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O ensino religioso, a losoa e a história da educação brasileira Artigos/Articlesw
O ensinO religiOsO, a filOsOfia e a história da educaçãO
brasileira
Religious education, the philosophy and the histoRy of
bRazilian education
Danilo Nobre dos Santos
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resumO: Pretendemos analisar o problema da disciplina Ensino Religioso em seus aspectos
legais e curriculares na história da educação brasileira, mediante sua estruturação metodológica,
bem como seus processos de constituição, identicação e interação de seus temas em diferentes
contextos educacionais. Ao abordarmos este problema, identicamos interesses econômicos e
políticos diversos e algumas vezes, desencontrados, opiniões dispersas, discussões e tendências, bem
como julgamentos em relação a algumas práticas, além de certa falta de informação referente a
esta temática e sua conceituação, no que se refere também à própria realidade e a necessidade dos
educandos. Consideramos o aspecto legal e curricular do Ensino Religioso um assunto delicado e
complexo, mas ao mesmo tempo, pertinente e de interesse para a compreensão da história da própria
educação brasileira, fazendo-se necessário um aprofundamento adequado na legislação sobre ele, a
m de contribuirmos para um verdadeiro esclarecimento quanto a possíveis reducionismos que
podem ocorrer em torno do estudo do fenômeno religioso, do discurso sobre Deus e da experiência
cultural-religiosa de um povo. Deste modo, nosso intento assenta-se na observação dos vínculos
existentes entre educação e doutrina religiosa e em que medida os conteúdos legais e curriculares
adotados até o presente momento, considerando todas as reformas promovidas, contribuem,
reforçam ou corrigem as disparidades que eventualmente podem ainda estar ocorrendo, com as
novidades da Base Nacional Comum Curricular brasileira.
Palavras-chave: Educação. Ensino Religioso. Currículo. História da Educação.
abstract: We intend to analyze the problem of Religious Education in its legal and curricular
aspects in the history of Brazilian education through its methodological structuring, as well as
its processes of constitution, identication and interaction of its themes in dierent educational
contexts. In addressing this problem, we identify diverse and sometimes disparate economic and
political interests, disperse opinions, discussions and trends, as well as judgments about some
practices, as well as a lack of information regarding this topic and its conceptualization, also refers
to the reality itself and the need of the learners. We consider the legal and curricular aspects of
Religious Education to be a delicate and complex subject, but at the same time pertinent and
of interest for the understanding of the history of Brazilian education itself, making it necessary
Docente na Faculdade João Paulo II, FAJOPA, Brasil. Doutorando em Educação (Filosoa e História da Edu-
cação) – Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE – Faculdade de Filosoa e Ciências – FFC - Univer-
sidade Estadual Paulista - UNESP – Marília/SP – Faculdade de Filosoa e Letras. danilo_nobre@hotmail.com
http://doi.org/10.36311/2447-780X.2019.v5.n1.02.p9
https://doi.org/10.36311/2447-780X.2019.v5n2.03.p25
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to properly deepen the legislation on it, in order to contribute for a real clarication as to the
possible reductions that may occur around the study of religious phenomena, discourse about
God and the cultural-religious experience of a people. In this way, our intention is based on the
observation of the links between education and religious doctrine and to what extent the legal
and curricular contents adopted up to the present moment, considering all the reforms promoted,
contribute, reinforce or correct the disparities that may still be with the news of the Brazilian
National Curricular Common Base.
KeywOrds: Education. Religious education. Curriculum. History of Education.
intrOduçãO
O presente trabalho tem por objetivo apresentar a relação entre as apro-
priações que zemos quanto ao conteúdo da disciplina Filosoa e História da
Educação (Séculos XIX e XX) do Programa de Pós-Graduação em Educação da
UNESP de Marília e a temática desenvolvida em nosso projeto de pesquisa para
o Doutorado em Educação: O Ensino Religioso em seus aspectos legais e curriculares
na história da educação brasileira, como critério de avaliação da referida disciplina.
Pretendemos destacar as diversas contribuições que as discussões, as
aulas expositivas e os painéis integrados propostos na referida disciplina, pude-
ram oferecer ao desenvolvimento de nossa pesquisa, sobretudo ao que se refere à
história da Educação brasileira, que consideramos ser o principal contributo para
o nosso intuito.
Deste modo, apontaremos os aspectos que mais ampliaram nossos co-
nhecimentos acerca do objeto de nossa pesquisa, favorecendo assim, o bom de-
sempenho de nossa empreita, como certamente foi também, o próprio objetivo
da disciplina, além da oportunidade de termos contato com os demais projetos
de pesquisa de mestrado e doutorado dos colegas participantes do mesmo curso.
O objetivo de nosso projeto de pesquisa é explorar a questão dos funda-
mentos legais e curriculares do Ensino Religioso no Brasil, observando sua aplica-
ção no país e nos Estados, mediante o risco de possíveis episódios de proselitismo,
desrespeitando assim a meta principal da disciplina que é justamente aquele de
abordar a diversidade cultural e religiosa brasileira, dentro da história da educação
brasileira, considerando as diversas mudanças ocorridas, suas motivações, tendên-
cias, e possíveis condicionamentos.
