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SAMPAIO, Denise Braga. A Hipervelocidade nas Redes Sociais Online: perspectivas filosóficas e informacionais.
Brazilian Journal of Information Science: research trends, vol. 17, publicação contínua, 2023, e023044. DOI:
10.36311/1981-1640.2023.v17.e023044
A HIPERVELOCIDADE NAS REDES SOCIAIS
ONLINE:
perspectivas filosóficas e informacionais
Hyperspeed on online social networking: philosophical and informational perspectives
Denise Braga Sampaio (1)
(1) Universidade Federal da Bahia, Brasil, denise.sampaio@ufba.br
Resumo
Trata-se de um estudo teórico cuja questão de pesquisa é como a hipervelocidade da circulação de
informações nas redes sociais funda um novo sujeito informacional? O objetivo é enveredar por uma
discussão teórica a respeito da temática e caracterizar este novo sujeito informacional, com base nos
conceitos de aldeia global, de Marshall McLuhan (1994), da positividade, do cansaço e da transparência de
Byung-Chul Han (2017a, 2017b), para entender o fenômeno da hipervelocidade da disseminação e
reprodução da informação e de seu reverso, a desinformação. O universo da pesquisa levou em consideração
as ferramentas e mecânicas das redes sociais online Facebook, Instagram e Twitter, além do relatório We
are Social e Hootsuite, de 2022. Foi possível perceber que a dinâmica destes serviços traz uma nova relação
das pessoas com a informação. A hipervelocidade, o cansaço, a necessidade de estar em evidência nestas
redes causa não somente sofrimento, mas dificuldade de apreender informação e de não estar
constantemente nestes espaços, opinando, interagindo, de maneira transparente e irreflexiva.
Palavras-chave: Sociedade da Informação; Sociedade da Transparência; Sociedade do Cansaço; Redes
sociais.
Abstract
This is a theoretical study whose research question is how does the hypervelocity of information circulation
in social networks establish a new informational subject? The objective is to embark on a theoretical
discussion on the subject and characterize this new informational subject, based on the concepts of global
village, by Marshall McLuhan (1994), of positivity, tiredness and transparency by Byung-Chul Han (2017a,
2017b), to understand the phenomenon of hypervelocity of the dissemination and reproduction of
information and its reverse, disinformation. The research universe took into account the tools and
mechanics of the digital social networks Facebook, Instagram and Twitter, in addition to the We are social
and Hootsuite report, from 2022. It was possible to perceive that the dynamics of these networks brings a
new relationship between people and information. Hypervelocity, fatigue, the need to be in evidence in
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these networks causes not only suffering, but also difficulty in apprehending information and not being
constantly in these spaces, giving opinions, interacting, in a transparent and unreflective way.
Keywords: Information Society; Transparency Society; Fatigue Society; Social networking.
1 Introdução
Inicia-se esta pesquisa com uma alegoria, para tratar da hipervelocidade na
contemporaneidade, por meio do universo da Detective Comics (DC). Mais especificamente com
o personagem Barry Allen, que, ao vestir sua roupa escarlate, torna-se Flash, um velocista cunhado
a partir da explosão de um acelerador de partículas sob a tutela do Laboratório S.T.A.R. Este
evento fora responsável por torná-lo um meta-humano, da categoria speedster, cuja
hipervelocidade adquirida auxilia na resolução de crimes, na cidade de Central City (Colorado,
USA).
O personagem passa a conviver com seu corpo trabalhando em velocidade sobre-humana,
enfrentando questões morais a respeito do poder adquirido e o utilizando em favor da polícia local,
a priori, como um justiceiro. Prática bastante comum dos personagens dos universos da DC e da
Marvel Comics. No entanto, o que chama a atenção, e por isso o uso dos termos speedster e
multiverse em alguns momentos da pesquisa, é como a velocidade é abordada nessa estória e a
possibilidade de interseção com o contexto atual do uso constante das redes sociais online. A
alegoria, neste sentido, serve à discussão para entender que há uma potencialidade metafórica no
personagem Barry Allen, que reflete um sujeito informacional contemporâneo, marcado pela
necessidade de otimização do tempo, pela hipervelocidade e pela busca constante de superação
desta velocidade, que se percebe na própria mudança de mecânica das redes sociais online e dos
próprios sujeitos informacionais conectados, por meio destas.
