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REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO DE PRODUÇÃO DA
HIPERMÍDIA NA PESQUISA ANTROPOLÓGICA
REFLEXIONES SOBRE EL PROCESO DE PRODUCCIÓN DE
HIPERMEDIA EN LA INVESTIGACIÓN ANTROPOLÓGICA
REFLECTIONS ON THE HYPERMEDIA PRODUCTION PROCESS IN
ANTHROPOLOGICAL RESEARCH
DOI:
https://doi.org/10.36311/1982-8004.2024.v17.e024004
Artigo
Recebido: 15/02/2022
Aprovado: 02/04/2024
Publicado: 13/05/2024
_________________________________
Maria Grazia Cribari Cardosoª
https://orcid.org/0000-0003-2873-237X
ª Doutora em Antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife,
Pernambuco, Brasil. Professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE),
Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail: mariagraziacardoso@gmail.com
Artigo
Original
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Resumo: O objetivo do artigo é avaliar a utilização da multimídia e sua linguagem na
divulgação dos trabalhos científicos. O site foi construído a fim de comunicar os
resultados de uma pesquisa sobre o trabalho feminino nas religiões afro-brasileiras. Esta
investigação revelou que a “Obrigação” no candomblé se refere a todas as atividades
desempenhadas para a realização das cerimônias e a principal é a preparação das comidas
sagradas para o sacrifício aos deuses, posteriormente repartida com a comunidade.
Equiparamos esses trabalhos nos terreiros com os trabalhos domésticos relacionando-o
com a condição do trabalho feminino no cenário local para mostrar o caráter voluntário e
de resistência à exploração quando realizado na comunidade religiosa afro-brasileira. A
questão norteadora deste artigo é examinar se a hipermídia na comunicação científica é
capaz de exprimir ideias conceituais que não estão claras a uma visão imediata. A imagem
principal foi composta em formato de mosaico de fotografias acrescido por uma
diversidade de meios audiovisuais e textos escritos (vídeos, áudio, fotos, slides, resumo e
relatório) que versam sobre as várias faces das atividades das cozinheiras de religião afro-
brasileira desde sua família e seus afazeres domésticos no lar ao seu trabalho remunerado.
A metodologia utilizada foi a interpretação do sentido das obras consultadas com vistas
a criar um quadro de referência que permitiu compreender a lógica da construção do
problema de pesquisa e o nexo com o raciocínio de construção de imagens de sua
divulgação científica. A exibição dos resultados da pesquisa na hipermídia segue o
mesmo fundamento da investigação científica, ou seja, ambas são reconstruções da
realidade social elaborada para responder ao problema levantado. Assim como a
linguagem escrita não substituiu a linguagem falada, o relatório audiovisual não substitui
o relatório escrito. Porém, diferentemente deste, representa o conceitual através da
experiência do sujeito no mundo. Enquanto instrumento de comunicação científica,
contribui com novas condições de diálogo observador/observado porque favorece a todos
os envolvidos na investigação.
Palavras-chave: Antropologia, Pesquisa, Relatório, Hipermídia.
Resumen: El objetivo del artículo es evaluar el uso de la multimedia y su lenguaje en la
difusión de trabajos científicos. El sitio web fue creado con el objetivo de comunicar los
resultados de una encuesta sobre el trabajo femenino en las religiones afrobrasileñas. Esta
investigación reveló que la “Obligación” en Candomblé se refiere a todas las actividades
que se realizan para llevar a cabo las ceremonias y la principal es la preparación de
alimentos sagrados para el sacrificio a los dioses, luego compartidos con la comunidad.
Equiparamos estos trabajos en los terreiros con el trabajo doméstico, relacionándolo con
la condición del trabajo femenino en el escenario local para mostrar el carácter voluntario
y la resistencia a la explotación cuando se realiza en la comunidad religiosa afrobrasileña.
La pregunta rectora de este artículo es examinar si los hipermedia en la comunicación
científica son capaces de expresar ideas conceptuales que no son claras para una visión
inmediata. La imagen principal estuvo compuesta en un formato mosaico de fotografías
más una diversidad de medios audiovisuales y textos escritos (videos, audio, fotografías,
diapositivas, resumen y reportaje) que abordan los diversos aspectos de la actividad de
los cocineros afrobrasileños desde su familia. y tus tareas domésticas en casa a tu trabajo
remunerado. La metodología utilizada fue la interpretación del significado de las obras
consultadas con miras a crear un marco de referencia que permitiera comprender la lógica
de la construcción del problema de investigación y la conexión con el razonamiento detrás
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de la construcción de imágenes para su divulgación científica. La exhibición de resultados
de investigación en hipermedia sigue el mismo fundamento que la investigación
científica, es decir, ambas son reconstrucciones de la realidad social diseñadas para dar
respuesta al problema planteado. Así como el lenguaje escrito no sustituyó al lenguaje
hablado, el informe audiovisual no sustituye al informe escrito. Sin embargo, a diferencia
de ésta, representa lo conceptual a través de la experiencia del sujeto en el mundo. Como
instrumento de comunicación científica, contribuye a nuevas condiciones para el diálogo
observador/observado porque beneficia a todos los involucrados en la investigación.
