SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
n.11
p. 207-225
Dez/2022
207
ARTICULANDO NÍVEIS DA LUTA PELA HEGEMONIA NA
REVOLUÇÃO PASSIVA: O FENÔMENO DO LAND GRABBING
E A CONCILIAÇÃO BURGUESA NO MODELO
DESENVOLVIMENTISTA DO PT
ARTICULANDO NIVELES DE LA LUCHA POR LA HEGEMONÍA EN
LA REVOLUCIÓN PASIVA: EL FENÓMENO DEL ACAPARAMIENTO
DE TIERRAS Y LA CONCILIACIÓN BURGUESA EN EL MODELO
DESARROLLADOR DEL PT
ARTICULATING LEVELS OF THE STRUGGLE FOR HEGEMONY IN
THE PASSIVE REVOLUTION: THE LAND GRABBING
PHENOMENON AND THE BOURGEOIS CONCILIATION IN THE
PT'S DEVELOPMENTALIST MODEL
João Victor Batista de Albuquerque
1
RESUMO:
Propõe-
s
e ne
s
te a
r
tigo um início de inve
s
tigação que percorre o caminho trilhado
do
s
pen
s
adore
s
herdeiro
s
do marxi
s
mo e mai
s
exclu
s
ivamente de Antonio Gramsci.
As
s
im, na primeira parte bu
s
camo
s
remontar o circuito de relaçõe
s
micro
s
cópicas que
de
s
enharam a rota da luta de cla
ss
e
s
com a
s
piraçõe
s
hegemônica
s
que determinaram a
dinâmica da acum
u
lação do capital no
s
gove
r
no
s
Lula 1 e 2, a
ss
im como no rápido
período de derrocada da ge
s
o
Dilma Rou
ss
ef. Na
s
egunda parte, a pre
ss
ão exercida pelo
capital internacional foi exemplificada na sua capacidade de cau
s
ar tran
s
formaçõe
s
e
s
paciai
s
(que trazem implicaçõe
s
em área
s
como: tran
s
formação da
s
pai
s
agen
s
, ge
s
tão
de di
s
tribuição hídrica, produtividade do
s
olo, ace
sso
legal à terra por comunidade
s
tradicionai
s
e etc.) no Bra
s
il.
P
ara tanto, inve
s
timo
s
na recon
s
t
r
ução de momento
s
importante
s
na promulgação de Lei
s
que regulamentam a compra de te
rr
as cultivávei
s
em território nacional por inve
s
tidore
s
e
s
trangeiro
s
, o fenômeno da
L
and G
r
abbing, que
facilmente no
s
remete à
s
que
s
tõe
s
s
obre a
s
inve
s
tida
s
do Imperiali
s
mo no
s
éculo XX
I
.
PALAVRAS-CHAVE: Land Grabbing. Revolução Passiva. PT.
1
Mestrando
pelo
Programa
de
s-graduação
em
Sociologia
da
Universidade
Estadual
de
Londrina.
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ABSTRACT:
This article proposes the beginning of an investigation that follows the path trodden by
thinkers who are the heirs of Marxism, and more exclusively by Antonio Gramsci. Thus,
in the first part we seek to reassemble the circuit of microscopic relationships that
designed the route of class struggle with hegemonic aspirations that determined the
dynamics of capital accumulation in the Lula governments 1 and 2, as well as in the rapid
period of overthrow of the Dilma Roussef administration. In the second part, the pressure
exerted by international capital was exemplified in its ability to cause spatial
transformations (which bring implications in areas such as: transformation of landscapes,
water distribution management, soil productivity, legal access to land by traditional
communities, etc. ) in Brazil. To this end, we invested in the reconstruction of important
moments in the enactment of Laws that regulate the purchase of arable land in the national
territory by foreign investors, the phenomenon of Land Grabbing, which easily leads us
to questions about the onslaughts of Imperialism in the 21st century.
KEY WORDS:
Land Grabbing. Passive Revolution. PT
RESUMEN:
Este artículo propone el inicio de una investigación que sigue el camino recorrido por
pensadores herederos del marxismo, y más exclusivamente por Antonio Gramsci. Así, en
la primera parte buscamos reconstruir el circuito de relaciones microscópicas que
diseñaron la ruta de la lucha de clases con aspiraciones hegemónicas que determinaron la
dinámica de acumulación de capital en los gobiernos de Lula 1 y 2, así como en el rápido
período de derrocamiento de el gobierno de Dilma Roussef. ) en Brasil. Para ello,
invertimos en la reconstrucción de momentos importantes en la promulgación de Leyes
que regulan la compra de tierras cultivables en el territorio nacional por parte de
inversionistas extranjeros, el fenómeno del Land Grabbing, que fácilmente nos lleva a
interrogarnos sobre los embates del Imperialismo en el siglo 21.
PALABRAS CLAVE: Land Grabbing. Revolución Passiva. PT.
INTRODUÇÃO
No dia 1 de
J
aneiro de 2003, Luiz Inácio Lula da
S
ilva tomou po
ss
e como
P
re
s
idente da República em emocionante celebração na E
s
planada do
s
M
ini
s
tério
s
, um
norde
s
tino de origem e ex-operário do ABC pauli
s
ta, con
s
iderado um do
s
per
s
onagen
s
mai
s
emblemático
s
da histó
r
ia da política bra
s
ileira.
A narrativa de
s
ua vitória na
s
urna
s
comumente remete à chegada ao poder
de um
s
obrevivente da e
s
trutura de
s
igual de di
s
tribuição de oportunidade
s
que
mantém o
s
i
s
tema de apropriação capitali
s
ta no Bra
s
il.
S
ua biografia é compo
s
ta por
s
ignificativo
s
acontecimentos que
s
e vinculam ao imaginário popular de um Bra
s
il
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209
mai
s
profundo, poi
s
remonta à infância vivida na mi
s
éria que ca
s
tiga o
s
e
s
quecido
s
munícipio
s
do norde
s
te, a juventude de trabalhado
r
fabril no
S
ude
s
te, e avida adultade
trabalhador com con
s
ciência da opre
ss
ão patronal que so
fr
ia a cla
ss
e operária, o que lhe
teria levado almejar o protagoni
s
mo político.
Para muito
s
eleitore
s
, que
n
ão
s
e re
s
tringem apena
s
ao
s
militante
s
do
P
artido dos Trabalhadore
s
(
P
T), e
ss
a narrativa heroica empo
ss
a a figura de Lula
com todo o potencial
s
imbólico de um nacionali
s
mo que tem de fato como ba
s
e a
vida real, ou melhor, faz de dele um tradutor da realidade do
s
meno
s
favorecido
s
na
e
s
trutura de
s
igual do capitali
s
mo bra
s
ilei
r
o, um intelectual o
r
gânico no
s
entido
gram
s
ciano do termo
2
.
