Programa Transcidadania
Artigos/Articles
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Revista do Instituto de Políticas Públicas de Marília, v.9, n.1, p. 27-40, Jan./Jun., 2023
P
ROGRAMA
T
RANSCIDADANIA
:
UMA REVISÃO SISTEMÁTICA
T
RANSCITIZENSHIP
P
ROGRAMA
:
A SYSTEMATIC REVIEW
Kyury Silva de Assis
1
Agnes de Sousa Arruda
2
RESUMO:
Este artigo objetiva analisar o percurso histórico sobre as publicações científicas que
possuem como ferramenta de pesquisa o Programa Transcidadania por uma revisão sistemática
de abordagem descritiva e qualitativa, elaborada e redigida conforme recomendações do PRISMA
(Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyzes). Foram consultadas as bases
de dados do Portal de periódicos Capes e o Google Acadêmico. A busca na fonte citada teve como
termo indexador: “Programa Transcidadania” ePolíticas blicas”. A pesquisa foi realizada com-
binando esses termos em inglês. E para a revisão, considerou-se o período de 2015 até o ano de
2022. Realizada a busca foram encontrados (6) artigos que apresentaram aderência com o objetivo
e tema do estudo. Nota-se que o Programa Transcidadania, implementado em 2015, possui poucas
publicações, evidenciando assim uma escassez de artigos para análise, e que a maioria delas objetiva
uma metodologia descritiva e introdutória.
PALAVRAS-CHAVE:
Transgeneridades; Cidadania; Políticas Públicas.
ABSTRACT:
This article aims to analyze the historical trajectory of the scientific publications that
have the Transcitizenship Program as a research tool through a systematic review with a descriptive
and qualitative approach, elaborated and written according to the PRISMA (Preferred Reporting
Items for Systematic Reviews and Meta-Analyzes) recommendations. The Capes Journals Portal
and
Google Scholar databases were consulted. The search in the cited source had as index term:
“Transcidadania Programand “Public Policies”. The search was performed by combining these
terms in English. And for the review, the period from 2015 to the year 2022 was considered. After
the search, (6) articles were found that adhered to the objective and theme of the study. It is noted
that the Transcidadania Program, implemented in 2015, has few publications on it, thus evidenc- ing
a shortage of articles for analysis, and that most of them aim at a descriptive and introductory
methodology.
KEYWORDS:
Transgenderities; Citizenship; Public policy.
1
Mestranda em Políticas Públicas pela Universidade de Mogi das Cruzes (SP) bolsista pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Graduanda em Engenharia da Computação pela
UNIVESP (SP); Tecnólogo (2022) em Gestão de Recursos Humanos pela FATEC (SP).
2
Doutora (2019) e Mestre (2010) em Comunicação pela Universidade Paulista (SP); Graduação (2005) em
Comunicação Social - Jornalismo pelo Centro Universitário Teresa D’Ávila (SP); Autora do Pequeno Dicionário
Antigordofóbico (2022) e O peso e a mídia (2021).
http://doi.org/10.36311/2447-780X.2023.n1.p27
ASSIS, K. S.;ARRUDA, A. S.
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INTRODUÇÃO
Segundo Andrade (2012) em sua maioria, as políticas públicas
existentes e destinadas para a população trans centralizam a prevenção de
doenças e o combate à exploração sexual, existindo a carência de políticas
interdisciplinares que resultem em uma melhor qualidade de vida às
transgeneridades. As consequências da vulnerabilidade social, especialmente no
que se refere a esfera da empregabilidade, levou a Prefeitura de São Paulo,
por
meio do Centro de Combate à Homofobia e da Secretaria Municipal
de
Direitos Humanos e Cidadania, a construir o Programa Transcidadania,
responsável por desenvolver atividades de formação e capacitação para o
mercado de trabalho (PEDRA, 2018).
A partir desta política pública, este estudo pretende analisar o
percurso histórico sobre as publicações científicas que possuem como
objeto ou ferramenta de pesquisa o Programa Transcidadania, antecedendo
uma breve apresentação sobre a política selecionada, e objetivando em
sua discussão as perguntas estabelecidas na delimitação das questões de
investigação.
CONTEXTUALIZÃO: PROGRAMA TRANSCIDADANIA
Segundo Nunes (2019) O programa Transcidadania foi
implementado entre os anos de 2013 e 2016, mais precisamente em 29
de janeiro de 2015, durante a gestão municipal de Fernando Haddad, no
estado de São Paulo. Ademais, o Programa Transcidadania foi originalmente
desenvolvido como POT (Programa Operação Trabalho) o qual iniciou-se
em 2003 (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2022).