De modo especíco, pretendemos observar a evolução (ou não) da pro-
posta de um Ensino Religioso no Brasil, desde a sua implantação, as inuências
do catolicismo enquanto religião ocial do Estado, considerando as normatiza-
ções que regularam a oferta da disciplina nas salas de aula durante os períodos his-
tóricos que nos precederam, com seus contextos próprios, inuências, interesses e
tendências sócio-políticas e religiosas de cada época.
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Pretendemos também analisar de modo especíco, os currículos e as
leis que respaldaram estes respectivos currículos, bem como sua aplicação e os
demais processos envolvidos em cada período histórico, além de sua contribuição
ou não para a evolução da educação brasileira, mediante a transmissão dos valores
proposta pela disciplina no decorrer de seu desenvolvimento, enquanto compo-
nente presente nas unidades escolares.
Nos propomos ainda a abordar a atual discussão acerca do problema
do Ensino Religioso no Brasil proposto na Base Nacional Comum Curricular,
como área de conhecimento ou como componente curricular dentro da área de
Ciências Humanas, no Ensino Fundamental.
educaçãO brasileira e ensinO religiOsO: asPectOs históricOs
Ao longo da história da educação brasileira, podemos observar o En-
sino Religioso presente nas escolas públicas como disciplina obrigatória para a
escola e facultativa para o estudante. A religião sempre foi considerada elemento
presente nos currículos escolares brasileiros. Ocupava centralidade no processo
de escolarização da população. Houve a reforma pombalina
2
, os missionários da
Companhia de Jesus (Padres e Irmãos Jesuítas) foram expulsos do país com seus
trabalhos catequéticos, mas o ensino da religião ocial do Estado Português foi
mantido como componente curricular obrigatório.
No período imperial
3
, cujo credo ocial do Estado nacional era o ca-
tolicismo, seu ensino permaneceu como elemento que integrava o ato de ensinar
nas instituições de ensino do país, uma vez que a colônia assume a religião de seu
colonizador. De modo que o Rei de Portugal e o Papa estabelecem um acordo a
respeito da educação do povo da nova colônia. Assim, mediante um contexto de
Reforma Protestante e Contrarreforma Católica, o catolicismo passa a ser ensina-
do como processo de catequização, com a expectativa de se conquistar e assegurar
novos adeptos para a Igreja Católica Apostólica Romana.
De modo que, ao se fazer uma retrospectiva histórica, compreende-se
que o Ensino Religioso foi utilizado como garantidor de uma formação doutrinal
católica. E era assim que acontecia a formação religiosa do povo brasileiro. A
disciplina era compreendida e utilizada como um instrumento de evangelização
2
Em 1759, Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal (Primeiro-Ministro de Portugal de 1750
a 1777), expulsa os Missionários Jesuítas do Brasil com o objetivo de centralizar o poder que estes detinham
mediante seus processos educacionais e catequéticos. Representou a implantação de um novo modelo educa-
cional para o país e uma tentativa de modernização da sociedade com vistas ao desenvolvimento da economia
portuguesa para manutenção e fortalecimento de seu sistema absolutista.
A Constituição Imperial de 25 de março de 1824 trazia já no início a proclamação de que Pedro I era Impe-
rador do Brasil “por graça de Deus e unânime aclamação dos povos”. E em seu artigo 5º armava que a religião
católica era a religião ocial do Império. (CAMPANHOLE & CAMPANHOLE, 1976).
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e não como um componente curricular a promover e respeitar a diversidade cul-
tural e religiosa.
No Brasil, nos períodos colonial (1500-1822) e imperial (1822-1889),
a legislação referente ao ensino era inuenciada pela religião e isto se devia ao zelo
do Imperador pelo regime do Padroado
4
. Segundo Figueiredo (1995, p. 9-10), no
período de 1800 a 1900,
O Ensino Religioso é atrelado ao sistema de protecionismo da metrópole, concretizado
a partir do juramento do Imperador, em manter ocialmente a Religião Católica, na
forma do artigo 103 da Constituição Política do Império do Brasil, outorgada em 1824.
A situação anterior evoluiu no processo de dependência e de subordinação da religião ao
próprio Estado. A ‘doutrina cristã é uma das partes principais que entra na obrigação dos
professores de primeiras letras’. Nas escolas são usados os manuais de catecismo da dou-
trina cristã, difundidos em diferentes pontos do país, nos padrões do Concílio de Trento.
Com a Proclamação da República em 1889, foi estabelecida a separa-
ção entre a Igreja e o Estado brasileiro, atendendo aos anseios de vários partidos e
movimentos, tais como a Maçonaria, o Positivismo, tanto o Partido Liberal como
o Republicano, além, evidente, dos grupos protestantes. Deste modo, pelo menos
em tese, o Estado se tornou laico e há alguma perspectiva para o reconhecimento
da diversidade religiosa e a liberdade de culto. “O Decreto de separação da Igreja
e do Estado é de 07.01.1890 sob o número 119-A” (CURY, 1991, p. 71).
Essas tendências secularizantes, cuja meta era a própria laicidade, são
colocadas em prática com a assinatura do Decreto
5
, que, enm, separava a Igre-
ja do Estado brasileiro. Então, o Ensino Religioso, a partir desse momento da
história do Brasil, deveria ser “leigo e não mais tutelado por nenhuma tradição
religiosa” (JUNQUEIRA, 2002, p. 10).
