, firmando-se como uma reflexão
epistemológica (Japiassu 1976).
A epistemologia da CI se firma sobre o conceito de informação. Sem adentrar em detalhes
sobre a subjetividade desse termo e as diferentes concepções de dados, informação e
conhecimento, podemos afirmar que a informação é transversal, pois perpassa todos os campos do
conhecimento (Pinheiro 2014). Portanto, em qualquer domínio científico, ela é um insumo
essencial, mas é a Ciência da Informação que a toma enquanto objeto de estudo:
Assim, informação, por ser objeto de estudo da Ciência da Informação, permeia
os conceitos e definições da área. E, embora informação não possa ser definida
nem medida, o fenômeno mais amplo que este campo do conhecimento pode
tratar é a geração, transferência ou comunicação e uso da informação, aspectos
contidos na definição de Ciência da Informação. (Pinheiro 2006 p. 2)
Entretanto, quando outra disciplina tem a necessidade de tratar e organizar a informação,
podemos afirmar que ela é ou deveria ser tomada como um objeto de estudo também naquele
domínio. No caso da Musicologia, área abordada neste trabalho, quando se cria um catálogo de
um compositor, por exemplo, o objetivo ao menos tangencia a geração, transferência, comunicação
ou uso da informação musical. Ou seja, de alguma forma, é necessário que essa informação esteja
organizada, de modo a facilitar o acesso, frente à determinada finalidade.
Um olhar mais atento sobre a constituição dos campos científicos da Musicologia e da
Ciência da Informação revela que pode haver mais semelhanças entre eles do que se imaginaria à
primeira vista.
Segundo Demore e Magalhães-Castro (2020 p. 46), “A Musicologia surgiu como ciência
sem possuir um método próprio” à semelhança da Ciência da Informação em um contexto
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positivista que preconizava a experimentação. Disciplinas como acústica, matemática, psicologia,
lógica, gramática, métrica, poética, estética etc. são citadas como auxiliares à Música na
constituição de seu arcabouço teórico-metodológico. A própria subdivisão desse domínio em
Musicologia Histórica, Sistemática, Comparada, Nova Musicologia e Etnomusicologia (Demore
e Magalhães-Castro 2020) fornece indícios sobre sua multi e/ou interdisciplinaridade.
Tomando como base o estudo de Pinheiro (2006), Santos Neto et al. (2017) elaboraram um
gráfico informativo que ilustra as disciplinas que mantêm algum grau de interdisciplinaridade com
a Ciência da Informação, como pode ser observado na Figura 1:
Figura 1 Interdisciplinaridade da Ciência da Informação
Fonte: adaptação de Santos Neto et al. (2017) sobre dados de Pinheiro (2006)
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Na figura, não é apresentada nenhuma relação da Música com a CI, o que nos leva a indagar
se uma possível interdisciplinaridade entre os dois domínios seria de ordem metodológica,
epistemológica ou ambos, ou se haveria apenas um contato de caráter prático para a resolução de
questões pontuais.
Apesar de a informação ser transversal, poucas áreas, como a Ciência da Informação, a
tomam enquanto objeto de estudo. No caso da Música, frente à necessidade de inventariar as
coleções de compositores, intérpretes, formas musicais etc., a informação se torna um dos
fenômenos de estudo, mas talvez não o objeto em si.
Na Musicologia, trabalhos iniciais voltados para a catalogação datam do século XVIII, mas
os fundamentos que embasaram tais atividades advêm do Chronologisch-thematisches
Verzeichniss, de Ludwig Richter von Köchel (1862) e da enciclopédia Quellen-lexikon, de Robert
Eitner (1898-1904), conforme explica Cotta (2006 p.14).
Tais bases foram, é claro, profundamente transformadas no decorrer do século
XX, culminando, depois de um longo processo histórico, em um projeto de
proporção mundial como o Répertoire Internationale de Sources Musicales
RISM, o mais ambicioso projeto de catalogação de fontes musicais
implementado até o momento, iniciado em 1952.
Morin (2002 p. 140) defende a criação de um novo paradigma científico, que permitirá
distinguir os domínios sem separá-los, ou seja, sem impedir que se comuniquem e se integrem e
sem a criação de leis gerais, o que ele chamou de paradigma da complexidade. Para isso, seria
necessário um método não unitário, capaz de incorporar diversidades, incerteza e vazios:
A missão desse método não é fornecer as fórmulas programáticas de um
pensamento “são”. É convidar a pensar-se na complexidade. Não é dar a receita
que fecharia o real numa caixa, é fortalecer-nos na luta contra a doença do
intelecto o idealismo , que crê que o real se pode deixar fechar na idéia e
que acaba por considerar o mapa como o território, e contra a doença degenerativa
da racionalidade, que é a racionalização, a qual crê que o real se pode esgotar
num sistema coerente de idéias.
