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FAMÍLIA MONOPARENTAL FEMININA: A MULHER COMO CHEFE DE
FAMÍLIA
F
EMALE MONOPARENTAL FAMILY
:
THE WOMAN AS CHIEF OF
FAMILY
Francisco Antônio Morilhe Leonardo
1
Ana Graziele Longo de Morais
2
RESUMO: O presente trabalho tem como escopo identificar os entraves, dimensões e demais
problemas enfrentados pelas famílias monoparentais femininas no Brasil, pois,ao longo dos tempos,
a família passou por graduais transformações e adaptações, sendo diretamente influenciada pela
realidade social e a diversidade de estruturações domésticas na qual se adequam conforme a época
emergente. Desse modo, discutir-seo papel da mulher, hodiernamente, enquanto chefe de
família e mãe, fornecedora da dinâmica familiar, na qual se encontra em circunstâncias vulneráveis
socialmente. Sobre as famílias monoparentais femininas compreendem-se que, a questão de gênero
não influencia nos resultados familiares devido a ausência paterna, além dos fatores de risco, onde se
ressalva a situação econômica que as compreendem, pois cabe ao Estado se ater à necessidade dessa
realidade pelo viés das políticas sociais públicas, de modo a conquistarem os Direitos Humanos,
que,
entre limites e possibilidades, buscam superar sua condição vulnerável.
P
ALAVRAS
-
CHAVE
:
Família Monoparental; Mulher; Gênero.
A
BSTRACT
:
The present work has as scope to identify the obstacles, dimensions and other problems faced
by single parent families in Brazil, since, over time, the family has undergone gradual transformations
and adaptations, being directly influenced by the social reality and the diversity of domestic structures
in which they adapt according to the emergent era. In this way, the role of women, nowadays, will
be discussed as head of family and mother, provider of family dynamics, in which she is in socially
vulnerable circumstances. Regarding single-parent families, it is understood that gender issues do not
influence family outcomes due to paternal absence, in addition to risk factors, where the economic
situation that includes them is reserved, since it is the State’s responsibility to confront the necessity
of this reality by the bias of public social policies, in order to conquer Human Rights, which, within
limits and possibilities, seek to overcome their vulnerable condition.
K
EYWORDS
:
Single-parent family; Woman; Genre.
1
Mestre em Didática do Ensino do Direito (Univem -Marília-SP). Centro Universitário Eurípedes de Marília/
SP (Univem, Marília-SP). kiko_marilia@hotmail.com
2 Pós Graduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela UCAM ProMinas. UCAM - Universidade
Cândido Mendes. ani_longo@hotmail.com
http://doi.org/10.33027/2447-780X.2017.v3.n1.02.p11
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LEONARDO, F. A. M.; MORAIS, A. G. L.
1
I
NTRODUÇÃO
O crescimento da família monoparental no Brasil é constante nas
diversas camadas sociais devido
às
transformações
que
afetaram
a
condição
da
mulher e os padrões familiares, uma vez que, a chefia feminina deixou de
ser algo restrito às camadas pobres, ganhando nova relevância no bojo da
sociedade. “A grande concentração da chefia feminina encontra-se nas camadas
pobres.” (CASTRO, 1990). Mesmo com a situação de pobreza, as mulheres se
lançam ao mercado de trabalho em situações em que precisam compartilhar
a manutenção do lar com o companheiro, ou até mesmo, responsabilizar-se
sozinha pelo domicílio.
Assim, a atuação feminina no mercado de trabalho, aliada ao
desenvolvimento da chefia domiciliar, está diretamente concatenada a questão
emancipatória do gênero. Outrossim, as camadas sociais de onde elas provêm
originam em um dos indicadores importantes para elucidar parte dessa questão,
haja vista que o vínculo do trabalho e a emancipação feminina parecem convergir
mais nas camadas médias do que nas inferiores; pois, nesta última, o que as
motivam ao ingresso ao mercado de trabalho é, em muitas vezes, a luta pelo
sustento.
O que há de fundamental a destacar é que, as mulheres das camadas
mais pobres, além de possuírem um baixo nível educacional e qualificação, estão
inseridas em grande parte no mercado informal, em péssimas condições de
trabalho e salários. Por outro lado, as mulheres provenientes das camadas médias
e altas são, geralmente, melhores instruídas e qualificadas para enfrentar as novas
exigências do mercado.