Es
s
e
s
imboli
s
mo e
s
boçado aqui brevemente, repre
s
enta o conteúdo do
imaginário que
s
u
s
tenta
s
ua repre
s
entatividade política convencionalmente
denominado pela literatura de “luli
s
mo”, e é certamente uma qualidade mágica
3
in
s
tran
s
ponível que
s
e evidencia na sua capacidade em concorrer ao
s
pleito
s
à
P
re
s
idência da República
s
ua vitória em 2022, depois de longa per
s
eguição política,
s
ó mo
s
tra quanto uma figura política pode e
s
tar imbuído de
s
ignificação coletiva.
S
ua relevância na hi
s
tória nacional tem como marca o índice de 87% de
aprovação de
s
eu
s
egundo governo (BONIN, 2010), em 2010, re
s
ultado ba
s
tante
relevante em um paí
s
reconhecidamente con
s
ervador. E
ss
e número que pode apena
s
repre
s
entar de modo
s
impli
s
ta o
s
uce
ss
o popula
r
de uma ge
s
tão, ganha importância para
o anali
s
ta quando
s
e con
s
idera a dinâmica progre
ss
i
s
ta das política
s
implementada
s
pelo governo que teve início em 2003. Inclu
s
ive,
s
e to
r
na
s
ociologicamente
relevante
s
e e
s
clarecido que, como argumenta
P
erry Ander
s
on (2011), houve uma
vi
s
ível radicalização do governo em direção contrária à
s
açõe
s
e
s
tatai
s
imbuídas
2
Nessa
passagem,
consideramos
exclusivamente
o
potencial
de
ação
do
intelectual
frente
às
oportunidades
na luta
pela
hegemonia:
“Os
intelectuais
possuem
uma
função
orgânica
bastante
importante
no
processo
da reprodução
social,
na
medida
em
que
ocupam
espaços
sociais
de
decisão
prática
e
teóricas,
tornando-os
objeto
de
longa
análise
nos
Cadernos
do
Cárcere.
Mas
a
principal
função
destes
se
encontra
na
formação
de
uma
nova
moral
e
uma
nova
cultura,
que
podem
ser
entendidas
também
como
uma
contra-hegemonia,
que
o
objetivo
final
das
lutas
organizativas
seria,
no
seu
momento
histórico,
o
socialismo.
(Mari,
2011,
p.2).
3
Em
um
sentido
encontrado
na
antropologia
de
Claude
Levi-Strauss,
associamos
o
termo
gramsciano
à
origem
do
poder
mágico,
em
que
o
intelectual
deve
corresponder
às
expectativas
do
seu
grupo
social:
“O
problema
fundamenta
l
é
,
portanto
,
o
da
re
l
ação
entre
um
i
nd
i
v
í
duo
e
o
grupo,
ou,
ma
i
s
prec
i
samente,
entre
um
determ
i
nado
t
i
po
de
i
nd
i
v
í
duo
e
determ
i
nadas
ex
i
gênc
i
as
do
grupo
(LEVI-STRAUSS,
2021,
p.180).
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do neoliberali
s
mo que caracterizaram
o
governo antecedente.
Como lembra em
s
eu artigo O Bra
s
il de Lula” (2011, p. 11),
s
eu
reconhecimento como articulad
o
r da
s
demanda
s
do
s
capitali
s
ta
s
no poder e ao
me
s
mo tempo da
s
cla
ss
e
s
menos favorecida
s
, a
ss
ocia
s
ua figura à per
s
onagen
s
como
Getúlio Varga
s
e
F
ranklin D. Roosevelt (New Deal), conhecido
s
por terem
u
tilizado
o E
s
tado como promotor de avanço
s
s
ociai
s
.
A no
ss
o ver, tai
s
aproximaç
õ
e
s
hi
s
tórica
s
devem con
s
iderar a análi
s
e da
di
s
puta pela hegemo
n
ia que
s
e deu no pa
ss
ado recente do Bra
s
il, e ir além. Uma
análi
s
e rigoro
s
amente explicativa deve recon
s
truir a interlocução entre categoria
s
analítica
s
que interpretam as relaçõe
s
interna
s
do E
s
tado, e e
s
sa
s
em relação ao
s
agente
s
internacionai
s
. Dito de out
r
a maneira, acreditamo
s
que é impo
ss
ível falarmo
s
de um “New Deal bra
s
ileiro
s
em pa
ss
a
r
mos da análi
s
e da
s
relaçõe
s
de força da
s
cla
ss
e
s
em di
s
puta pela hegemonia à análi
s
e corre
s
pondente do tipo de de
s
envolvimento local
empregado pela expan
s
ão internacional do capitali
s
mo.
Po
r
tanto, propõe-
s
e ne
s
te a
r
tigo um início de inve
s
tigação que percorre o
caminho trilhado do
s
pen
s
adore
s
herdeiro
s
do marxi
s
mo e mai
s
exclu
s
ivamente de
Antonio Gramsci (2007).
Ass
im, a motivação foi a de contribuir com o
e
s
clarecimento da
s
foa
s
competitivas que ao
s
e chocarem, guiada
s
p
or
intere
ss
e
s
fracionado
s
de cla
ss
e, determinaram a potencialidade conciliativa ou
de r
u
ptura do apoio dedicado ao
s
governo
s
peti
s
ta
s
durante um período temporal
definido: que
s
elecionamo
s
partindo da vitória de Lula em 2002 até o golpe
parlamentar
s
ofrido por Dilma Rous
s
ef em 2016.
Os evento
s
remontado
s
aqui foram dividido
s
em dua
s
camada
s
, ou
s
eja, dua
s
e
s
calas de ob
s
ervação da
s
relaçõe
s
de força, na tentativa de aproximar-
s
e da propo
s
ta
de Adam
M
o
r
ton (2007) a re
s
peito do entendimento da revolução pa
ss
iva na
s
ua
relação com o nível “nacional” e “internacional” do
s
s
i
s
tema
s
hegemônico
s
.
As
s
im, na primeira parte bu
s
camo
s
remontar o circuito de relaçõe
s
micro
s
cópicas que de
s
enharam a rota da luta de cla
ss
e
s
com a
s
piraçõe
s
hegemônica
s
que determinaram a dinâmica da acum
u
lação do capital no
s
gove
r
no
s
Lula 1 e 2, a
ss
im
como no rápido período de derrocada da ge
s
o
Dilma Rou
ss
ef.
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Na
s
egunda parte, a pre
ss
ão exercida pelo capital internacional foi
exemplificada na sua capacidade de cau
s
ar tran
s
formaçõe
s
e
s
paciai
s
(que trazem
implicaçõe
s
em área
s
como: tran
s
formação da
s
pai
s
agen
s
, ge
s
tão de di
s
tribuição
hídrica, produtividade do
s
olo, ace
sso
legal à terra por comunidade
s
tradicionai
s
e etc.)
no Bra
s
il.
P
ara tanto, inve
s
timo
s
na recon
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t
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ução de momento
s
importante
s
na
promulgação de Lei
s
que regulamentam a compra de te
rr
as cultivávei
s
em território
nacional por inve
s
tidore
s
e
s
trangeiro
s
, o fenômeno da
L
and G
r
abbing, que facilmente
no
s
remete à
s
que
s
tõe
s
s
obre a
s
inve
s
tida
s
do Imperiali
s
mo no
s
éculo XX
I
.