Dessa forma, este trabalho pretende dar um passo rumo à observação das formas de
comunicação entre música e informação, considerando a diversidade, a incerteza e o vazio.
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3 Procedimentos metodológicos
Para esta pesquisa, de cunho exploratório e descritivo, foi empregada a análise
bibliométrica para mapeamento quantitativo de dissertações e teses nas áreas da Música e das Artes
para levantamento de indicadores de produção científica. Também foi utilizada a Análise de
Conteúdo qualitativa, a fim de promover o enriquecimento da leitura, a partir de uma função
heurística, ou seja, que favorece novas descobertas, e uma função de prova, que almeja a
confirmação dos achados (Bardin 1977).
Como fonte de pesquisa, foram utilizadas a Biblioteca Digital Brasileira de Teses de
Dissertações (BDTD) e o Catálogo de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Em ambas, foi feito um recorte de trabalhos publicados
no Brasil, escritos em língua portuguesa e defendidos nas áreas de Música e Artes entre 2001
e 2022, a fim de identificar o que tem sido pesquisado sobre catalogação musical no culo XXI
no Brasil. As bases foram escolhidas por serem depositárias oficiais dos trabalhos de pesquisa
stricto sensu brasileiros, o que permite uma amostragem nacional.
O levantamento de dissertações e teses na BDTD foi realizado no dia 14/06/2023,
utilizando a expressão de busca no campo assunto: (Assunto:musica OU Assunto:musicologia) E
(Assunto:catalogação OU Assunto:catalogo OU Assunto:inventário). Para a busca no Catálogo de
Teses e Dissertações CAPES, que foi feita em 20/06/2023, usou-se a expressão: (musica OR
musicologia) AND (catalogo OR catalogacao OR inventario).
As teses e dissertações foram listadas, a fim de evitar duplicidade de textos entre as duas
bases. Após análise dos resumos, foi feita a exclusão de trabalhos que fugiam ao escopo desta
pesquisa, bem como daqueles que, de alguma forma, não permitiam acesso ao texto completo em
formato digital. Dessa forma, chegou-se a um corpus composto por 38 dissertações e teses
defendidas em programas de pós-graduação brasileiros nas respectivas áreas.
Foi utilizada a Análise Documental como ferramenta metodológica, como descrito em
Sousa (2020), a fim de tomar conhecimento quanto a objetos, objetivos, métodos e demais
elementos inerentes à pesquisa científica.
Após a coleta de dados em planilha Excel
®
, foi realizada a mensuração estatística quanto:
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1. Evolução temporal.
2. Nível de ensino (mestrado e doutorado).
3. Áreas dos programas de pós-graduação.
4. Instituição de ensino de realização da pesquisa.
5. Distribuição geográfica.
6. Orientadores.
7. Banca de defesa.
8. Palavras-chave.
Em seguida, foi realizada a Análise de Conteúdo prévia, utilizando a categorização a priori,
como descrita em Bardin (1977), cuja finalidade foi identificar o motivo que levou os
pesquisadores a realizarem a catalogação, ou seja, se essa tarefa faz parte do escopo original das
pesquisas ou se foi inserida de modo a dirimir algum impeditivo dos trabalhos. Foram utilizadas
como categorias iniciais de análise:
1. Abrangência musical.
2. Objetivo geral da pesquisa.
3. Motivação da criação ou estudo do catálogo.
Esta pesquisa, de caráter inicial, apresentará o perfil das monografias de pós-graduação,
como forma de explorar o corpus levantado e criar familiaridade com possíveis problemáticas,
bem como identificar possíveis pontos de contato entre Musicologia e Ciência da Informação que
poderão guiar as próximas investigações. Em trabalhos futuros, serão apresentados demais
resultados quantitativos de análise de citação e qualitativos sobre o arcabouço teórico-
metodológico empregado pelos autores do corpus estudado.
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4 Resultados e discussão
Como não foram identificados trabalhos que se debruçam ao mesmo escopo desta pesquisa,
não será possível dialogar de forma profunda com outros autores durante a discussão dos
resultados.
