O favorecimento da apropriação da língua escrita nos anos finais da Educação Infantil
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‘O
FAVORECIMENTO DA APROPRIAÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA NOS ANOS
FINAIS DA
E
DUCAÇÃO
I
NFANTIL E INICIAIS DO
E
NSINO
F
UNDAMENTAL
:
APROXIMAÇÕES E DISTANCIAMENTOS
THE FAVORING OF WRITTEN LANGUAGE APPROPRIATION IN THE FINAL
YEARS OF EARLY CHILDHOOD EDUCATION AND THE BEGINNING OF
ELEMENTARY sCHOOL: APPROXIMATIONS AND DISTANCES
Flaviane Maria Rodrigues Giroto
1
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo observar o cenário em que o processo de
apropriação da escrita acontece e traçar possibilidades aos professores alfabetizadores por meio de
atividades e práticas que elucidem boas e eficientes práticas pedagógicas. Como possibilidades de
alinhar os conteúdos às práticas dicas no processo do aprender, o artigo busca fazer uma análise
das necessidades das crianças como seres ativos socialmente, elucidar situações que podem agravar a
apropriação da escrita e viabilizar momentos em que o professor utilize ferramentas mais ligadas ao
brincar à medida que se aprende. O trabalho de pesquisa bibliográfica teve como eixos norteadores a
Teoria Histórico Cultural de Vygotsky e os princípios dialógicos do Círculo de Bakhtin. Como base
de práticas, faz-se presente no texto, algumas atividades lúdicas desenvolvidas em sala de aula, com
alunos do segundo ano do ensino fundamental em processo de alfabetização. Como instrumento
de geração de dados, foi utilizado a pesquisa bibliográfica e análise de práticas pedagógicas, dentro
do cenário escolar de apropriação da escrita. A construção do artigo elucidou a problemática inicial
de que na maioria das vezes as práticas “professorais” não vão ao encontro das as necessidades
dos alunos, confrontando assim com a função do ensinar. Confirmou-se que, a forma com que
o professor alfabetizador na maioria das vezes (e sem conhecimento de outras possibilidades) leva
o conteúdo aos seus alunos, faz com que esses memorizem as informações em caráter avaliativo e
somativo e não como deveria, que é em caráter qualificativo e formativo. Ao final do artigo, destaca-
se a importância do ensino lúdico e seu valor social nos processos de ensino e de aprendizagem.
Palavras-chave: Educação. Apropriação da linguagem escrita. Ensino Lúdico. Práticas de
alfabetização.
1
Possui licenciatura em Pedagogia Pela Universidade Estadual Paulista UNESP Marília (2017). Com pós-
-graduação em Ensino Lúdico pela FAEL, cursa Mestrado em Educação pela UNESP Marília. Atua como
professora de Educação Infantil pela Prefeitura Municipal de Marília.email: flaviane.giroto@unesp.br
http://doi.org/10.36311/2447-780X.2022.n1.p21
GIROTO, F. M. R.
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ABSTRACT: This article aims to observe the scenario in which the process of appropriation of
writing takes place and to outline possibilities for literacy teachers through activities and practices
that elucidate good and efficient pedagogical practices. As possibilities of aligning content with
playful practices in the learning process, the article seeks to analyze the needs of children as
socially active beings, elucidate situations that can aggravate the appropriation of writing and
enable moments in which the teacher uses tools more connected to the play as you learn. The
work of bibliographic research had as guiding axes the Historical Cultural Theory of Vygotsky
and the dialogical principles of the Bakhtin Circle. As a basis of practices, it is present in the text,
some playful activities developed in the classroom, with students of the second year of elementary
school in the literacy process. As an instrument of data generation, bibliographic research and
analysis of pedagogical practices were used, within the school scenario of appropriation of writing.
The construction of the article elucidated the initial problem that most of the time “of teachers”
practices do not meet the needs of students, thus confronting the function of teaching. It was
confirmed that the way in which the literacy teacher most of the time (and without knowledge of
other possibilities) takes the content to his students, makes them memorize the information in an
evaluative and summative character and not as he should, which is in a qualifying and formative
nature. At the end of the article, the importance of playful teaching and its social value in the
teaching and learning processes is highlighted.
Keywords:
Education. Appropriation of written language. Playful Teaching. Literacy practices.