Palabras clave: Antropología, Buscar, Informe, Hipermedia.
Abstract: The objective of the article is to evaluate the use of multimedia and its language
in the dissemination of scientific works. The website was built in order to communicate
the results of a survey on female work in Afro-Brazilian religions. This investigation
revealed that the “Obligation” in Candomblé refers to all activities carried out to carry
out the ceremonies and the main one is the preparation of sacred foods for sacrifice to the
gods, later shared with the community. We equate these works in the terreiros with
domestic work, relating it to the condition of female work in the local scenario to show
the voluntary nature and resistance to exploitation when carried out in the Afro-Brazilian
religious community. The guiding question of this article is to examine whether
hypermedia in scientific communication is capable of expressing conceptual ideas that
are not clear to an immediate vision. The main image was composed in a mosaic format
of photographs plus a diversity of audiovisual media and written texts (videos, audio,
photos, slides, summary and report) that deal with the various aspects of the activities of
Afro-Brazilian cooks since your family and your domestic chores at home to your paid
work. The methodology used was the interpretation of the meaning of the works consulted
with a view to creating a frame of reference that allowed understanding the logic of the
construction of the research problem and the connection with the reasoning behind the
construction of images for its scientific dissemination. The display of research results in
hypermedia follows the same foundation as scientific investigation, that is, both are
reconstructions of social reality designed to respond to the problem raised. Just as written
language did not replace spoken language, the audiovisual report does not replace the
written report. However, unlike this, it represents the conceptual through the subject's
experience in the world. As a scientific communication instrument, it contributes to new
conditions for observer/observed dialogue because it benefits everyone involved in the
research.
Keywords: Anthropology, Inquiry, Report, Hypermedia.
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Introdução
O artigo visa apoiar o encontro entre a antropologia e a hipermídia. A construção
de repertórios de sons e imagens na pesquisa antropológica não é nova na história da
disciplina. Antropólogos clássicos como Haddon, Franz Boas, Malinowski e Lévi-
Strauss introduziram a fotografia e o cinema no registro etnográfico. Na época
contemporânea as novas tecnologias de comunicação e informação estão presentes na
pesquisa de campo antropológica. O ciberespaço
1
é utilizado tanto como um local para o
desenvolvimento de pesquisa quanto o lugar onde a pesquisa antropológica encontra
novos meios de expressão. Os meios tradicionais de registros de informação na pesquisa
de campo, o diário de campo e as entrevistas converte os seus recursos habituais
acrescidos com fotografias, filmes, sons, que possibilitam novo método rico e
diversificado de coleta e tratamento de informações ao permitir a interação menos
assimétrica entre entrevistador /entrevistado, trazendo novas condições de diálogo ao
facilitar a restituição imediata aos sujeitos da pesquisa.
No ciberespaço, a pesquisa encontra diferentes meios de expressão. A adesão à
mídia, visual e às tecnologias digitais configura-se como novas possibilidades no fazer
antropológico para os pesquisadores, para as populações sujeitos da análise e para o
público que fará uso dela. A esse respeito, a hipermídia
2
é um exemplo. Enquanto
instrumento de comunicação e investigação científica, contribui com novas condições de
diálogo observador/observado porque favorece a participação de todos os envolvidos: aos
sujeitos de pesquisa garante o “direito de acesso aos resultados da investigação” (Código
de ética do antropólogo e da antropóloga, 2021), para os pesquisadores, pode ser resultado
de pesquisa ou fonte de investigação e para o público, através da beleza da linguagem
artística amplia a reflexão e as novas formas de fazer e de divulgar os trabalhos
científicos.
O objetivo deste artigo é avaliar o projeto de construção da hipermídia na
apresentação de resultados de pesquisa antropológica, discutir semelhanças e diferenças
1
Espaço virtual de comunicação onde não há a presença física de seres humanos para se desenvolver o
diálogo
2
Hipermídia é uma tecnologia digital de informação que disponibiliza diversos recursos audiovisuais como
textos, áudios, vídeos, animação, gráficos e outras ferramentas que juntas oferecem uma experiência ao
usuário de apreensão de conhecimento através de meios multimídias variados.
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entre um relatório visual e um relatório escrito e em seguida mostrar a contribuição da
ferramenta digital para os protagonistas da pesquisa.
A finalidade do projeto de hipermídia foi construir um site a fim de comunicar os
resultados da pesquisa sobre o trabalho feminino nas religiões afro-brasileiras.