Conforme Silva (2019) o Programa Transcidadania oferece
condições para a recuperação das oportunidades de vida para a população
trans, aqueles (as) que se encontram em situação de vulnerabilidade social.
Portanto, segundo Pedra (2018, p. 184) “[...] o Programa Transcidadania,
que desenvolve atividades de formação e capacitação para o mercado
de trabalho junto a uma rede de parceiros como forma de emancipar
os participantes enquanto sujeitos de transformação de suas próprias
realidades [...]”
O transcidadania é um programa da Prefeitura de São Paulo destinado a pro-
mover os direitos humanos, cidadania e condições de oportunidades de vida
para mulheres transexuais e travestis e homens trans em situação de vulnera-
bilidade social. O Programa possui como dimensão estruturante o aumento
do nível de escolaridade e possibilita condições de autonomia financeira, por
meio da transferência de renda condicionada à execução de atividades rela-
cionadas ao Programa. Há formação profissional e formação cidadã. A essas
ações soma-se um exercício de aperfeiçoamento institucional, no que tange a
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qualificação de serviços e equipamentos públicos para atendimento qualificado
e humanizado desta população. (CONCÍLIO ET AL, 2017, p.24 apud NU-
NES,2019, p.46).
O programa Transcidadania concede a oferta da corroboração
objetivando uma autonomia financeira, através da distribuição de renda,
tendo como requisito para obtenção a frequência e conclusão da escolaridade
básica, qualificando-se desta forma para o mercado de trabalho, obtendo
formação profissional, conforme Silva (2019). Mas a atuação não se limita
na esfera de intermédio educacional, segundo Concílio (2017) o programa
também realiza atividades internas, como grupos psicossociais, atendimento
individuais, atendimentos espontâneos, cursos de cidadania e Direitos
Humanos, entre outros eventos construídos a partir das necessidades das
(os) usuárias (os) e das possibilidades concretas de realização.
Ademais, existem atividades externas, que articulam com o
trabalho em rede intersetorial do município de São Paulo, participando
Escolas Municipais e Estaduais, Centro Integrado de Educação de Jovens e
Adultos (CIEJA), Sistema Único de Saúde e o Sistema Único de Assistência
Social, conforme Concílio et al. (2017). Acrescenta Pedra (2018, p. 84)
“[...] formação profissional pelo Programa Nacional de Acesso ao Ensino
Técnico e Emprego (PRONATEC), além de cursos de “Cidadania, Direitos
Humanos e Democracia”, estágios e introdução ao mundo do trabalho.”
Segundo Miranda (2017, p.5) “Nesse período as participantes
se beneficiam da parceria com o Programa Operação Trabalho (POT) da
Secretaria Municipal de Desenvolvimento, Trabalho e Empreendedorismo
(SMDTE), que visa a transferência de renda através de uma bolsa salário.”
Além disso, a política limita-se à duração de 2 anos para cada pessoa
beneficiada, sendo o prazo máximo de permanência de cada turma inserida
no Programa Transcidadania, afirma Miranda e Machado (2017).
Em janeiro de 2015 contava com 100 vagas. Em 2016, o valor do auxílio
mensal aumentou para R$1001,70. No ano de 2017 o Transcidadania foi des-
centralizado passando a ser realizado nos 4 centros de Cidadania LGBTI, antes
era somente atendido na região central da cidade. Com a descentralização o
serviço se tornou mais democrático, humano e próximo das pessoas. Em 2019,
o valor da bolsa foi para R$ 1047,90. (SÃO PAULO, 2019)
METODOLOGIA
A natureza deste estudo trata-se de uma revisão sistemática
de abordagem descritiva e qualitativa, elaborada e redigida conforme
recomendações do PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic
Reviews and Meta-Analyzes).
ASSIS, K. S.;ARRUDA, A. S.
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DELIMITÃO DAS QUESTÕES DE INVESTIGÃO
Visando identificar as contribuições das comunidades científicas
brasileiras, foram definidas as seguintes perguntas de pesquisa: I) As
metodologias utilizadas dão conta de uma análise aprofundada da política
pública em questão? II) é possível identificar estudos sobre a política
pública nos períodos de covid-19? III) O que ainda pode ser explorado?