É fundamental re
ss
altar q
u
e a análi
s
e aqui empregada e
s
comprometida
com o horizonte gram
s
ciano explorado pelo trabalho de Adam
M
orton (2007,
2021), em que a revolução pa
ss
iva (que lançamo
s
mão como chave interpretativa
do
s
evento
s
“nacionai
s
)
e o de
s
envol
v
imento de
s
igual e combinado (princípio
interpretativo do fenômeno da
s
L
and G
r
abbing
s
)
s
ão tratado
s
de maneira articulada,
como categoria
s
teórica
s
afin
s
, con
s
iderando a po
ss
ibili
d
ade de complementariedade
explicativa:
o
desenvolvimento
desigual
e
combinado
como
condão
estruturante
e
a revolução
passiva
com
sua
ênfase
de
agentes
de
classes
são
conceitos
afins
e internamente
relacionados
abordando
como
o
desenvolvimento
capitalista
se desenrola
e
como
as
lutas
de
classes
entre
agentes
estatais
e
subalternos
produziram
e
transformaram
o
espaço
ao
longo
do
tempo
através
de
ciclos
variados
de
revolução
e
de
restauração
(MORTON,
2007,
p.12).
Finalmente, ao seguir as ideias expostas neste artigo, espera-se que fiqueclaro
ao leitor o comprometimento com o pensamento crítico, que não naturaliza a
conjuntura social, e que, acreditamos, revela algumas das múltiplas linhas de força que
operam na transformação recente dos aspectos legais da apropriação de terras por
estrangeiros no país.
O DESENVOLVIMENTISMO DO PT COMO REVOLUÇÃO PASSIVA DO
CAPITAL
Perry Anderson (2011) é um dos autores que sustentam a leitura de que o
governo que promoveu um novo capítulo na condução de políticas públicas no Brasil,
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212
não iniciou seu mandato alinhando-se às expectativas dos apoiadores progressistas,
pois, ainda durante o período que antecedeu o pleito de 2002, o então futuro presidente
traçou um caminho de afastamento da agenda defendida tradicionalmente por seu
próprio partido. E, de maneira sintomática ao que se convencionou chamar de
presidencialismo de coalização(ABRANCHES, 1988), (essa aparente contradição
que costuma confundir os apoiadores mais ave
ss
o
s
ao reali
s
mo da política), o p
r
imeiro
governo Lula
s
inalizou nítida aproximação à cúpula de intere
ss
e
s
do grande
empre
s
ariado bra
s
ileiro. Um importante documento que regi
s
t
r
a o de
s
ejo de
conciliação com o empresariado foi a Carta ao
P
ovo Bra
s
ileiro” lida em 22 de junho
de 2022 ainda no período de candidatura
4
.
E
s
se movimento que de
s
creve a trajetória da
s
ge
s
tõe
s
peti
s
ta
s
, que
s
e re
s
ume em
um início em que bu
s
cou-
s
e acomodar a candidatura frente de
s
confiança
s
de uma elite
burgue
s
a um tanto ainda indefinida, como um movimento prólogo que antecede
a po
s
terior radicalização progre
ss
i
s
ta caracte
s
tica do
s
egundo mandato, pode
s
er
vi
s
to também na análi
s
e de
A
nd
r
é Singer (2009)
s
obre a
s
raíze
s
s
ociais do luli
s
mo.
E
s
ta lógica
s
e apre
s
enta quan
d
o, tendo alcançado a pre
s
idência apó
s
s
uce
ss
iva
s
tentativas fru
s
trada
s
, Lula teria iniciado o
s
p
r
imeiro
s
ano
s
de mandato em
con
s
onância e acomodação à agenda do ex-pre
s
idente
F
ernando Henrique Cardo
s
o:
A
continuidade
do
governo
Lula
com
o
governo
FHC
na
política
macroeconômica
baseada
em
três
pilares:
metas
de
inflação,
mbio
flutuante
e
superávit
primário
nas
contas
blicasfoi
uma
decisão
política
e
ideológica.
A
elevão
do
superávit
primário
para 4,25%
do
PIB,
a
concessão
de
independência
operacional
ao
Banco
Central,
que
teve
à
sua
frente
um
deputado
federal
eleito
pelo
PSDB
com
autonomia
para
determinar
a
taxa
de
juros,
e
a
inexistência
de
controle
sobre
a
entrada
e
a
saída
de
capitais
foram
o
modo
encontra‑
do
para
assegurar
um
elemento
vital
na
conquista
do
apoio
dos
mais
pobres:
a
manutenção
da
orde
(
S
INGER, 2009, p.96).
4
Como
exemplo
não
banal
da
contradição
imposta
pelo
ofício
político
do
governo
que
seria
eleito,
vale
lembrar que
o
conteúdo
da
Carta
foi
idealizado
pelo
futuro
Ministro
da
Fazenda,
Antonio
Paloci,
homem
forte
da
primeira gestão,
estimado
por
ser
um
grande
articulador
de
interesses
que
vinculavam
o
governo
à
parcela
importante
do empresariado.
Anos
depois,
no
final
do
primeiro
governo
petista,
sua
reputação
moral
seria
manchada
com
a
vinda à
blico
das
reuniões
entre
amigos
e
assessores
em
uma
mansão
no
Lago
Sul,
luxuoso
bairro
de
Brasília,
em
que
Palocci
alimentava
relações
escusas
de
partilha
de
dinheiro,
regado
a
bebidas
e
denúncias
de
prostituão,
descobertas
no
calor
das
investigações
de
corrupção
do
governo
petista
em
2005
no
conhecido
caso
do
Mensalão.
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v.7
n.11
p. 207-225
Dez/2022
213
M
a
s
,
s
e por um lado o primeiro governo teve início
s
e di
s
tanciando de crítica
s
feita
s
pelo próprio PT durante o
s
governo
s
d
o
PS
DB (por exemplo, a re
s
peito do
s
limite
s
e
s
tabelecidos
s
obre a Lei de Re
s
pon
s
abilidade
F
i
s
cal de 04 e maio de 2000),
por outro lado, o governo te
r
ia também con
s
eguido adequar à matriz
macroeconômica então e
s
tabelecida o incentivo do cre
s
cimento de um mercado
inter
n
o voltado para o
s
mai
s
pobre
s
, que veio a
s
e most
r
a
r
altamente promi
ss
or
para o
s
pro
d
utore
s
nacionai
s
, ao me
s
mo tempo que concretizou a implementação
de política
s
de diminuição da in
s
egurança alimentar e erradicação da pob
r
eza (em que
o
Bol
s
a
F
amília de 2004 foi o mai
s
bem
s
ucedido).
C
o
mo con
s
equência de
ss
a articulação de intere
ss
e
s
, o público-alvo da
s
políticas di
s
tributiva
s
principalmente a
s
família
s
de baixa renda do Norte e
Norde
s
te
s
e torna
r
am politicamente relevante
s
ao
s
olidificar uma ba
s
e eleitoral que
demon
s
trava reconhecer o então pre
s
idente como promotor de garantia
s
mínima
s
de dignidade de vida. O que
s
e revelou determinante para que Lula alcança
ss
e a
vitória no pleito de 2005, e con
s
egui
ss
e
s
obrevive
r
politicamente me
s
mo diante da
s
denúncia
s
de e
s
quema de pagamento de propina queenvolviam integrante
s
do
s
eu
governo.