Mesmo durante a implantação da República, com suas ideias novas de
escola pública e laica, mediante diversas discussões referentes à manutenção do
estudo da religião, a modalidade não foi abolida e continuou fazendo parte do
cotidiano dos currículos escolares e das normatizações legais. Ou seja, a mudança
ocorrida foi mais teórica do que prática.
A Igreja Católica, por sua vez, questionou a implementação do Estado
laico, mas a Constituição de 1891 “legitimou a separação entre as referidas ins-
tâncias vedando a subvenção, a manutenção e a restrição ao exercício de cultos e
de crenças e, no âmbito da educação, ela se tornou laica na rede pública de ensi-
O Padroado era uma instituição pela qual a Igreja e as monarquias luso-hispânicas estabeleciam e mantinham
entre si acordos e alianças, mediante troca de privilégios, favores e poder. O reconhecimento da religião católica
como religião ocial pela monarquia era parte destes tratados. Até a nomeação de bispos dependia da autoridade
imperial, e os clérigos, eram, de fato, funcionários do império. Os funcionários públicos não clérigos, por sua
vez, tinham o dever de fazer seu juramento de fé, para assumir seus respectivos cargos, inclusive os professores.
Decreto este que não é inteiramente interditivo e até permite em seu artigo 6º, espaço de negociação da Igreja
com os Estados.
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no.” (CAETANO, 2010, p. 3). Na Constituição de 1891, o ensino público apa-
recerá pela primeira vez na esteira das constituições do Brasil, como ensino laico.
É claro que houve discussão a propósito de laicidade. (CURY, 1991, p. 303-384). No
caso, havia questões em torno da subvenção, dos cemitérios e do casamento. A subven-
ção foi vedada, os cemitérios secularizados e o casamento aceito como ocial apenas na
sua forma civil. E foi aceita a plena liberdade de culto e consciência.
Já em relação ao ensino, o § 6º do artigo 72 diz: “Será leigo o ensino ministrado nos estabe-
lecimentos públicos”. Para se chegar a essa formulação, o caminho político-normativo foi
bastante sinuoso. (CURY, 1991, p. 372-382)
Na chamada República nova (1930), há uma reaproximação entre Igre-
ja e Estado. A Revolução de Trinta, marca o retorno da Igreja Católica ao cenário
político brasileiro. Mediante a instabilidade do Governo Provisório, a Igreja se
apresenta agora como instrumento de manutenção da ordem. Desta maneira, na
Constituição de 1934, o ensino da religião tida ainda como ocial, ganha novo
fôlego, apesar das diversas discussões a este respeito e a laicidade do Estado conti-
nuarem movimentando o discurso de muitas lideranças nacionais.
Entretanto, já na primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional, a Lei 4.024/61, em seu artigo 97, encontraremos o dispositivo com de-
terminação para que o Ensino Religioso seja oferecido nos horários normais das
escolas, ou seja, é validado o ensino da religião dentro dos currículos comuns
escolares, embora com matrícula facultativa e sem qualquer ônus para o Estado.
Durante o período da ditadura militar, iniciada em 1964, mais precisa-
mente em 1971, é elaborada uma nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB) para o 1º e
2º graus, a Lei nº 5.692/71 de 11 de agosto de 1971, conhecida como Lei da Pro-
ssionalização do Ensino, que confere ao Ensino Religioso uma visão muito mais
antropológica do que teológica, como era em sua origem, sendo mantido com
caráter obrigatório, mas com matrícula facultativa (Cf. art. 7º § único). Só que
agora extensiva ao que passa a ser chamado ensino de 2º grau. (SAVIANI, 1987).
Equipes de estudo são criadas, bem como toda uma sistemática para
orientar as diferentes séries, com suas respectivas abordagens. No entanto, fato
é que continua sendo aula de religião. Em alguns Estados, ela ganha um caráter
ecumênico ou interconfessional. E assim o Ensino Religioso retorna ao sistema
educacional brasileiro, (por Decreto de um Governo provisório), de onde havia
sido retirado em 1889.
A Lei nº 5.692/71 e a Lei 7.044/82 que se lhe sucedeu, reconhecem o exercício do
magistério do ensino religioso da mesma forma como atribui à autoridade eclesiástica
respectiva a competência para nomear, registrar, acompanhar e treinar os professores de
ensino religioso.
Isso se conrma com o Parecer CFE nº 853/71 (BRASIL, DOCUMENTA, 1971) que
inclui a Educação Religiosa em Outras Atividades. (CURY, 1993, p. 30).
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E assim, o professor de Ensino Religioso passa a ser pago pelo Estado,
além de ter garantido seu enquadramento na carreira docente ocial. Isso ocorreu
na maioria dos Estados da Federação, mediante a estruturação das Secretarias Es-
taduais de Educação para estas nalidades. Em alguns lugares são celebrados con-
vênios, em outros, foram criadas comissões, núcleos, setores, departamentos, etc.
Com a redemocratização do Brasil, em 1985, é promulgada uma nova
Constituição Federal, em 1988 e a questão do Ensino Religioso retorna, duran-
te os debates da Constituinte de 1987-88 e nas consequentes Constituições es-
taduais. Sobre a referida disciplina, Pinheiro (1991), em sua pesquisa sobre a
Constituinte, destaca: “Sobre o Ensino Religioso, manteve-se do início até o nal
o dispositivo de que o ensino religioso constituirá disciplina de matrícula faculta-
tiva no ensino fundamental público, conforme reivindicação do setor particular.
