SEÇÃO DOSSIÊ
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GRAMSCI NO MST: A TEORIA EM MOVIMENTO
GRAMSCI IN THE MST: THE THEORY IN MOVEMENT
GRAMSCI EN EL MST: LA TEORÍA EN MOVIMIENTO
Luciana Aliaga
1
Resumo
Este artigo pretende demonstrar que a organização política do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), ao final de sua segunda década de existência, assentava-se em concepções, estruturas e
procedimentos que podem ser entendidos como uma tradução do pensamento gramsciano no âmbito da
prática. Para atingir nosso objetivo, iniciaremos com uma breve reflexão sobre o contexto imediatamente
anterior ao nascimento do movimento, no qual a difusão do pensamento de Gramsci na América Latina
passou por uma notável expansão e, consequentemente, apropriação tanto nos ambientes acadêmicos
quanto políticos no Brasil. Nesse contexto, destaca-se o papel desempenhado pelas Comunidades Eclesiais
de Base e pela Teologia da Libertação como difusoras de um conjunto de preceitos teóricos e políticos
marxistas, contribuindo para a apropriação prática de Gramsci pelo MST. Para tratamento do nosso objeto
principal analisaremos a prática da “mística” e a estrutura organizativa e formativa do MST.
Palavras-chave: Antonio Gramsci; MST; Teologia da Libertação; Partido Político; Educação.
Abstract
This article intends to demonstrate that the political organization of the Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST), at the end of its second decade of existence, was based on conceptions, structures
and procedures that can be conceived as a translation of gramscian thought within the scope of practice. To
achieve our objective, we will begin with a brief reflection on the context immediately prior to the birth of
the movement, in which the diffusion of Gramsci's thought in Latin America underwent a remarkable
expansion and, consequently, appropriation in both academic and political environments in Brazil. In this
context, the role played by Comunidades Eclesiais de Base and Teologia da Libertação stands out as
disseminators of a set of theoretical and political marxist precepts, contributing to the practical
appropriation of Gramsci by the MST. To address our main object, we will analyze the practice of the
“mystic” and the organizational and formative structure of the MST.
Keywords: Antonio Gramsci; MST; Teologia da Libertação; Political Party; Education.
Resumen
Este artículo pretende demostrar que la organización política del Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), al final de su segunda década de existencia, se basó en concepciones, estructuras y
procedimientos que pueden concebirse como una traducción del pensamiento gramsciano en el ámbito de
practica Para lograr nuestro objetivo, comenzaremos con una breve reflexión sobre el contexto
inmediatamente anterior al nacimiento del movimiento, en el que la difusión del pensamiento de Gramsci
en América Latina experimentó una notable expansión y, consecuentemente, apropiación tanto en los
ámbitos académicos como políticos en Brasil. En este contexto, se destaca el papel jugado por las
1
Professora Depto. Ciências Sociais e do Programa de pós-graduação em Ciência Política e Relações
Internacionais - PPGCPRI (UFPB). Coordenadora do grupo de pesquisa Materialismo e Modernidade
(UFPB/CNPq). Secretária da Internacional Gramsci Society-Brasil (2019-2022). ORCID 0000-0001-7842-
715X. lualiagaa@gmail.com
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Comunidades Eclesiais de Base y la Teología de la Liberación como difusoras de un conjunto de preceptos
marxistas teóricos y políticos, contribuyendo a la apropiación práctica de Gramsci por parte del MST. Para
abordar nuestro objeto principal, analizaremos la práctica de la “mística” y la estructura organizativa y
formativa del MST.
Palabras clave: Antonio Gramsci; MST; Teología de la Liberación; Partido Político; Educación.
Introdução
Sustentamos neste artigo a hipótese de que a organização política do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao final de sua segunda década de existência,
1990, assentava-se em concepções, estruturas e procedimentos que podem ser entendidos
como uma tradução do pensamento gramsciano no âmbito da prática. Publicações
recentes têm mostrado claramente que nas últimas décadas o autor passou a constituir
uma das mais importantes fontes teóricas do MST. O Dicionário da Educação do Campo,
por exemplo, publicado em 2012 pela editora parceira do movimento, a Expressão
popular, fundamenta-se largamente sobre o pensamento de Gramsci, utilizando-o como
referência para discussão de temas centrais da obra como: Estado, educação, pedagogia,
escola, hegemonia, intelectuais e vontade coletiva, entre outros (cf. CALDART, 2012).
