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ROCHA, Acrisonelia Medeiros de Sousa; SANTOS, Raquel do Rosário. Mediação da Leitura Literária por Meio das
Obras Plásticas de Flávio Tavares. Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol.17,
publicação contínua, 2023, e023037. DOI: 10.36311/1981-1640.2023.v17.e023037.
MEDIAÇÃO DA LEITURA LITERÁRIA POR MEIO
DAS OBRAS PLÁSTICAS DE FLÁVIO TAVARES
MEDIATION OF LITERARY READING THROUGH THE ARTWORK OF FLÁVIO TAVARES
Acrisonelia Medeiros de Sousa Rocha (1), Raquel do Rosário Santos (2)
(1) Universidade Federal da Bahia - UFBA, Brasil, acrisonelia@gmail.com
(2) quelrosario@gmail.com
Resumo
Objetivo: evidenciar as atividades de mediação da leitura, com base na literatura paraibana, realizadas por
meio das influências nas artes plásticas de Flávio Tavares. Método: esta pesquisa se caracteriza como
descritiva, tendo como método o estudo de caso, sendo investigada a importância do agir mediador de
Flávio Tavares. Como técnicas de coleta de dados foram desenvolvidas a análise das obras de Flávio
Tavares e a realização de uma entrevista junto a esse Artista. Resultado: Flávio Tavares promove a
mediação da leitura literária por meio de suas obras, em um agir representativo que o envolve, como
também os literatos, o seu lugar de pertencimento e os(as) leitores(as). Destaca-se também que Flávio
Tavares se utiliza de sua arte, para realizar uma mediação indireta da leitura, que subsidia reflexões a
respeito das relações sociais, por exemplo, das condições de trabalho de povos sub-representados,
demonstrando um processo de conscientização por parte de si e dos sujeitos leitores. Conclusões: é possível
identificar nas obras de Flávio Tavares sua criatividade e criticidade, contextualizadas em seu lugar de
pertencimento. A mediação da leitura, realizada de maneira consciente, pelo Artista viabiliza aos sujeitos,
inclusive àqueles colocados à margem da sociedade, o acesso e a apropriação dos bens culturais,
favorecendo a inclusão e o desenvolvimento desses sujeitos, como leitores críticos que podem reconhecer
elementos que são simbólicos e representativos de seu povo.
Palavras-chave: Mediação da leitura; Leitura literária; Artes plásticas Flávio Tavares.
Abstract
Objective: to highlight the reading mediation activities, based on Paraíba literature, carried out through
influences in the visual arts of Flávio Tavares. Method: this research is characterized as descriptive, using
the case study method, investigating the importance of Flávio Tavares' mediating action. As data collection
techniques, the analysis of the works of Flávio Tavares and an interview with this Artist were developed.
Result: Flávio Tavares promotes the mediation of literary reading through his works, in a representative
act that involves him, as well as the literati, his place of belonging and the readers. It is also noteworthy
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that Flávio Tavares uses his art to carry out an indirect mediation of reading, which subsidizes reflections
on social relations, for example, the working conditions of underrepresented peoples, demonstrating a
process of awareness on the part of themselves and of the readers. Conclusions: it is possible to identify in
the works of Flávio Tavares his creativity and criticality, contextualized in his place of belonging. The
mediation of reading, carried out consciously by the Artist, enables subjects, including those placed on the
margins of society, access and appropriation of cultural goods, favoring the inclusion and development of
these subjects, as critical readers who can recognize elements that are symbolic and representative of their
people.
Keywords: reading mediation; literary reading; Fine Arts Flávio Tavares.
1 Introdução
As expressões artísticas, a exemplo da pintura, podem ser entendidas como dispositivos
que informam, sendo necessária a leitura desses dispositivos para a interpretação da informação
que se deseja compartilhar. Desse modo, a leitura é um ato essencial para a apropriação da
informação, e essa é uma instância de transformação da vida e da relação do sujeito com o mundo.
Entende-se que tais informações podem ser articuladas pelos agentes mediadores da leitura,
que ao utilizarem repertórios diversificados de informação, proporcionam aos sujeitos a
possibilidade de se apropriarem das linguagens que melhor se adequem e tenham conforto para se
expressar e compartilhar seus saberes. Nesse sentido, a mediação da leitura se articula para apoiar
que os sujeitos, para além de ter acesso, possam se apropriar das informações registradas nos
dispositivos informacionais, como as obras de arte, além de favorecer a produção e o
compartilhamento de conhecimentos, apoiando a relação e o (re)conhecimento dos sujeitos sobre
si e o outro.
O presente artigo apresenta parte dos resultados obtidos na pesquisa realizada no mestrado
em Ciência da Informação, cujo recorte para esta comunicação busca evidenciar as atividades de
mediação da leitura - como base na literatura paraibana - realizadas por meio das influências nas
artes plásticas de Flávio Tavares. A escolha por analisar as narrativas literárias de Flávio Tavares,
que possui mais de 60 anos de carreira, deve-se ao seu reconhecimento nacional e internacional,
atuando de forma a considerar e apresentar traços culturais e identitários do povo paraibano por
meio da literatura e presente em suas obras.
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Quanto à metodologia, a presente pesquisa se caracteriza como descritiva, tendo como
método o estudo de caso, uma vez que se observou a importância do agir mediador de Flávio
Tavares. Como técnicas de coleta de dados, foram desenvolvidas a análise das obras de Flávio
Tavares e a realização de uma entrevista junto a esse Artista. Cumprida essa etapa, os resultados
foram analisados à luz do referencial ancorado, por exemplo, nos estudos de Freire (1981, 1989),
Martins (1988), Almeida Júnior e Bortolin (2007), Bortolin (2010), Cavalcante (2020) e Candido
(2011).
2 Mediação da Leitura Literária para formação do sujeito leitor
O ato de ler pode colaborar para a constituição de sujeitos conscientes, ao favorecer as
percepções da dinâmica sociocultural que envolve os sujeitos e desvendar para o leitor aspectos,
por vezes implícitos, sobre o mundo e sua relação consigo e com o outro. Dessa maneira, é preciso
refletir a respeito do entendimento de Freire (1989) quando ao tratar da alfabetização de adultos
aponta que essa ação é um ato de conhecimento, um ato político e que nesse processo o
‘alfabetizando’ tem o papel de sujeito. Nesse sentido, a leitura e a mediação dessa ação podem ser
entendidas como um ato que favorece a construção de conhecimentos, a interpretação, como
também a interferência dos sujeitos junto ao coletivo, transformando-o ao mesmo tempo em que
se transforma.