CRITÉRIOS DE BUSCA
Como condução e estratégia de busca para a seleção dos estudos,
foram consultadas as bases de dados do Portal de periódicos Capes e o
Google Acadêmico. A busca na fonte citada teve como termo indexador:
“Programa Transcidadania” e “Políticas Públicas”. A pesquisa foi realizada
combinando esses termos em inglês. E para a revisão, considerou-se o
período de 2015 até o ano de 2022, tal recorte temporal é justificado pela
criação do POT, em 2008, renomeado Transcidadania em 2015.
Portanto, como critérios de inclusão, consideraram-se artigos
interdisciplinares que estejam no escopo da pesquisa. Já os critérios de
exclusão foram: estudos repetidos, e/ou que não atendam o objetivo da
pesquisa, ou seja, os não relacionados ao Programa Transcidadania.
RESULTADOS
Realizada a busca foram encontrados (475) resultados, sendo (472)
no Google Acadêmico e (3) advindos do Periódicos Capes. Logo após, foi
efetuada uma triagem para exclusão de artigos duplicados entre as bases,
culminando em (472) resultados para leitura dos títulos, excluindo (461)
estudos que possuíam títulos divergentes ao foco da pesquisa. Também foi
realizada a leitura de (11) resumos, sendo excluídos (5) estudos que tinham
como foco outros objetivos e resultando em (6) artigos que apresentaram
aderência com o objetivo é tema do estudo. O procedimento da exclusão
de artigos é ilustrado na Figura 1.
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Figura 1:
Fluxograma de seleção dos estudos para revisão sistemática
(PRISMA)
Fonte:
Adaptado e traduzido de PRISMA 2020.
Dessa forma, para a constituição da análise do estudo, foram
considerados 6 estudos, tal como apresentados no Quadro 1.
Quadro 1:
Portfólio de trabalhos selecionados
Autores
Título
Objetivo / Enfoque
Santos e
Pereira
(2017)
Políticas públicas
LGBT: uma análise
do programa
Transcidadania da
prefeitura de São
Paulo.
Analisar o Programa TransCidadania
da Prefeitura de São Paulo,
descrevendo suas ações e formas de
atuação para o enfrentamento da
transfobia e promoção da cidadania
de travestis e transexuais naquele
município.
ASSIS, K. S.;ARRUDA, A. S.
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Miranda e
Machado
(2017)
Transversalidade
na Prática em
Política Pública:
a implementação
do Programa
TransCidadania
em São Paulo
Descrever a implementação do
programa e analisamos as inovações
que ele
traz.
Pedra et al
(2018)
Políticas Públicas
para inserção social
de Travestis e
Transexuais: Uma
análise do programa
“Transcidadania”
Compreender como essa política
pública atua na inserção das
pessoas assistidas na sociedade e,
principalmente, no mercado de
trabalho.
Silva e
Ramacciotti
(2020)
Programa
Transcidadania:
Política Pública
de Inclusão de
mulheres Trans pela
educação formal e
não-formal.
Fazer uma análise descritiva do
Programa e uma avaliação ou análise
prescritiva de alguns resultados
a partir de dados referentes
à população trans usuária do
Transcidadania, entre os anos 2013
e 2019.
Nunes e
Portéro
(2020)
O programa
transcidadania
como ferramenta
de inclusão
educacional e
profissional dos (as)
transgêneros no
município de São
Paulo
Fazer a contextualização social da
população transgênera descrevendo
a vulnerabilidade social que estão
submetidos(as) e os estarrecedores
índices de violência.
Suárez e
Martínez
(2021)
Trabajo decente
y personas trans:
un análisis
del Programa
TransCidadania
(2015-2016)
Analisar a imbricação entre o
conceito de trabalho decente e a
população trans por meio do estudo
da primeira edição do programa
TransCidadania implantado na
cidade de São Paulo nos anos de
2015 e 2016.
Fonte:
Elaboração do autor.
Sobre os artigos selecionados, de acordo com a Tabela 1, no
que concerne o processo metodológico na busca de resultados, 02 (dois)
artigos priorizam a Revisão de Literatura e/ou de Bibliografia, 04 (quatro)
priorizam a Pesquisa Documental, 03 (três) priorizam a Pesquisa de
Campo e 01 (um) priorizou Estudos de caso. Ressalta-se que diversos
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artigos possuem mais uma nuance metodológica em sua produção, além
de suas propostas.