(p. 286).
A votação do capítulo sobre a educação, no 1º turno, realizou-se no dia 19 de maio de
1988, numa sessão presidida pelo Presidente da Constituinte, Deputado Ulisses Guima-
rães, assistida pela presença maciça que tomou conta das galerias.
Apesar do destaque do Deputado Fausto Rocha visando aprovar o ensino religioso como
disciplina facultativa e de matrícula igualmente facultativa, os termos de disciplina obri-
gatória e de matrícula facultativa foram mantidos por 285 votos, contra 76 votos e 16
abstenções.
A votação conjunta do capítulo conrmou a íntegra do acordo [...] que obteve 443 votos
favoráveis, 2 contrários e 3 abstenções. Essa aprovação foi conrmada no dia 30 de agos-
to, durante as votações do 2º turno. No que se refere ao ensino religioso, a redação nal
na Constituição de 1988 (BRASIL, 1989) cou assim:
Art. 210. § único: O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos
horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”. (CURY, 1993, p. 32).
Uma nova LDB, aprovada em 1996, no ano seguinte, estabelecerá o
Ensino Religioso como parte integrante da formação básica do cidadão brasilei-
ro. Como disciplina do Ensino Fundamental, a lei garante o respeito à enorme
diversidade cultural e religiosa do país, deixando vedada qualquer forma de pro-
selitismo.
A carência que se nos parece evidente neste processo histórico, diz res-
peito aos fundamentos epistemológicos e pedagógicos do ponto de vista curri-
cular, antropológicos e sociológicos, enquanto área de conhecimento, exigindo
assim, maior clareza quanto ao tratamento oferecido ao Ensino Religioso nas
legislações nacionais, mas sobretudo nas estaduais.
Assim, desde o tempo passado, até os dias atuais, o Ensino Religioso,
muitas vezes, reduzido a uma atividade confessional ou dependente de uma “teo-
logia”, necessita de uma abordagem séria e respeitosa, que privilegie a experiência
do sujeito, bem como as próprias expressões religiosas, que, por sua vez, são diver-
sas e plurais, além das tradições religiosas e seus inevitáveis traços socioculturais.
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O ensino religioso, a losoa e a história da educação brasileira Artigos/Articlesw
Trata-se de uma tarefa interdisciplinar, que se serve da História, da Antropologia,
das Ciências da Religião, da Sociologia, da Fenomenologia, da Psicologia da Re-
ligião, sempre sob o prisma da Educação, mediante um necessário respaldo legal
de seus currículos.
Desta maneira, nos propomos analisar, de forma objetiva, as balizas
que foram, no decorrer da história da educação, aplicadas no âmbito do chamado
Ensino Religioso, enquanto disciplina nos currículos educacionais brasileiros. De
modo que, carão evidentes quais as bases teóricas, legais e metodológicas com-
põem a história do referido componente pedagógico, buscando assim, averiguar
os momentos em que o enfoque se rendeu a uma abordagem meramente catequé-
tica, doutrinal, proselitista, tendenciosa e/ou dependente nos campos teológicos.
Será de fundamental importância, analisar cautelosamente quais as tra-
dições religiosas compõem o universo religioso brasileiro para, assim, compreen-
dermos também as mudanças de abordagem que ocorreram durante o tempo em
que a disciplina passou a ser proposta nas instituições educacionais deste país,
levando em conta as distintas teologias existentes, as próprias culturas e tradições
religiosas presentes neste chão, bem como os textos sagrados, os ritos e liturgias
empregados, além das tradições orais.
currículO e ensinO religiOsO
Os problemas epistemológicos decorrentes do fenômeno educacional
mencionado implicam na própria legislação que chancela os conteúdos oferecidos
até o momento, interessando-nos, assim, buscar compreender qual foi o caminho
trilhado para se chegar a determinados currículos, suas inuências, possíveis de-
pendências além das nalidades com as quais o processo foi sendo implementado.
Por esta razão, considerando a necessidade natural que a sociedade sem-
pre teve de estabelecer princípios para a sua própria organização, am de bem
orientar os seus cidadãos acerca de seus direitos e deveres, além de determinadas
outras normas e balizas necessárias para o bom funcionamento do coletivo, que-
remos analisar também as legislações que basearam o Ensino Religioso brasileiro.
Para tanto, buscaremos compreender a legislação que orientou os cur-
rículos do Ensino Religioso nos Estados brasileiros mediante uma retrospectiva
histórica passando pelas Constituições e Leis da Educação ao longo do período
republicano (a partir de 1890) e os documentos que regulamentaram e normati-
zaram este componente curricular nos Estados a partir do artigo 33 da LDBEN
9.394/96, alterado pela Lei 9.475/97.
Assim o artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
em relação a proponente curricular, Ensino Religioso, assevera:
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Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação bá-
sica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo. (Redação dada pela Lei nº 9.475, de 22.7.1997)
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a denição dos con-
teúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos
professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denomi-
nações religiosas, para a denição dos conteúdos do ensino religioso. (BRASIL, 1997).
Já o artigo 34, versa sobre a jornada escolar, período das aulas, mas
sempre à critério dos sistemas de ensino.
Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas de
trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de perma-
nência na escola.
§ 1º São ressalvados os casos do ensino noturno e das formas alternativas de organização
autorizadas nesta Lei.