Nos primeiros 22 anos do século XXI, foram encontradas 38 monografias de pós-graduação
que abordavam a criação de catálogos musicais nas áreas de Música e Artes. Considerando esse
intervalo temporal, pode-se afirmar que foi realizada 1,73 pesquisa por ano, em média. A maior
parte dos trabalhos foi defendida em 2012, com um total de 6 dissertações (15,79%). A evolução
temporal pode ser observada na Figura 2.
Figura 2 evolução temporal das dissertações e teses que abordam a catalogação musical
Fonte: dados da pesquisa
Quanto ao nível, observou-se que a maior parte dos trabalhos, ou 86,84% (total de 33) são
do nível mestrado e apenas 13,16% (total de 5) são de doutorado. Comparando esse dado com a
evolução temporal, que revela um pico de trabalhos em 2012, é possível inferir que os trabalhos
de mestrado sobre catalogação não tiveram continuidade no doutorado. Duas explicações possíveis
que podem ser comprovadas apenas em futuras pesquisas: ou os alunos de mestrado não
continuaram seus estudos no doutorado ou alteraram os escopos das pesquisas de modo a não
abranger a catalogação.
0
2
4
6
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020
2021
2022
0
2
0
2
3
2
2
1
3
1
2
6
3
2
0
2
0
2
1
3
1
0
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
Observando os programas de pós-graduação (PPG), verificou-se que 89,47% (ou 34
trabalhos) foram feitos em programas de Música, contra apenas 10,53% (total de 4) em programas
de Artes.
Quanto às instituições de defesa, os 38 trabalhos foram realizados em 11 Instituições de
Ensino Superior (IES), em uma média de 3,46 trabalhos por universidade. A IES com maior
número de monografias é a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que produziu um total
de 9 trabalhos (23,69%), seguida pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com 5
(15,79%) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro (Unirio), ambas com 5 (13,16% cada). A Figura 3 mostra a distribuição das
investigações por IES.
Figura 3 distribuição das dissertações e teses por Instituições de Ensino Superior
Fonte: dados da pesquisa
Chama a atenção o fato de que todas as pesquisas foram realizadas em IES públicas, o que
ressalta a importância dessa esfera para a Musicologia.
Para indicadores de distribuição regional, foram contabilizadas as distribuições dos
trabalhos por região e por estado. A maior parte das dissertações e teses, ou 84,21%, foi defendida
23,69
15,79
13,16
13,16
10,53
7,89
5,26
2,63
2,63
2,63
2,63
UFMG
Unicamp
UFRJ
UNIRIO
Unesp
UFBA
USP
UFG
UFPB
UFRN
UFU
15
SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
no Sudeste (total de 32), sendo que somente 13,16% foram feitas no Nordeste (5) e 2,63% no
Centro-oeste (1).
Olhando por unidade da federação, nota-se que o estado de São Paulo é responsável por
31,58% (ou 12 trabalhos) das pesquisas que abrangem a catalogação na Música, seguida por Minas
Gerais (10) e Rio de Janeiro, ambas com 26,32% cada (ou 9 trabalhos cada). A Figura 4 permite
observar a distribuição das investigações por estado. Ressalta-se que apenas 7 estados
apresentaram teses e dissertações com o tema abrangido por esta pesquisa, perfazendo uma média
de 5,43 trabalhos por unidade da federação.
Figura 4 distribuição das dissertações e teses por unidade da federação
Fonte: dados da pesquisa
Quanto às orientações, notou-se uma dispersão de nomes, com 81,58% (total de 31) de
orientadores com apenas 1 trabalho. Os orientadores que se destacaram com mais de uma
orientação foram Carlos Alberto Figueiredo Pinto, com 7,9% das orientações, ou 3 orientações,
seguido por Lenita Waldige Mendes Nogueira e Mônica Pedrosa de Pádua com 5,26%, ou 2
orientações cada (Tabela 1).
31,58
26,32
26,32
7,89
2,63
2,63
2,63
SP
MG
RJ
BA
GO
PB
RN
16
SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
Tabela 1 distribuição das dissertações e teses por orientador
Orientador
Quantidade
%
Carlos Alberto Figueiredo Pinto
3
7,90
Lenita Waldige Mendes Nogueira
2
5,26
Mônica Pedrosa de Pádua
2
5,26
Orientadores com 1 trabalho
31
81,58
Total
38
100
Fonte: dados da pesquisa
Os dados permitem observar que, na Musicologia, as pesquisas em Organização da
Informação estão dispersas, indicando a hipótese de que são fruto não da linha de investigação dos
orientadores, e sim de iniciativas ou problemas pontuais. Por exemplo: um pesquisador pode ter
de catalogar previamente seu corpus de pesquisa, a fim de poder dar continuidade ao seu trabalho.