Freire (1989, p.13) também destaca a importância da leitura e afirma que
[...] a leitura de mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta
implica na leitura daquele [...] podemos ir mais longe e dizer que a leitura da
palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma
de ‘escrevê-lo’ ou de ‘reescrevê-lo’, quer dizer, de transformá-lo através de nossa
prática consciente.
Com isso, é possível compreender que a leitura está intrinsecamente relacionada com o ato
de transformação consciente do mundo. Nesse sentido, existe uma relação cíclica, em que a leitura
de mundo dá subsídios para que o sujeito possa ‘desvendar’ a leitura das palavras, que por sua vez
se completa favorecendo a relação dele com o mundo e propiciando ao sujeito a oportunidade de
(re)conhecer acontecimentos, (re)escrever o que foi lido e/ou vivido e, ainda, de maneira
consciente, através de suas práticas, modificar o mundo. Portanto, a partir do entendimento da
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percepção apresentada por Freire (1989), a leitura é uma ação em que o sujeito interpreta e se
relaciona com o mundo - mesmo aquele distinto e distante da sua realidade - reconhecendo-se
como parte dele e estando apto a construir relações com esse mundo, por meio do ato de se
expressar e interpretá-lo.
Ainda de acordo com Freire (1981, p.42) “A codificação, mesmo pictórica, é um ‘discurso’
a ser ‘lido’ por quem procura decifrá-la.” Entende-se que o sujeito desenvolve um repertório que
poderá subsidiá-lo na condução de sua forma de expressão, em suas reflexões, em seu direito de
escolha, contribuindo para uma ruptura da cultura de silenciamento, imposta pela classe dominante
e tornando efetiva a postura de busca por condições de liberdade para todos os sujeitos.
É válido destacar também que, ao buscar uma atitude consciente na realização das
atividades mediadoras, os sujeitos envolvidos poderão favorecer o ato de liberdade de expressões,
percepções, ideias, atitudes e escolhas. Essa postura crítica diante do mundo, favorece que os
sujeitos possam (re)conhecer os fatos e as circunstâncias do que acontece ao seu entorno e de que
modo consciente poderá agir para modificá-los. A partir dessa reflexão, entende-se que o
analfabetismo, mais que a impossibilidade de compreender uma dada linguagem, refere-se à
dificuldade que o sujeito expressa ao realizar uma leitura crítica da dinâmica social em que está
inserido, como também das possibilidades de acesso à informação e, por meio dela, de realizar
suas práticas sociais de maneira consciente. Para além dos dispositivos em que a informação é
registrada por meio da linguagem escrita, também existem os diversos dispositivos produzidos por
meio das linguagens artísticas, como a fotografia, a pintura, a dança, o teatro, entre outros, que
também potencializam ações voltadas ao fortalecimento sociocultural, de evocar indícios
memorialísticos e identitários dos sujeitos, que se dá por meio do ato de ler tais dispositivos.
Considerando outros pensamentos apresentados em relação ao ato de ler e tratando sobre a
ampliação da noção de leitura para além do texto escrito, Martins (1988, p.30), considera que “[...]
o ato de ler se refere tanto a algo escrito quanto a outros tipos de expressões do fazer humano [...]”
e ainda argumenta que
[...] a leitura se realiza a partir do diálogo do leitor com o objeto lido - seja escrito,
sonoro, seja um gesto, uma imagem, um acontecimento. Esse diálogo é
referenciado por um tempo e um espaço, uma situação; desenvolvido de acordo
com os desafios e as respostas que o objeto apresenta, em função das expectativas
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e necessidades, do prazer das descobertas e do reconhecimento de vivências do
leitor. (Martins, 1988, p.33).
Considerando-se o pensamento da autora, é possível dizer que o ato de ler pode ocorrer em
circunstâncias diversas, a partir de diferentes dispositivos informacionais, como a fotografia, a
pintura, a música, a poesia, entre outros, mesmo com a inexistência de palavras, considerando o
interesse do sujeito leitor em decodificar, analisar e interpretar o dispositivo que é repleto de valor
simbólico e informacional. Ao favorecer o processo de desenvolvimento desse leitor, no que tange
à possibilidade de alcançar novas sensações, sentimentos e percepções das suas relações com o
outro, a leitura é uma ação imprescindível para a construção do conhecimento.
No campo da Ciência da Informação, Almeida Júnior e Bortolin (2007, p.3) defendem que
o leitor é tão responsável pelo texto quanto quem o escreve e que “[...] cabe ao leitor ter a iniciativa
de promover encontros ‘cruzando’ os textos que habitam o seu interior com aqueles existentes ao
seu redor [...]” Desse modo, de acordo com o entendimento dos autores, para ocorrer uma leitura
efetiva, é necessário que exista uma relação estreita entre leitor e o texto, promovendo a realização
de interpretações de maneira conectadas tanto com o mundo ao qual ele esteja inserido quanto com
o seu mundo interior, assim, indicando a necessidade da atuação mediadora. Ainda segundo
Almeida Júnior e Bortolin (2007) o mediador é um leitor e a partir do seu gosto pela leitura é
possível considerar sua subjetividade no ato de mediar a leitura, para tanto, compreende-se que o
faça sem imposição, favorecendo a relação dos demais leitores com os dispositivos utilizados.
Sousa, Santos e Jesus (2020, p. 18) tomando como base o conceito defendido por Almeida
Júnior (2009), refletem que mediação da leitura é:
[...] uma ação realizada conscientemente por um profissional da educação, da
informação e/ou da cultura, de maneira individual ou coletiva, que propicie uma
leitura singular ou plural na ambiência dos dispositivos informacionais, sociais e
culturais, na perspectiva de possibilitar a apropriação da informação.
Desse modo, compreende-se que além das categorias destacadas pelas autoras, com base
no conceito de mediação da informação (Almeida Júnior, 2009), sendo atividades individuais ou
coletivas, singulares ou plurais, também se destaca que a mediação da leitura pode ser uma ação
direta ou indireta. Tomando como base as categorias de mediação da informação defendidas por
Almeida Júnior (2009), entende-se que nas atividades de mediação direta da leitura ocorre a
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interação entre o agente mediador e o leitor, de maneira em que a presença física desses sujeitos é
essencial para o desenvolvimento das atividades. Por outro lado, a mediação da leitura também
pode ser realizada por meio de seu ato produtor, quando suas atividades criativas realizam a
mediação, mas sem sua presença física, sendo considerada a mediação indireta da leitura. Assim,
em uma exposição artística, as obras de arte podem ser consideradas uma ação de mediação
indireta da leitura, visto que favorece uma interferência do agente mediador com os sujeitos
leitores, mesmo que esse não esteja fisicamente presente.