3
A
literatura antropológica sobre a cultura e a religião negra no Brasil pouco faz menção às
mulheres cozinheiras, considerando que o foco das pesquisas são aquelas de maior
reconhecimento na religião: as sacerdotisas. “Obrigação” no candomblé se refere a todas
as atividades para a realização das cerimônias e a obrigação principal é a preparação das
comidas sagradas para o sacrifício aos deuses e posteriormente repartida com a
comunidade. Na tradição nagô são as filhas de santo que executam a tarefa de cuidar da
cozinha da preparação das comidas sagradas, sob a supervisão da mãe ou do pai de santo.
Equiparamos esses trabalhos nos terreiros com os afazeres domésticos para o lar,
relacionando-o com a condição do trabalho feminino no cenário local, para mostrar o
caráter voluntário e de resistência à exploração quando realizado na comunidade religiosa
afro-brasileira.
Diante do crescimento do interesse do campo antropológico nas tecnologias e
mídias visuais, resolvemos experimentar novas maneiras do fazer antropológico
construindo uma hipermídia cuja finalidade é apresentar os resultados da pesquisa dando
visibilidade a essas mulheres e, simultaneamente, divulgar a investigação. Porém, a
contribuição da hipermídia para a investigação é muito mais ampla do que supomos
incialmente.
Na primeira seção do artigo apresentaremos uma discussão sobre o fundamento
do relatório de pesquisa escrita e do relatório visual revelando suas semelhanças. Na
segunda seção, descrevemos a peça virtual construída e sua contribuição para os
protagonistas da pesquisa.
1. Relatório Visual e Relatório Escrito
No sentido amplo, relatório é um documento escrito, preparado com o objetivo de
transmitir informações sobre fatos observados ou narrar ações desenvolvidas na
3
Disponível em: www.cozinheirasdeterreiro.com.br
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realização de uma atividade, fornecendo informações claras e seguras aos seus
destinatários. Existem várias modalidades de relatórios (administrativo, técnico-
científico, de viagens, de participação em eventos, estágios, etc.) que respondem a
diferentes demandas: desde a organização na gestão administrativa para fundamentar
decisões ou ser um relatório de apresentação de resultados de uma pesquisa científica. O
relatório é uma ponte de comunicação entre o autor e seu(s) destinatário(s), que se
conectam através de uma linguagem comum (Salomon, 1999; UFPR, 2001; Bousquié,
1970).
Denomina-se como “relatório de pesquisaum texto que registra formalmente os
resultados ou o desenvolvimento de uma investigação científica. É elaborado em função
de uma demanda formal de organizações de financiamento ou educacionais para avaliar
o desempenho da atividade científica. Nas palavras de Salomon (1999, p. 225): “O
relatório tem uma posição típica entre os trabalhos científicos: ‘relatar’ a pesquisa em
toda a sua dimensão, desde o planejamento até as conclusões, mas de maneira concisa.
Ao mesmo tempo, deve ser feito visando ao destinatário.” A comunicação e apresentação
dos achados da investigação por meio de relatório escrito é um momento central na
pesquisa porque sintetiza e realça no documento escrito o(s) conhecimento(s)
conquistado(s).
O planejamento da pesquisa tem como passo inicial a determinação do assunto e
sua especificação teórica e operacional transformada em problema de pesquisa. Nas
palavras de Salomon (1999, p.216), “o problema implica: ser dificuldade, ser delimitação,
ser expressão de pensamento interrogativo (dúvida, curiosidade, necessidade,
admiração...)”. Na antropologia e nas ciências sociais, o levantamento da questão
norteadora implica em um deslocamento da apreensão que se tem sobre os sujeitos da
pesquisa porque esta é informada por arcabouços teóricos conceituais da própria
disciplina e gera conhecimento rompendo com a familiaridade e as concepções primeiras
impostas pelo contato direito com os sujeitos da pesquisa, substituindo-as por categorias
que os definem antropologicamente. É através da experiência pessoal e na elaboração
teórica dessa experiência que avaliamos os fatos socioculturais na sua
pluridimensionalidade e na totalidade complexa da qual faz parte. Para tal é preciso
transpor os pressupostos do senso comum que enrijecem as noções primeiras da vida
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social para alcançar as condições e posições sociais que fornecem “a lógica objetiva da
organização e que conduz ao princípio de explicar, (..) atitudes, opiniões e aspirações”
(Bourdieu,1999, p.29). A hipermídia construída para apresentar resultados de pesquisa
atua da mesma forma. Ela foi produzida para responder a indagação inicial da pesquisa,
porém através da imagem visual. A imagem base, através da linguagem artística e técnica,
tem a mesma finalidade: representa a pergunta norteadora e a solução dos problemas
iniciais colocados na investigação. O relatório escrito e o relatório visual respondem e
comunicam as indagações iniciais propostas no estudo e sua resolução.