As redes sociais online são, na perspectiva de Zenha (2018), o espaço síncrono e assíncrono
de interação, em meio digital, que oportuniza a o estabelecimento de relações e laços sociais,
ademais e consequentemente, serve também como local permanente de comunicação e troca de
informações sem que sejam afetadas por barreiras geográficas.
uma estética, conforme observado na sequência deste artigo, que convida à permanência
nas redes sociais online e ao consumo perene e acelerado de informações. Exemplo disso, o Twitter
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conta com aproximadamente 1,3 bilhão de usuários, um fluxo de 500 milhões de postagens diárias
e 211 milhões de usuários monetizados (AHLGREN, 2022), sendo chamado de Twitosfera
(ALVES, 2011), graças a esses números elevados. No Brasil, segundo dados de 2023, a maior rede
social online é o Facebook, contando com 109 milhões de usuários (VOLPATO, 2023). Essas
interações na casa dos milhões refletem a ideia de hiperconectividade de que fala McLuhan (1994),
que a batizou de aldeia global. O mesmo autor entende as tecnologias como próteses, extensões
dos sentidos humanos. Extensões estas, que exacerbam a capacidade de digerir as informações
circulantes. Uma vez que são deglutidas, sem que se possa absorver plenamente seus conteúdos.
É o que mostra o estudo Social clicks: what and who gets read on Twitter (GABIELKOV;
CHAINTREAU; RAMACHANDRAN; LEGOUT, 2016), apontando que aproximadamente 59%
dos links compartilhados nas redes sociais não chegam a ser clicados.
A estética em rolagem de feed, dessas redes sociais online, propicia interações rápidas,
superficiais e acríticas, sendo a reprodutibilidade a tônica e a criatividade, a exceção, conforme
verifica o filósofo sul-coreano Han (2017a, 2017b). A interação com o tempo, com a ociosidade
são diferenciadas. É com base neste preâmbulo que se interroga como a hipervelocidade da
circulação de informações nas redes sociais funda um novo sujeito informacional, o qual se
nomeia, nesta pesquisa, como speedster, em alusão ao seriado Flash. O objetivo é enveredar por
uma discussão teórica e conceitual a respeito da temática e caracterizar este novo sujeito
informacional, com base em Han e Mcluhan, sendo este sujeito enredado na hipervelocidade da
comunicação e [re]produção da informação, na digital influência, na permanência e manutenção
de redes sociais online e na dificuldade de assimilação entre informação e desinformação.
2 Trajetória da pesquisa
Esta pesquisa se trata de um estudo teórico e conceitual com base nos conceitos de aldeia
global, de McLuhan (1994), e dos conceitos de positividade, cansaço e transparência de Han
(2017a, 2017b), para entender o fenômeno da hipervelocidade da disseminação e reprodução da
informação e de seu reverso, a desinformação.
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Para isso, se vale do método fenomenológico, uma vez que, conforme Zahavi (2019, p. 8),
[...] a fenomenologia oferece toda uma série de análises teóricas ligadas ao conhecimento e à
ciência [...] por exemplo, análise de conceitos como verdade, evidência [...]”. A Fenomenologia
“[...]compreende o sujeito como ser-no-mundo assentado corporalmente, socialmente e
culturalmente [...]” (ZAHAVI, 2019, p. 8). Ainda segundo o autor, o fenômeno deve ser
compreendido como “o modo de aparição do próprio objeto” (ZAHAVI, 2019, p. 13), que se
mostra, que se revela por ele mesmo. Neste sentido, a fenomenologia é concebida como uma
análise filosófica “dos diversos modos de aparição [...] como uma investigação reflexiva das
estruturas compreensivas, que permitem aos objetos se mostrarem como aquilo que são”
(ZAHAVI, 2019, p. 13).