Partindo do fato de que as mulheres não se constituem como um
grupo homogêneo e universal, pelo contrário, são heterogêneas e estão situadas
em contextos diversos e condições distintas, é que se pode afirmar que o próprio
entendimento da questão “mulheres chefes de família” deve considerar também
uma diversidade de categorias, visto que ela perpassa outras dimensões além de
gênero, como classe, raça/etnia e idade/geração (MACÊDO, 2001).
Somando-se a essas, outras variáveis que se apresentam como
esclarecedoras da questão são aquelas que dizem respeito ao próprio entendimento
do termo “chefia feminina”. Geralmente este é associado à negação da chefia
masculina, seja pela ausência do parceiro no domicílio, seja pela condição de
viúvas, mães solteiras, ou separadas com dependentes (CARVALHO, 1998). Mas
esse tipo de entendimento é limitado, pois desconsidera não a diversidade de
modelos familiares presentes nas sociedades atuais, mas a diversidade de chefia
(tipo e quantidade) que as mesmas podem absorver.
Portanto, o objetivo do presente estudo é tecer ideias sobre os entraves,
dimensões e demais problemas enfrentados, pelas famílias monoparentais
Família monoparental feminina
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femininas no país, em especial o fator econômico. Ademais, traça-se um perfil da
mulher na sociedade atual, como chefe de família e mãe, pois se encontram em
circunstâncias vulneráveis socialmente. Elas sub-rogam-se na responsabilidade
paterna, de modo a cumprir integralmente com todas as despesas e o afeto que a
família necessita. A pesquisa cujos resultados ora se apresentam foi desenvolvida
na perspectiva do enfoque dedutivo e o levantamento bibliográfico, além da
pesquisa qualitativa.
Nesse viés, destacam-se as famílias monoparentais femininas
compreendendo-se que a questão de gênero não influencia nos resultados familiares
e os fatores de risco, onde se ressalva a situação econômica que compreendem
tais
famílias chefiadas por mulheres, de modo a garantir os Direitos Humanos
inerentes, de modo a se valer a isonomia preconizada na Carta Magna.
2
A
FAMÍLIA MONOPARENTAL FEMININA NO
B
RASIL
Constatou-se no Brasil, ultimamente, um déficit nas famílias compostas
por casal e filhos, e em contrapartida, o aumento gradual de famílias compostas
por um dos membros e filhos ou de pessoas morando sozinhas, aliada ao declínio
da fecundidade e do crescimento da expectativa de vida, originando o fenômeno
da monoparentalidade.
Diniz (2002, p. 11) expõe que:
A família monoparental ou unilinear desvincula-se da ideia de um casal relacionado
com seus filhos, pois estes vivem apenas com um dos seus genitores, em razão de viuvez,
separação judicial, divórcio, adoção unilateral, o reconhecimento de sua filiação pelo
outro genitor, produção independente.
Ao destacar a família monoparental, descrita na Constituição Federal
de
1988, cuja inovação trouxe novo conceito, Farias e Rosenvald (2010, p. 55) nos
ensinam que, no artigo 226, § da referida Carta Magna está positivado o
reconhecimento da família constituída por um dos pais e seus filhos, chamando-a
de Família Monoparental, utilizaram-se dessa terminologia para deixar explícito
que é formada por apenas a mãe ou o pai e seus descendentes, ou seja, terá
somente a presença de um genitor que seresponsável pelo sustento, educação
e criação dos filhos.
Cabe salientar que, a característica principal é a existência de um
genitor, na qual repousa a diferença básica deste tipo familiar para obiparental.
Assim, nas famílias biparentais existem dois genitores, cuja função parental é
exercida conjuntamente, de sobremodo que ambos se responsabilizam na criação,
convivência, educação e manutenção da prole. Entretanto, a família monoparental
possui apenas um dos genitores na manutenção familiar a fim de desempenhar
tais papéis.
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No Brasil, Barroso e Bruschini (1981) apontam que, embora houvesse
um contingente expressivo de famílias chefiadas por mulheres, é a partir dos anos
1970 que elas passam a ter visibilidade e conquistam um lugar entre as pesquisas
sociológicas. Para as autoras:
É preciso não esquecer que as mulheres chefes de família costumam ser também mães-
de-família: acumulam uma dupla responsabilidade, ao assumir o cuidado da casa
e das crianças juntamente com o sustento material de seus dependentes. Essa dupla
jornada de trabalho geralmente vem acompanhada de uma dupla carga de culpa por
suas insuficncias tanto no cuidado das crianças quanto na sua manutenção econômica.