Ao mesmo tempo, pesquisas empíricas têm demonstrado a apropriação de Gramsci pelo
MST nas elaborações intelectuais de seus dirigentes e militantes, manifestas em seus
discursos e nos materiais impressos do movimento (cf. ROBERTS, 2018).
Nosso objetivo, no entanto, não consiste na investigação da recepção de Gramsci
pelo MST ou de sua apropriação intelectual e usos pelo Movimento. Diversamente,
dedicaremos nossa atenção à expressão concreta na organização política do Movimento
de alguns dos principais fundamentos do pensamento de Gramsci relativos à organização
das classes subalternas. Nesse sentido, o movimento sem-terra torna-se um campo de
prova essencial para as ideias gramscianas, isto é, um laboratório no qual elementos
teóricos gramscianos encontram-se com os entraves e com as potencialidades da realidade
brasileira. Destarte, por diferentes vias, em especial por meio da difusão do pensamento
de Gramsci na cultura política latino-americana nos anos 1970 e 1980, assim como pela
via da apropriação prática do marxismo pela Teologia da Libertação (TdL) e sua difusão
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entre os sem-terra, Gramsci chegou ao MST de forma heterodoxa e pragmática em seus
anos de formação.
Desse modo, nas duas primeiras décadas de existência do Movimento, a
apropriação de Gramsci ocorreu no interior de um esforço teórico e político para
construção de uma estrutura organizativa capaz de dar estabilidade e durabilidade ao
Movimento, além de tornar possível ações coordenadas em nível nacional. Assim, não
por acaso, a educação e a formação política, bem como as instâncias organizativas e a
prática da “mística” revelam uma notável similitude com o pensamento gramsciano, ou
melhor dizendo, elas traduzem para a realidade concreta alguns dos elementos mais
fundamentais da teoria de Gramsci, em especial aqueles referentes ao moderno
príncipe”, ou seja, ao partido político das classes subalternas.
Para atingir nosso objetivo iniciaremos com uma breve reflexão sobre o contexto
histórico imediatamente anterior à formação do MST, levando em consideração que esse
período abrangeu um momento importante de expansão da difusão do pensamento de
Gramsci na América Latina e, consequentemente, de sua apropriação tanto nos ambientes
acadêmicos quanto políticos no Brasil. Consideramos também o importante papel
desempenhado pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e pela TdL como difusoras
de um conjunto de preceitos teóricos e políticos, de cujo cerne participavam diferentes
autores marxistas e não marxistas.
O período estudado abrange desde os primeiros anos de formação do MST até o
momento em que as direções estaduais e nacionais se apresentavam quase totalmente
compostas por militantes seculares, autonomizando-se, portanto, das direções
eclesiásticas que dirigiram o movimento nos seus primeiros anos de existência. Nosso
recorte temporal está compreendido, portanto, entre as décadas 1980 e 1990. A partir
disso, procuraremos mostrar como a apropriação do pensamento gramsciano pelo MST
ocorreu de forma heterodoxa e pragmática, isto é, assimilando diversas fontes marxistas
e não marxistas com vistas à efetividade da ação. Para consecução da pesquisa que apoia
a presente exposição utilizamos principalmente documentos internos do MST (resoluções
de congressos, cartilhas e orientações), entrevistas próprias e aquelas dadas pelos
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dirigentes em órgãos da imprensa nacional, artigos publicados pelo movimento na mídia
impressa e eletrônica, além de pesquisa bibliográfica e observação participante.