O método fenomenológico, neste sentido, auxilia a compreender que o objeto-fenômeno
(que não são as redes sociais digitais, mas as interações que coexistem nelas) pelo qual se limita a
relação de hipervelocidade que se estabelece e que propõe uma nova interação com a informação,
inaugura novos modos dessa sociedade, pautados na efemeridade informacional, no consumo e na
repetição.
Para viabilizar a pesquisa, utiliza-se as seguintes etapas do referido método, (1) de redução,
(2) descrição e (3) interpretação (MARTINS; BICUDO, 1983), investigando a (1 e 2) estrutura do
Instagram, do Facebook e do Twitter quanto à sua mecânica e estética e os números de interação
destas redes; para, então, traçar concepções filosóficas e informacionais que ajudem a entender o
fenômeno da hipervelocidade nesses espaços, bem como suas consequências diretas. Trata-se,
portanto, de uma pesquisa descritiva, quali-quantitativa e teórica.
3 Sociedade da informação transitória
A Sociedade da Informação é inaugurada pela ode às tecnologias como tônica econômica,
industrial, cultural e social do século XX. O desenvolvimento, a popularização e as constantes
atualizações dos Personal Computers (PC) redistribuem das mãos de muito poucos, para as mãos
de poucos, a oferta destas máquinas, recriando a ideia de elite. Com essa primeira onda da
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popularização dos computadores surgem as categorias inforricos e infopobres (RAMONET,
1998).
Segundo o Livro Verde da Sociedade da Informação (TAKAHASHI, 2000, p. 3),
Assistir à televisão, falar ao telefone, movimentar a conta no terminal bancário e,
pela Internet, verificar multas de trânsito, comprar discos, trocar mensagens com
o outro lado do planeta, pesquisar e estudar são hoje atividades cotidianas, no
mundo inteiro e no Brasil. Rapidamente nos adaptamos a essas novidades e
passamos em geral, sem uma percepção clara nem maiores questionamentos
a viver na Sociedade da Informação, uma nova era em que a informação flui a
velocidades e em quantidades apenas poucos anos inimagináveis, assumindo
valores sociais e econômicos fundamentais.
Para que tais atividades fossem possíveis, ainda segundo Takahashi (2000), era necessária
uma convergência entre computação, comunicações e conteúdo, cujo resultado era a construção
de infovias (vias de informação). Essas infovias, que o autor também chamou de superestradas,
possibilitou, e possibilita até hoje, o trânsito de informações. A informação sai de uma categoria
dispersa resultante das interações sociais humanas, para se tornar um insumo (TAKAHASHI,
2000). O ingresso na Sociedade da Informação trouxe a sensação de democratização do acesso a
este insumo.
A expressão ‘sociedade da informação’ passou a ser utilizada, nos últimos anos
desse século, como substituto para o conceito complexo de ‘sociedade pós-
industrial’ e como forma de transmitir o conteúdo específico do ‘novo paradigma
técnico-econômico’ [...] Esta sociedade pós-industrial ou, “informacional”, como
prefere Castells, está ligada à expansão e reestruturação do capitalismo desde a
década de 80 do século que termina. As novas tecnologias e a ênfase na
flexibilidade ideia central das transformações organizacionais têm permitido
realizar com rapidez e eficiência os processos de desregulamentação, privatização
e ruptura do modelo de contrato social entre capital e trabalho característicos do
capitalismo industrial (WERTHEIN, 2000, p. 71-72).
O Livro Verde da Sociedade da Informação no Brasil (TAKAHASHI, 2000) destaca, no
entanto, que esta democratização apresenta lacunas, as quais Marques (2012) chama de fossos
informacionais. Nos anos 2000, houve um incentivo à aquisição de aparelhos de telefonia móvel,
mas os computadores eram, ainda, pouco acessíveis (TAKAHASHI, 2000). Foi neste contexto que
o governo brasileiro criou o Comitê para a Democratização da Informática, que buscou parcerias
para incentivar e implementar políticas de acesso a computadores e à Internet.