É verdade que essas insuficiências existem também em outras famílias, e igualmente é
verdade que ambas têm suas raízes nas condições geradas pela sociedade. Porém, esses
fatores sociais são ocultados pela ideologia que coloca a culpa na vítima, e o problema
se torna mais agudo quando as duas vítimas são encarnadas por uma pessoa.
(BARROSO; BRUSCHINI, 1981, p. 40).
Dessa forma, destacam-se os padrões de mudança nas bases familiares,
percebidas como parte de uma estrutura mais ampla e de transformações
econômicas e sociais. Assim, a família está no topo de mudanças fundamentais.
Portanto, isto não quer dizer que esteja, fundamentalmente, desvanecendo. As
fundamentações mais simples, nesta seara, retomam às mudanças nos padrões
de comportamento, desde a gradativa relação entre os mesmos sexos, declínio da
fecundidade, ampliação das mães solteiras e de divórcios, novos padrões sociais,
relações de gênero e até a inclusão feminina, de crianças e adolescentes no mercado
de
trabalho formal e informal.
A variedade de arranjos domésticos dos grupos populares - onde
sobressai a presença de famílias monoparentais, sobretudo, mulher com filhos
- é atribuída a uma maior instabilidade do vínculo conjugal, fato que tem
alimentado o mito da desorganização familiar entre os pobres. Arraigado entre
os mais diferentes setores profissionais e ou acadêmicos, este mito adquire
características de perversidade e estigma na medida em que influi no
comportamento daqueles que nele acreditam e serve para desqualificar o pobre
(GOMES, 1991).
Em sintonia com isso, muitas vezes as mães cumprem o papel duplo, ou
seja, também são “pais” e chefes de família, trabalham e se ausentam diariamente,
ficando ausentes da vida cotidiana de seus filhos, retornando apenas à noite aos
lares. De igual sorte, a família monoparental feminina constrói-se sobre esta
denominação, muitas vezes, devido ao divórcio e, nesses casos, comumente
não intervenção financeira do ex-marido, competindo-as com a grande
responsabilidade de lidarem com os obstáculos da vida.
As mudanças na composição familiar, sua visibilidade e a aceitação da
sociedade exigem que se leve em conta o reflexo daquelas na sociedade mais ampla,
nas formas de se viver em família e nas relações interpessoais. Para compreendê-
las e desenvolver projetos de atenção à família, o ponto de partida é o olhar
Família monoparental feminina
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para esse agrupamento humano como um núcleo em torno do qual as pessoas se
unem, primordialmente, por razões afetivas (SZYMANSKI, 2002, p. 10).
Nesse diapasão, o obstáculo existente entre a conciliação do trabalho com
a vida familiar da mulher, como chefe de família, está evidente hodiernamente,
revelando os entraves das mulheres sendo mães e provedoras do sustento familiar,
de modo a resguardar uma participação ativa junto aos filhos e à esfera familiar.
Ademais, o afeto na família monoparental regida pela mulher se expressa como
um fator unido que promove uma relação de troca recíproca, de respeito e carinho
dos descendentes com as genitoras.
A articulação das trajetórias individuais se define em estágios de
desenvolvimento familiar e, portanto, estruturas diferenciadas de família.
Estruturas estas que parecem condicionar as “chances” individuais e, assim,
influenciar na definição e redefinição das trajetórias dos membros da família
no tempo. Um exemplo comum disto é a estreita e documentada relação entre
pobreza e famílias chefiadas por mulheres, sem cônjuge, e com filhos menores
(BARROS; FOX, 1990).
Devido às mudanças ocorridas na base familiar brasileira, com a
promulgação da Carta Magna, em 1988, fora conferida também, como entidade
familiar constituída por qualquer um dos pais e seus filhos, de modo a alterar
a definição da sociedade de família tradicional, formada por genitores e filhos,
reconhecendo a família monoparental (BRASIL, 1988). Nessa linha de raciocínio,
Santos e Santos (2008, p. 31) apontam as alterações ocorridas no conceito de
família, após a Constituição Federal de 1988:
O conceito de família, antes restrito àquela constituída pelo casamento, foi ampliado para
abranger a família monoparental. Esta espécie de família rompeu com a ideia preconcebida
de que o núcleo familiar deve ser oriundo do casamento e compreender o pai, a mãe e os
filhos. O fato é que esta entidade familiar pode se originar de diversos fatores e compreende,
apenas, um dos genitores e seus descendentes. A sociedade passa a se confrontar com a
presença de famílias biparentais e monoparentais, lado a lado, no cotidiano.