INTRODUÇÃO
A alfabetização é um processo longo e extremamente necessário na
formação educacional/pedagógica da criança. Para tanto, muitos são os fatores
que
levam ao sucesso ou fracasso de passo tão importante.
Por mais que vários aspectos precisam ser observados, um dos pilares
fundamentais nesse processo é o professor. É ele quem direciona, organiza e gere
esse aprendizado (ou sua falta). A necessidade de organização do professor e sua
capacidade de pensar no grupo heterogêneo (sala de aula) ao mesmo tempo em
que precisa trabalhar com a personalização (o aluno e suas especificidades) são os
norteadores que o levarão aos resultados finais. A integralidade e as peculiaridades
de cada criança são um desafio e concomitantemente, a chave para a alfabetização.
Em defesa disso, Fiorin (2008, p. 28) alega que
No dialogismo incessante, o ser humano encontra o espaço de sua liberdade e de
seu inacabamento [...]. A singularidade de cada pessoa no “simpósio universal”
ocorre na “interação viva das vozes sociais”. Nesse “simpósio universal”, cada
ser humano é social e individual.
Até mesmo na vida acadêmica temos mais interesse naquilo que vem
ao
encontro com o que acreditamos ou com aquilo que sabemos como utilizar
em
nossas vidas. Com as crianças funciona dessa mesma forma, não podemos ensinar
ao aluno que a letra “A” é de avião, se a criança não conhece um avião e
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porque vou ensinar que essa letra é do avião mesmo sabendo que ela se encontra
em tantas palavras e diversos contextos.
Ensinar a unidade mínima das letras e das palavras é descontextualizar
seus significados. As palavras são carregadas de sentidos, em cada realidade e
contexto uma mesma palavra pode ter significados diferentes. Aproximar a
linguagem da realidade social da criança é ensinar o valor social de se comunicar,
seja pela forma escrita ou oralmente. A língua se forma nas relações e não pode ser
considerada estática, uma vez que conforme mudanças na sociedade, ela muda
junto. Freitas (1994) alega que para Bakhtin a língua é constituída historicamente
e por esse motivo não pode ser desvinculada de sua funcionalidade social.
Principalmente ensinar a linguagem escrita é suprir a necessidade
que as crianças já têm dessa forma de comunicação, para assim interagir com
sua realidade, pois a partir do momento em que se apropria da língua escrita,
ela consegue desvendar um novo mundo de significados e realidades sociais
historicamente acumulados e que fazem parte de sua constituição.
Se o processo de apropriação da escrita requer envolvimento de
dedicação, um bom caminho é transformar as atividades pedagógicas em
momentos divertidos e significativo às crianças. Jogos, brinquedo, brincadeiras,
dinâmicas em grupos ou até individuais, contextualizam os conteúdos e os
caracterizam na linguagem infantil, fazendo com que o aluno interiorize o
aprendizado na mesma velocidade em que é capaz de se divertir. Mais uma vez
nos deparamos com a importância da intencionalidade das atividades elaboradas
pelo professor.
Como o próprio Ministério da Educação, a partir da Base Nacional
Comum Curricular (2017) cita, o brincar é fundamental, por isso a maior
preocupação da escola com essas crianças deve ser no desenvolvimento de atividade
que estimulem o lado criativo, lúdico para que a partir desses aspectos possa-se
inserir os conteúdos que lhes cabe. Não que os outros anos não necessitem dessa
forma mais lúdica e didática, mas essas são crianças antes do ensino pré-escolar e
precisam brincar, pois
Para a criança nesse nível de desenvolvimento físico, o ainda atividade
teórica abstrata, e a consciência das coisas, por conseguinte, emerge nela,
primeiramente, sob a forma de ação. Uma criança que domina o mundo que
a cerca é a criança que se esforça para agir neste mundo. (VIGOTSKII, 1988,
p. 120).
O MEC, a partir do documento de defesa da ampliação do ensino
fundamental para nove anos (2006), defende a importância do ensino da língua
escrita a partir das relações sociais e da significância do que será ensinado, já que
a criança demonstra a partir do envolvimento com o mundo, a necessidade de
comunicação. Alega-se no documento,
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[...] que desde muito cedo elas manifestam um grande interesse pela leitura
e pela escrita, ao tentar compreender seus significados e tentar imitar o gesto
dos adultos escrevendo. Nesse processo, a escola deve considerar a curiosidade,
o desejo e o interesse das crianças utilizando a leitura e a escrita em situações
significativas para elas. (BRASIL, 2006, p. 21).