É sabido que o uso de imagem nas ciências sociais tem crescido. A mídia visual
tem despertado interesse das mais variadas formas, seja enquanto apoio metodológico ou
como objeto de análise. Pink (2001) discute o futuro do uso das tecnologias digitais na
antropologia e postula que esta resulta em grande parte da forma que os profissionais se
engajam no uso das mídias visuais. A hipermídia é uma tecnologia visual que traz muitas
possibilidades para a antropologia porque amplia o diálogo entre a antropologia
acadêmica e antropologia aplicada e também favorece a interdisciplinaridade. Nas
palavras de Pink (2001, p.1), “Isso convida a uma antropologia visual para o século XXI,
que é influenciada e influencia o desenvolvimento da antropologia escrita, e
simultaneamente se afasta de e faz referência a formas textuais existentes”.
O relatório visual no formato de hipermídia, por ser uma mídia que agrupa um
conjunto variado de outras mídias (som, vídeo, imagens e a escrita), permite transmitir
tanto um conhecimento mais conceitual e abstrato (através de textos escritos) como
também a experiência dos sujeitos da pesquisa. Moreira Leite (1998) avalia o uso da
imagem nas ciências humanas e as diversas práticas resultantes do crescimento da
representação visual no texto escrito a fim de, analisando-as enquanto fonte primária para
compreender as questões suscitadas na interpretação da imagem fotográfica, verificar
“que o texto verbal e o visual são polissêmicos e complementares, sendo cada um deles
mais adequado a determinadas utilizações.” A imagem visual, muitas vezes no texto
científico, complementa o texto escrito considerando que a escrita não pode representar
fidedignamente a imagem visual, assim como o texto verbal necessita do discurso para
sua expressão. Nas palavras da autora: “[...] frequentemente, a palavra inclui um valor
figurativo a considerar. O desenho ou a fotografia não reproduzem abstrações.
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Representam um caso concreto, um fato particular, um presente. E isto faz da
apresentação dos resultados de pesquisa através da hipermídia uma forma mais completa
do que a fotografia porque a comunicação, através do relatório visual, abre as
possibilidades do relatório escrito, na função de informar porque alcança múltiplos
destinatários. O relatório visual se afasta e se aproxima do relatório escrito, mas não o
substitui Moreira Leite (1998, p. 43- 44).
No que se refere ao conceito de trabalho, o que significa representar em hipermídia
o trabalho das cozinheiras de terreiro? Considerando que a “Obrigação” no candomblé se
refere a todas as atividades realizadas para a realização das cerimônias, o que nos dizem
as imagens sobre o trabalho feminino na religião afro-brasileira? Até que ponto a
perspectiva cultural explorada neste trabalho permite compreender as mudanças e
permanências da condição destas mulheres na sociedade em geral?
O texto visual sugere um certo olhar, direcionar-se para determinados enfoques
que dizem dos aspectos mais sutis de um dado grupamento social. É revelar, naquele
contexto social específico, o trabalho das cozinheiras nas crenças, concepções e práticas
mágicas que fundamentam o caráter voluntário e de resistência à exploração quando
realizado na comunidade religiosa afro-brasileira.
O desafio da hipermídia, neste caso, é ver além da imagem concreta do trabalho e
ela faz isto ao exibir tanto textos escritos quanto os textos visuais. Para muitas pessoas,
trabalho se refere às atividades ligadas ao mercado de trabalho e todas as outras que não
estejam neste ramo são consideradas como não trabalho. É o caso do trabalho doméstico.
Há uma desvalorização social do afazer doméstico apesar do altruísmo implicado na
execução, pois é pensado como “amor” e “obrigação” da mulher. Igualmente, o trabalho
doméstico remunerado vincula-se a formas inferiorizadas de trabalho com pouca
valorização social, remuneração e proteção social. Todavia, há organizações sociais onde
o trabalho doméstico é encarado como uma dimensão mais ampla porque proporciona
sociabilidade e acolhimento espiritual. É o caso do ofício das cozinheiras de terreiro. A
socialização na atividade é fruto de um trajeto de vida, mas não garante emprego porque
o contexto sociocultural religioso não atribui as características de trabalho profissional à
atividade. O formato clássico da transmissão do conhecimento científico é o texto escrito
e do saber popular é a oralidade. A hipermídia permite uma extensão do relatório escrito
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capaz de traduzir, num texto visual e na linguagem artística, sentimentos e significados
dos “imponderáveis da vida social” (Malinowski, 1984.)
A construção da imagem na apresentação de resultados de pesquisa tem múltiplas
contribuições na investigação social para todos os envolvidos: contribui com novas
condições de diálogo entre o observador/observado, para os pesquisadores, pode ser
resultado de pesquisa ou fonte de investigação e, para o público, através da beleza da
linguagem artística, informa e amplia o saber sobre o tema com informações científicas.
É o que veremos a seguir.