Para continuarmo
s
s
obre e
s
ta que
s
tão, devemo
s
lembrar que
s
e o “luli
s
mo”
repre
s
entou a conqui
s
ta de um eleitorado de baixa renda que
s
e viu repre
s
entado
no nível
f
ederal po
r
política
s
populi
s
ta
s
e, de maneira meno
s
óbvia, por re
s
ultado
s
gerado
s
pelo incentivo do mercado interno, não devemo
s
e
sq
uecer que tai
s
deci
s
õe
s
do E
s
tado não ocorreram em um campo vazio de relaçõe
s
de força.
P
or e
ss
a razão, o
pro
ss
eguimento da interpretação hi
s
r
ica que e
s
s
endo remontado aqui remete a
uma per
s
pectiva cara à Antonio Gram
s
ci, que acreditamo
s
s
e orientar pela
s
eguinte
que
s
o: qual fração da burgue
s
ia nacional que na luta pela hegemonia po
ss
ibilitou
um E
s
tado com a
s
pecto
s
progre
ss
i
s
ta
s
?
O
f
ortalecimento do mercado interno, pode
s
er um ponto chave para e
s
clarecer
o apoio burguê
s
que tornou viável o “progre
ss
i
s
mo po
ss
ível do governo peti
s
ta e
s
u
s
tentou-o mesmo durante a
s
cri
s
e
s
de legitimidade gerada
s
pelo
s
ca
s
o
s
de corrupção do
ca
s
o
M
en
s
alão.
SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
n.11
p. 207-225
Dez/2022
214
Em “Governo Lula: a nova burgue
s
ia nacional no poder, Armando Boito
J
r.
(2012
)
, argumenta que no
s
egundo mandato a ba
s
e de apoio foi claramente acre
s
cida
pela chamada bu
r
gue
s
ia inte
r
na
5
, fração de cla
s
se compo
s
ta por produtore
s
(indu
s
triai
s
e agrícola
s)
que tinham intere
ss
e
s
alinhado
s
a agenda di
s
tributiva do
luli
s
mo, intere
ss
e
s
que coincidiam ba
s
icamente com o fortalecimento do
s
etor de
produção nacional, em detrimento da burguesia compradora e de capital financeiro
internacional.
Segundo o autor, durante o
s
governo
s
peti
s
ta
s
, o papel de cla
ss
e burgue
s
a
hegemônica foi exercido por e
ss
a fração do bloco no poder que tinha intere
ss
e
s
na
s
iniciativa
s
do go
v
e
r
no que vi
s
a
v
am fortalecer a rede prod
u
tiva nacional, o que
aproximou o grande capital indust
r
ial ao
s
intere
ss
e
s
político
s
do movimento
s
indical
e popular
6
. E
s
ta aliança, que na análise gram
s
ciana podem pertencer à ordem
conjuntural da
s
relaçõe
s
de força em uma
s
ociedade capitali
s
ta, formou a frente de
apoio que o governo bu
s
cou repre
s
entar no projeto econômico cla
ss
ificado por Boito
J
r. de neode
s
envolvimenti
s
ta: o novo de
s
envolvimenti
s
mo concent
r
a
-
se no
s
s
etore
s
de
proce
ss
amento de produto
s
agrícola
s
, pecuário
s
ou de recur
s
o
s
naturai
s
e, no
ca
s
o da indú
s
tria de tran
s
formação, e
s
focado no
s
s
egmento
s
de baixa
den
s
idade tecnológica
7
”. (2012, p. 69).
Armando Boito
J
r. fortalece o argumento de que, a
ss
im como
P
erry
Anderson e, anteriormente, André
S
inger, a linha me
s
tra que une a
s
dua
s
ge
s
tõe
s
peti
s
ta
s
foi a do de
s
envol
v
imenti
s
mo, me
s
mo que o início do primeiro mandato
tenha
s
ido priorizado a acomodação diante da de
s
confiança da grande burgue
s
ia.
I
ss
o porque, e Boito
J
r. é mais enfático ne
s
ta que
s
tão,
s
e a fração compradora da
burgue
s
ia participa na expan
s
ão
s
em limites do impe
r
iali
s
mo, a frão de cla
ss
e
5
Usaremos
o
termo
elaborado
inicialmente
por
Nicos
Poulantzas
(1978)
em
itálico
por
se
tratar
de
um
elemento
importante
na
análise.
6
Neste
contexto,
foi
significativo
que
o
periódico
“Revista
da
Industria
tenha
retornado
suas
publicações
na gestão
de
Paulo
Skaf,
empossado
diretor
da
FIESP
em
2004,
com
matérias
de
postura
ideológica
que
via
na
gestão anterior
[FHC]
excessos
monetaristas,
enquanto
expunha
aberto
otimismo
no
que
dizia
ser
a
nova
era
da
FIESP”. Ver
trechos
das
entrevistas
de
Skaf
apresentadas
no
artigo
de
Boito
Jr.
(2012,
p.89.).
7
Nesse
modelo
as
empresas
nacionais
mais
fortes
em
escala
mundial
eram
quase
exclusivamente
as
de
processamento
de
produtos
de
baixo
valor
agregado,
Friboi,
a
Brazil
Foods,
a
Vale,
a
Gerdau,
a
Votorantim
Celulose.
SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
n.11
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Dez/2022
215
burgue
s
a que apoiou Lula, a chamada bu
r
gue
s
ia interna, tem como caracterí
s
tica
impor limite
s
ao imperiali
s
mo, embora não tenha razõe
s
pragmáticas para inve
s
tir na
s
ua eliminação (2012, p. 75).
Além da importância dada a exportação e o fortalecimento do mercado interno,
impo
r
limite
s
à força exercida pelo capital e
s
trangeiro na privatização de
s
erviço
s
público
s
em um regime democrático, pa
ss
a pela ação do E
s
tado como provedora
de bem-e
s
tar
s
ocial, qualificando o projeto como de
s
envolvimenti
s
ta. O opo
s
to
di
ss
o,
s
ão a
s
iniciativas de privatização de empre
s
a
s
pública
s
para inve
s
tidore
s
na Bol
s
a de Valore
s
, como o
s
casos emblemático
s
do
S
i
s
tema Teleb
s
em 1998
e recentemente no ca
s
o da Eletrobrá
s
, que repre
s
entam algun
s
do
s
diver
s
o
s
exemplo
s
em que o E
s
tado bra
s
ileiro cedeu a inte
r
esses e
s
cu
s
o
s
d
o capital
e
s
trangeiro e capitalizou
s
erviço
s
de origem e função pública.
No trabalho “Trajetória da
s
de
s
igualdade
s
”,
M
arta Arretche (2015) apre
s
entou
pe
s
quisas que corr
o
boram com o argumento que de fato houve a implementação do
modelo de bem
-
esta
r
s
ocial no Bra
s
il da primeira década do
s
éculo XX.