Essa dispersão dá indícios de uma fragilidade na Música, elemento que deve ser considerado na
busca pela interdisciplinaridade com a CI nos futuros desdobramentos deste trabalho, tendo em
vista a teoria da complexidade defendida por Morin (2002).
Informações sobre a formação e a área de pesquisa dos orientadores foram levantadas no
Currículo Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),
plataforma na qual também se verificou que todos possuem produção científica envolvendo a
elaboração de catálogos musicais. Trabalhos com foco na produção desses orientadores e seus
respectivos grupos de pesquisa podem ser feitos, a fim de levantar, de modo mais rigoroso, o perfil
de seus estudos e sua interdisciplinaridade com a Ciência da Informação.
Ressalta-se que apenas Lenita Waldige Mendes Nogueira possui formação na área de
Ciência da Informação, pois cursou Especialização em Organização de Arquivos pela
Universidade de São Paulo (USP). Lenita Nogueira é professora na Universidade Estadual de
Campinas, possui graduação em Educação Artística, mestrado em Artes e Doutorado em Ciências
Sociais, tendo pesquisado Musicologia, música brasileira, história da música, ópera, fundamentos
e crítica.
Carlos Alberto Figueiredo Pinto está afiliado à Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro e tem Bacharelado em Piano, com mestrado e doutorado em Música. Suas pesquisas
enfocam a regência coral, a musicologia histórica e a análise musical.
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exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
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Mônica Pedrosa de Pádua, docente da Universidade Federal de Minas Gerais, tem
graduação em Canto, mestrado em Canto e doutorado em Letras. Pesquisa canto lírico, música de
câmara, literatura comparada, música contemporânea, oratória e ópera.
Quanto aos demais 31 orientadores, nenhum possui qualquer formação na área de Ciência
da Informação, seja em nível de graduação ou pós-graduação, conforme dados levantados a partir
do currículo Lattes.
Também foi verificada a formação das bancas de defesa dos trabalhos, a fim de saber se
houve uma formação interdisciplinar para a avaliação. Não foi possível identificar a composição
da banca de 6 dissertações, pois não havia folha de aprovação ou quaisquer registros na BDTD ou
no Catálogo CAPES. Dessa maneira, foram levantados os nomes de 76 membros de banca de
defesa, cujas formações também foram procuradas no Currículo Lattes. Verificou-se que apenas
dois possuem formação na área de CI: André Henrique Guerra Cotta, que obteve título de mestre
em 2000 pela UFMG com a dissertação O Tratamento da Informação em acervos de manuscritos
musicais brasileiros, e Rubens Ribeiro Gonçalves da Silva, doutor em Ciência da Informação pela
UFRJ, cuja tese se intitula Digitalização de acervos fotográficos públicos e seus reflexos
institucionais e sociais: tecnologia e consciência no universo digital.
Apenas 4 pessoas participaram de mais de uma banca de defesa, como mostra o Quadro 1,
entre eles, André Cotta.
Quadro 1 pesquisadores que mais participaram de bancas de defesa
Nome
André Henrique Guerra Cotta
Giacomo Bartoloni
Marcelo Verzoni
Radegundis Feitosa Nunes
Fonte: dados da pesquisa
Reunindo as 142 palavras-chave das dissertações e teses, foi criada uma nuvem de tags a
partir do software Word Clouds
®
, a fim de destacar as expressões utilizadas pelos autores para
identificar os temas de suas pesquisas, expressas na Figura 5. Ressalta-se que 11 trabalhos não
apresentaram palavras-chave após o resumo.
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Figura 5 nuvem de palavras-chave
Fonte: dados da pesquisa
Pela análise das palavras-chave, para além dos assuntos catálogo e catalogação, que
aparecem em destaque, já é possível identificar a inserção de alguns temas próprios da Ciência da
Informação, como “sistema MARC” e “FRBR”. Também se observa o uso de RISM-Brasil,
‘braço’ brasileiro do Répertoire International de Sources Musicales (RISM), instituição fundada
em Paris em 1952 e patrocinada pela International Musicological Society (IMS), International
Association of Music Libraries, Archives and Documentation Centres (IAML), Répertoire
International de Littérature Musicale (RILM), Répertoire International d'Iconographie Musicale
(RIdIM) e Répertoire International de la Presse Musicale (RIPM).