2. A Peça Virtual: um mosaico de fé, trabalho e resistência
A peça visual elaborada como tela principal é a base que abriga o conjunto de
hiperlinks. Foi idealizada enquanto uma “colagem” de fotografias em formato de
mosaico e evidencia a cozinheira, sua fé e serviço, além do produto de seu trabalho: as
oferendas alimentares em toda sua beleza e cores. A esta imagem base inseriram-se
hiperlinks que levam o usuário para o universo da cozinheira de terreiro.
Os orixás são ávidos comedores. A esse respeito Bastide (2001, p.332) é bastante
explícito. Descreve como os mitos retratam estórias de banquetes 'pantagruélicos'. Nas
oferendas dos filhos de santo a abundância, as formas e cores das comidas saltam aos
olhos, “Cada orixá tem seu prato preferido. Os deuses não são apenas comilões, mas
também finos gourmets. Sabem apreciar o que é bom e, como o comum dos mortais, não
comem de tudo”. Nas religiões afro-brasileiras a culinária e as comidas de santo são
elementos ritualísticos estruturadores das crenças nos Orixás. Se a comida profana e o ato
de comer nos remetem, entre outras coisas, a dimensão da emoção e da afetividade, a
comida sagrada nos leva para os aspectos simbólicos e religiosos da alimentação. No
candomblé existem prescrições e proibições alimentares relativas a certas comidas.
“Oxalá nunca vai comer junto de azeite, ele é pro fumo, é o branco, da paz, é um santo
frio, limpo. É muito mel”
4
(Souza; Cardoso, 2011). Nele a comida tem uma função
espiritual e a comida de santo reveste-se de um caráter sobrenatural. A crença nos Orixás
estabelece um tipo de relação entre os filhos de santo e as divindades de forma que os
4
Entrevista concedida por uma cozinheira.
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deuses personificados nos elementos da natureza (água, fogo, terra, ar) exigem uma
atitude ritual em relação a eles. Um Orixá não se mistura com o outro “Quem tocou no
dendê não poderá fazer nada para Oxalá”
5
(Alves, C.; Oliveira, G, 2011).
O saber da cozinheira de terreiro inclui a preparação culinária que pertence a cada
divindade e a mitologia correspondente, além de um saber que envolve os insumos, a
preparação e a oferta da comida ao santo e sua distribuição entre os membros da
comunidade e os visitantes. Tudo isto em observância as tradições da culinária dos orixás
e de cada casa. Toda comida tem seu santo, seu cântico, seu manuseio. A cozinha sagrada
é uma cozinha mágica. A preparação dos alimentos vem acompanhada não só da
combinação dos ingredientes, mas também de palavras mágicas, evocações, cantos e
orações. Assim, a comida de santo também alimenta a alma coletiva do terreiro ao
evidenciar um conjunto de conhecimentos transcendentais partilhados pela comunidade
de crença. “É a felicidade do invisível, não vem com coisas visíveis”
6
.
Considerando que a comida é um elemento chave na religião afro-brasileira
porque a oferta alimentícia aos orixás e à comunidade são constitutivos da celebração ao
santo, a comida no terreiro nos leva ao encontro da encantação e da magia e pretendíamos
que a imagem visual fizesse um convite a conhecer o indizível.
O trabalho das cozinheiras de terreiro, é essencial para o funcionamento da casa
de santo e de seus rituais. Equiparamos a “obrigação” das devotas de cuidar do terreiro
aos afazeres domésticos ou ao trabalho doméstico remunerado. Enquanto o primeiro é
um trabalho que se funda na disponibilidade contínua das mulheres a sua família
caracterizado enquanto tarefas vinculadas aos cuidados prestados às pessoas, em geral
compreendidas na família lar conjugal ou parentela é considerado um trabalho gratuito
desempenhado pelas mulheres. Porém, há uma naturalização como sendo
necessariamente feminino. Muitas vezes esta atividade é “invisível “aos olhos do grupo
familiar. Geralmente ele é constituído por uma sobrecarga de horas despendidas pela
mulher, pois exigem dedicação contínua de tempo e presença em tempo integral. No
entanto, há uma desvalorização da atividade apesar do altruísmo implicado na execução,
5
Idem.
6
Idem.
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pois é pensado como ‘amor’ e ‘obrigação’ da mulher (Hirata, 2009; Fougeyrolles-
Schwebel, 2009; Prado,1979; Melo, 2013).
No que diz respeito ao trabalho doméstico remunerado, atualmente, ainda é uma
das principais ocupações das mulheres pobres e negras mesmo após décadas do fim da
escravidão. Profissão secular das mulheres negras está associada a formas inferiorizadas
de trabalho com pouca valorização social, remuneração e pouca proteção social. A
participação da mulher negra no marcado de trabalho incorpora as desigualdades de
gênero, classe e raça presentes na sociedade brasileira. Se por um lado, este trabalho
representa uma das principais fontes de renda das mulheres negras, por outro lado é fonte
de desigualdades sociais considerando que nele estão às mulheres negras, pobres e com
pouca escolaridade.