Portanto, os diversos dispositivos informacionais podem proporcionar uma aproximação
com os sujeitos, de modo que sua história de vida, a forma de se expressar e se relacionar com o
mundo sejam contemplados nas atividades mediadoras. Dessa maneira, o repertório informacional
que sustenta as atividades mediadoras da leitura deve ser diverso, incluindo os dispositivos
produzidos a partir das artes plásticas. A reflexão apresentada por Pirolo (2011, p. 7) defende a
arte como
[...] uma representação simbólica de um momento, de uma referência, de um
contexto, procura transparecer um ideal, uma idéia, um conteúdo, uma
informação, para quem a observa. Uma obra de arte pode ser apreciada e
compreendida, ser considerada um instrumento para desencadear uma possível
informação em um observador.
A partir do entendimento apresentado pela autora, a obra de arte pode ser compreendida
como um dispositivo informacional. Portanto, seguindo as reflexões aqui apresentadas, o ato de
ler envolvendo a pintura se a partir do repertório que o sujeito leitor adquiriu em suas vivências,
subsidiando a interpretação dos elementos utilizados pelo artista plástico na construção da obra ali
representada. Desse modo, a mediação da leitura por meio da pintura deve ser pautada no
favorecimento, cada vez mais consciente, em tornar o sujeito leitor íntimo das variadas
manifestações artísticas.
Desse modo, entende-se que a partir da pintura os sujeitos podem realizar leituras diversas,
compreendendo elementos de um tempo histórico distinto do seu, o modo com que o produtor
percebe e se relaciona com o mundo, como também aspectos que envolvem a própria produção da
arte, a exemplo, do tipo de material utilizado para a pintura. Nesse sentido, associa-se ao
entendimento defendido por Cavalcante (2020), quando afirma que a partir do ato de ler o sujeito
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exercita a alteridade, e que o ato de ler pode também desenvolver saberes críticos e reflexivos,
subsidiando a construção de conhecimentos. Cada um dos elementos apresentados em uma pintura
são informações que podem ser acionadas/lidas pelo sujeito em contato com a obra. Entretanto,
esse processo de realizar uma leitura mais ampla será possível por meio da interferência do
agente mediador da leitura, que poderá evidenciar a multiplicidade de informações registradas no
documento artístico e favorecer uma leitura crítica sobre o sujeito produtor, o tempo histórico e o
leitor.
Nesse sentido, destaca-se a possibilidade de a pintura refletir traços da literatura, ou seja,
do artista revelar, em suas produções, leituras que ele realizou de dada obra, tomando-a como base
para refletir sobre temas de interesse. Assim, o artista plástico pode desenvolver um processo de
mediação da leitura, quando por meio de sua obra interfere no processo de aproximação do sujeito
com outras expressões, como a literatura.
Seguindo na perspectiva da mediação da leitura, é importante destacar a concepção inerente
à leitura literária, para tanto, evidencia-se a consideração feita por Bortolin (2010), ao tratar da
mediação oral da literatura como sendo uma ação, planejada ou espontânea, promovida pelo
mediador da leitura, com o intuito de aproximar o “leitor-ouvinte” dos textos literários. Embora a
autora apresente duas classificações, a mediação da leitura planejada ou espontânea, entende-se
que a mediação espontânea ocorre no contexto familiar, na atuação de professores e outros sujeitos
que entre as suas intencionalidades desenvolvem a mediação da leitura. Entretanto, nesse contexto
da pesquisa, compreende-se a necessidade de uma mediação planejada, portanto, consciente do
objetivo que se pretende alcançar, que envolva a prática, mas também um arcabouço teórico, que
fundamente a mediação da leitura, favorecendo que o agente mediador, junto aos leitores, alcance
novas percepções, ampliem seus repertórios e estejam atentos às possibilidades decorrentes do ato
de ler.
Nesse sentido, Bortolin (2010) apresenta o que considera mediação oral da literatura, no
contexto das atividades de narração literárias como sendo
[...] narrativas orais de textos diversificados, colagens poéticas, rodas de leitura,
clubes de leitura, montagens de jograis, leituras públicas de textos (em hospitais,
praças, ônibus, restaurantes, rádio e televisão), saraus literários, bate-papo com
escritores, oficinas de produção e leitura de textos, festivais de filmes, entrevistas
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com pioneiros, realização de encontros com repentistas e cordelistas, cantorias,
sessões de piadas, causos, adivinhações, parlendas, trava-línguas etc. (Bortolin,
2010, p. 137-138).
Diante da exposição feita pela autora, das mais variadas possibilidades de se efetuar a
mediação oral da literatura, compreende-se que a ação mediadora pode ser realizada com base nas
narrativas orais e visuais advindas das percepções imagéticas que se dão a partir do acesso aos
mais diversos dispositivos, tomando como exemplo as obras de arte, que podem estar em museus
e galerias de arte, como também nos lugares populares. Desse modo, o agente mediador deve estar
atento para possibilitar que haja uma ruptura para o lugar da informalidade, apoiando que a leitura
literária chegue onde os mais diversos leitores se encontram, a exemplo de shoppings, escolas ou
mesmo nas mídias sociais, como também em equipamentos culturais que estejam localizados nas
periferias e nos centros das cidades, próximos ao grande público, ou seja, com fácil acesso,
possibilitando que as pessoas mais desfavorecidas econômica e socialmente tenham o acesso
viabilizado.
O que não quer dizer que inexista cultura ou literatura própria desse lugar, mas é
interessante que esse encontro entre a diversidade cultural e literária ocorra para que os referidos
sujeitos possam ter uma percepção mais ampliada sobre o seu lugar que o é apenas o lugar da
periferia. Desse modo, a base literária se associa às outras expressões, se apresentam em diversos
dispositivos, podendo tratar de aspectos da literatura, como também se associar aos aspectos
culturais de um dado contexto social e favorecer que as narrativas sejam desenvolvidas no processo
de mediação da leitura.
Destaca-se também o entendimento de Candido (2011), quando defende que toda obra
literária é um objeto construído e que, enquanto construção, possui grande poder humanizador e
favorece a formação de indivíduos mais compreensivos. O autor também apresenta a literatura
como sendo uma necessidade universal para que o indivíduo possa preservar a sua personalidade,
aprimorar os seus sentimentos e a sua forma de ver o mundo, por meio dela ser capaz de “embarcar
em viagens” pelos mais diversos universos, independente que seja por intermédio de poemas,
dramas, lendas, anedotas, modas de viola.
Evidencia-se ainda que, como afirma Candido (2011), para alcançar uma sociedade mais
justa deve-se favorecer o acesso à fruição da arte e da literatura, em diferentes formas. Ratifica-se
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o papel social dos mediadores da leitura ao assumirem o compromisso com essa sociedade mais
justa, ao potencializar que os diferentes dispositivos possam ser acessados, interpretados em seu
contexto histórico, cultural e político, e que as informações materializadas em tais dispositivos
possam ser apropriadas.