Destarte, a sociedade brasileira necessita compreender que o modo de
família tradicional, ou seja, aquele constituído pelo pai, mãe e filhos já não é
absoluto. Com o passar dos anos, as famílias, o Estado e a sociedade mudaram,
de modo que todos precisam se conscientizar sobre a condição estruturaldas
famílias atuais, denominadas monoparentais, em especial àquelas chefiadas por
mulheres, haja vista que estas que compõem a grande maioria possam ter seus
direitos tutelados, independentemente de sua formação.
3
A
QUESTÃO FINANCEIRA DA FAMÍLIA MONOPARENTAL FEMININA
A questão financeira das famílias monoparentais chefiadas por mulheres
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merece caráter passível de reflexão. Caracterizá-la, desse modo, remete-se ao
aspecto econômico, sem, no entanto, esquecer as relações afetivas que representam
a família, pois a fragilidade financeira fomenta a dificuldade econômico-social que
intensifica a falta de tempo para uma maior participação na vida familiar, no
que
tange à educação e criação dos filhos.
Vitale (2002) relata acerca da relação entre famílias monoparentais
femininas e pobreza acaba, de um lado, por construir outro estigma, o de que as
mulheres são menos “capazes” para cuidar de suas famílias ou para administrá-
las sem um homem. De outro, é apontado que as mulheres, hoje, ganharam
maior independência e, portanto, podem assumir suas famílias. No entanto,
enquanto houver a associação maciça entre monoparentalidade e pobreza e
os dados do Censo Demográfico de 2000 o confirmam, em especial quando
se
observa a distribuição por regiões do país acaba por fortalecerem-se muito
mais
a adjetivação dessas famílias como vulneráveis ou de risco do que como
potencialmente autônomas.
Por esse prisma, a mulher chefe da família monoparental age sozinha
cumprindo várias funções no âmbito doméstico e, em muitas vezes, se dedicam
integralmente à família e suplantam seus desejos e as realizações pessoais a fim de
cuidar somente do lar, tornando-as o arrimo e o porto seguro.
Bilac (1990) nos ensina que a maioria das famílias das camadas
populares está permanentemente ameaçada pelos baixos salários e desemprego.
Esta pressão produz seus efeitos: mulheres, jovens e crianças são lançadas no
mercado de trabalho. Deste modo, há um processo contínuo de reestruturação
destas famílias. Uma das interpretações é de que como unidade de cooperação
econômica as famílias pobres “forçam e reforçam” a solidariedade entre seus
membros e a casa própria aparece como um grande valor.
É uníssono que as posturas consideradas progressistas e tradicionais
estão insertas nas atitudes e posturas femininas das chefas de família das camadas
mais desprovidas economicamente, tanto em relação à autonomia nas decisões no
lar, quanto nas atividades domésticas. Nessa esteira, tais condutas taxadas como
mais tradicionais ou conservadoras não devem ser compreendidas categoricamente
como formas de aceitação, contradição ou submissão da mulher.
As mulheres pobres chefes de família vivem posições consideradas
tradicionais em relação ao poder de decisão no âmbito doméstico. O termo
chefia guarda o peso da tradição que remete a valores machistas, pois sempre
coube ao homem a chefia. Esta, em primeiro lugar diz respeito a autoridade e
responsabilidade que englobam não a família, mas os espaços públicos (SARTI,
1996).
Em verdade, as mulheres rogam visando mudanças, ou seja, sem
alterações radicais e abruptas no âmbito familiar, pois mesmo alistadas num
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panorama de mudanças simples e repletas de conservadorismo, é possível
perceber a emergência de elementos a que as tornaram mais independentes,
decididas e com a elevada estima. Entretanto, nota-se a existência de alterações
nas relações de poder, na qual, ao tempo em que procuram no trabalho o sustento
familiar, as mulheres vão conquistando sua independência e liberdade por meio
da
sociabilidade adquirida no âmbito laboral.