Em
s
eu artigo, ba
s
eando-
s
e
n
o
s
re
s
ultado
s
do
s
cen
s
o
s
do IBGE de
s
de 1970,
a auto
r
a mo
s
tra que a trajetória de di
s
tribuição de
ss
e
s
s
erviço
s
público
s
no paí
s
s
eguiu
um padrão que relaciona a entrega de
s
te
s
s
erviço
s
ao aumento da renda pe
r
capita por
região. A
ss
im, ob
s
e
r
vou
-s
e que hi
s
toricamente o
s
mai
s
pobre
s
que viviam em regiõe
s
rica
s
receberam mai
s
rapidamente a iniciativa do E
s
tado em õe
s
que vi
s
aram
s
anar a
de
s
igualdade no ace
ss
o à
s
erviço
s
s
icos, como: água, energia elétrica, coleta de lixo
e
s
aneamento bá
s
ico.
A quebra de
ss
e padrão
s
ó foi ob
s
ervada no
s
dado
s
de 2010, em que houve
uma nítida melhora
n
a oferta de
s
te
s
s
erviço
s
, principalmente no ace
ss
o à água e
energia elétrica, em regiões de baixa renda pe
r
capita, principalmente no Norte e
Norde
s
te. A explicão mai
s
pla
u
sível para e
ss
a con
s
tatação é a de que o
s
dado
s
mo
s
trariam o re
s
ultado de política
s
de univer
s
alização de
ss
e
s
s
erviço
s
que foram
implementado
s
a partir do
s
éculo XXI, dentro do período dos governo
s
de Lula.
Deve ter ficado claro ao leit
o
r até aqui que a
s
emelhança entre todo
s
o
s
argumentos apre
s
entado
s
, de
S
inger, Ander
s
on, Boito
J
r. e Arretch, e
s
no
SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
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216
reconhecimento da
s
ingulari
d
ade de
s
te governo em ter con
s
eguido articular intere
ss
e
s
da
s
camada
s
s
ociai
s
menos privilegiada
s
ao me
s
mo tempo que repre
s
entou
temporariamente o projeto hegemônico da cla
ss
e b
u
rgue
s
a interna a meno
s
imperiali
s
ta entre a
s
frõe
s
da cla
ss
e burgue
s
a.
Em análi
s
e po
s
terior, num contexto progre
ss
i
s
ta de menor otimi
s
mo, André
Singe
r
(2015) continuou
s
ob a me
s
ma orientação para decretar a derrocada
do ensaio de
s
envol
v
imenti
s
ta” do governo Dilma Rou
ss
ef, que: comprometido em
acelerar o lulismo, bu
s
cou atender a agenda da fração de cla
ss
e burgue
s
a
produtivi
s
ta no a
s
pecto e
s
trutu
r
al
8
e rompeu com o
s
ilêncio a re
s
peito do
inju
s
tificável valor da taxa
S
elic operada pelo Banco Central, principal freio de
inve
s
timento da burgue
s
ia interna, determinando
s
ua queda de
1
2,5
%
para 7,25% entre
2011 e 2013.
Em curto e
s
paço de tempo, cre
s
ceu a intolerância diante do
s
primeiro
s
re
s
ultados negativo
s
do
s
aju
s
te
s
realizado
s
pelo governo que cau
s
aram o aumento
na taxa de inflação, ameaçando a capacidade de inve
s
timento do
s
etor produtivo
até então aliado conjuntural do luli
s
mo - além de diminuir o poder
d
e compra da
população. Ao me
s
mo tempo, a alta ma
r
gem da
S
elic abria uma janela de
po
ss
ibilidade
s
alinhado ao
s
intere
ss
e
s
e
s
peculativo
s
da burguesia renti
s
ta que
pa
ss
aram a manife
s
tar crítica
s
ao governo e a exigir a diminuição do
s
gastos
público
s
, di
s
cur
s
o que tomado por
g
rupo
s
em bu
s
ca da hegemonia política/ideológica,
ajudou a renovar o neoliberali
s
mo no Bra
s
il.
O coro ultraliberal” do
s
crítico
s
do governo, que no primeiro momento foi
repre
s
entado por político
s
do
PS
DB, ganhou força com a onda de manife
s
taçõe
s
que
teve início em junho de 2013 e a demonização da cla
ss
e política gerada pela
que
s
tionável Operação Lava
J
ato. No rápido p
r
oce
ss
o de de
s
legitimação do projeto
econômico de
s
envolvimenti
s
ta, Dilma se viu deixada pela fração de cla
ss
e que
garantia a conciliação burgue
s
a de
s
eu governo, a
fr
ação produtora da burgue
s
ia
nacional, naquilo que na hi
s
tória política bra
s
ileira repre
s
ent
o
u um
8
É
significativo
lembrar
o
pronunciamento
à
TV
aberta,
em
2013,
em
que
Dilma
Roussef
anunciou
a
primeira
redução
no
valor
da
conta
de
luz
na
história
do
Brasil,
demanda
que
era
requerida
pela
FIESP
desde
2011
e
que,
obviamente,
contribuiria
muito
para
popularidade
de
seu
governo.
SEÇÃO ARTIGO
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de
s
envol
v
imenti
s
mo com a
s
pecto
s
que remetem ao conceito de revolução pa
ss
iva, ou
s
eja, uma tran
s
formação que acomodou forças antagônica
s
s
em criar uma ruptura
definitiva, pairando sob a ordem do permanente e do po
ss
ível
9
.
O PROBLEMA DA EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA NO BRASIL
O fim do governo Dilma foi decretado através da utilização de uma arma nuclear institucional
(CHUEIRI; KOZICKI, 2019).
P
ara Wanderley Guilherme do
s
S
anto
s
, tratou-
s
e de uma
ve
r
são de um novo tipo de golpe, pico de democracia
s
repre
s
entativa
s
moderna
s
, o golpe pa
r
lamenta
r
: uma ruptura política que con
s
egue a façanha de
manter o verniz de legalidade das in
s
tituiç
õ
e
s
me
s
mo que tenha como fundamento
um procedimento de ge
s
tão comum (SANTO
S
, 2017).
Este golpe de Estado com origem e sustentação parlamentar acelerou o
reposicionamento do País ao padrão reacionário que vinha crescendo em escala
mundial desde o final do século XX, com a retomada agressiva da agenda liberal. Esse
reacionarismo em nível internacional, mas sustentado pelo mundo moderno, havia
substituído a crença no fortalecimento das instituições em que se baseia a sociedade de
bem-estar social como modo de combater a armadilha malthusiana do crescimento
populacional, e alçou como a perspectiva predatória que estabelece a busca pelo
crescimento sem considerar uma alternativa moderada como a nova premissa do
crescimento econômico do Estado (2017, p.105).
A pre
ss
ão exercida pelo “ultraliberali
s
mo” na tentativa de direcionar
mercadologicamente a
ss
unto
s
que no fundo dizem re
s
peito a
S
oberania Nacional,
pode
s
er ob
s
ervado no Brasil, e em outr
os
paí
s
e
s
agroexportadore
s
da América Latina
e África, na primeira década dos anos 2000, nas alterõe
s
jurídica
s
a re
s
peito da
regulamentação da compra de terra
s
produtivas em território nacional.