Ainda sobre os artigos, é possível analisar que 02 (dois) possuem
proposta descritiva e, também, 04 (quatro) artigos possuem proposta
descritiva e analítica. Ademais, de modo a atingir os objetivos desta produção
com clareza, a seção de discussão será sumarizada a fim de responder às
perguntas definidas na delimitação das questões de investigação, as quais
foram mencionadas na metodologia.
DISCUSSÃO
I)
A
S METODOLOGIAS UTILIZADAS DÃO CONTA DE UMA ANÁLISE
APROFUNDADA
DA POLÍTICA PÚBLICA EM QUESTÃO?
Embora a palavra análise componha o título de sua obra, de acordo
com Santos e Pereira (2017, p.1) “Este trabalho tem por objetivo analisar
o Programa TransCidadania da Prefeitura de São Paulo, descrevendo suas
ações e formas de atuação [...]” Portanto, o estudo de Santos e Pereira (2017)
não necessariamente possui cunho avaliativo, somando-se às produções de
2017, mas com viés introdutório e necessário sobre a política. Salienta-se
a informação de que o primeiro artigo acadêmico produzido sobre o tema
foi publicado em 2017.
No mesmo ano, assim como Santos e Pereira (2017), Miranda
e Machado (2017) realizaram uma descrição histórica acerca da
implementação do Programa Transcidadania, e ademais às pesquisas
documentais, sua produção conta com uma pesquisa de campo captando o
depoimento dos atores públicos relacionados a esta política pública, tanto
quanto pessoas beneficiadas pela mesma. Segundo pesquisa de Miranda e
Machado (2017, p.3):
Quando a gente começou a pensar o Transcidadania, eu ainda nem estava em
São Paulo, mas eu participei de algumas discussões, primeiro que foi uma en-
comenda do prefeito. Então, ele realmente tem a ver com o modelo de gestão
que a gente queria aplicar na cidade, que era um modelo de gestão que tratas-
se, pela primeira vez, de pessoas que nunca foram recepcionadas pelo serviço
público na cidade de São Paulo e pessoas trans* era um desse público, além de
LGBT, então essa foi uma encomenda do prefeito. (Symmy Larrat, excoorde-
nadora do programa TransCidadania).
Esses atores públicos que se relacionam com o programa
também descrevem as propostas da política pública enquanto atuação
multidisciplinar, conforme Miranda e Machado (2017, p.8):
ASSIS, K. S.;ARRUDA, A. S.
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A gente construiu. Fazia de uma forma, se reunia, não deu certo, vamos mudar,
agora vai ser desse jeito, a gente veio construindo isso”. (Millena Wanzeller,
ex-auxiliar de coordenação do programa TransCidadania).
A discussão de casos é feita pelas trabalhadoras psicólogas, assistente social e
pedagoga, que levam alguns casos para serem discutidos na reunião geral, onde
as decisões são tomadas coletivamente. As profissionais validam e reconhecem
a importância da equipe multidisciplinar para os processos de trabalho. Sobre
o trabalho multidisciplinar, pra mim é fantástico. Tem entraves? Óbvio. São
teorias, são metodologias que são muito distintas. Mas é isso, o que nos enri-
quece é o trabalho multidisciplinar, é um complementando o outro” (Cíntia
Spíndola, ex- assistente social do programa TransCidadania).
Essa coisa do coletivo, vamos decidir juntos, vamos fazer juntos, muito tra-
balho, mas quando sai o resultado, é outro. O trabalho é construído coletiva-
mente, ele o é construído individualmente (Gabriela Oliveira, ex-assistente
social do Programa Transcidadania).
Ainda no caráter avaliativo, para Berman (1978) é importante
analisar as políticas públicas a partir dos parâmetros situacionais pertinentes
ao seu contexto, contribuindo para a redução dos problemas na fase de
implementação. Berman (1978, apud PEDRA et al., 2018) menciona
cinco parâmetros situacionais que “capturam” as contingências da situação
da política, e definem aspectos da natureza da política, bem como a situação
institucional do contexto e a interação entre eles.
Pedra et al (2018) define seu primeiro parâmetro de análise,
o nomeando de “escopo de mudança” e sobre o mesmo, o autor define
que “[...] a alta programabilidade do Transcidadania, a partir de grades
de cursos bem definidos e um ciclo de desenvolvimento individual bem
estruturado, são insumos necessários [...] (p. 190).