§2º O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a cri-
tério dos sistemas de ensino. (BRASIL, 1997).
Com a referida Lei 9.475/97, uma nova redação é oferecida ao artigo
33 da Lei 9.394/96, cando estabelecido, portanto, que o Ensino Religioso, de
matrícula facultativa, constitui-se como disciplina escolar e há um destaque para
o necessário respeito para com a diversidade religiosa e cultural do Brasil, além do
também necessário e imperioso, não proselitismo, visto, porém, como uma afron-
ta a qualquer processo educacional, uma vez que fere o princípio da imparcialida-
de, laicidade e a própria liberdade de escolha dos sujeitos envolvidos no processo.
A legislação acerca do Ensino Religioso arma que ele se propõe a ser
um componente curricular, com a proposta de uma discussão sobre “a diversidade
e a complexidade do ser humano como pessoa aberta às diversas perspectivas do
sagrado presentes nos tempos e espaços histórico-culturais” (OLIVEIRA et al.,
2007, p. 34).
A coordenação do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso
(FONAPER), gestão 2008-2010, na apresentação à 9ª edição dos Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (PCNER), destaca:
O Conselho Nacional de Educação (CNE), ao instituir as Diretrizes Curriculares Na-
cionais para o Ensino Fundamental (Resolução CEB/CNE nº 02/98), contemplou as
aspirações e as necessidades da atual sociedade brasileira no que diz respeito à disciplina
de Ensino Religioso, conferindo-lhe status de área do conhecimento, entre as dez que
compõem a base nacional comum, garantindo a igualdade de acesso aos conhecimentos
religiosos, substrato cultural presente em todos os povos da humanidade (FONAPER,
2009, p. 7-8).
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O ensino religioso, a losoa e a história da educação brasileira Artigos/Articlesw
Como vemos, o Ensino Religioso é apresentado como uma área de
conhecimento e não como um espaço de doutrinação de uma ou mais denomi-
nações religiosas. Assim, ca evidente a garantia da liberdade religiosa e vedação
quanto a qualquer prática proselitista. Fazendo-nos entender assim, que a educa-
ção religiosa, enquanto transmissão de valores e práticas é uma tarefa da família
do sujeito e da comunidade religiosa que possam integrar e não da instituição de
ensino.
Por m, nossa análise pretende chegar até a recém promulgada Base
Nacional Comum Curricular e as mudanças que ela propõe para o Ensino Re-
ligioso, bem como seu impacto na realidade educacional brasileira atual, como
perspectivas de se trabalhar a diversidade, sobretudo, religiosa, enquanto espaço
de diálogo, debate e construção coletiva de aprendizagem.
O Ensino Religioso, para a sua construção estrutural e explicitação, necessitou vincular-
-se a uma ciência de referência. No campo do ensino, dialogou com os elementos peda-
gógicos permitindo uma estrutura em que a linguagem e o fenômeno estejam explícitos
e, desta forma, o componente permita enfrentar situações, construir argumentações e
elaborar propostas (Documentos do MEC/ ENEM/ PAS). De tal forma que contribua
para a leitura e interpretação da realidade, estabelecendo a possibilidade de participação
do cidadão na sociedade de forma autônoma. (JUNQUEIRA, 2015, p.18).
Ou seja, procuraremos observar se as práticas pedagógicas adotadas vol-
tam-se para uma autêntica educação não-confessional, capaz de trabalhar os pro-
blemas religiosos de maneira ampla, diversa e respeitosa, considerando em todo
momento a imensa diversidade cultural e religiosa existente em nosso país, além
de ser verdadeiramente uma disciplina com proposta de uma formação integral,
voltada para o indivíduo e seu consequente desenvolvimento humano. Ao consi-
derarmos que a formação cultural do Brasil teve várias passagens e inuências de
outras culturas compreendeu-se a necessidade de demandar “[...] práticas escola-
res diferenciadas, capazes de contemplar suas necessidades e diferentes modos de
inserção social.” (BRASIL, 2016, p. 322).
Assim, vemos que o Ensino Religioso está presente nos currículos edu-
cacionais do Brasil há certo tempo e sempre com discussões a seu respeito, so-
bretudo no que se refere aos problemas epistemológicos inerentes a ele, devido
à necessidade de um maior esclarecimento para uma consequente aplicação a
contento, respeitando tradições religiosas e culturais presentes em nosso país.
Deste modo, identicamos a necessidade de se estudar os pressupostos
legais e curriculares da referida disciplina, sob a ótica da Educação, am de obser-
varmos em que medida o Ensino Religioso praticado no Brasil cumpre aquilo a
que se propõe ou deixa a desejar, sucumbindo a uma inuência de determinadas
teologias”, com o objetivo de doutrinar, catequizar, por meio de certo proseli-
tismo.
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Consideramos ser este um tema complexo e atual para as discussões
acerca da Educação brasileira, levando em conta a mudança ocorrida recentemen-
te na Base Nacional Comum Curricular, depois de tanta discussão e polêmicas,
na qual o Ensino Religioso, conforme orienta a Lei de Diretrizes e Bases, con-
tinua sendo disciplina obrigatória nas Escolas Públicas, porém, permanecendo
facultativo ao aluno, cursá-la ou não, ou seja, a matrícula poderá ser optativa aos
alunos do ensino fundamental. Entre as competências para esse ensino estão a
convivência com a diversidade de identidades, crenças, pensamentos, convicções,
modos de ser e viver.