Ao mesmo tempo em que é possível encontrar preocupação com o
social da criança, encontramos a defesa pela sistematização do ensino dando-lhe
parâmetros que, se seguidos a rigor, criticam a ideia anterior, defendendo “[...] um
trabalho sistemático, centrado tanto nos aspectos funcionais e textuais, quanto no
aprendizado dos aspectos gráficos da linguagem escrita e daqueles referentes ao
sistema alfabético de representação. (BRASIL, 2005, p. 21).
que de certa forma cobrança de alfabetização sobre a criança e o
professor, é fundamental que, ao utilizar de formas para ensinar, esse professor tenha
conhecimento da importância do que ensina objetivado pelo interesse que em
aprender tal contdo, promovendo diálogos, momento de troca de experiências, em
que cada pessoa tenha direito de ser ouvida e de falar, sem desvalorizar a individualidade
de cada um que tem a agregar nesses momentos de partilha e interação.
Os sujeitos que se envolvem nessas relações dialógicas não são entes autônomos
e pré-sociais, mas indivíduos socialmente organizados. Isso significa dizer que
os sujeitos se definem como feixes de relações sociais: constituem-se e vivem
nestes feixes que são múltiplos, não fixos e nunca totalmente coincidentes
de pessoa a pessoa (ainda que membros de um mesmo grupo social). Os
sujeitos são, portanto, seres marcados por profunda e tensa heterogeneidade.
(FARACO, 2009, p. 121).
A apropriação da língua escrita é um processo complexo ao ponto que
ensinar letras é uma parte tão pequena desse processo que, se transformada em
objeto, descaracteriza a linguagem, fragmentando-a e decodificando as palavras a
partir dessa unidade e não do processo como um todo. Além de não dar sentido
real à alfabetização, a criança não tem despertado o interesse em aprender a ler e a
escrever, pois não desafios que a ajudarão a compreender a vida.
Alfabetizar não é ensinar uma palavra separada. De que adianta ensinar
o nome das frutas se a criança nem conhece determinada fruta, os temas devem
surgir da realidade social dos alunos, por isso vemos que
Bakhtin contrapôs à fragmentação da linguagem instrumentalizada do
subjetivismo idealista e do objetivismo abstrato, uma concepção dialética
de linguagem que o homem como sujeito falante, como autor, portanto
como produtor. Criticou o subjetivismo idealista que o ato da fala de
criação individual como fundamento da língua. [...] o centro organizador de
toda enunciação não é interior, mas essituado no meio social que envolve o
indivíduo. (FREITAS, 1994, p. 104).
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A partir do pensamento bakhtiniano, é nítido que não uma ngua
morta, porque essa se constitui a partir das relações sociais. Se essa se nesse
contexto, a alfabetização não pode se desvincular do valor real social. Alfabetizar
a partir das experiências, contextos e culturas, é fazer com que o aluno entenda
o verdadeiro motivo pela qual precisamos nos comunicar - seja de forma oral
ou escrita - e estabelecer relações, uma vez que para Freitas (1994, p. 105) essas
crianças “não recebem a língua pronta para ser usada: eles penetram na corrente
da comunicação verbal, ou melhor, somente quando mergulham nessa corrente é
que sua consciência desperta e começa a operar”.
O presente artigo foi construído a partir do pressuposto de que, as
formas como o professor alfabetizador na maioria das vezes (e sem conhecimento
de outras possibilidades) leva o conteúdo aos seus alunos, faz com que esses
memorizem as informações em caráter avaliativo e somativo e não em caráter
qualificativo e formativo, visando sua constituição histórica, social e intelectual.
Para que os conteúdos e o processo de apropriação da língua escrita sejam realmente
significativos, acredita-se que é fundamental criar práticas e métodos mais lúdicos
para que ao se divertir, o aluno esteja aprendendo conteúdos fundamentais para
sua vida toda.
TEORIA E PRÁTICA REALIDADES DA SALA DE AULA
As relações são estabelecidas quando um falante e um interlocutor.