Diante do exposto, justifica-se estudos como este que se debruçam sobre a mediação da
leitura que tem como objeto as obras de arte, como dispositivos de leitura e de ressignificação das
práticas socioculturais dos diferentes grupos formadores da sociedade.
3 Metodologia
Esta pesquisa se caracteriza como descritiva, tendo como método o estudo de caso, de
acordo com Antonio Carlos Gil (2010), consiste no aprofundamento exaustivo dos objetos e
permite seu amplo e detalhado conhecimento. Também foi utilizado o método documental, uma
vez que se propôs a mapear narrativas literárias presentes nas pinturas e desenhos de Flávio
Tavares, ou seja, na pesquisa fez uso de fontes informacionais que não receberam tratamento
analítico, pois como julga Antonio Carlos Gil (2010, p. 66)
[...] a pesquisa documental assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica. A única
diferença entre ambas está na natureza das fontes. Enquanto a pesquisa
bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores
sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que não
receberam ainda o tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de
acordo com os objetivos da pesquisa.
Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi evidenciar as atividades de mediação da leitura,
com base na literatura paraibana, realizadas por meio das influências nas artes plásticas de Flávio
Tavares. Para tanto, as técnicas de coleta de dados utilizadas foram a análise das obras de Flávio
Tavares e a realização de uma entrevista junto a esse Artista, cujo roteiro era composto por
questões que objetivaram evidenciar a percepção de Flávio Tavares quanto a constituição
identitária que permeia a produção de suas obras, como também a sua interferência, como agente
mediador que toma como base a literatura.
Flávio Tavares, com mais de 60 anos de carreira, participou de exposições nacionais e
internacionais. Sua formação identitária, familiar e sociocultural e o seu posicionamento
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sociopolítico demonstram seu protagonismo sociocultural que são evidenciados nas suas obras
com alusão à narrativa literária e justificam a escolha desse reconhecido Artista para esta
investigação.
Para o cumprimento do objetivo foi realizada uma entrevista com Flávio Tavares que
buscou identificar seu autorreconhecimento como mediador da leitura e a interação com os sujeitos
leitores de sua obra. Além de analisar as narrativas de Flávio Tavares por meio de suas obras,
foram selecionados os painéis: Ariano Suassuna e seu pai (2020); Embaixo do Tamarindo (1995);
Fogo Morto (2020) e A Bagaceira (2012).
Obras que trazem a representação de características de literatos paraibanos. Nesse sentido,
foi adotada a técnica de análise documental das referidas obras, em que as percepções obtidas a
partir dos aspectos presentes foram registradas, para serem apresentadas e discutidas à luz da
literatura. Tais aspectos permearam a identificação e análise das obras selecionadas, considerando
a apresentação das características técnicas das obras, as peculiaridades que remetem aos traços do
cotidiano do seu lugar de pertencimento e do povo nordestino, como também do próprio Artista.
4 Entrelaces das narrativas literárias e as atividades mediadoras por meio das
pinceladas de Flávio Tavares
Flávio Tavares em suas obras adota, entre outras técnicas, acrílica sobre tela, óleo sobre
tela, nanquim e aquarela. O Artista, para além da multiplicidade de técnicas e de traços ancorados
na originalidade, manifesta o sentimento de um verdadeiro amante da arte, quando se constata que
várias de suas produções são inspiradas em outras expressões artísticas, como, por exemplo, na
literatura, no cinema e na música. Em se tratando das produções de Flávio Tavares que são
advindas de obras de literatos, pode-se identificar telas e desenhos associados às produções de
escritores como Jorge Amado, Gabriel García Márquez, Machado de Assis, Ariano Suassuna,
José Lins do Rego, José Américo de Almeida, Augusto dos Anjos, sendo os quatro últimos
paraibanos.
Para além das diversas temáticas, ao realizar a leitura de suas obras também é possível
identificar informações que circulam livremente pelo seu trabalho, que envolve a literatura, em um
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cotidiano sobre os paraibanos, evidenciando signos representativos desse povo, como: os
trabalhadores da cana-de-açúcar e dos engenhos, associados à obra de José Lins do Rego; os
retirantes da seca, presentes na obra de José Américo de Almeida; o sertanejo e o vaqueiro,
retratados na obra de Ariano Suassuna; como também os animais e as feras, nos poemas de
Augusto dos Anjos. É importante destacar que as análises expostas no trabalho têm a pretensão de
compreender tais obras, como dispositivos que também interferem no processo de mediação da
leitura, subsidiando que os leitores possam fazer associações entre as telas produzidas por Flávio
Tavares e as obras de literatos paraibanos mencionados visando alcançar o objetivo proposto.
Assim, defende-se que Flávio Tavares, ao atuar no processo de encontro dos leitores e das obras
literárias, esse Artista pode ser considerado um mediador da leitura, que também desenvolve a
mediação da leitura literária de maneira indireta, conforme categorização da mediação da
informação defendida por Almeida Júnior (2009), categorias que podem ser associadas às
atividades de mediação da leitura, visto a inter-relação dessas ações mediadoras.
Quanto às práticas de mediação da leitura literária realizadas por Flávio Tavares e as ações
que refletem a interação e o reconhecimento cultural dos seus leitores, ao ser questionado se ele se
reconhece como um mediador da leitura por meio de suas obras, ao entender a mediação da leitura
como prática desenvolvida por uma pessoa com o objetivo de despertar em outros sujeitos o gosto
e o prazer pela leitura, seja ela literária, artística, musical etc., Flávio Tavares, na entrevista, afirma
que
Reconheço sim, eu reconheço e ao mesmo tempo, como eu falei sobre isso, o
medo de você não ter a mesma força da leitura e também não é uma norma, vamos
dizer, dentro da pessoa, ele, vamos dizer “funcionar” através da literatura, mas é
uma história que aonde você lendo imagem, você faz com que o outro também
leia aquela história que ali narrada num é? [...] vamos dizer pra gente falar
claramente de Menino de Engenho, não precisa você olhar aquele quadro, ter lido
José Lins do Rego sabe, não precisa. Voestá olhando um moinho, se alguém
de fora perguntar que roupa é aquela, se tem alguma coisa típica de alguma região,
tudo bem, mas antes é importante você olhar a pintura e através da pintura, isso
que eu falei da arte descritiva, indiscutivelmente você vai ler as imagens, aí você
vai chegar a Lins, dentro do pintor, ou dentro do artista, do ilustrador, muitas
vezes ele não tá dentro dessa narrativa literária, ele as vezes tá mais dentro de um
espírito de Zé Lins, do que do próprio livro de Zé Lins.