Para aquelas mulheres que trabalham fora ele vivenciado com pesar, pois têm que
se dividir entre os afazeres domésticos e a vida profissional e para aquelas exclusivamente
donas de casa é vivenciado como trabalho exaustivo que provoca desvalorização de si
mesma (Prado, 1979; IPEA, 2011; Silva, 2013; Xavier, Werneck, 2013; Melo, Considera,
2013; Nogueira, Jacino, 2013; Melo, 2018).
No entanto, diferentemente do lar e do mercado de trabalho, os trabalhos
domésticos no terreiro são voluntários. É trabalho doado a comunidade de crença. É
expresso como atividade de devoção. É a doação do serviço para o sagrado e a
comunidade. Embora ele seja a continuidade dos afazeres domésticos e do trabalho
remunerado, o trabalho doado ao terreiro é diferente da rotina casa trabalho porque
proporciona sociabilidade mais ampla e acolhimento espiritual. É a participação
voluntária para a vida coletiva do terreiro.
Em contraste com o afazer doméstico para o lar e do trabalho doméstico
remunerado, no candomblé, as mulheres sabem que ao final vão beber, vão comer, vão
brincar e dançar assim como sua família e toda a comunidade de santo (Motta, 1984).
Assim é que a introdução dos links clicáveis superpostos à imagem base sugere a
passagem ao mundo do encantamento a que esta atividade nos leva, tanto quanto o
caminho da pesquisa, que revelou as diversas dimensões sociais do serviço num contexto
cultural específico. Abaixo apresento a imagem construída pela equipe do projeto.
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Imagem 1 - Interface elaborada para o projeto Saber, Trabalho e Sabor de Terreiro em
Hipermídia (Cardoso, 2018)
Fonte: Trabalho e Sabor de Terreiro em Hipermídia (Cardoso, 2018).
As protagonistas são as cozinheiras de terreiro representadas nas suas práticas
religiosas. Em primeiro plano, a mulher negra na sua autonomia e empoderamento.
Altiva, expressa alegria no seu saber fazer tradicional. Por detrás desta imagem e no alto,
a líder da cozinha, revelando a sua força pelo levantamento do braço no manejar das
panelas. Abaixo, sua fé e sua crença, que lhe dão coragem para a resistência. Logo à frente
da primeira imagem, o produto de seu trabalho: a beleza e o cuidado das comidas. Do
lado oposto, a imagem retrata a preparação do alimento, enriquecido de evocação aos
deuses. Embaixo, a devoção e, no centro do mosaico, o oferecimento e a distribuição dos
alimentos.
Os dispositivos clicáveis na imagem base formam a estrutura explicativa da
hipermídia e elas acessam a:
Produção de 01 resumo escrito e 02 relatórios escritos que relatam os resultados
obtidos na investigação, geradores das produções audiovisuais seguintes:
03 vídeos documentários: Os três vídeos foram produzidos para apresentar os
subtemas selecionados de acordo com os interesses da pesquisa, quais sejam, a
“obrigação” das cozinheiras e o produto do seu trabalho. Todos os vídeos foram
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encomendados a dois diretores. Um dos diretores, que produziu dois vídeos, é advogado,
militante do movimento social negro que interage com as religiões afro-brasileiras,
apresentou a leitura audiovisual do tema a partir do olhar ‘nativo’. Por outro lado, o
terceiro vídeo apresenta a interpretação antropológica pela voz do pesquisador.
01 série de fotografias com 30 fotografias de diferentes terreiros gravitando em
torno dos subtemas acima explicitados e acrescidos de imagens que apresentam a
cozinheira na sua atividade profissional remunerada e na família, além de imagens dos
instrumentos de trabalho e do ritual.
01 produção de áudio. O áudio apresenta um canto gravado durante a preparação
de uma comida ritual para evocar a dimensão sagrada da atividade.
O conjunto da hipermídia representa as peças-chaves para a compreensão do
trabalho feminino no terreiro em todas as dimensões na família e na casa, no seu trabalho
remunerado e na sua religião. Eles aprofundam imagens icônicas formuladas no plano da
pesquisa e no relatório escrito. Os links fazem-nos mergulhar nesta experiência. A
hipermídia favorece o trânsito entre o relatório escrito (abstrato) e o relatório visual
(figurativo). As duas linguagens, as duas formas de expressão, são incompletas e
simultaneamente interdependentes, dado que a mutualidade entre o texto escrito e o texto
visual é que constrói a totalidade do fato estudado (Pink, 2001).