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Mais de vinte anos depois, o que mudou? Segundo dados da Pesquisa Nacional de
Amostras por Domicílio (PNAD), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), 82,2% dos domicílios nacionais possuem acesso à Internet (PESQUISA... 2021). Este
levantamento mostra que 12,6 milhões de domicílio não tem tal acesso. Mostra, ainda, que mesmo
passados quase vinte anos desde a concepção do Livro Verde até o momento, prevalece o acesso
maior à telefonia móvel (99,5% dos domicílios), em detrimento do computador (45,1% dos
domicílios). A televisão, por sua vez, perdeu espaço (no final da década de 1990, atingia 86% dos
domicílios e, atualmente, 31,7%). Cabe destacar que as funções dos telefones móveis à época do
Livro Verde, eram muito distantes da realidade tecnológica atual, que transformou os celulares em
inteligentes, em smartphones.
Estes smartphonesnão tem a ligação tradicional (de áudio) como principal função, mas
armazenam agendas, contatos, músicas, jogos, bem como fotografias (que são também tiradas por
estes aparelhos), fazem chamadas de vídeo, transações bancárias etc. Essa multifuncionalidade dos
smartphones exacerbam a ideia de próteses do sentido (MCLUHAN, 1994), que seria a ideia de
que os artefatos criados pela humanidade servem a esta para potencializar suas habilidades, ou
mesmo suprir àquelas que o corpo não consegue fazer de maneira otimizada. A simbiose
instaurada, na contemporaneidade, entre smartphones e as pessoas que o possuem parece quase-
vital, fazendo surgir uma necessidade de estar perto dele, assim como a necessidade social de
estar vestido. Eis que surge a nomofobia (no + mobile + phobia), que indica o medo ou a angústia
de ficar offline ou sem uma tecnologia que permita a comunicação (MAZIERO; OLIVEIRA,
2016).
Essa nomofobia reforça outra ideia trabalhada por McLuhan (1994, p. 16) de que “O meio
é a mensagem”. O uso de smartphones é a tônica do sentir-se incluindo, ou não-excluído. Em uma
sociedade dita da informação, não possuir o principal meio de acesso a ela é estar fora dessa
sociedade.
Tal afirmação pode parecer exagerada, apocalíptica. Mas não é este o objetivo, nem
tampouco, está, tal afirmação, deslocada da realidade. Basta observar as configurações
informacionais e de comunicação do período da Pandemia de Covid-19
(1)
. O trabalho remoto foi
a alternativa econômica encontrada por rias corporações, em respeito ao isolamento social, até
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que o número de casos de infecção declinasse, ou que se achasse uma forma de desacelerar o
contágio do vírus. As aulas, antes presenciais, tiveram de ser realizadas diretamente das casas de
professores e estudantes intermediados por aparelhos conectados à Internet (computadores, tablets
e celulares).
Os governos criaram aplicativos acessíveis, via smartphone, para que determinados
programas sociais pudessem ser solicitados, como o Auxílio Emergencial, recurso financeiro
disponibilizado, no ano de 2020, pelo Governo Federal a trabalhadores de baixa-renda que estavam
desempregados ou que precisavam de renda complementar para se manter, no contexto da
Pandemia de Covid-19
(2)
. Na realidade brasileira, no entanto, aproximadamente 12,6 milhões de
domicílios não possuem acesso à Internet. 12,6 milhões de família não teriam como usufruir de
tais benefícios, por consequência. Segundo dados da Fundação Getúlio Vargas, a exclusão digital
e as barreiras tecnológicas foram fatores determinantes para não se conseguir o benefício do
Auxílio Emergencial. Quanto mais pobre, maiores e mais recorrentes eram as queixas dessa
impossibilidade de acesso. Ou seja, quem mais precisava deste auxílio é quem menos tinha
condições de tê-lo. Por tanto, a exclusão digital é, também, uma exclusão social.
Além disso, uma outra barreira para àqueles que possuem aparelhos com acesso à
Internet, mas não sabem utilizá-los. Neste caso, nem sempre alguém que possui um smartphone,
ou com acesso à Internet, saberá utilizá-lo. Infere-se, neste sentido, que além da barreira de acesso,
a barreira de uso e de conhecimento técnico mínimo para este fim, como pode ser verificado no
Gráfico 1.