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O Dossiê originou-se de trabalhos que foram apresentados durante a
XI Semana da Mulher
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realizada na UNESP, campus de Marília com objetivo de
debater a temática da mulher, gênero e violência diante de pesquisas contemporâneas
e das novas perspectivas epistemológicas. De natureza multidisciplinar, o evento
possibilitou a criação de um espaço para diálogos e interfaces entre os estudos
de gênero, os feminismos, os movimentos sociais e suas distintas demandas, os
direitos reprodutivos e de cidadania, conuindo com as práticas cotidianas e de
violência em uma sociedade que se almeja democrática.
Os textos e suas(os) autoras tiveram como preocupação a reintrodução
da temática em foco, relacionando-as com questões consideradas, para alguns,
superadas” mas que, partindo de um lugar e com as críticas do tempo presente
e os debates que se colocam na agenda feminista contemporânea e pós-colonial,
apontaram para signicados que levaram em conta as experiências, a subjetividades
e o vivido do “ser mulher”, categoria essa tida como unitária e homogênea.
Revitalizada pela interseccionalidade/interseções
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entre gênero, classe,
raça, geração e sexualidades, o sujeito feminino subalternizado e silenciado emergiu
nessa virada do milênio como sujeito político que desaa as normas de subordinação
e as relações de poder, inclusive provocando alterações epistemológicas no meio
O evento de natureza nacional e internacional, ocorreu de 9-11/04/2017, com a coordenação geral da Prof.
Tania Suely A. M. BRABO e Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania de Marília (NUDHUC), em parceria
com o Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero (LIEG),o Grupo de Pesquisa, Formação do Educador
(GP Forme), ambos da FFC; do Centro de Investigação em Educação e Intervenção Educativas (CIEE); da
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto.
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Como categoria analítica é aprendida em uma historicidade onde as relações de gênero, classe, raça, geração
e sexualidades possuem “múltiplas diferenciações que incorporam aspectos econômico, político, cultural,
físico, subjetivo e experiencial que se interseccionam em contextos historicamente especícos”. BRAH e
PHOENIX,In: Não sou mulher? Revisitando a interseccionalidade, BRANDÃO et ali. (Org). Traduções da
cultura – perspectivas críticas feministas (1970-2010). Florianópolis: EDUFAL; Editorada UFSC, 2017,
p.663-664.
http://doi.org/10.33027/2447-780X.2017.v3.n1.01.p7
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acadêmico e na produção do conhecimento. Tangenciados por distintos eixos
teóricos metodológicos, os artigos que compõem esse dossiê reavivaram o sentido
do que signica ser “mulher” em diferentes circunstâncias históricas, desaando
as noções a-históricas e essencialista de mulher.
Por que retomar a “interseccionalidade”, nesse caso? Pela riqueza e
sosticação analítica que ela pode proporcionar? Pelas distintas experiências de
mulheres que a cada momento e situações evidenciam sujeitos performáticos em
suas práticas e identidades?
Entendemos que pensamento moderno ilustrado redigiu uma pauta de
diretrizes e normas de pensar o Outro, quase sempre abstrato, sem corporicações.
Com o advento do pós-estruturalismo nos anos 90, a teoria do discurso, a
desconstrução, a psicanálise, a análise dos processos sociais, a teoria queer e a
crítica pós-colonial, constatamos que há diferentes feminismos para além de uma
concepção teórica homogênea do Norte.
Tornou-se urgencial com os relevantes estudos autobiográcos
e empíricos, levar em conta que os movimentos sociais, os feminismos, os
sujeitos, a violência das relações de gênero são produzidos em relações históricas
contingências e sempre podem ser contestados nos múltiplos posicionamentos.
É nesse contexto, o conceito de “agência” é substancialmente importante
ao ser recongurado com as novas teorias de subjetividades que aoram e fornecem
subsídios e compreensão da vida psíquica e emocional e das relações sociais.
As(os) autores presentes desse dossiê, que são colaboradores e trouxeram
para o campo das discussões a análise de distintos objetos, que tangenciam e
entrecruzam com a temática “Mulher e Gênero” reetidas, em um primeiro
bloco, com o papel da mulher, das mulheres, da violência e das relações de
gênero e classe, tais como : o papel da mulher enquanto chefe de família e mãe,
fornecedora da dinâmica das relações familiares em circunstâncias vulneráveis;
a prática arbitrária e ilegal do uso de algemas em mulheres detentas durante o
parto, apesar da presença de uma legislação e jurisprudência contra esse ato de
violência; o papel da mulher numa sociedade de classes, situando a discussão
de que a subalternidade feminina é ideológica, construída por um pensamento
que valoriza o que pode se tornar propriedade; as mulheres vítimas de violência
doméstica, quase sempre inseridas em um processo vitimizatório, que mesmo
diante da Lei Maria da Penha sofre o que denomina-se de culpabilização; a
violência de gênero e a cultura do estupro vivenciadas no espaço universitário
situando a urgência de garantir efetivamente a inclusão social, de gênero e racial
na vida acadêmica diante dos inúmeros enfrentamentos e os conitos. Em um
segundo momento, dois artigos que investem no campo da literatura e das relações
internacionais, reintroduzindo a discussão dos sujeitos e de categorias que fogem
da normatização dos gêneros e se ancoram em visões sexistas que colocam como
prerrogativas de verdade um discurso monolítico e monopolizador.
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Fica registrado, portanto, a nossa contribuição teórica que devidamente
situada no tempo presente, amplia as discussões sobre os estudos de gênero e
mulher e contempla as novas ferramentas e possiblidades analíticas que desaam
o jogo de poder em sua dimensão local e global.
Lidia M. V. POSSAS.
Livre Docente História e Gênero da Faculdade de Filosoa e Ciências da
UNESP – Marilia/SP
Coordenadora do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero /LIEG
e- mail. lidia.possas@uol.com.br
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