Segundo Oliveira (2000), a forma tradicional de expressão do trabalho
antropológico é a escrita. É a linguagem principal por meio da qual se constitui a
disciplina e os pesquisadores se comunicam. No entanto, segundo este mesmo autor: “[...]
o grande desafio hoje é fazer com que a distância entre o discurso feito por imagens,
portanto, uma linguagem feita por imagens e a imagem escrita se aproximem mais”
(Samain; Mendonça, 2000). As imagens que apresentam resultados de pesquisa são
“palavras” visuais. Organizadas, são ferramentas na construção de narrativas
antropológicas com grande capacidade de difusão de ideias, além de ser um recurso de
pesquisa com capacidade de multiplicar as vozes e os olhares para a compreensão
antropológica dos protagonistas da pesquisa: os pesquisadores, os sujeitos e o público.
Esta é justamente mais uma contribuição da hipermídia para a pesquisa, ela “conversa
antropologicamente” com todos eles (Pink, 2001).
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Salomon (1999) apresenta princípios básicos para a realização da pesquisa e da
divulgação científica. A comunicação científica é um conceito abrangente que envolve
tanto apresentação oral e/ou escrita quanto uma variedade de tipos de trabalho. Nas
palavras do autor: “Entender-se-á, então, por divulgação científica: a comunicação ao
público, geral ou particular, de conhecimentos extraídos de obras de divulgação científica
e/ou tratados à maneira científica, com o fim de informar” (Salomon, 1999, p.207). Os
destinatários da informação científica são os especialistas da área e o público em geral,
os primeiros, especialistas, procuram os principais achados da pesquisa, e os leitores
menos especializados, informações abrangentes sobre a ciência.
A hipermídia na divulgação científica avança na comunicação, considerando que
nela é possível atender a um público variado, seja o público em geral, os pesquisadores e
os sujeitos de pesquisa. A hipermídia “é influenciada e influencia o desenvolvimento da
antropologia escrita, e simultaneamente se afasta de e faz referência a formas textuais
existentes”. Pink (2001) explora as possibilidades da hipermídia na antropologia e sua
capacidade de favorecer uma “conversa antropológica” integradora do fazer
antropológico, seja no campo acadêmico ou aplicado. Para os pesquisadores, a hipermídia
impulsiona redes de informações e redes de pesquisadores, tendo em vista que os textos
escritos vinculam as informações produzidas pelos autores para outros autores,
constituindo uma fonte primária que funciona como um banco de dados que disponibiliza
tanto o conteúdo obtido pela investigação científica quanto o conhecimento popular,
expressos através de imagens e áudios.
A antropologia cada vez mais tem examinado as questões éticas na pesquisa
considerando que o processo de investigação coloca o antropólogo entre dois mundos: de
um lado, o mundo dos seus pares, intelectuais e a vida social acadêmica, é o que Geertz
(2002) chama de estar lá. De outro lado, o mundo dos pesquisados, dos excluídos, das
comunidades tradicionais e etnias discriminadas, favelados, operários, leigos em geral, o
estar aqui. A pesquisa social estabelece uma relação entre o mundo do pesquisador e o
mundo dos sujeitos da pesquisa. No entanto, não é mais possível deixar de reconhecer as
desigualdades de que são vítimas os sujeitos tradicionais da pesquisa antropológica. As
técnicas de pesquisa não são neutras e a aplicação de instrumentos de pesquisa em grupos
sociais que são discriminados devem se pautar por concepções respeitosas que promovam
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a interação menos assimétrica entre o pesquisador/pesquisado. É urgente na atualidade
buscar novas condições de diálogos menos pautado na autoridade e no poder do
antropólogo. Além do que, é premente uma construção do conhecimento antropológico
que garanta aos pesquisados o “direito de acesso aos resultados da investigação e o direito
de autoria e co-autoria das populações sobre sua própria produção cultural”, segundo
apregoa o código de ética do antropólogo (Giili, 1972, Thiollent,1987; Oliveira, 2000;
Geertz, 2002; Código de ética do antropólogo, 2021).
A hipermídia enriqueceu nossa prática tendo em vista que a investigação que a
fundamentou foi pensada nos moldes acadêmicos tradicionais, no sentido de que houve
pouca participação dos sujeitos de pesquisa no planejamento inicial. A comunidade
religiosa afro-brasileira é alvo histórico de discriminação e intolerância na sociedade
brasileira e isto interferiu na entrada no campo, que só foi possível em razão de uma rede
de relações que garantiram a entrada dos pesquisadores nos terreiros. Diferentemente, o
projeto de construção da hipermídia exigiu um envolvimento dos protagonistas
7
e isto
permitiu o maior engajamento dos sujeitos da pesquisa através da construção audiovisual,
que suscitou a voz e a interpretação “nativa” da questão, dando acesso a um tipo de mídia
pouco acessível a estas populações, reforçando o empoderamento e dando visibilidade às
mulheres responsáveis pela preparação das comidas religiosas. Acrescenta-se a facilidade
que a ferramenta oferece de restituição imediata dos resultados aos sujeitos da pesquisa.