No dia 27 de setembro de 2017, o STF (Superior Tribunal Federal)
decidiu que o Ensino Religioso em escolas públicas pode ter caráter confessional,
ou seja, as aulas podem ter como guia os ensinamentos de uma religião especíca,
levantando assim, mais uma vez, um grande debate sobre a legitimidade da deci-
são estabelecida, bem como sua aplicação, forma e prazo de implementação nas
unidades escolares.
Com placar apertado, quase que empatado (seis votos a cinco), os Mi-
nistros do STF decidiram de maneira a não considerar a laicidade do Estado
Brasileiro de Direito, julgando uma ação de inconstitucionalidade movida pela
Procuradoria-Geral da República, que defendia que as aulas da referida disciplina
deveriam oferecer uma visão geral sobre as diferentes tradições religiosas, modi-
cando inclusive, a lei que até então estava em vigor e assim orientava os currículos
brasileiros.
O Conselho Nacional de Educação ainda deverá decidir se o Ensino
Religioso terá tratamento como área do conhecimento ou como componente cur-
ricular da área de Ciências Humanas, no Ensino Fundamental. De modo que a
discussão continua e isto nos interessa frontalmente, pois está exatamente dentro
do que temos estudado e assim poderemos analisar os desdobramentos e delibe-
rações da referida discussão.
Além das questões supra apresentadas, identicamos também um nú-
mero consideravelmente pequeno de estudos sobre o assunto, o que nos interpela
ainda mais a nos propormos para oferecer também a nossa contribuição para a
evolução do debate e da reexão acerca dos temas em questão.
A fundamentação teórica de nosso trabalho se dará na pesquisa dos
documentos legislativos nacionais e estaduais, como fontes primárias, para ave-
riguar o processo pelo qual passou o Ensino Religioso e a sua aplicação. Aborda-
remos também os currículos nacionais e estaduais para vericar quais foram os
conteúdos e temas propostos a serem trabalhados em sala de aula, se abarcam a
pluralidade sociocultural e religiosa brasileira, com sua riqueza de crenças, ritos,
devoções e experiências.
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Analisaremos ainda, criticamente, a Base Nacional Comum Curricular,
esta bem mais recente, am de observarmos qual a orientação atual do Ministério
da Educação e Cultura para a disciplina do Ensino Religioso em todo o Brasil,
considerando as polêmicas e debates, discussões e interesses políticos e religiosos
que marcaram e ainda marcam a referida publicação.
As obras dos comentadores destas legislações e do próprio tema, de
modo geral, enquanto área de conhecimento educacional, nos servirão como fon-
tes secundárias am de embasarmos nossas considerações acerca do problema em
questão, sobretudo no que diz respeito, precisamente aos aspectos legais e curri-
culares da disciplina que nos propomos investigar.
A rica bibliograa proposta pela disciplina Filosoa e História da Edu-
cação nos proporcionou contato com temas e autores que muito contribuem para
nossa reexão. E assim, inuenciam positivamente a nossa pesquisa, uma vez
que, de modo, transversal, dialoga com a temática por nós escolhida e dá suporte
epistemológico para a nossa averiguação.
Desde a discussão acerca do que seria o pós-moderno, a questão do
mundo do trabalho, o lugar social de cada indivíduo, a luta de classes, a busca
por uma identidade de grupos minoritários e suas consequentes lutas, além do
avanço cientíco, mediante as diversas especializações do conhecimento e suas
subdivisões, com seus respectivos referenciais teóricos e a questão da interdiscipli-
naridade e da formação omnilateral e a preocupação com uma visão de mundo
mais próxima possível da realidade.
Na história da humanidade os processos educativos não escolares e escolares sempre bus-
caram cumprir o objetivo de integrar os indivíduos entre si e ao contexto social em que
estiveram inseridos. Uma integração social adequada supõe formação para a participação
nos processos de trabalho e de vivência cultural, com vistas a assegurar o provimento dos
bens materiais e culturais necessários para a harmônica relação da vida humana em socie-
dade e a transformação dos recursos naturais de modo a preservar suas fontes e a própria
espécie humana. Contudo, nem sempre o objetivo de integração social dos indivíduos
foi adequadamente alcançado no decorrer da história, pois em muitas situações houve
carência no suprimento de necessidades elementares tais como as de alimento e moradia.
(CASTRO; SILVA, J. R. M; SILVA, V. P., 2015).
Assim, vemos as implicações de concepções losócas e históricas de
trabalho e de educação escolar no processo da formação humana. Na perspectiva
losóca temos a persistência da centralidade na produção material em detrimen-
to da produção não material e da formação omnilateral, bem como, o papel da es-
cola na preparação para o trabalho e possibilidades de sua contribuição para uma
sociedade emancipada, além de perspectivas decorrentes da formação omnilateral:
educação intelectual, corporal e tecnológica integradas.
Já do ponto de visto histórico, destacamos aspectos da educação brasi-
leira no século XIX e as ações dirigidas à organização de um sistema de instrução
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SANTOS, D. N.
primária, além de aspectos do processo de institucionalização do modelo escolar
paulista no nal do século XIX até os anos de 1930, bem como as ideias políti-
co-pedagógicas e a organização da estrutura educacional no Brasil, entre 1931 e
1946, inclusive a trajetória de lutas e de elaboração das leis que se constituíam em
bases da educação brasileira após 1946.