4
G
ÊNERO
M
ASCULINO
X G
ÊNERO
F
EMININO
: A
SUBSTITUIÇÃO DA PATERNIDADE
A família monoparental chefiada por mulheres, além da vulnerabilidade
social a que está subjugada, na maioria dos casos, enfrenta a ausência paterna, seja
por falecimento do cônjuge, celibato, divórcio ou por união livre, situações em
que, indubitavelmente, acometema constituição psicológica e social da genitora
como principal provedora dos descendentes. Desse modo, os resquícios dessas
perdas, muitas vezes, conservam e podem emergir posteriormente na vida dos
filhos, restando à mulher atenção única com eles. Nesse aspecto, ela tenta proteger
seus filhos de uma situação que se tornou irremediável.
Em consonância com isso, o fato de substituir a paternidade acaba
gerando orgulho e estima para a mulher chefe de família, pois elatoma para si
essa causa, visando ao bem da própria família. Assim, o binômio importância e
necessidade da participação do homem no seio familiar se relaciona com certas
atividades domésticas socialmente atribuídas a ele, mas também realizadas pelas
mulheres. Todavia, mesmo com uma vida econômica simples, as mulheresque
chefiama família monoparental acabam desenvolvendo, também, a função do
cônjuge ausente, deixandoevidente que a presença masculina no núcleo familiar
torna-se desnecessária.
Ademais, as mães solteiras, que formam a família monoparental
feminina, são marginalizadas pela sociedade. Esta ambiguidade, onde a lei
reconhece, mas a sociedade despreza, decorre do fato de ser a sociedade brasileira
extremamente tradicionalista. Contudo, tal situação tende a mudar, pois se
percebe um abrandamento dos costumes, através da defasagem do casamento e da
tendência desta geração a coabitar (SANTOS; SANTOS, 2008).
Nesse sentido, além das questões sociais e legais, ainda outro entrave
a ser superado devido à ausência do cônjuge: o fator econômico. As mulheres que
integram as camadas mais baixas da sociedadeprecisam vencer o obstáculo da falta
de estudos, e consequentemente, a carência de qualificação profissional. No caso
de divórcio, as mulheres podem recorrer à pensão alimentícia, pois é direito do
alimentando e está tutelado na Constituição Federal de 1988.
Além do mais, a precariedade das medidas governamentais de modo
a auxiliá-las, com destaque, por exemplo, ao número de creches ou escolas que é
insuficiente para atender a necessidade dos filhos. Destarte, as mulheres de melhor
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poder econômico não são atingidas por tais problemas. Entretanto, as mães
de família monoparental, independente da classe social e do poder aquisitivo,
enfrentam uma dupla jornada, conciliando o tempo entre os filhos e a atividade
laboral.
Em verdade, cabe ressaltar que as ações e as atitudes, o respeito mútuo,
a aceitação social, o apreço as formas culturais diversas, à dignidade, à liberdade
sexual e à igualdade são direitos característicos a todos os seres humanos, sem
observar os critérios de raça, sexo, cor, idade e gênero. No caso vertente, cada
cidadão possui sua individualidade, sua personalidade, seu modo próprio de
ver e de sentir as coisas tendo o livre arbítrio para sua vida em comunidade
(LEONARDO, 2017).
No caso em tela, o fenômeno da monoparentalidade está presente nas
diversas classes sociais, pois os empecilhos enfrentados dia a dia, como a baixa
renda e o dificultoso acesso ao mercado de trabalho atinge todos os cidadãos
brasileiros. Não de se olvidar que, no Brasil ainda não mecanismos
restritamente inerentes ao exercício do dever de proteção constitucional imposta,
pois somente oferta às cidadãs, desde que preenchidos certos requisitos, as
chamadas ões sociais, como por exemplo, os programas “Bolsa Renda” e “Bolsa
Família”, que o são unicamente focados em prol do setor financeiro para estas
mulheres carecedoras e merecedoras de tais benefícios, uma vez que são políticas
voltadas para a família em geral.
É de clareza ímpar que se houvesse ações sociais, exclusivamente
destinadas às mães, seria mais benéfico e cômodo para as chefes de família liderarem
seus lares, pois a questão econômica seria um fator minimizado e a função de
provedoras dacasa, seja no plano financeiro ou no emocional, seriamtotalmente
independentes dos genitores.Por via de consequência, Santos e Santos (2008, p.
25) descrevem a atuação unilateral, praticamente, da mulher em relação à criação
dos filhos:
Na monoparentalidade, a ala feminina é quem mais arca com o peso deste fenômeno.