A pesquisa precisa valorizar essa relação dialógica na qual
[...] o enunciado se forma entre dois indivíduos socialmente organizados, e, na
ausência de um interlocutor real, ele é ocupado, por assim dizer, pela imagem
do representante médio daquele grupo social ao qual o falante pertence. A
palavra é orientada para o interlocutor, ou seja, é orientada para quem é esse
interlocutor [...]. (VOLOSHINOV, 2017, p. 204)
Para Voloshinov e Bakhtin (2011, p. 75),
O erro fundamental daqueles que até agora estudaram as formas segundo as
quais a palavra outra é reportada constitui-se pelo fato de que essas eram
claramente separadas do contexto que as reporta. Daqui deriva o caráter
estático e inerte no qual essas formas foram apresentadas (estaticidade que, em
geral, caracteriza inteiramente o estudo da sintaxe). No entanto, o verdadeiro
objeto deve ser a própria inter-relação dinâmica desses dois fatores: a palavra
reportada (“outra”) e aquela que reporta (a palavra do “autor”).
Se eu digo ou penso em algo, é porque esse conteúdo chegou a mim
a partir da relação com o outro. Se eu pensar em forma de coleta de dados que
ignora a voz do outro, automaticamente estou desconsiderando minha própria
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constituição. A presença do outro traz informações que somente as palavras
escritas em uma entrevista não são capazes de expressar.
A enunciação é sempre de alguém para alguém. Responde e reclama uma
resposta. Esta resposta ultrapassa os limites do verbal. Está sujeita a
comportamentos e solicita comportamentos que não são somente de tipo
verbal: vive no cruzamento de atos comunicativos extraverbais que podem ser
entendidos como signos que a interpretam e como signos que ele interpreta.
Definitivamente, a enunciação vive no jogo de compreensões responsivas,
expressadas por signos verbais e não verbais. (PONZIO, 2016, p. 95).
É preciso considerar que trato da apropriação da língua escrita como
algo complexo e real se comparado a maneira como os professores normalmente
conduzem os momentos de escrita com interesse na alfabetização tanto falada
e sonhada pelos professores principalmente dos primeiros e segundos anos
do ensino fundamental. A questão não é a terminologia da palavra, mas os
métodos tradicionais que são utilizados até hoje na escola para que a criança seja
alfabetizada. Ao pensar em apropriação da ngua, a complexidade da expressão vai
além de recursos didáticos restritos a escola. Apropriar-se de algo é tomar para si
de fato, é constituir-se a partir daquilo que nos afeta e nos modifica, uma vez que
ao nos apropriarmos de algo ele se torna nosso, como propriedade, como uma
extensão do “eu”. tomamos para nós aquilo que de alguma forma nos atinge
e nos faz pensar além da forma que pensamos agora, ou ao menos refletir sobre o
que está a acontecer.
Nas crianças a necessidade de apropriar-se é algo efervescente e gritante,
pois é a partir das apropriações do mundo, do conhecimento historicamente
acumulado, que elas se constituem como seres humanos e sociais. A apropriação
da escrita se justamente a partir das significações, pois
Se formos capazes de desenterrar essa pré-história da escrita, teremos adquirido
um importante instrumento para os professores: o conhecimento daquilo que
a criança era capaz de fazer antes de entrar na escola, conhecimento a partir
do qual eles poderão fazer deduções ao ensinar seus alunos a escrever. (LURIA,
1998, p. 144).
A escola tende a abordar a aprendizagem assim como se faz em uma
confeitaria para que bolos sejam preparados: primeiro se coloca os ingredientes,
depois mistura tudo, põe no forno, tudo feito sempre na mesma ordem para
que nada saia errado e o bolo não “desande”. A grande questão é que muitos
“desandam” mesmo seguindo a ordem, mas a diferença é que na confeitaria o
erro pode estar em qualquer lugar, nos ingredientes, no confeiteiro ou no forno,
contudo na escola o erro está sempre no forno. Imaginemos que os ingredientes
são os materiais dos professores, os padeiros o os professores e cada criança é um
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forno com sua própria temperatura, tamanho e forma ora, se os materiais não
mudaram nem o padeiro, a culpa pode ser mesmo do forno.
Os professores tendem a usar sempre o mesmo material e da mesma
forma e culpabilizam os que não aprendem por não serem iguais àqueles que
aprenderam. A questão que nem todos têm a mesma “temperatura”, as crianças
não são iguais, os interesses e as vivências não são as mesmas e nem os objetivos.