As diversas considerações oferecidas na referida disciplina, auxiliaram,
sobremaneira, a nossa formação acercas destes temas e períodos históricos da edu-
cação brasileira, contribuindo assim, para o nosso objeto de pesquisa, posto que
certamente a questão do Ensino Religioso, passou por todos estes aspectos e por
eles acabou sendo também, inuenciada.
De modo especial, destacamos a questão apresentada pelos dois profes-
sores da disciplina no que se refere à exclusiva objetivação de uma formação para
o trabalho, carecendo assim de atenção também para outras dimensões do ser hu-
mano formado. Deste modo, a proposta de uma formação integral, chama a nos-
sa atenção, pois direção o foco para além das atribuições exigidas para o trabalho a
ser desempenhado pelos sujeitos envolvidos na relação ensino-aprendizagem. Ou
seja, de modo holístico, olhar para a necessária formação nos campos da ética, da
estética, da cidadania e etc, para uma autêntica integração social.
As obras de Karl Marx e Herbert Marcuse apresentadas, nos propicia-
ram fazer contato com os conceitos de alienação, mais valia, valorização do tra-
balho, mercantilização, etc. A mercadoria, o capital, estando acima do homem, o
iguala à condição de mercadoria, também. Aumenta a valorização do mundo das
coisas e consequentemente, a desvalorização do mundo dos homens. “O trabalho
não produz apenas mercadorias; produz-se também a si mesmo e ao trabalhador
como uma mercadoria, e justamente na mesma proporção com que produz bens.
(MARX, 1993, p.159).
A necessária consciência da servidão a que se encontram os operários
trabalhadores é o que favorecerá e ocasionará a sua libertação, além da substi-
tuição de necessidades impostas pela ideologia do capital por autênticas e reais
necessidades dos indivíduos. “Toda libertação depende da consciência de servi-
dão e o surgimento dessa consciência é sempre impedido pela predominância
de necessidades e satisfações que se tornaram, em grande proporção, do próprio
indivíduo.” (MARCUSE, 1979, p. 28).
Todos os homens deveriam ter acesso à riqueza material e espiritual
oriundo do mundo do trabalho. O grande problema é quando esta riqueza ca
restrita a um determinado grupo (classe) e o grupo que realiza o trabalho e produz,
literalmente a riqueza, não tem acesso a ela. Ou seja, não há autonomia, mas alie-
nação para os sujeitos que acreditam ter uma liberdade, mas na realidade, é ilusória.
Ricardo Antunes, com suas obras Os sentidos do trabalho e O privilégio
da servidão, nos ajudaram a compreender que a classe que vive do trabalho, que
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vende sua força de trabalho em troca de salário, encontra condições extremamente
precarizadas de trabalho, marcada por uma divisão sexual desigual do trabalho e,
sobretudo, da renda. Isso obriga a uma nova organização de trabalho (informal),
que passa também pela luta feminista emancipatória, além da inclusão criminosa
de crianças no mercado de trabalho em diversas partes do mundo e o surgimento
de movimentos religiosos que se valem do desemprego. Há uma desconstrução
do trabalho no Brasil, neste século. O aparato produtivo não responde às neces-
sidades dos trabalhadores.
Depois, destacamos a reexão à partir da contribuição de István Mézá-
ros, com sua obra: A educação para além do capital, pois de certa maneira, identi-
camos fatores interessantes ali apontados para a nossa temática. O objetivo cen-
tral desta obra é o debate sobre a superação da lógica do capital e a apresentação
de um modelo de educação que vai além desta lógica meramente mercantil. Ele
começa armando que “as mudanças não podem ser apenas formais; elas devem
ser essenciais.” (MÉSZAROS, 2005, p. 35). Propõe, assim, uma alternativa para
a “educação institucionalizada”, enquanto modelo irresistível e incontestável for-
jado pelo capital.
Portanto, seja em relação à “manutenção”, seja em relação à “mudança” de uma dada
concepção do mundo, a questão fundamental é a necessidade de modicar, de uma
forma duradoura, o modo de internalização historicamente prevalecente. Romper a ló-
gica do capital no âmbito da educação é absolutamente inconcebível sem isso. E, mais
importante, essa relação pode e deve ser expressa também de uma forma concreta. Pois
através de uma mudança radical no modo de internalização agora opressivo, que susten-
ta a concepção dominante do mundo, o domínio do capital pode ser e será quebrado.
(MÉSZAROS, 2005, p. 52-53).
Ele reconhece que a educação institucionalizada, nos últimos 150 anos,
serviu apenas para legitimar e expandir o próprio capital, fornecendo condições
técnicas e humanas para isso. Além de instituir valores que seguem este mesmo
interesse. Ele assevera que não basta reformar o sistema escolar formal estabeleci-
do, mas esta reforma deve ser integral, ou seja, atacar todas as dimensões internas
do capital institucionalizadas.
Outra contribuição importante, encontramos em Textos sobre educação
e ensino de Karl Marx, que considera a questão do trabalho infantil e feminino.