O RISM tem publicado séries de indexação de dados musicais desde 1950 e traz mais de
1,4 milhão de registros de fontes musicais de todo o mundo, como manuscritos, partituras
impressas e escritos teóricos localizados em acervos de bibliotecas, arquivos, igrejas, escolas e
coleções particulares, sendo a única organização global que documenta fontes musicais escritas
(RISM 2016), organizando-as em séries.
A série A/I indexa impressões individuais publicadas entre 1600 e 1800, e a série
A/II indexa manuscritos musicais posteriores a 1600, com descrições extensas,
incluindo suas localizações. Ambas as séries originalmente eram para ser
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
organizadas alfabeticamente pelo nome do compositor, como é o caso dos
volumes de série A/I. Como ambas as séries agora são publicadas como bancos
de dados, muito mais pontos de acesso podem ser oferecidos. A Série B é
projetada para cobrir categorias específicas de repertório, como antologias dos
séculos XVI a XVIII, hinos alemães, literatura de origem sobre teoria musical em
latim, grego, árabe, hebraico e persa, etc. As séries A/I, A/II e B são
complementadas pela série C, o Diretório de Pesquisa Musical de Bibliotecas.
(RISM-Zentralredaktion Frankfurt 2016 p. 116 tradução nossa)
O catálogo público online (OPAC) RISM traz registros em MARCXML e RDF e é
referência na pesquisa musical e na catalogação de música impressa (RISM 2023), permitindo,
inclusive, a busca por notas musicais.
O RISM foi citado apenas uma vez, o que nos remete a certos questionamentos. Os
pesquisadores brasileiros têm conhecimento desse recurso? Ou esse recurso não possui registros
suficientemente completos da música brasileira erudita e popular para dar suporte às pesquisas?
Isso também nos leva a refletir sobre o percurso investigativo que os pesquisadores seguem: a
catalogação faz parte do escopo inicial da pesquisa ou é necessário inserir uma tarefa a mais de
organização, a fim de dar suporte ao seu trabalho e de outros que possam futuramente se interessar
pelo mesmo corpus musical?
Se não se encontra uma coleção minimamente organizada, a tarefa cabe ao próprio
pesquisador. Teria gasto esse tempo ‘catalogando’ se houvesse uma organização prévia? E como
essa tarefa interfere na pesquisa: é uma forma de auxiliar na exploração do corpus ou um
empecilho que demanda um tempo que poderia ser utilizado em outras tarefas da pesquisa?
Nesse contexto, seria a catalogação um ‘mal necessário’? Assim, reforçamos a hipótese de
que um desvio procedimental, que obriga os pesquisadores no domínio da Musicologia a
catalogarem as coleções de compositores ou acervos, a fim de dar suporte às pesquisas,
convertendo essa catalogação também em procedimento metodológico.
É importante esclarecer que a interdisciplinaridade não deve ser observada como um
compósito, ou seja, como a simples soma de partes, nem tampouco pode ser avaliada segundo
princípios simples e gerais (Morin 2002), de modo que a mera identificação dos elementos aqui
levantados não permite fazer afirmações taxativas sobre uma questão que é tão complexa. Tendo
em vista o objetivo deste trabalho, que se debruça a explorar pontos de contato existentes e/ou
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
potenciais da catalogação na Música e na Biblioteconomia, dados sobre ausências e fragilidades
aqui observados permitirão agregar complexidade e adensar em questões mais profundas em
futuras pesquisas.
4.1 Análise de Conteúdo
Para a Análise de Conteúdo, foi realizada uma categorização prévia, a fim de explorar os
trabalhos e encontrar problemáticas, recortes ou elementos de análise que permitissem delinear de
modo mais exato as futuras pesquisas que serão realizadas acerca do mesmo corpus. Por questões
de limitações de extensão impostas pelo gênero artigo científico, apresentaremos aqui dados que
permitam identificar a relação entre a catalogação e as dissertações e teses estudadas. Resultados
mais detalhados serão publicados em outras ocasiões.
A Análise Documental permitiu identificar algumas problemáticas inerentes ao domínio da
Música intimamente relacionadas ao universo da Organização da Informação, como, por exemplo,
questões de recatalogação e pré-catalogação. Campos (2006) utilizou um catálogo publicado em
um livro, a fim de propor uma nova ordenação cronológica mais exata que permitisse formar um
percurso composicional do compositor estudado, Glauco Velásquez. Já Abrahim (2010 p. 5) cita,
em sua dissertação, que: “Salomea Gandelman (1997) deu um passo que foi de grande valia para
nossa pesquisa, catalogando peças escritas para piano no período de 1950 a 1988, dentre as quais
podemos encontrar em torno de vinte obras para piano expandido”.