Flávio Tavares, ao se reconhecer como um mediador da leitura, externaliza que esse agir é
realizado por meio da expressão imagética, em que a obra literária adquire uma representação em
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sua obra artística. O artista ainda afirma que não se restringe a seguir uma norma que venha limitar
o seu trabalho, de modo que restrinja a fruição da literatura. A sua intenção é a de que conforme o
sujeito faça a leitura da imagem elaborada por ele também consiga ler a história ali narrada, pois,
conforme Flávio Tavares, o artista muitas vezes ultrapassa a narrativa apresentada pelo autor em
seu livro. Assim, Flávio Tavares promove a mediação da leitura literária por meio de suas obras,
em um agir representativo que o envolve, como também os literatos, o seu lugar de pertencimento
e os leitores.
Para transparecer aspectos evidenciados na fala de Flávio Tavares, no que tange a mediação
da leitura literária, de autores paraibanos, pode-se explicar a obra intitulada Ariano Suassuna e seu
Pai (Figura 1), que faz parte do Acervo da Academia Paraibana de Letras. Na obra pode-se
identificar em primeiro plano a representação do escritor paraibano Ariano Suassuna, vestido com
suas tradicionais roupas em linho branco, mais ao centro e de costas, o cantador e poeta cordelista
paraibano João Melchíades Ferreira, que virou personagem de O Romance d’A Pedra do Reino e
o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta
(1)
e também o ex-presidente da Paraíba, João Suassuna, pai
de Ariano Suassuna. O fato de Ariano Suassuna ter perdido o pai quando ainda criança pode ter
feito ele representar a importância desse personagem que “traduz” ou “comunica” o mistério e a
beleza do mundo, como possivelmente faria o seu pai.
Os referidos personagens se encontram em um cenário que remete a representação de um
palco, possivelmente de um teatro, onde aparece uma cena que também associa-se à obra O
Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, contendo elementos como
as cavalhadas, as duas pedras compridas que dão nome ao romance, o castelo, a vegetação típica
do sertão, o cangaceiro, a onça Caetana, o rei D. Sebastião de Portugal, o touro alado, ou seja,
alguns elementos que estão descritos na obra do literato.
É possível também identificar logo atrás de Ariano Suassuna, o que poderia se chamar de
coxia do teatro, os brasões das famílias Dantas e Suassuna, os tradicionais retratos do casal que
origem a família formada a partir da união de Rita de Cássia Dantas Villar com João Urbano
Pessoa de Vasconcelos Suassuna. Desse modo, além de representar o cenário público da obra,
Flávio Tavares também destaca elementos da constituição identitária de Ariano Suassuna,
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ROCHA, Acrisonelia Medeiros de Sousa; SANTOS, Raquel do Rosário. Mediação da Leitura Literária por Meio das
Obras Plásticas de Flávio Tavares. Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol.17,
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evocando traços de sua vida privada que também podem ser representativos para o sujeito leitor,
por exemplo, a exposição de quadros da base familiar, conforme pode ser observado na Figura 1.
Figura 1 Ariano Suassuna e seu pai
(2)
Fonte: http://flaviotavares.com.br/pt_br/galeria/
Desse modo, foi possível perceber que os elementos retratados na tela têm um significado
na obra de Ariano Suassuna e que Flávio Tavares demonstra um sentimento de admiração e de
representatividade de si e de outros sujeitos pertencentes ao seu contexto sociocultural, e se utiliza
desses detalhes tornando sua obra um dispositivo que permite a interpretação de tais elementos,
fomentando a identificação dos mesmos por parte de quem fez a leitura de obras de Ariano
Suassuna, como também despertando a curiosidade dos leitores que ainda não a fizeram. Tais
indícios fortalecem o argumento aqui apresentado de que Flávio Tavares também assume o papel
de mediador da leitura literária, visto que, segundo Bortolin (2010), a mediação da leitura deve ser
entendida como uma interferência que pode ser espontânea ou planejada, em que o mediador da
leitura busca aproximar o leitor de textos literários, tanto por meio da voz viva quanto pela voz
mediatizada. Nesta pesquisa, amplia-se esse pensamento com a inclusão de outras formas de
expressão, tal qual as artes plásticas.
Flávio Tavares se destaca como um mediador da leitura literária que se preocupa em
ampliar o acesso à informação, por meio das atividades mediadoras que realiza para além do
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ROCHA, Acrisonelia Medeiros de Sousa; SANTOS, Raquel do Rosário. Mediação da Leitura Literária por Meio das
Obras Plásticas de Flávio Tavares. Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol.17,
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ambiente físico. É válido destacar que no processo mediador, quando se utiliza de diferentes
dispositivos informacionais para realizar uma ação mediadora, a exemplo do que tem sido
apresentado nesta pesquisa, com a observação do entrelaçamento das pinturas de Flávio Tavares
com a obra literária de Ariano Suassuna, pode-se apoiar o leitor no alcance do sentimento de
pertencimento, a partir da identificação de elementos que são basilares para sua constituição
identitária. Por isso, cabe ao agente mediador buscar planejar e realizar ações que possam ampliar
a percepção do leitor e o conduzir para um ato de ler significativo, ou seja, atribuindo um processo
de relação entre si, o mundo e os dispositivos informacionais que acionam esse processo de leitura,
como indicam Almeida Júnior e Bortolin (2007), em que o leitor promova encontros dos textos
que habitam o seu interior com aqueles existentes ao seu redor.
Centrado na temática da natureza e adentrando a tela de Flávio Tavares alinhada à poesia
de Augusto dos Anjos, a Figura 2 remete ao poema Debaixo do Tamarindo, publicado inicialmente
no único livro do poeta intitulado Eu, depois reeditado, em 1919, como Eu e Outras Poesias, com
o acréscimo de outros poemas. Com base nessa publicação, Flávio Tavares desenvolve uma obra
intitulada Embaixo do Tamarindo.
Figura 2 Embaixo do Tamarindo
(3)
Fonte: @flaviotavares
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Na Figura 2, pode-se perceber que ao lado da ilustração foi citado o poema que
provavelmente o inspirou na realização da obra. Essa apresentação de imagem e texto possibilita
a associação que o leitor da publicação poderá realizar ao ler tais dispositivos, fomentando o acesso
a parte da obra do poeta paraibano e possibilitando o despertar do interesse dos leitores em
conhecer mais da obra do referido poeta. Atitude mediadora que se aproxima do entendimento de
Cavalcante (2020), quando afirma que, a partir do ato de ler, o sujeito desenvolve saberes críticos
e reflexivos, subsidiando a construção de conhecimentos. Desse modo, de acordo com o
entendimento da autora, para ocorrer uma leitura efetiva, é necessário que exista uma relação
estreita entre leitor e o texto, promovendo a realização de interpretações de maneira conectadas,
tanto com o mundo ao qual ele esteja inserido quanto com o seu mundo interior, assim, indicando
a necessidade da atuação mediadora.