Havia uma divisão de idade para as crianças, de 9 a 12; de 13 a 15 e dos 16 aos 17
anos, mediante carga horária de trabalho denida, receberem educação intelec-
tual, corporal e uma tecnológica, respectivamente. Trata-se de uma análise muito
interessante acerca da realidade da vida do trabalho e da educação presentes no
contexto da Alemanha da época, cujo autor propõe uma estrutura de educação
adequada, mediante a vida de trabalho.
Seria ótimo que as escolas elementares iniciassem a instrução das crianças antes dos nove
anos. Porém, por agora, só nos preocupamos como antídotos absolutamente indispensá-
veis para resistir aos efeitos de um sistema social que degrada o operário até o ponto de
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SANTOS, D. N.
transformá-lo em um simples instrumento de acumulação de capital e que fatalmente
converte os pais em mercadores de escravos de seus próprios lhos. Os direitos das crian-
ças e dos adultos terão de ser defendidos, já que não podem fazê-los e os próprios. Daí o
dever da sociedade de combater em seu nome.
Se a burguesia e a aristocracia descuidam-se dos deveres com os seus descendentes, isto
é problema deles. A criança que desfruta os privilégios dessas classes está condenada a
sofrer seus próprios prejuízos. (MARX e ENGELS, 2004, p. 67-68).
Destacamos a denúncia de que o dono do capital não quer o povo ins-
truído. Há forte resistência da burguesia em relação à instrução, à educação, ao
ensino da escrita e da leitura do proletariado. Vemos então que a ideia de infância,
já desde este período era algo considerado para e pelas elites, posto que para o tra-
balhador, para o pobre, para o assalariado, infância já era momento de trabalhar,
produzir, gerar lucro (para o patrão).
Assim, observamos as diversas contribuições que os textos apresentados
puderam nos oferecer e extrair deles várias apropriações para a nossa compreensão
acerca da história da educação do Brasil no século XIX, mediante alguns marcos
históricos delineados nas exposições e partilhas realizadas. As categorias, os pro-
fessores, as mulheres, os trabalhadores, os sujeitos que tiveram repercussão neste
período, etc.
De modo especial, vemos a inuência da religiosidade presente na mo-
dicação das estruturas e da própria educação, com suas especicidades, seja de
mudanças ou de resistências em relação à educação, que é fruto de uma sociedade,
com suas adesões ou não, além das lutas pessoais, que garantem o espaço de atu-
ação de cada componente presente no ambiente escolar.
Deste modo, aprendemos o que vem a ser a História Cultural, por exem-
plo, como fenômenos que vão marcando a vida e a história das pessoas e estas suas
vivências, ao serem trabalhadas, valorizadas, levadas em conta, permitem assim uma
apropriação do que perpetua um jeito de ser e viver das pessoas. Esta perspectiva
fenomênica da história que aborda de modo global tudo o que está acontecendo no
mundo e na vida das pessoas durante todo o tempo de sua vida, nos ajuda a com-
preender de modo mais adequado o panorama da educação brasileira.
cOnclusãO
Em virtude dos aspectos supramencionados, podemos, por ora, concluir
que os temas trabalhados na disciplina Filosoa e História da Educação (Séculos XIX
e XX) do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESP de Marília muito
contribuiu com a temática que temos desenvolvido em nosso projeto de pesquisa
para o Doutorado em Educação: O Ensino Religioso em seus aspectos legais e curricula-
res na história da educação brasileira, uma vez que nos ajudou a conhecer e compre-
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ender algumas das bases losócas e metodológicas, as intenções, os pressupostos,
as inuências e as raízes do que chamamos de História da Educação Brasileira.
Deste modo, podemos destacar a relevância da discussão losóca acer-
ca da história da educação, para se compreender as suas bases metodológicas,
curriculares, legais e práticas de seus fenômenos, observando os diversos marcos
estabelecidos, construídos e oferecidos até o presente momento.
Além disso, destacamos também o papel das ideologias presentes como
fenômenos históricos e losócos inuenciadores da sociedade dentro do campo
educacional e os problemas epistemológicos daí decorrentes. Seja a mudança, seja
a xação, ambos fenômenos, necessariamente, passam pela nossa ação, pela nossa
prática enquanto educadores, ora de resistência, ora de adesão para as transfor-
mações almejadas.
Assim, o pesquisador que trabalha na perspectiva histórica, realiza um
trabalho muito mais descritivo e interpretativo do que, propriamente, o desejo de
querer situar determinados fatos em determinados períodos históricos. De modo,
que será uma tentativa de identicar e recuperar questões a serem interpretadas e
devidamente analisadas para uma possível síntese acerca de determinado proble-
ma apontado, considerando sujeitos e seus papeis, contextos e sentidos.
Observamos também o lugar da Cultura, que fundamenta os compor-
tamentos humanos dentro de uma sociedade e, inevitavelmente, dentro da pró-
pria educação, também, uma vez que partimos de nossas próprias interpelações
acerca deste ou daquele problema a ser resolvido e por isso mesmo, objeto de
investigação. Em nosso caso, temos o fenômeno da religiosidade e seu estudo, sua
abordagem e considerações no interior das instituições educacionais.
Portanto, ao observarmos os aspectos legais e curriculares do Ensino
Religioso na história da educação brasileira, comparando-os com as apropriações
da disciplina oferecida, consideramos de grande valia o avanço signicativo que
identicamos em nosso entendimento em relação aos diversos aspectos que fun-
damentam o tema de nossa investigação.
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Recebido: 07/03/2019
Aceito: 04/05/2019