A catalogação cooperativa foi notada no trabalho de Rosa (2005), que contou com a ajuda
de bibliotecários da Universidade Estadual de Campinas, local onde foi desenvolvido o trabalho,
tendo em vista que o objetivo da autora foi o de criar um catálogo on-line de coro infantil a capella
utilizando o formato MARC.
Barbosa (2012) cita o uso de remissivas, uniformização de títulos, transcrição
diplomática, descrição física, uso de espaçamento como indicador de posição de dados, uso de
sinais gráficos para semântica, entre outros. O autor também explica as fontes utilizadas para
prescrição dos dados, demonstrando rigor metodológico no tratamento do catálogo e também faz
uma classificação alfanumérica para as peças estudadas, mas não consegue ultrapassar a ordenação
sequencial, demonstrando carência na compreensão da teoria classificatória.
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
Porto (2020) elaborou um modelo de descrição de partituras com base nos elementos obra,
expressão, manifestação e item do FRBR, reunindo todos em um mesmo registro, separando-os
por cores.
Foram identificadas tipologias diferentes de catálogos elaborados ou estudados pelos
autores, como o geral, o temático e o comentado. A definição e a diferenciação entre esses tipos
serão analisadas futuramente, mas é possível afirmar que 9 autores elaboraram catálogos
temáticos, definidos como aqueles que devem apresentar os compassos iniciais de uma obra musical,
conhecidos como incipit (Pinto 2013).
Pela exploração inicial do conteúdo das dissertações e teses, percebeu-se que os elementos
inerentes aos princípios de Organização da Informação estão dispersos entre os trabalhos e que
não um padrão para tratamento dos acervos musicais. Sendo assim, é possível indagar se tal
despadronização não poderá interferir no resultado de novas pesquisas, uma vez que a discrepância
de apresentação dos dados pode dificultar a comparação entre os catálogos e impossibilitar a
realização de pesquisas, em especial as que trabalham com coleções extensivas.
Ressalta-se que o domínio da Música possui uma grande complexidade, em razão da
diversidade da própria natureza das obras musicais, como a multiplicidade documental, os aspectos
técnicos da sua representação e suas formas de utilização (Castro 2013). De acordo com Assunção
(2005), deve haver um equilíbrio entre regras de catalogação, que são generalistas, e as descrições
usualmente feitas pelos musicólogos, que são muito específicas para um público não especializado.
Portanto, também é possível indagar se uma possível contribuição da CI para a Musicologia não
seria demasiado genérica, o que pode ser investigado futuramente.
É importante ressaltar que as 5 últimas pesquisas, publicadas entre 2019 e 2021, citaram
ferramentas da Ciência da Informação, em especial AACR, ISBD e RDA, o que pode indicar um
atual movimento de aproximação com a Ciência da Informação e o intuito de gerar maior rigor
conceitual e metodológico na elaboração dos catálogos. Apenas um trabalho, defendido em 2006,
havia citado o uso do formato MARC.
A partir do estudo da categoria abrangência musical, observou-se uma diversidade de
escolhas, com enfoque em objetos de pesquisa como compositores, instrumentos, obras específicas
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
etc., como mostra a Tabela 2. Nem sempre o corpus musical estudado foi o mesmo a ser catalogado
pelos autores, o que criou uma intrincada trama de objetos de pesquisa. Para facilitar a
apresentação dos dados, categorizamos o corpus a partir da abrangência musical de cada trabalho.
Verificou-se que 2 textos não especificaram a temática musical, pois abrangeram como objeto de
estudo a organização de um acervo e conceitos de catalogação.