Forçar que todos se interessem e aprendam a escrever pelo conteúdo sem lhes
ofertar o contexto sempre da mesma forma, ao meu ver está mais ligado a decoração
e decodificação de sinais. Dar condições para que as crianças, que tem interesse
histórico na escrita, cheguem a se apropriar dessa linguagem a partir de seus reais
interesses, constitui o processo de apropriação da língua escrita. Porém, é preciso
respeitar e acompanhar as fases e os interesses das crianças. O professor é sempre
um pesquisador que, com sensibilidade percebe as possibilidades de seus alunos,
primeiro explorando as coisas para depois materializá-las, isso vale tanto para a
escrita quanto para qualquer oura situação de aprendizagem na escola, uma vez
que a criança precisa conhecer os signos
2
, ver as coisas do mundo e atribuir-lhes
significados.
Para uma criança ser capaz de escrever ou anotar alguma coisa, duas condições
devem ser preenchidas. Em primeiro lugar, as relações da criança com as coisas
a seu redor devem ser diferenciadas de forma que tudo o que ela encontra
inclua-se em dois grupos principais: a) ou as coisas representam algum interesse
para a criança, coisas que gostaria de possuir ou com as que brinca; b)ou os
objeto são instrumentais, isto é, desempenham apenas um papel instrumental
ou
utilitário, e só tem sentido enquanto auxílio para a aquisição de algum
outro
objeto ou para a obtenção de algum objetivo, e, por isso, possuem apenas um
significado funcional para ela. Em segundo lugar, a criança deve ser capaz
de
controlar seu próprio comportamento por meio desses subsídios, e nesse
caso
eles funcionam como sugestões que ela mesma invoca. Só quando as
relações
da criança com o mundo que a cerca se tornam diferenciadas dessa
maneira,
quando ela desenvolveu sua relação funcional com as coisas, é que
podemos
dizer que as complexas formas intelectuais do comportamento humano
começaram a se desenvolver. (LURIA, 1998, p. 145).
As metodologias e recursos escolares precisam acompanhar a rapidez
com que as coisas se modificam, ainda mais na era digital, em que as informações
circulam em uma velocidade surpreendente, não basta ensinar que o “B+A” forma
“BA”, mas mostrar que a grafia está a serviço da comunicação e não o contrário.
O que emerge da própria exposição de Bakhtin é a instabilidade e não a
estabilidade do conhecimento e, de certo modo, da própria linguagem, da
própria palavra, em razão de sua criação permanente pelas relações humanas
2
Para Bakhtin/Voloshínov, “[...] o signo não se constitui fora da realidade material, mas reflete e refrata outras
realidades. Os signos somente emergem e podem existir dentro de uma realidade material e concreta. Eles com-
portam em si índices de valores que espelham e constituem os sujeitos que os utilizam e a realidade social por
onde circulam. (GEGe, 2013, p. 93)
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e por não estarem imobilizadas como produto cultural concluído. Nada, desse
modo, permanece estável durante muito tempo, porque a própria natureza da
estabilidade é provisória. Trata-se de uma característica que vai solicitar a ação do
pensamento de natureza dialética para compreender o movimento da palavra, em
sua evolução constante, não na aparência gráfica ou sonora, mas na sua essência
ideologizada. A evolução da palavra, portanto da linguagem, aciona a própria
mudança e evolução nos modos de pensá-la, organizando uma contribuição
recíproca entre pensamento e linguagem. (ARENA, 2010, p. 173).
Retomemos as afirmações de Vieira (2009). Essa pesquisadora, ao
analisar a reorganização do espaço de salas da Educação Infantil, com base em
fundamentos da Teoria Histórico-cultural, argumenta a exigência de pensarmos:
[...] [um] espaço que proponha relações que contribuam para a formação das
funções psicológicas nas crianças pequenas, proporcionando as condições
adequadas para a máxima apropriação das qualidades humanas pelas novas
gerações e é, portanto, um dos componentes estruturantes da realidade social
(SITTA, 2008). Assim, é importante pensar em espaços que asseguram as
diferentes formas de brincar, possibilitando que a brincadeira seja vivida como
experiência de cultura e como elemento fundamental para o desenvolvimento
das potencialidades e habilidades das crianças. (VIEIRA, 2009, 16).
Em consonância com essa argumentação, Rinaldi (1999, p. 77) afirma:
[...] deve ser um lugar que acolha o indivíduo e o grupo, que propicie a ação
e a reflexão. Uma escola ou uma creche é antes de mais nada, um sistema
de relações em que as crianças e os adultos não são apenas formalmente
apresentados a organizações, que são uma forma da nossa cultura, mas também
a possibilidade de criar uma cultura. [...] É essencial criar uma escola ou creche
em que todos os integrantes sintam-se acolhidos, um lugar que abra espaço às
relações.