Pedra et al (2018) define seu segundo parâmetro de análise
como “conflito sobre metas e meio” e sobre o mesmo, o autor define
que esse parâmetro reflete o conflito entre o conteúdo da política e as
ferramentas a serem utilizadas. “Um método adaptativo lida com situações
conflituosas, de modo que a implementação requer negociação com as
partes interessadas.” (p. 191). O autor chega à conclusão que a partir do
eixo de inserção da população alvo ao ambiente de trabalho, é notório que
a forma de funcionamento da política atende suas propostas (PEDRA et
al., 2018).
Para Pedra et al (2018) o terceiro parâmetro de análise trata- se
do grau de certeza da tecnologia, que segundo o autor refere-se “[...]
da incerteza sobre a tecnologia e a teoria utilizadas.” (p. 191). O
Transcidadania foi construído a partir de discussões realizadas por equipes
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especializadas nos temas abordados, é possível inferir que embasamento
teórico aprofundado que fundamenta a aplicabilidade da política, portanto
se entende que a política foi definida a partir do consenso teórico vigente,
o que não impede que ela sofra alterações no decorrer do tempo (PEDRA
et al., 2018).
O quarto parâmetro de análise trata-se da “[...] estabilidade do
ambiente de implementação da política. Nesse ponto, tratam-se dos pesos
e contra-pesos do ambiente de implementação que podem afetar ou não
os resultados.” (PEDRA et al., 2018, p. 192). Para o autor, é notável a
instabilidade em relação ao ambiente de implementação da política, pois
se refere a uma população marginalizada, a qual é historicamente excluída
de muitos ambientes, como o mercado de trabalho, além de enfrentar
a resistência e perseguição de uma parcela da sociedade (PEDRA et al.,
2018).
Quanto ao quinto parâmetro de análise, trata-se sobre a
operacionalização do Programa, e espera-se sobre a sua administração,
o desenvolvimento das atividades previamente definidas, tanto quanto
o resguardo de uma discricionariedade do implementar, e ademais ao
pagamento de bolsas, exigindo um maior controle financeiro, e no
cumprimento das regras e processos acordados (PEDRA et al., 2018).
Ademais as análises mencionadas sobre a viabilidade do Programa
Transcidadania e os relatos sobre os atores públicos e os atos relacionados
à política, Silva e Ramacciotti (2020) realizaram uma pesquisa de campo,
concernente a uma dissertação de mestrado que agregam informações
quantitativas e analíticas acerca do público beneficiado pelo Programa.
Silva e Ramacciotti (2020) elaboraram uma tabulação acerca
da escolaridade das pessoas beneficiadas pelo Programa Transcidadania,
seus resultados foram: 50% possuíam Ensino Fundamental Incompleto,
17% Ensino Fundamental Completo, 5% Ensino Médio Completo, 14%
Ensino Médio Incompleto, 5% Ensino Superior Incompleto e 14% sem
informação, pois os beneficiários estavam providenciando documentos.
Ressalta-se que o recorte temporal dos resultados de Silva e
Ramacciotti (2020) foi de 2013 a 2019. O autor também traz os recortes
de gênero, e as transtravestilidades que mais foram atendidas pela política.
Segundo Silva e Ramacciotti (2020) 158 travestis, 152 mulheres trans, 22
homens trans e 114 pessoas que não rotularam sua identidade de gênero,
mas que se autodeclararam pertencentes à comunidade LGBTQIAP+,
foram desligadas do programa.
Ainda sobre os desligamentos, Silva e Ramacciotti (2020)
identificam nos centros de Cidadania LGBTI+ que, 92 desses desligamentos
ASSIS, K. S.;ARRUDA, A. S.
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foram por término de contrato, e que 183 términos foram por motivos
desconhecidos, e poucos por inserção no mercado de trabalho, que no caso
foram 32. Número alarmante por se tratar de uma baixa eficiência de um
dos principais objetivos do programa.
Seguindo a ordem cronológica das publicações, Nunes (2020)
através de sua pesquisa documental e revisão de literatura, atinge seu
objetivo em analisar o preconceito e a discriminação que rodeiam as
transtravestilidades, também no contexto da empregabilidade. A autora
também faz menções importantes sobre o Programa Transcidadania e seu
processo de implementação, mas a política pública é descrita e introduzida,
assim como Santos (2017).
sobre a análise de Suárez e Martinez (2021) a mesma baseia
sobre os três eixos que o Programa Transcidadania se propõe a atuar, sendo
eles: Mais autonomia; Mais oportunidades e Mais cidadania, em paralelo
aos princípios fundamentais do direito do trabalho. Após análise, Suárez
e Martinez (2021) concluíram que a política pública consegue melhorar a
qualidade de vida de pessoas trans mais vulneráveis, “[...] uma vez que suas
participantes eram em sua maioria mulheres trans negras que viviam nas
áreas mais pobres da cidade.” (SUÁREZ, 2021, p. 26).