Tabela 2 abrangência musical das dissertações e teses
Abrangência musical
Quantidade
%
Compositor
7
18,42
Compositor e instrumentação
7
18,42
Compositor e obra
6
15,79
Compositor e gênero musical
3
7,89
Compositor, obra e instrumentação
2
5,26
Instrumentação
2
5,26
Compositor, gênero musical e instrumentação
1
2,63
Compositor, gênero musical e obra
1
2,63
Compositor, suporte, localização geográfica e período
histórico
1
2,63
Gênero musical e localização geográfica
1
2,63
Gênero musical
1
2,63
Instrumento (físico) e construtor
1
2,63
Instrumentação, período histórico e nível de dificuldade
1
2,63
Instrumentação, obra e período histórico
1
2,63
Obra, período histórico e localização geográfica
1
2,63
Documentação
1
2,63
Acervo musical
1
2,63
Total
38
100
Fonte: dados da pesquisa
Quanto aos objetivos gerais das pesquisas, identificamos que 7 (18,42%) trabalhos
enfocaram a OI: 5 (13,16%) visaram a investigar questões referentes à catalogação e 2 (5,26%) a
organização do acervo. Entre os demais, 22 (57,90%) se debruçaram a questões de resgate histórico
de obras, compositores e períodos, 7 (18,42%) de performance e interpretação musical, 1 (2,63%)
de estilo composicional e 1 (2,63%) de difusão de contato de compositores e sites de compras de
partituras.
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
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Também foram avaliados os objetivos que levaram os autores a construir ou analisar
catálogos musicais, o que pode revelar a motivação do uso de catálogos na Musicologia. Cabe
ressaltar que os objetivos das pesquisas não se confundem com os objetivos de catalogação. A
Tabela 3 mostra as motivações explicitadas pelos autores em relação ao catálogo:
Tabela 3 motivação da elaboração ou estudo de catálogos
Motivação
Quantidade
%
Preservar a memória
6
15,79
Disseminar
4
10,53
Organizar
4
10,53
Organizar e disponibilizar
4
10,53
Reunir
4
10,53
Fazer tratamento documental
4
10,53
Consolidar catálogos
2
5,26
Não explicitado
2
5,26
Fornecer informações críticas
2
5,26
Registrar
2
5,26
Atualizar catálogo
1
2,63
Classificar
1
2,63
Dar destaque ao compositor
1
2,63
Fornecer fonte de pesquisa
1
2,63
Total
38
100
Fonte: dados da pesquisa
Apesar de 2 autores não deixarem explícito o que os levou a inserir a catalogação nos seus
estudos, o restante dos trabalhos permite observar a concepção de catálogo no domínio da Música.
A maior parte das motivações se aproxima aos objetivos da Organização da Informação na CI,
mas alguns os ultrapassam: 2 (5,26%) veem o catálogo como uma forma de inserção de apreciação
crítica e 1 (2,63%), como um modo de dar destaque ao compositor, como uma espécie de
homenagem. Também se notou que a catalogação possui relevância nos estudos da Musicologia,
tendo em vista a necessidade de organizar para preservar, reunir, disseminar, funcionar como
ferramenta de pesquisa, entre outros.
Os resultados aqui apresentados demonstram uma profícua possibilidade de aproximação
interdisciplinar entre as áreas, a qual não deve ser relegada pela CI, uma vez que este domínio
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
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possui muito a ensinar sobre a informação enquanto objeto de estudo e muito a aprender sobre a
vastidão conceitual da Música.
Considerações finais
É necessário esclarecer que este trabalho, por si só, não pode comprovar a
interdisciplinaridade entre Ciência da Informação e Musicologia, algo que nem está abrangido no
objetivo de pesquisa. Como se trata de estudo exploratório, este será apenas o pilar inicial para
futuras análises que se aprofundem na questão interdisciplinar, adentrando de forma mais densa
no corpus de pesquisa, pelo levantamento de indicadores de citação, e também em outros corpora
que podem vir a ser identificados.
A evolução temporal mostrou um pico de trabalhos (15,79%) defendidos em 2012, sendo
a maioria desenvolvida em pesquisas de mestrado (86,84%) na área de Música (89,47%). A maior
parte dos mesmos foi feita no Sudeste (84,21%) e a UFMG é a instituição de ensino com mais
pesquisadas realizadas (23,69%). concentração de pesquisas na região Sudeste (84,21%), em
especial São Paulo (31,58%), Minas Gerais (26,32%) e Rio de Janeiro (26,32%). Apesar de uma
queda na última década em investigações dedicadas à catalogação na Música, notou-se uma
tendência à inserção de uso de ferramentas da Ciência da Informação, como AACR, ISBD e RDA,
que apareceram nas 5 últimas pesquisas defendidas entre 2019 e 2021. Futuros trabalhos poderão
apreciar, de modo mais detalhado, quais ferramentas e técnicas da CI são utilizadas e de que forma
foram incorporadas nos estudos.
Os assuntos catálogo e catalogaçãoganham destaque dentre as palavras-chave, mas
apenas 18,42% dos corpora enfocaram a organização da informação enquanto objetivo geral de
estudo.