Na tela pintada em tons ocres e marrons é notória a densidade das imagens retratadas, sendo
possível observar, em primeiro plano, a figura solitária do poeta de costas e embaixo do de
tamarindo que, por sua vez, encontra-se carregado não apenas de suas memórias, mas também de
seus antepassados e os da própria árvore como apontado por Augusto dos Anjos quando, no referido
poema, cita:
No tempo de meu Pai, sob estes galhos,
Como uma vela fúnebre de cera,
Chorei bilhões de vezes com a canseira
De inexorabilíssimos trabalhos!
Hoje, esta árvore, de amplos agasalhos,
Guarda, como caixa derradeira,
O passado da Flora Brasileira
E a paleontologia dos Carvalhos!
Quando pararem todos os relógios
De minha vida, e a voz dos necrológicos
Gritar nos noticiários que eu morri,
Voltando à pátria da homogeneidade,
Abraçada com a própria Eternidade
A minha sombra há de ficar aqui! (Anjos, 2012, grifo nosso).
Ao ler o poema é possível perceber, entre outros aspectos, a importância que tal árvore tem
para Augusto dos Anjos. Observa-se que o pé de tamarindo representa para ele não apenas o
passado, como o presente e também o futuro, visto que a árvore, é descrita pelo próprio poeta como
a “caixa derradeira”, guardiã das lembranças de ambos. Considerando que Augusto dos Anjos
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ROCHA, Acrisonelia Medeiros de Sousa; SANTOS, Raquel do Rosário. Mediação da Leitura Literária por Meio das
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reforça em seu poema a sua relação quase simbiótica com a árvore, essa ação torna-se evidente
quando ele cita a “paleontologia dos Carvalhos”, fazendo a ligação de um dos seus sobrenomes
com uma espécie de árvore que também compõe a flora brasileira. O de tamarindo é apresentado
como o palco das memórias do poeta ou até mesmo o caleidoscópio de suas vivências. E tal
relevância é reiterada quando Augusto dos Anjos, ainda em Debaixo do Tamarindo, encerra o
poema expressando o desejo de que ao morrer a sua sombra possa ficar ali.
Na Figura 2, também é possível observar a casa em que o poeta nasceu, pessoas com
semblantes tensos, aflitos e sisudos, verifica-se também a representação do velório de um homem,
que possivelmente seja o pai de Augusto dos Anjos, acontecimento muito marcante na vida do
poeta, visto que tal fato é retratado nos sonetos I - A meu pai doente; II - A meu pai morto e III -
“Podre meu Pai! A Morte o olhar lhe vidra”. Vê-se também animais, monstros e uma figura
representativa da morte com uma foice. Também se observa que Flávio Tavares faz uma outra
representação do próprio poeta na copa da árvore e apesar de fazer uso de tintas de cores mais
sóbrias, o Artista destaca o semblante tranquilo e um pouco mais iluminado do enigmático de
Augusto dos Anjos, talvez uma alusão aos que o reconhecem pela forma magistral de uso de
antíteses em seus poemas, a exemplo de “Monstro de escuridão e rutilância” que o poeta traz em
Psicologia de um Vencido. Diante de tal fato, pode-se entender que o Artista se afasta da rotulação
estabelecida por muitos de que Augusto dos Anjos foi um homem amargurado, fúnebre e
melancólico. Assim, percebem-se indícios de uma representação de uma leitura de Flávio Tavares,
um ato mediador que possibilita a outros leitores uma ressignificação do entendimento que teve
em suas leituras.
Sobre a escolha de obras literárias que inspiram a produção de seu trabalho como artista
plástico, Flávio Tavares, durante a entrevista, relata que
[...] Ligada a Augusto dos Anjos, que eu ilustrei muito Augusto dos Anjos com o
universo tenebroso dele. Eu tinha muito medo porque lá em casa, eu era muito
novo, meu pai quando chegava em casa recitando: “eu sou a sombra, venho de
outras eras”, eu ficava com medo, eu dizia: isso é coisa de filme de alma, de terror
(risos). Aí mais tarde eu fui fazer Augusto dos Anjos, aí comecei a entrar mesmo
na poesia dele e a gente que ele além de um gênio, simplesmente ele iluminava
essa tragédia da alma humana, né?
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Obras Plásticas de Flávio Tavares. Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol.17,
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Ao relacionar sua produção com a obra de Augusto dos Anjos, Flávio Tavares expressa
uma aproximação com um ambiente que lhe é familiar, levando-o a produzir obras que fazem
referências aos personagens, cenários e práticas sociais presentes na literatura desse escritor. A
partir dessa relação expressa pelos aspectos socioculturais nos dispositivos produzidos por
Augusto dos Anjos, pode-se inferir que essa associação se dá por Flávio Tavares desejar preservar
e disseminar os memorialísticos individuais e coletivos do seu lugar de pertencimento.
A Figura 3 é mais uma tela em que Flávio Tavares produz a partir das obras de um literato
paraibano e que, ao mesmo tempo, traz elementos que estão presentes nas obras literárias, também
apresenta representações de artefatos que são significativos para cultura nordestina e que de
mesmo modo são abordadas na obra que se segue, tendo o retrato da cultura dos engenhos visto
pelos olhos de José Lins do Rego e em suas vivências no engenho da família.
A obra foi criada no ano de 2020, no momento em que o mundo enfrentava a Pandemia da
Covid-19 e que todos foram orientados a fazer um isolamento social. O Artista inicia um processo
de interação com o seu público através das suas redes sociais na web que recebeu o nome de Diário
da Quarentena. Nesse diário, Flávio Tavares passou a gravar vídeos em que apresentava o seu
atelier, fazia demonstrações das diversas modalidades de artes plásticas que produz, além do seu
processo de criação. Nesse contexto, surge uma série de obras com a temática O mundo de Lins,
em que o Artista apresenta todo o processo de criação, desde os esboços e estudos feitos até a
pintura em si, ao passo que vai trazendo as referências presentes na obra de José Lins do Rego,
que também são muito constantes no cotidiano do povo paraibano.
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ROCHA, Acrisonelia Medeiros de Sousa; SANTOS, Raquel do Rosário. Mediação da Leitura Literária por Meio das
Obras Plásticas de Flávio Tavares. Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol.17,
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Figura 3 Fogo Morto
(4)
Fonte: @flaviotavares
Na Figura 3 percebe-se que Flávio Tavares representa o cotidiano de um engenho,
podendo-se notar elementos que remetem a Fogo Morto, obra de José Lins do Rego, publicada em
1943, retratando parte do processo de decadência enfrentado pelos engenhos de cana-de-açúcar na
região Nordeste. E justamente por conta deste processo de decadência, os engenhos passaram a ser
de fogo morto, o que quer dizer que encerraram a produção e foram desativados.