O saber sociológico pode se encontrar em expressões múltiplas, além da
linguagem escrita. Com essa ideia, Becker (2009) defende que as diferentes formas de
representar a sociedade, as fotografias, as tabelas, os diagramas, por exemplo, são
adequados, desde que se alcance o que se almeja com elas. O autor toma como exemplo
as fotografias para demonstrar que as imagens construídas para representar a sociedade
“são feitas e usadas em organizações sociais, e nós as compreendemos melhor quando as
colocamos neste contexto” (Becker, 2009, p.185). As representações sociais da sociedade
não são fixas e imutáveis e seu significado advém dos contextos sociais dos quais foram
produzidas e de utilização que o usuário fará dela. Nas palavras dele, “(…) a mesma
imagem pode ter significados muito diferentes, de acordo com o seu uso em contextos
7
Toda a pesquisa e a produção audiovisual teve a aprovação dos pais e mães de santo dos terreiros e
cozinheiras(os) e dos sujeitos da pesquisa expressos em termo de consentimento.
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distintos por diferentes pessoas (Becker, 2009, p.200)” e é assim que a imagem responde
e ao mesmo tempo indaga sobre a sociedade, de acordo com o interesse daqueles que as
consomem.
O acesso aberto da hipermídia permite muitos olhares e diferentes linguagens e,
consequentemente, o seu público pode ser muito diversificado também. O mosaico
construído comporta ferramentas que vão da imagem visual à escrita, desde
representações concretas e acessíveis, como as imagens e som para aqueles que procuram
informações gerais, falando também ao público especializado de pesquisadores que
buscam análises da realidade social elaborada em razão de responder ao problema de
pesquisa levantado.
Finalizando, contribuir para dar visibilidade à categoria de mulheres de
comunidades religiosas afro-brasileiras, através do uso da imagem em hipermídia
enquanto forma de apresentar um relatório de pesquisa escrito tradicional, é reconstruir
este universo em toda a sua beleza e cores. Nisso, a linguagem artística, a beleza do
mosaico, faz justiça à força das mulheres negras.
Considerações Finais
A construção do objeto e do relatório constituem dois elementos centrais na
pesquisa. O relatório visual tem semelhanças e diferenças com o relatório escrito. Cada
um, com sua linguagem e expressão específicas, elabora e responde ao mesmo problema
de pesquisa. A hipermídia é um conjunto multimídia que possibilita transmitir um
conhecimento mais abstrato através dos textos escritos e uma informação mais concreta
através das imagens das experiências dos sujeitos de pesquisa. O relatório visual não
substitui o relatório escrito, mas pode amplificar seu alcance para diferentes destinatários,
além de acrescentar, através da linguagem artística, a dimensão dos sentimentos e
significados do tema estudando. Para os protagonistas da pesquisa, abre novas
possibilidades para todos. Para os pesquisadores, reduz a distância entre a antropologia
aplicada e a antropologia acadêmica e impulsiona redes de relações e informações. Para
os sujeitos da pesquisa (e para os pesquisadores), possibilita relações menos assimétricas
e maior participação no resultado final. Para o público, permite o acesso a diferentes
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usuários com diferentes interesses. Pode ser utilizado para refletir sobre o tema e motivar
o debate.
A hipermídia é um exemplo das diversas aplicações da tecnologia visual na
pesquisa e procuramos mostrar sua contribuição na comunicação dos resultados da
investigação considerando que ela promove a aproximação entre o escrito e a imagem.
As novas tecnologias visuais estão presentes na antropologia do planejamento da pesquisa
à apresentação dos resultados e vem estimulando discussões e renovando o campo e o
fazer antropológico.
Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com o apoio da FACEPE, entidade do Governo do
Estado de Pernambuco voltada para o fomento de pesquisa e ao desenvolvimento
tecnológico do Estado
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NOTAS
Agradecimentos: O presente trabalho foi realizado com o apoio da FACEPE, entidade
do Governo do Estado de Pernambuco voltada ao fomento de pesquisa e ao
desenvolvimento tecnológico do Estado.
Financiamento: Financiamento da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do
Estado de Pernambuco - FACEPE
Comitê de ética em Pesquisa: O trabalho respeitou a ética durante a pesquisa, porém
não passou por um comitê de ética.
Contribuições dos autores: Maria Grazia Cribari Cardoso é responsável pela pesquisa,
análise, redação e correções do artigo. Assumindo integral responsabilidade pelo trabalho
e o conteúdo publicado.
Disponibilidade de dados e material: Os dados e materiais utilizados no trabalho estão
disponíveis para acesso por meio das referências disponibilizadas no artigo. E pelo site:
www.cozinheirasdeterreiro.com.br
Conflitos de interesse: A Autora declara não haver conflitos de interesse pertinente.
Publisher Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP),
Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília. Programa de Pós-Graduação Ciências
Sociais. Portal de Periódicos UNESP. As ideias expressadas neste artigo são de
responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos
editores ou da universidade.
Recebido:15/02/2022 | Aprovado: 02/04/2024 | Publicado: 13/05/2024