Carlos Alberto Figueiredo Pinto apareceu como o orientador com o maior número de
orientações (7,90%) e apenas dois membros de bancas de defesa possuem formação na área de CI,
o que aponta para uma necessidade de um trabalho mais próximo com a Ciência da Informação, o
qual não pode ficar apenas a cargo dos pesquisadores da Musicologia, em especial se pretendemos
construir uma mútua influência entre domínios que permita criar uma real interdisciplinaridade.
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
Pela exploração inicial das 38 dissertações e teses nas áreas de concentração da Música e
Artes, observou-se que os catálogos musicais também possuem as três funções descritas por
Harden (2017), ou seja, atuam como um inventário, provêm chaves para descoberta dos recursos
e fornecem informações diretamente. Mas também se notou seu potencial enquanto ferramenta de
apreciação crítica e homenagem aos compositores.
Em relação ao caráter de homenagem, embora tenha sido explicitado por apenas um autor,
fica claro nos demais trabalhos que a catalogação é uma forma de tornar público não apenas o
registro de dados, mas também a expressão de admiração e respeito aos compositores. Preservar
em um catálogo é preservar para a posteridade uma parte do legado musical.
A ligação entre catalogação e preservação da memória se mostrou clara nos objetivos de
pesquisa, uma vez que mais da metade do corpus (57,90%) se debruçaram a questões de resgate
histórico de obras, algumas vezes ligando o estudo da vida e da obra do compositor à observação
do desenvolvimento de seu estilo. Isso reforça a complexidade do delineamento da
interdisciplinaridade, tal como apregoado por Morin (2002) e indica que pode ser seguido o
caminho que abranja o referencial de estudos sobre preservação e memória, que também são caros
à Ciência da Informação. Isso indica que nossos olhares, quando voltados para a catalogação no
domínio da Música, não pode se ater a questões técnicas de descrição, mas também abranger
questões sócio-históricas.
Quanto à abrangência, a maioria dos trabalhos abrangeu compositores (18,42%),
compositores e instrumentação (18,42%) e compositores e suas obras (15,79%), sendo que poucas
pesquisas enfocaram questões do acervo per se (5,26%).
Observou-se uma preocupação com a descrição de dados descritivos e poucas medidas de
representação temática, a qual, em sua maioria, abarca apenas a classificação do acervo. O uso do
incipt nos catálogos temáticos revela que pode haver uma concepção de tematicidade na Música
diferente da CI, a qual pode ser explorada em futuras pesquisas.
Para dar continuidade a este trabalho, serão investigadas as citações presentes no corpus, a
fim de observar o perfil de referências, a produtividade e as frentes de pesquisa presentes nas
dissertações e teses sobre catalogação musical. Também poderá ser explorada a conceituação do
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
termo catalogação, tendo em vista as críticas à Ciência da Informação em relação à falta de uma
terminologia própria. Além disso, na esfera da interdisciplinaridade, segundo Japiassu (1976),
deve haver um acordo entre os termos utilizados a fim de evitar p-conceitos e equívocos.
Compreender uma ‘linguagem cifrada’ parece não ser o único componente em comum
entre bibliotecários e músicos, pois foi observada uma proximidade entre Musicologia e Ciência
da Informação, pela apropriação da informação enquanto objeto de pesquisa. Dessa forma,
justificam-se futuras pesquisas que averíguem a interdisciplinaridade pela via da contribuição
mútua, no sentido de incorporar a complexidade presente na diversidade, incerteza e vazio
compartilhados entre os domínios.
Por fim, é importante salientar que, para além de supostas certezas aqui encontradas,
também que se valorizar o desconhecimento e as incertezas. Morin (2002) explica que
conhecimento não é sinônimo de eliminação da ignorância e que o desconhecimento pode ser
gerado pelo próprio conhecimento, pois “Em outras palavras, conhecer é negociar, trabalhar,
discutir, debater-se com o desconhecido que se reconstitui incessantemente, porque toda solução
produz nova questão (Morin 2002, p. 104).
Dessa forma, esperamos que o conhecido e o desconhecido revelado por esta pesquisa
possam servir de base para a busca de novas certezas e incertezas.
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SOUSA, Raquel Juliana Prado Leite de; TAFFARELLO, Tadeu Moraes. Catalogação no Domínio da Música: análise
exploratória pela perspectiva da Organização da Informação. Brazilian Journal of Information Science:
research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023051. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023051.
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Received: 29/08/2023 Accepted: 07/11/2023