No romance é possível perceber a junção do real com o imaginário decorrente da memória
do autor, pautada em sua vivência no engenho, no tempo histórico em que viveu, como também
na conjuntura política, econômica e social, mas especialmente do homem, o ser social que sofre
influência na sociedade em que está inserido e pode influenciar. Fogo Morto além de
autobiográfico é a representação da memória coletiva do senhor de engenho, das pessoas
escravizadas, da dona de casa, do artesão, enfim, de todas as pessoas que de alguma forma
vivenciaram tal realidade.
Na referida tela, em primeiro plano, destaca-se um momento de reunião dos trabalhadores
do engenho para fazer a refeição no final da “lida” em um longo dia de trabalho, com algumas
mulheres preparando a comida enquanto alguns outros trabalhadores vão chegando para fazer a
refeição. Tem-se também a representação do que pode vir a ser o coronel Lula de Holanda, o
proprietário do Engenho Santa , com suas tradicionais vestes, o chapéu e a sua bengala. O
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coronel era um homem com completo despreparo para a função de administrador do engenho. Ao
seu lado, encontra-se a figura de um lobo, uma possível representação do Mestre José Amaro,
artesão que trabalhava na fabricação de selas, um homem amargurado, orgulhoso e rancoroso que
possui a fama de virar lobisomem pelo fato do mesmo sofrer de insônia e constantemente andar
no meio da noite.
Além dos carros de boi, são retratadas também as diversas instalações que formavam o
engenho, a casa-grande, a casa de purgar, o bueiro, a cavalariça e a senzala. Portanto, observou-se
que dentro das imagens que compõem a tela analisada, fica perceptível os traços contidos em outras
obras do mesmo autor, por exemplo, as telas em que se observam signos visuais característicos da
obra de José Lins do Rego. Pode-se identificar, ainda, a repetição de elementos com as passagens
em meio ao contexto de engenhos, de como era o cotidiano de trabalho, como era o comportamento
social das pessoas tidas como donas do referido espaço e dos demais sujeitos que ali se
encontravam em uma situação subalternizada.
Com base no exposto, considera-se a afirmação de Paulo Freire (1989) de que a leitura do
mundo precede a leitura da palavra, fomentando um processo de consciência crítica da realidade
apresentada. Percebe-se, que Flávio Tavares realiza uma mediação indireta da leitura literária,
apresentando situações retratadas nas obras de José Lins do Rego, como também na de José
Américo de Almeida (obra apresentada a seguir), visto que o Artista se utiliza de sua arte para
promover a reflexão a respeito das relações sociais, das condições de trabalho, como também
propiciar um processo reflexivo que fundamenta a conscientização por parte dos sujeitos, por meio
da mediação da leitura que realiza, tendo como dispositivo as suas obras.
Ainda seguindo nesse tema dos engenhos, observa-se mais uma obra de Flávio Tavares,
aqui retratada como Figura 4, que remete a outro escritor paraibano, José Américo de Almeida,
que transparece a saga de retirantes da seca que seguem em busca de sobreviver e assim se deparam
com a realidade vivida nos engenhos do brejo.
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ROCHA, Acrisonelia Medeiros de Sousa; SANTOS, Raquel do Rosário. Mediação da Leitura Literária por Meio das
Obras Plásticas de Flávio Tavares. Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol.17,
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Figura 4 A Bagaceira
(5)
Fonte: Dados da pesquisa
O painel que é referenciado por meio da Figura 4 traz, além da representação da família de
José Américo de Almeida, o mesmo nome do romance e cenas que remetem à sua obra. O referido
romance aborda a situação em que viviam os sertanejos que buscavam sobrevivência em outros
lugares. Além das inaceitáveis questões como a exploração da mão de obra e do sofrimento
humano abordada no romance, também outro tema igualmente inconcebível: a exploração
sexual.
Observando-se o quadro da esquerda para a direita é possível perceber que a Figura 4 retrata
cenas características do sertão em tempo de estiagem. Nota-se a aridez do local, com poucos
animais e pessoas que resistiram, se organizando para sair em busca de sobreviver. A imagem foi
uma homenagem que Flávio Tavares fez a Linduarte Noronha, cineasta considerado precursor do
Cinema Novo, nascido em Pernambuco e criado na Paraíba. Aruanda retrata a história da
comunidade existente na Serra do Talhado, na região de Santa Luzia, com a narrativa pautada na
história de sua formação como também da sobrevivência de seus descendentes que é assegurada
pelo trabalho das mulheres, em sua maioria, na produção e venda de potes e panelas de barros
produzidos artesanalmente. O filme também aborda questões como o fato de viverem
institucionalmente isolados e a precariedade existente na comunidade, características claras
também retratadas no painel de Flávio Tavares.
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O painel apresenta em sua centralidade a representação do núcleo familiar de José Américo
de Almeida. Observa-se sentados da esquerda para direita D. Alice (esposa), o próprio José
Américo, D. Josepha e Sr. Ignácio (pais do escritor), além de uma figura ficcional e a figura de um
menino sentado ao chão, que segundo Flávio Tavares, vem a ser o próprio José Américo de
Almeida quando criança. Vê-se também de e mais atrás no mesmo sentido a filha Selda, José
Américo Filho e outra figura ficcional com um carcará pousado em seu ombro, uma referência ao
momento de fome enfrentado pelos retirantes sertanejos. Na sequência, tem-se a representação da
figura do filho Reynaldo, como também de outras duas figuras ficcionais e de um boi bem nutrido
em contraponto à realidade do sertão nos períodos de seca.
Em um terceiro plano, percebe-se no alto de um morro a figura de um sertanejo de joelho
fazendo suas súplicas. Entende-se que as imagens aqui descritas são apresentadas de modo que
representassem a dialética existente entre o sertão e o brejo, ou seja, a falta de água para a
abundância da mesma; a escassez de tantos para a fartura de poucos, fato que aponta para
importância de se refletir a respeito das consequências que decorrem da realidade descrita.
Na parte mais à direita do painel tem-se a representação de mais elementos que remetem
ao romance e que retrata de maneira clara que apesar de não sofrer por questões relacionadas com
a seca, o povo que vive no brejo, subjugado aos mandos dos latifundiários, também vivem em
estado de grande sofrimento, fato que fica notório quando José Américo de Almeida aponta através
de citações apresentadas no prefácio do romance em questão, que: “Há uma miséria maior do que
morrer de fome no deserto: é não ter o que comer na terra de Canaã.” Ao fazer a leitura do romance,
a referida citação ganha ainda mais sentido diante da realidade em que vivem as pessoas que
trabalham nos engenhos.