Independente do fator determinante da família monoparental, o encargo, geralmente,
é enfrentado pelas mulheres. Quando tal entidade familiar advém da ruptura do
casamento, na maioria das vezes, a prole fica sob a tutela da mulher. Em se tratando, das
uniões livres, do celibato e das mães solteiras não o que se discutir, pois a liberdade de
formalidades dessas relações não impõe o caráter de responsabilidade sobre os filhos dela
oriundos, mesmo que a legislação prescreva o contrário. E por fim, acerca da viuvez, o
número de mulheres nesta condição é bem maior que o de homens.
Diante dos fatos, pode-se afirmar que grande parte dos entraves da
monoparentalidade é encarada pelas mulheres. Tais obstáculos
são
expressos nas
esferas econômica, social e emocional dessas líderes dos lares que suportam
unilateralmente todas as barreiras. Porém, o setor financeiro é o mais afetadoe
a pensão alimentícia não um desfecho à situação, quando não geraoutro
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problema. Todavia, o problema feminino não se condensaa pensão ou as ações
sociais do governo, mas sim a independência econômica, social e emocional em
relação aos ex-cônjuges.
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O fenômeno recente que inovou o conceito constitucional de família
é bastante complexo visto a amplitude das situações que o originam, pois trouxe
a definição de entidade familiar onde denominamos “monoparentalidade”. De
início, constata-se que o principal obstáculo a ser superado pelas mulheres que
assumem sozinhas as famílias se devido a sua disposição, fazendo divergir do
ideal social de família, além do fator econômico.
Nesse caso, a estrutura determinada, ou seja, o pai a mãe e a prole é
rompida devido alguns fatores como o divórcio, viuvez ou o fato se serem mães
solteiras. Assim, o genitor deixa de ser o sustentáculo econômico principal e
mãe assume a obrigação, muitas vezes sem auxílio do ex-companheiro (como o
pagamento de pensão alimentícia), onde essa tem a incumbência de cuidar dos
filhos e do lar.
Por esse viés, a estrutura familiar foralegalizada por meio de um casamento
civil ou união estável e, posteriormente dissolvida. A família monoparental foge
desses parâmetros, pois ao invés do molde clássico, se encontra apenas um dos
pais e sua prole, ou seja, nesse caso, a mulher. A genitora guardiã supre sozinha,
na maioria das vezes, as necessidades econômicas e as afetivas.
Ademais, os descendentes convivem sem a presença contínua dos pais.
O que de fato determina a família monoparental não é a união (casamento) e sim,
na sua maioria, sua ruptura, seguido de outras causas decisivas, como a união livre
e as mães solteiras, o distinguem dos moldes clássicos e gera, para as mulheres
provedoras do sustento do lar, a vulnerabilidade social, devido o fator econômico
ser preponderante.
Destarte, a mulher enfrenta esse paradoxo inserto no bojo da sociedade
e, também, no âmbito laboral, pois advém a precariedade econômica com a
queda no poderio econômico familiar. No caso em apreço, a genitora se lança no
mercado de trabalho visando suprir as necessidades dos filhos.
Nessepanorama, as famílias monoparentais percorrem circunstâncias, em
alguns casos, alheias à vontade de um dos cônjuges, infligindosuaestruturação. A
mulher chefe da falia monoparental age unicamentecom diversificados papéis no
âmbito doméstico, sendo “mãe” e “pai” concomitantemente, assim, cria e cuida dos
descendentes, provendo a educação, o sustento e o afeto que necessitam. Ao Estado,
assiste-lhe o dever de fomentar ações sociais em benefícios dos lares monoparentais,
de modo específico, a fim de contribuir com bem estar das famílias.
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Por derradeiro, as mulherescuidam somente da família, pois
substituem e compensam a ausência paterna, de modo a serem o arrimo e o porto
seguro dos lares. Assim sendo, a realidade das mulheres que agem com várias
responsabilidades, além de serem mães e chefes de família, que entre a superação
diária dos problemas e as possibilidades, buscam vencer a atual conjuntura de
vulneráveis socialmente pelo próprio esforço e pelo viés da escassez depolíticas
sociais públicas exclusivas, numa sociedade que estabelece direitos e deveres a
todos e prega a isonomia.
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VITALE, Maria Amália Faller. Famílias Monoparentais: indagações. Revista Serviço Social e
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Submetido em: 10/05/2017
Aprovado em: 30/08/2017
LEONARDO, F. A. M.; MORAIS, A. G. L.
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Revista do Instituto de Políticas Públicas de Marília, Marília, v.3, n.1, p.11-22, Jan./Jun., 2017