Trata-se, assim, de espaços nos quais cada criança e cada professor
sintam-se pertencentes, assumindo um lugar participativo nas relações
estabelecidas. Nessa perspectiva, para Vieira (2009, p. 17):
[...] o espaço físico é visto como pano de fundo das relações e desempenha
um papel importante na aprendizagem, ou seja, o espaço condiciona as
relações entre as pessoas e as atividades, o ritmo e o tempo, dependendo do
contexto nele organizado, é visto como um dos elementos fundamentais para
uma Pedagogia da Educação Infantil que garanta o direito à infância e uma
educação de qualidade.
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Com essas ideias introdutórias e pautadas na concepção de espaço
como ambiente e lugar de vivências significativas ao pleno desenvolvimento
humano, discute-se, neste artigo, aspectos sobre as prescrições sobre a organização
e estrutura dos espaços e tempos dos Jardins da Infância.
POSSIBILIDADES DO ENSINAR A PARTIR DO BRINCAR
A fundação da instituição escolar e sua manutenção ao longo do
tempo histórico, estão atreladas à mais valia, ao controle social e manutenção dos
costumes sociais, visto que a escola é reprodutora dos fenômenos sociais locais a
que está instalada.
A educação institucionalizada, especialmente nos últimos 150 anos, serviu
no seu todo ao princípio de não fornecer conhecimentos e o pessoal
necessário à máquina produtiva em expansão do sistema capital, como também
gerar e transmitir um quadro de valores que legitima os interesses dominantes,
como se não pudesse haver nenhuma alternativa à gestão da sociedade, seja
na forma internalizada” (isto é, pelos indivíduos devidamente “educados” e
aceitos) ou através de uma dominação estrutural de subordinação hierárquica
implacavelmente imposta. (MEZÁROS, 2005 apud BARROS, 2009. p. 42)
que, “O brincar contribui para o processo de formação da
subjetividade do indivíduo, considerando que somos formados por nossas
experiências sociais e pelo contato com objetos da cultura, durante nossa história
de vida, (BARROS, 2009, p. 108), faz-se necessário incluir momentos lúdicos
em sala de aula nas situações de alfabetização, para que o sujeito imerja em um
“mundo” mais atingível a ele e consequentemente para que a aprendizagem seja
mais significativa e dialógica.
Muitas são as possibilidades do educador em sala de aula. Neste
artigo reforça-se com mais intensidade, as questões que envolvam o processo de
apropriação da língua escrita e por isso as possibilidades de momentos lúdicos
se dão neste cenário. Abaixo, como exemplo, aparecem três momentos em que
é possível trabalhar alfabetização a partir de brincadeiras que podem ser
incorporadas na rotina de sala de aula, com os alunos. Vale ressaltar que, as práticas
foram desenvolvidas à uma turma de segundo ano do ensino fundamental, o que
representa um marco no processo de apropriação da escrita. Ao final deste tópico,
ficam explícitas as evoluções que houveram na aprendizagem real afastando-se
do memorizar ou decorar regras ortográficas dos alunos após a utilização das
atividades exemplificadas.
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1.
PEGA-PEGA DAS LETRINHAS
Essa atividade pode ser dirigida a um grupo maior de alunos, contudo
desenvolvi com um grupo de seis alunos que realizam o apoio pedagógico.
Inicialmente, a professora explica queque brincarão de pega-pega, mas quem for
pego precisa falar uma letra e enquanto corre para pegar outra pessoa, precisa ir
dizendo, em voz alta, palavras que iniciem com a letra que escolheu.
Outra regra do jogo é de que todos precisam ser pegos, que a intenção é
que todos pratiquem a oralidade e a construção alfabética e formação das palavras.
Ao final dessa etapa, nos dirigimos à sala de aula e os alunos recebem um tablet
para no bloco de notas escreverem as palavras que eles falaram na brincadeira. O
bloco de notas tem, assim como no Word, um sinalizador de escritas incorretas,
isso faz com que o aluno perceba que algo ali precisa ser revisto. A todo momento
faço interferências e resgato o processo de construção de nosso idioma.