A primeira cada do
s
éculo XX repre
s
enta um capítulo importante na
hi
s
tória de e
s
trangerização de terra
s
no Brasil, poi
s
o contexto internacional de
9
Na
literatura,
é
famosa
a
passagem
do
livro
O
Leopardo,
do
escritor
italiano
Tomasi
di
Lampedusa,
que
bem
resume
a
noção
de
continuísmo
das
classes
dirigentes
mesmo
em
eventos
aparentemente
disruptivo:
Se
nós
não
estivermos
lá,
eles
fazem
uma
república.
Se
quisermos
que
tudo
fique
como
está,
é
preciso
que
tudo
mude.
Expliquei-me
bem?”
(p.28).
SEÇÃO ARTIGO
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© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
n.11
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218
e
s
ca
ss
ez na ofe
r
ta de alimentos e fonte
s
de energia viávei
s
ne
s
te período colocou o
mundo diante de uma eminente cri
s
e de recur
s
o
s
, e o capital internacional, vi
s
ando
s
ua expan
s
ão, de
s
lumbrou e
s
tratégias direcionada
s
ao
s
paí
s
e
s
de maior
p
rodução
agrícola.
P
or aqui, o
s
re
s
ultado
s
mai
s
notó
r
ios foram a expan
s
ão da
s
fronteira
s
agrícola
s
,
o aumento do preço da
s
gleba
s
e o acirrame
n
to de conflito
s
fundiário
s
e territoriai
s
,
notávei
s
, e
s
te
s
último
s
, na
s
articulaçõe
s
P
arlamentare
s
p
a
r
a a mudança legi
s
lativa em
favor de intere
ss
e
s
e
s
cu
s
o
s
.
O
f
enômeno do
L
and G
r
abbing, como
s
e nomeia o inve
s
timento ma
ss
ivo
de ato
r
es econômico
s
e
s
trangeiro
s
na aqui
s
ição de terra
s
de grande exten
s
ão no
território nacional
,
é um do
s
fato
r
e
s
que a
ss
inalam para tal “e
s
trangeirização em
s
ua manife
s
tação contempo
r
ânea ba
s
eada em aqui
s
ição de terra
s
e produção de
commoditie
s
(WILKIN
S
ON, 2018). Trata-
s
e, de um procedimento de a
s
piração
neocoloniali
s
ta articulado legi
s
lativamente por políticos repre
s
entante
s
da fração
de cla
ss
e produtiva, particularmente produtore
s
agropecuários e u
s
ineiros,
repre
s
entado
s
no
P
oder Legi
s
lativo pela chamada Bancada Rurali
s
ta.
Dua
s
hipóte
s
e
s
s
ão evocada
s
para explicar o boom de commoditie
s
que atingiu o
s
maio
r
es paí
s
e
s
p
r
odutore
s
. Uma primeira explicação articula a lei de oferta e
demanda, con
s
ide
r
a o impacto gerado pelo cre
s
cimento econômico da China e Índia
como forte
s
compradore
s
de g
r
ão em um mercado com pouca oferta.
P
aralelamente,
outro ponto de
s
ta explicação
s
e
r
ia o otimi
s
m
o
a re
s
peito do
s
combu
s
tívei
s
agrícola
s
(biocombu
s
tívei
s
) como
s
ub
s
tituto do pet
r
óleo ante
s
da de
s
coberta do
P
ré-
S
al em
2
006-2007.
Outra hipóte
s
e explicativa propõe que teria havido uma combinação
ent
r
e o comportamento da
s
autoridade
s
financeira
s
e a
s
inovaçõe
s
no
s
etor
financeiro, o que ajuda
r
ia explicar a correlação ob
s
ervada na época entre o
s
pro
s
da
s
principai
s
commoditie
s
(petróleo, alimento e minério):
Segundo
essa
linha
de
explicação
do
boom
das
commodities,
as
políticas
monetárias
adotadas
pelos
principais
bancos
centrais
desde
meados
dos
anos
2000,
caracterizadas
por
juros
historicamente
muito
baixos,
garantiram
liquidez
em
abundância.
Na
busca
por
retorno
atraente,
os
operadores
do
mercado
financeiro
passaram
a
atuar
intensamente
em
mercados
até
então
pouco
afetados
pela
SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
n.11
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Dez/2022
219
dinâmica
financeira.
Os
tradicionais
mercados
de
commodities
se
tornaram,
dessa
forma,
um
destino
cada
vez
mais
importante.
O
resultado
foi
um
considerável
aumento
da
compra
de
ativos
lastreados
em
commodities
na
fase
crescente
do
ciclo
(
FLEXOR;
LEITE,
2017,
p.
25)
Salvo a
s
hipóte
s
e
s
explicativa
s
do boom que ocorreu no novo milênio, a compra
de te
rr
as no Bra
s
il por capitai
s
e
s
trangeiro
s
, agrário
s
ou financeiro
s
, ou
s
eja,
repre
s
entado
s
pela nomenclatura moderna
L
and G
r
abbing, pode
s
er identificado no
movimento de expan
s
ão da fronteira agrícola em direção à região Norte de
s
de o
s
ano
s
1970, e que tem como ca
s
o mais recente a região geográfica de
M
atopiba (iniciai
s
do
s
e
s
tado
s
do
M
aranhão, Tocantin
s
,
P
iauí e Bahia), faixa territorial ba
s
eada no cultivo
agrícola de grande exten
s
ão que vi
s
a a expo
r
tão do re
s
ultado.
E na década de 90, com o novo e
s
tado jurídico de empre
s
a
s
e
s
trangeira
s
com
s
e
d
e no Bra
s
il que na prática revogava o
s
limite
s
de inve
s
timento
s
e
s
trangeiro
s
determinado pela Lei. 5.709/1971, a flexibilização da entrada do capital e
s
trangeiro
havia trazido que
s
tõe
s
s
ob
r
e a regulamentação de pe
ss
oa
s
jurídicas e
s
trangeira
s
que
voltariam a
s
er di
s
cutida
s
diante d
o
f
o
r
te intere
ss
e do capital e
s
trangeiro durante
a corrida pela produção de commodities e biocombu
s
tívei
s
no
s
éculo XXI.
As
s
im, fica evidente que a p
r
ática de Land Grabbing nada mai
s
é do que um
termo atual para nomear um fenômeno ba
s
tante pre
s
ente na hi
s
tória da formação do
território bra
s
ilei
r
o, remonta
n
do ao pa
ss
ado colonial e o continuí
s
mo da relação
extrativi
s
ta empregada pelo capitali
s
mo e
s
trangeiro (moderno ou mercantili
s
ta).