Suárez e Martinez (2021) também fazem menção para a
necessidade de adicionar educação financeira em um dos eixos promovidos,
a fim de uma melhor administração de um dinheiro vindo ou não de uma
atividade formal, assim como uma educação sobre a legislação e direitos
que lhes concerne. A autora menciona que a política foi promulgada como
decreto, e que a continuidade no governo municipal subsequente foi
ameaçadora, mas através das lutas dos coletivos trans a política conseguiu
se manter, mesmo recebendo cortes de bolsas disponíveis.
As metodologias utilizadas, que objetivam o Programa
Transcidadania, em especial as pesquisas de campo, foram eficazes em
analisar a viabilidade do projeto, sobre as pesquisas documentais de viés
descritivo, destoam apenas na profundidade do estudo, evidenciando a
necessidade de outras metodologias que agreguem esta linha de pesquisa.
Como exemplo, pesquisas de campo que levantem relatos das pessoas
atendidas pela política, entre outros objetivos a serem explorados.
II)
J
Á É POSSÍVEL IDENTIFICAR ESTUDOS SOBRE O
P
ROGRAMA
T
RANSCIDADANIA
NOS PERÍODOS DE COVID
-19?
Através do recorte temporal utilizado nesta revisão, não foi
possível identificar nenhuma publicação de artigo acadêmico que avalie o
Programa Transcidadania e sua atuação durante a pandemia de Covid-19.
Programa Transcidadania
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Embora a publicação de Suárez e Martinez (2021) seja decorrente ao
período pandêmico, seu estudo é referente aos anos de 2015 e 2016.
III)
O
QUE AINDA PODE SER EXPLORADO
?
Consoante ao período pandêmico e como mencionado por
Suárez e Martinez (2021) a redução das bolsas por atuação de um governo
subsequente, esses fatores externos corroboram com a necessidade de novas
avaliações e comparações sobre a política. Comparações essas não apenas
temporais, mas também territoriais, que é uma política que está sendo
implementada em outros estados.
Art. Institui o
Programa TransCidadania no Estado do Rio Grande do
Norte, destinado a promover os direitos humanos, o acesso à cidadania e a
qualificação e humanização do atendimento prestado às pessoas transgêneros,
travestis e transexuais em situação de vulnerabilidade social (RIO GRANDE
DO NORTE, 2022).
Enquanto política que se desenvolve também na esfera do
trabalho e proteção social básica, uma linha de pesquisa que pode ser
melhor explorada é a presença de pessoas trans em empresas privadas
beneficiadas por este programa, colaborando para uma maior produção de
dados quantitativos acerca da empregabilidade da comunidade trans.
Segundo Assis (2022) são necessários novos estudos científicos
a respeito desse tema, sobre principalmente dados sociodemográficos em
torno das transidentidades em empresas privadas. O mesmo autor discorre
sobre a ausência de dados quantitativos acerca da presença de pessoas trans
em empregos formais. Tornando-se válido mencionar a baixa produção
acadêmica sobre uma política pública que existe desde 2015, abrindo
margem para uma possível defasagem de publicidade e visibilidade do
Programa Transcidadania, a qual linha de pesquisa, assim como sua atuação
durante pandemia, pode ser melhor explorada.
CONSIDERÕES FINAIS
O presente estudo buscou compreender o percurso histórico do
programa transcidadania, por meio de uma revisão acerca de publicações
científicas. Compreende-se que esta revisão conseguiu atingir seu objetivo
proposto. Portanto, nota-se que o Programa Transcidadania, implementado
ASSIS, K. S.;ARRUDA, A. S.
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em 2015, possui poucas publicações sobre, evidenciando assim uma escassez
de artigos para análise, e que sua maioria delas objetiva uma metodologia
descritiva e introdutória, possuindo uma grande margem a ser explorada
futuramente.
Além disso, o desenvolvimento do presente estudo exibiu
algumas lacunas a serem desenvolvidas nesta linha de pesquisa, e com
esta política pública, que inova e avança no âmbito, não apenas na área
de empregabilidade para pessoas trans, mas também sobre a reintegração
social, desenvolvendo programas de maneira ampla e se pautando em eixos
como: autonomia; oportunidade; e cidadania.
REFERÊNCIAS
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