O intuito aqui não é apenas pedir para escreverem terem seus erros
apontados pela professora, mas a partir da brincadeira, a aprendizagem se tornar
mais atrativa e além disso, os alunos têm como suporte, um elemento atrativo a
eles e que permite ao professor interferências sem que o ele precise esgotar o aluno
com “certos e errados”.
2.
SELFIE-SERVICE DA ESCRITA
Essa atividade foi desenvolvida com a turma toda. Foi preparado um
balcão cheio de panelas, jarro, pratos e copos. O intuito é que os alunos de fato se
sirvam, porém, dentro das panelas existem palavras, dentro dos jarros letras e
sílabas. Os pratos, assim como os copos são para que eles se sirvam e façam o uso
daquele material adquirido da forma que eles quiserem, podendo formar grupos de
até quatro pessoas. Ao mesmo tempo, os alunos já haviam trazido alimentos para
um piquenique comunitário e, enquanto trabalhavam eles também podiam comer.
O direcionamento da professora é de que eles podem fazer o uso de tudo o que
quiserem desde que registrem em folha avulsa o que eles criaram. Eles podem fazer
colagens, escrever e até desenhar, não podem se esquecer de utilizar como
base,
o material do qual eles se serviram”.
Ao final eles apresentam para a turma suas construções e as relações
com o material utilizado. A intervenção da professora é de observação e mediar
dúvidas. O interessante dos grupos, é que a atividade fica mais interativa e, um
aluno auxilia o outro por si próprio, sem que o professor precise solicitar interação
de todos. Os alunos aprendem pela imersão no conteúdo, o que torna o conteúdo
mais significativo e lúdico.
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3.
SOLETRANDO
Essa atividade ficou famosa por um programa televisivo. Na sala de
aula, é formado três grupos de alunos na sala, eles se organizam em filas e quando
a palavra é dita pela professora, os alunos um de cada equipe deve correr e
bater na mão da professora para soletras a palavra dita. As equipes vão pontuando
até que a última criança participe. As equipes são montadas pela professora, uma
vez que, as equipes precisam ser homogêneas.
Ao final a equipe que ganhar a atividade tem o direito de escolher duas
brincadeiras que a sala toda participará. Essa escolha é livre, mas meu incentivo
é para que seja algo em que todos possa participar, como queima, pular corda,
elástico ou amarelinha africana, por exemplo.
As atividades em grupo, proporcionam interações, trocas e construções
de regras, personalidade, empatia, respeito, entre outros valores à mesma
medida em que o aprendizado deixa de ser um fardo e uma obrigação recaída
sobre a criança.
A partir da inserção de atividades mais lúdicas na sala de aula, ficou
nítido que os alunos se engajaram mais. O fator de trabalhar em um colégio
particular em que os alunos até o segundo ano não recebem notas avaliativas
somente uma nota no final do ano letivo auxilia que práticas lúdicas sejam
desenvolvidas, contudo essas práticas são viáveis a qualquer educador, uma vez
que não exigem mudanças de ambientes ou ruptura com os conteúdos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No momento em que a teoria confronta-se com a prática, é visível
o quanto as práticas adotadas prejudicam ou por vezes, não favorecem um
aprendizado significativo aos alunos. Contudo se conhecimento das
possibilidades teóricas se aplicarem nas ações do fazer docente, e o professor
incorporá-las em suas práticas, possivelmente as relações serão melhores e a
formação será para a vida toda, em vez de ser apenas para o ambiente escolar.
Ao analisar aspectos da BNCC para compreender as propostas desse
documento na intenção de favorecer ou não o processo da apropriação da língua
escrita, é possível constatar que os conteúdos são ali depositados, mas a didática,
as práticas, são deixadas de lado o que abre um outro grande tema, a falta de
qualificação do professor, em relação à didática e práticas em sala de aula
bem como estratégias e habilidades que favoreçam a subjetividade e a ação
do educador, uma vez que é densa em quantidade de habilidades apontadas,
comprometendo assim o tempo e o currículo local que, possivelmente seria
desenvolvido pelo professor da turma. Além de constatar a desvalorização das
apropriações humanas, ficou nítido um dilema ainda maior, os rumos que a
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educação brasileira está tomando em relação às metodologias direcionadas à língua
escrita, desfavorecendo o sentido social e sua função histórica. Se as atividades
primárias da escrita são a comunicação, os registros historicamente formados e a
interação social, a utilização de manuais instrucionais, padronizados e unificados
elimina qualquer possibilidade de apropriação, uma vez que apropriar-se é tomar
algo para si, é ver sentido nas ações e incorporar na própria constituição. O futuro
da alfabetização no Brasil é incerto, e cabe a nós não nos acomodarmos, mas
levarmos nossas ações para além do senso comum e das limitações educacionais
estabelecidas, na busca do saber construído por ações fortalecidas em teorias que
garantam um ensino valorativo com significância para toda a vida.