A exemplo disso, pode-se apontar na imagem uma mãe com a criança deitada em seu colo,
enquanto aguarda alguém que compre as macaxeiras que estão em um balaio - homenagem feita
por Flávio Tavares a Antonio David Diniz, ao apresentar uma releitura de uma de suas fotografias
feita nos anos 1980. É notório o estado sofrível que se encontram essas pessoas que depois de
serem escravizadas por um longo período de tempo, foram lançadas ao mundo sem a menor
condição de sobrevivência, visto que não tinham nem para onde ir e, apesar de viverem em um
ambiente de fartura, são obrigadas a passar por tantas privações. O que não difere muito dos demais
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que se sujeitaram a permanecer trabalhando em troca de comida e de um teto precário, além de
outros trabalhadores, a exemplo das figuras do vaqueiro e do cortador de cana, que ocupam funções
específicas no engenho e que são também explorados em outras medidas.
É importante também considerar o fato de que esta obra de Flávio Tavares apresenta
intencionalmente uma estrutura em que o centro é ocupado pela classe média alta composta
unicamente de pessoas brancas, enquanto que nas duas extremidades do painel estão representadas
as classes sub-representadas e desfavorecidas econômica e socialmente, que apesar de ser
responsável pela mão de obra que sustenta o país não dispõe da possibilidade de usufruir dos bens
que produz e como acontece na vida real, está sendo ali retratada literalmente no que se
convencionou a chamar de periferia.
Assim, nota-se que Flávio Tavares toma como base o romance A Bagaceira para realizar
uma crítica sobre um processo histórico, que ainda se mantém impactando as relações sociais,
especialmente de trabalho e sobrevivência, de grupos sociais que são mantidos em situação de
vulnerabilidade. Observa-se a postura protagonista do Artista ao tomar consciência e mediar uma
leitura crítica e reflexiva por parte de outros sujeitos sobre tais fatos, favorecendo que um ato de
mudança a favor do coletivo possa ser fortalecido.
Flávio Tavares promove o compartilhamento de suas leituras, visto que, assim como ele lê
as obras literárias dos escritores paraibanos, também o faz com a fotografia e nela encontra
informações que precisa para inspirar sua obra e realizar a mediação desses dispositivos para os
leitores que têm acesso a sua arte. Dessa maneira, o Artista realiza uma mediação da leitura de
mundo, visto que representa o cotidiano do povo brasileiro, especialmente paraibano, como
também dos dispositivos sonoros, imagéticos, entre outros, em que integram sua obra. Essa
associação entre dispositivos que Flávio Tavares evidencia é tratada por Martins (1988) quando se
refere à leitura por meio dos diversos dispositivos e defende que esse ato deva ser considerado
como um processo de compreensão de expressões, sejam elas simbólicas ou formais, independente
do meio que seja acessado. Portanto, a obra de Flávio Tavares, além de ser inspirada na literatura,
também apresenta a relevância de outros dispositivos como o cinema, a música e, nesse caso, a
fotografia.
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Diante do exposto, pode-se perceber que Flávio Tavares promove o encadeamento de sua
obra com outras expressões artísticas, possibilitando que o leitor de suas produções tenha a
oportunidade de conhecer os mais variados repertórios a que ele tem acesso e que lhe serve de
inspiração, ao mesmo tempo em que ele realiza essa mediação.
5 Conclusões
A partir dos resultados analisados, observou-se que Flávio Tavares produz sua arte
considerando que o sujeito que tem acesso a ela possa desenvolver o pensamento crítico e
compreender melhor sua realidade, buscando meios para transformá-la. Constatou-se que o Artista
atua de maneira consciente do seu papel social por meio da produção artística, alinhada ao contexto
sociocultural do seu espaço geográfico, histórico e temporal. Flávio Tavares possibilita ao leitor,
independente da fase de vida em que está, (re)conhecer os problemas sociais decorrentes de um
percurso histórico e político que fundamentam os dias atuais e que mantém grupos sociais ainda à
margem da sociedade e da garantia de seus direitos.
Através da investigação também se pôde reconhecer a atuação de mediador da leitura de
Flávio Tavares, ao agir como um produtor de dispositivos (telas de pinturas) carregados de
elementos que propiciam aos sujeitos a atribuição de sentido. Enfatiza-se que a produção artística
de Flávio Tavares demonstra sua criatividade e criticidade, contextualizadas em seu lugar de
pertencimento. Essa mediação é realizada de maneira consciente e viabiliza aos sujeitos, inclusive
àqueles colocados à margem da sociedade, o acesso e a apropriação dos bens culturais,
favorecendo a inclusão e o desenvolvimento desses sujeitos, como leitores críticos que podem
reconhecer elementos que são simbólicos e representativos de seu povo, percebendo também a
trajetória em que seus ancestrais vivenciaram e observarem que pertencem a um povo forte, que
luta pelos seus direitos e buscam melhores condições de existirem no mundo, conduzindo-os ao
alcance de uma postura protagonista.
É importante também destacar que o próprio Artista se considera um agente da mediação
da leitura, chegando a afirmar durante a entrevista concedida que compartilha aspectos
relacionados a sua vivência, as leituras que realizou das obras literárias, como também de outros
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dispositivos que teve acesso. A partir dos resultados aqui apresentados e discutidos, como também
das considerações que foram alcançadas, é possível constatar evidências de vestígios identitários
e memorialísticos desse produtor, dos literatos, como também do povo paraibano. Essa percepção
transparece a conscientização desse Artista em sua atuação como mediador indireto da leitura que
apoia o processo de acesso à informação, por meio dos dispositivos por ele produzidos e que teve
acesso, favorecendo a relação da leitura de mundo e da leitura dos dispositivos, com ou sem
palavras.
Notas
(1) O Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta - foi publicado em 1971, romance que
vinha sendo escrito por Ariano Suassuna desde 1958. Foi traduzido para o alemão e o francês e também
apresentado como microssérie de uma tv brasileira.
(2) Obra criada em 2000; Acrílica sobre tela. Integra o acervo da Academia Paraibana de Letras, em João Pessoa.
(3) Obra criada em 1995; Bico de pena aquarelado. Integra Acervo Particular, em João Pessoa.
(4) Obra criada em 2020; Acrílica sobre tela. Integra um acervo particular, em Recife.
(5) Obra criada em 2012; Óleo sobre tela. Integra o acervo da Universidade Federal da Paraíba - CAMPUS I, em João
Pessoa.
Referências
Almeida júnior, Oswaldo Francisco de. Mediação da informação e múltiplas linguagens. Tendências da
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Received: 23/08/2023 Accepted: 18/09/2023