P
ortanto, pa
ss
emo
s
para o
s
procedimentos legai
s
que regulamentaram a aqui
s
ição de
terra por entidade
s
e
s
trangeira
s
no Bra
s
il remo
n
tando o
s
momento
s
fundamentai
s
apresentado
s
no artigo
M
arco
s
legai
s
e a liberação pa
r
a inve
s
timento e
s
trangeiro
em terra
s
no Bra
s
il”, de Luí
s
F
elipe
P
erdigão de Ca
s
tro e
S
érgio
S
aue
r
. A primeira
oportunidade de regulamentão da
L
and G
r
abbing remonta o pe
r
íodo Ditatorial
com a
s
inve
s
tigaçõe
s
da C
P
I que deram origem ao Relatório Vello
s
o no Con
gr
esso
Nacional, em 1968. Na oca
s
ião, a C
P
I con
s
tatou a aqui
s
ição fraudulenta de mai
s
de 28
milhões de hecta
r
e
s
,
s
endo 20 milhõe
s
em po
ss
e de grupo
s
e
s
trangeiro
s
(2017, p.42).
M
e
s
mo a
ss
im as inve
s
tigaçõe
s
não foram a diante.
SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
n.11
p. 207-225
Dez/2022
220
Pouco
s
ano
s
depoi
s
, é promul
g
ada a Lei. 5.709/1971 que demarcou a iniciativa do
Estado em legalizar e legitimar a “e
s
trangeirização” da terra no Bra
s
il, e
s
tabelecendo
a
s
diretrize
s
pa
r
a a aqui
s
ição territorial por pe
ss
oa
s
s
ica
s
e jurídica
s
, limitando o
ace
ss
o à quantidade de módulo
s
, no ca
s
o do primeiro, e exigindo o enquadramento
da função da produção, dent
r
o da aprovação do
M
ini
s
tério da Agricultura, a
ss
im como
definiu o limite da
s
oma total” da
s
á
r
eas rurai
s
adquirida
s
dentro de um me
s
mo
município por pe
ss
oa
s
ica ou jurídica e
s
trangeira, como
s
endo de até um quarto do
total da
s
uperfície do município. E, finalmente, e
s
tabeleceu a definição do que
s
eria
a empre
s
a
b
ra
s
ileira” e a empre
s
a bra
s
ileira de capital nacional”
,
pelo art. 171
d
a
C
F
/1988, influindo na atuação de controle na aqui
s
ição de terra por e
s
trangei
r
os pelo
In
s
tituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
A flexibilização ocorreu no
s
doi
s
governo
s
de
F
ernando Henrique Cardo
s
o
(
PS
DB) com a adoção do
P
arecere
s
GQ-22 (1994) e GQ-181 (1998) da Agencia
Nacional da União (
A
GU
)
que revogou o entendimento do § do art. da Lei
5.709/1971, e como re
s
ultad
o
deu
s
u
s
tentação para que pe
ss
oa
s
jurídica
s
bra
s
ileira
s
controlada
s
ou não por e
s
trangeiro
s
pudessem adquirir ou arrendar terra
s
no Bra
s
il.
Em outra medida do governo de
F
HC, foi in
s
tituída a Emenda Con
s
titucional 06
(EC-06), de 15 de ago
s
to de 1995, em que
s
e revogou o art. 171 da C
F
/1
9
88,
concluindo que para
s
er bra
s
ileira, ba
s
taria que a pe
ss
oa jurídica fo
ss
e con
s
tituída
s
ob
lei
s
bra
s
ileira
s
, com
s
ede e admini
s
tração no paí
s
. (2017, p.44).
J
á em 2007, diante do cenário de corrida mundial por terra
s
, o tipo de
progre
s
sismo econômico a
ss
umido pelo
s
egundo governo de Luiz Inácio Lula da
S
ilva
direcionou recu
r
sos público
s
no financiamento de investimento
s
e
s
trangeiro
s
na
expan
s
ão da
s
oja, cana e etanol, promovida pelo do BNDE
S
, em outra direção, o
governo tomou po
s
içõe
s
que caracteriza ce
r
to realinhamento do E
s
tado em relação
ao de
s
enho legal da Lei 5.709/1971. Corrobora neste
s
entido
q
ue em
s
etembro de
2008, em re
s
po
s
ta à pedido de revi
s
ão por parte da ge
s
tão petista, a CGU revogou o
s
P
arecere
s
GQ-22 e GQ-181, retomando o
s
entido propo
s
to pela §
d
o a
r
t. da Lei
5.709/1971. Em outro pa
ss
o, em Ago
s
to de 2010, a CGU acatou a publicação do
Parecer LA-01, e
s
tabelecendo re
g
ra
s
e limite
s
quantitativo
s
à apropriação de
SEÇÃO ARTIGO
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p207-225
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
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n.11
p. 207-225
Dez/2022
221
terra
s
po
r
e
s
trangeiro
s
na e
s
pacialidade do município, re
s
tabelecendo o limite de 25%,
(2017, p. 46
)
.
Na ge
s
tão de Dilma Rou
ss
ef, em 2011, o deputado federal Beto
F
ato (
P
T/
P
A)
que havia apre
s
entado o projeto de lei 2.289/ 2007, propondo regulamentar o art. 190
da C
F
/1988, reque
r
eu junto à Comi
ss
ão de Agricultura,
P
ecuária, Aba
s
tecimento
e De
s
envolvimento Rural da Câma
r
a do
s
Deputado
s
a abertura de uma comi
ss
ão
e
s
pecial para anali
s
ar a
s
alternativa
s
s
ob
r
e o proce
ss
o de aqui
s
ição e utilização
de terrar bra
s
ileira
s
por pe
ss
oa
s
s
ica
s
e jurídicas e
s
trangeira
s
.
J
á no ano de
2012, o de
s
fecho alcançado pela
s
di
s
cu
ss
õe
s
da comi
ss
ão não
f
oi oportuno para Beto
F
aro que teve
s
eu relatório rejeita.
M
ai
s
virtuo
s
o do que ele
s
e
s
aiu o deputado
M
arco
s
M
onte
s
(DE
M
/GO), ex-pre
s
idente da
F
rente
P
arlamentar da Agricultura, que
teve
s
eu sub
s
titutivo aprovado e a
s
sumido como
P
rojeto de Lei pela Comi
ss
ão de
Agricultu
r
a da Câma
r
a a
P
L n° 4.059/2012 (apen
s
ada ao
P
L n°2.289/2007).
Na tentativa de demon
s
trar o oportuni
s
mo explicito no intere
ss
e da Bancada Ruralista
e de
M
ichel Temer
10
11
na oca
s
ião do contexto de claro de retroce
ss
o e entregui
s
mo
que caracte
r
izou o período imediato apó
s
o golpe parlamentar de 2016, re
ss
altamo
s
algun
s
ponto
s
que são apre
s
entado
s
no
P
L n° 4.059/2012 do então deputado
M
arco
s
M
onte
s
(DE
M
/GO) que, no nosso ponto de vi
s
ta, ilu
s
tra a capacidade do capital
internacional de gerar pre
ss
ão econômica e política que determinam a geografia de
p
s
e
s
produtore
s
agrícolas. A
s
sim,
s
obre a
s
relaçõe
s
geopolítica
s
e a revolução pa
ss
iva
do capital como apre
s
e
n
tadas por Adam
M
orton (2007), podemos dizer que no nível
internacional da
s
relaçõe
s
de produção, a tendência é de extinção do controle do E
s
tado
Bra
s
ileiro
s
obre a
s
tran
s
açõe
s
envolvendo te
rr
as produtiva
s
no próprio território.