A criança é o outro estabelecido nas relações com o professor e é para
esse outro que as ações devem ser direcionadas. O interlocutor (aluno) necessita de
fontes que possibilitem a compreensão e interação com o falante (professor) que
em algum momento se transformará em interlocutor, não na inversão dos papeis,
mas na dialogia estabelecida entre professor e alunos. “A escola encara, nestes
tempos, a difícil tarefa de organizar a aula de modo que professores e alunos criem,
em
suas relações, o objeto real que os transforma.” (ARENA, 2010, p.177). Cabe
ao
professor buscar a superação do senso comum e partir rumo a propostas que
não
vejam o aluno como depósitos de todo e qualquer tipo de material. É preciso
-
lo como sujeito ativo, dono de suas vontades e buscas, como um indivíduo
pesquisador que, frequentemente, busca explicações para suas ressignificações do
mundo. A busca pelos significados precisa estar presente na escola, não ensinar
a escrever a partir do alfabeto, mas buscar signos no contexto social que depois de
apropriados podem ser remetidos a estudos mais afunilados. De nada adianta
ensinar o que não pode ser conhecido e objetivado.
Os signos também são objetos únicos e materiais e, como acabamos de ver,
qualquer objeto da natureza, da tecnologia ou de consumo pode se tornar um
signo. Neste caso, porém, ele irá adquirir uma significação que ultrapassa os
limites da sua existência particular. O signo é somente uma parte da realidade,
mas também reflete e refrata uma outra realidade, sendo por isso mesmo capaz
de distorcê-la, ser-lhe fiel, percebê-la de um ponto de vista específico e assim
por diante. (VOLOSHÍNOV, 2017, p. 93).
As crianças precisam ter vontade e consciência do que estão fazendo,
mas para isso os conteúdos devem favorecer as apropriações e as relações. Não
aprendemos apenas pelo material, muito pelo contrário, o material é apenas
um suporte auxiliar do aprendizado que deve se dar no cotidiano, nas relações,
principalmente na escola, que é o lugar específico para propiciar a formação das
pessoas. Para Bakhtin (2003, p. 275) é a
[...] alternância dos sujeitos do discurso que cria limites precisos do enunciado
nos diversos campos da atividade humana e da vida, dependendo das diversas
funções da linguagem e das diferentes condições e situações de comunicação,
O favorecimento da apropriação da língua escrita nos anos finais da Educação Infantil
Artigos/Articles
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é de natureza diferente e assume formas rias. Observamos essa alternância
dos sujeitos do discurso de modo mis simples e evidente no diálogo real, em
que se alternam enunciações dos interlocutores (parceiros do diálogo), aqui
denominadas réplicas.
Quando a preocupação com o destinatário, com o outro, a
intencionalidade muda, ou melhor, ela se direciona a um interlocutor real, que se
colocará responsivamente na relação se modificando enquanto modifica também
o remetente da ação. Assim, o professor direciona as atividades aos alunos, mas
se
não houver intencionalidade, embasada teoricamente para proporcionar o
desenvolvimento do aluno, não uma relação dialógica, nem uma proposta
pensada na atividade com sua função primeira de criação humana, pois essa
existe quando o objeto causara mudanças em quem o remete tanto quanto a
quem se faz interlocutor.
Os recursos lúdicos são um dos caminhos mais viáveis e possíveis para
a mudança do cenário educacional. Desde as civilizações mais antigas o brincar se
faz presente e, excluir as crianças de suas vivências sociais e substanciais, limitam o
processo educacional a industrializar o aprendizado e esperar, de pessoas diferentes,
sempre o mesmo resultado. Aproximar a educação do mercado industrial, afasta a
primeira de seu maior objetivo, o de formar cidadãos para a vida, que dominem
as
áreas do conhecimento que lhe serão úteis ao longo de sua jornada como ser
social e modificante da realidade de sua comunidade.
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Submetido em: 12/10/2021
Aprovado em: 18/04/2022