E e
s
tamo
s
ju
s
tificado
s
a pen
s
ar a
ss
im poi
s
o
s
a
s
pecto
s
imperiali
s
ta
s
11
12
que estão
s
olidificado
s
na perigo
s
a
P
L 4.059/2012 e
s
tabelecem o
s
s
eguinte
s
ponto
s
10
Quando
se
v
i
u
ameaçado
por
denc
i
as
de
2017
dec
l
arou
que
o
Projeto
ser
i
a
i
mportante
em
uma
c
l
ara
i
n
i
c
i
at
i
va
de
ut
ili
za-
l
a
como
moeda
de
troca
numa
tentat
i
va
de
conqu
i
star
apo
i
o
dos
rura
li
stas
estrange
i
ristas (Redação RBA, 2017).
11
O
desejo
da
aprovação
da
PL
4.059/2012
e
a
quem
e
l
a
pode
benef
i
c
i
ar,
nos
remete
aos
i
nteresses
que
envo
l
veram
a
negoc
i
ação
do
conf
li
to
marroqu
i
no
no
i
n
í
c
i
o
da
década
de
30:
O
sent
i
do
h
i
stór
i
co
do
conf
li
to
marroqu
i
no
,
remet
i
do
à
sua
expressão
ma
i
s
s
i
mp
l
es
e
ma
i
s
tosca,
é
a
l
uta
concorrenc
i
a
l
pe
l
a
dec
i
são
sobre
qua
l
dos
representantes
do
cap
i
ta
li
smo
europeu
será
o
pr
i
me
i
ro
a
poder
jogar-se
sobre
o
canto
noroeste
do
cont
i
nente
afr
i
cano
,
para
engo
li
-
l
o
ao
modo
cap
i
ta
li
sta
o
que,
af
i
na
l
,
é
o
sent
i
do
de
cada
fragmento
do
desenvo
l
v
i
mento
da
po
t
i
ca
mund
i
a
l
.
(LUXEMBURGO,
2011,
p.415).
SEÇÃO ARTIGO
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Marília, SP
v.7
n.11
p. 207-225
Dez/2022
222
de acomodação da legi
s
lação bra
s
ileira ao intere
ss
e do capital e
s
trangeiro na
s
L
and
G
r
abbing:
O não estabelecimento de limites para aquisição de áreas por estrangeiros,
restringindo a obrigatoriedade de fiscalização e licença para imóveis rurais
de até quatro módulos fiscais ou arrendamento de até dez módulos ficais.
Comprometendo o limite antes estabelecido de 25% da superfície do
município em que se situa.
A
po
ss
ibilidade de empre
s
as (controlada
s
por pe
ss
oa
s
s
ica
s
não
re
s
idente
s
no B
r
asil
)
ou pe
ss
oa
s
jurídica
s
(e
s
trangeira
s
com
s
ede no
exterior) adquirirem terra
s
bra
s
ilei
r
as
s
em limite de área.
O
fim da obrigatoriedade da declaração de cada
s
tro de todo
s
o
s
proprietá
r
ios e po
ss
uidore
s
de imóvei
s
ru
r
ai
s
, extinguindo o
S
i
s
tema
Nacional de Cada
s
tro Ru
r
al (SNCR) e a Diretoria de Ordenamento da
E
s
trutura
F
undiária do Incra. E
ss
a
s
s
upressões liberam a aqui
s
ição
de
s
en
f
reada de terra
s
rurai
s
por pe
ss
oa
s
e
s
trangeira
s
s
icas e jurídica
s
.
Cabe
s
alientar que o
P
rojeto Lei encontrou dificuldade em pro
ss
eguir
tramitação na Câmara do
s
Deputado
s
ainda na p
r
e
s
idência de Rodrigo
M
aia
(DE
M
/R
J
), poi
s
s
eu conteúdo gerou discu
ss
õe
s
que demon
s
tram a complexidade da
que
s
tão levantada.
S
e por um lado
f
icou evidente que havia diferente
s
projeto
s
de
fraçõe
s
de cla
ss
e que
s
eparava agriculto
r
es nacionali
s
ta
s
, receo
s
o
s
de perder
margem de mercado, daquele
s
que
s
ão produto
s
orgânicos de iniciativa
s
e
s
trangeira
s
,
empre
s
as ou aglomerado
s
internacionai
s
, ou daquele
s
que momentaneamente
s
e encontram localizado
s
no
s
i
s
tema internacional de produção em concordância
com intere
ss
e
s
de agente
s
externo
s
. Além di
ss
o, o ri
s
co evidente de que a
e
s
trangeirização” comprometa a
s
oberania nacional, que o E
s
tado, por definição
s
ociológica e jurídica,
s
e fundamenta no controle de um território e
s
pecífico, e
tal condição
n
ão é remediável,
s
ob o ri
s
co de legitimar e colocar em evidência o
coloniali
s
mo que é di
ss
imulado pelo di
s
cur
s
o político da
s
elite
s
econômica
s
.
SEÇÃO ARTIGO
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223
CONCLUSÃO
Com a finalidade de concluir o argumento desenvolvido até aqui, propomos
estabelecer uma articulação possível entre as duas escalas de luta pela hegemonia que
emboçamos brevemente. Portanto, ao retomarmos o debate acerca do
desenvolvimentismo do PT como o re
s
ultad
o
provi
s
ório da bu
s
ca pela hegemonia da
bu
r
gue
s
ia inte
r
na, concluímo
s
que tal modelo econômico foi uma revolução pa
ss
iva
do capital e não repre
s
entou uma ruptura ao capitalismo. E podemo
s
defender e
s
ta te
s
e
ao retomarmo
s
a que
s
tão da expan
s
ão da fronteira agrícola po
r
iniciativa e
s
trangeira
(
L
and G
r
abbing), como
s
endo um fenômeno que
s
obreviveu a
s
gestões peti
s
ta
s
, e
que hoje permanece
s
endo uma ameaça dentro do
s
plano
s
da Bancada Rurali
s
ta.
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ltimo
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CASTR
O
, Luí
s
F
elipe
P
erdigão de;
S
AUER,
S
érgio.
M
arco
s
legai
s
e a liberação
pa
r
a inve
s
timento e
s
trangeiro em terra
s
no Bra
s
il. In.
M
ALU
F
, Renato
S
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F
lexor,
George
s
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r
gs
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s
e
s
agrária
s
, agrícola
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e r
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p
olítica
s
púb
lica
s
. Rio de
J
aneiro : E
-
Paper
s
,
1
. ed. 2017.
CHUEIRI, Vera Karam de; KOZICKI, Katya.
I
m
p
eac
h
me
n
t: a arma nuclear
con
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titucional. São
P
aulo: Lua Nova, n. 108, p. 15
7
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Recebido em 17 de fevereiro de 2023
Aceito em 24 de fevereiro de 2023
Editado em fevereiro de 2023