Iniciaremos, portanto, com a exposição de um breve panorama da organização no
campo nas décadas de 1960 e 1970, trazendo a lume a importância que o progressivo
posicionamento crítico de grupos pertencentes a Igreja Católica assumiu nos anos da
ditadura militar, especialmente após o surgimento da TdL e das CEBs. Em seguida
dedicaremos algumas linhas para tratar resumidamente da difusão de Gramsci no Brasil
entre as décadas de 1960 e 1980. Nosso intuito consiste em mostrar como a apropriação
de Gramsci pela TdL, e posteriormente pelo MST, pode ser melhor compreendida se lida
no interior de um movimento mais amplo de difusão do pensamento do autor na América
Latina. Por último analisaremos os elementos da organização do MST que podem ser
considerados uma tradução do pensamento gramsciano, a saber: a “mística”, e a estrutura
organizativa e formativa.
1. A organização da luta pela terra
A partir da década de 1950, com a mecanização do campo e a expulsão de maciços
contingentes humanos das terras onde produziam e viviam, as mudanças na estrutura
agrária brasileira se aceleraram, os conflitos se acirraram e surgiram novas forças de
resistência no campo. Entre os grupos que concorriam à época pela direção da
organização dos trabalhadores rurais destacavam-se: as Ligas Camponesas, o Partido
Comunista Brasileiro (PCB) e os grupos católicos. A disputa pela direção sindical rural
se dava principalmente entre o PCB, a Igreja Católica e a Ação Popular (AP), que se
empenhavam na fundação do maior número possível de sindicatos e federações oficiais
no campo (cf. COLETTI, 2005).
A Ação Popular (AP) surgiu de setores leigos da igreja no campo e assumiu
posições radicais de apoio à luta dos trabalhadores rurais. Sua atuação se dava
principalmente por meio do Movimento Educação de Base e pela criação de sindicatos
de trabalhadores agrícolas (cf. COLETTI, 2005). Em oposição a AP, a Igreja Católica
atuava de forma extremamente reacionária. A primeira pastoral do campo, criada em 1950
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em Campanha (MG), nasceu numa reunião de fazendeiros, padres e professores rurais.
Sua principal preocupação era a possibilidade da perda dos trabalhadores rurais para os
demais movimentos sociais e partidos políticos, assim como tinha ocorrido com os
operários. “A questão era desproletarizar os operários do campo, evitar o êxodo que
levava os trabalhadores para a cidade e os tornava vulneráveis à agitação e ao aliciamento
dos comunistas” (MARTINS, 1995, p. 88).
O PCB, por outro lado, assumiu protagonismo como importante força hegemônica
sobre a direção da União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB)
fundada em 1954 (cf. CUNHA, 2007)
2
. O partido possuía ao lado da AP forte
influência na Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)
(COLETTI, 2005); além de sua atuação na fundação das Ligas Camponesas em 1945 (cf.
FERNANDES, 2000, p. 33). Entretanto, as profundas divergências em torno da revolução
socialista almejada pelas Ligas Camponesas consideradas sectárias e ultraesquerdistas
pelo PCB (cf. DIAS 1996; BORGES,1996) e diametralmente opostas à orientação da
Igreja Católica, que, como dissemos, nos anos de 1950 e início dos anos 1960 era
fortemente marcada por posições conservadoras, relegaram as Ligas ao isolamento
político.
Por outro lado, a perda da centralidade operário-camponesa” na política do PCB
(e a consequente diminuição da presença do partido no campo)
3
somada ao isolamento
das Ligas e ao enfraquecimento da AP com a repressão política, tornou possível à Igreja
que inicialmente não sofreu perseguição pela ditadura consolidar sua presença na
organização dos trabalhadores rurais. Sua atuação, no entanto, comportou uma importante
inflexão, especialmente com a instalação da ditadura militar e o acirramento da violência
no campo, forçando um posicionamento mais contestatório da Igreja. O deslocamento em
2
Segundo Cunha (2007, p. 81) a “linha programática da entidade propunha a reforma agrária como uma
das reivindicações centrais e a proibição de todas as formas de exploração semifeudal, como a ‘meia, a
‘terça’ e outras formas de parceria”. Esta linha política harmoniza-se com o posicionamento pecebista no
que se refere a sua luta antifeudal (cf. SANTOS, 1996a, p. 13). Para tratamento mais detido do assunto
consultar CUNHA (2004).
3
Cunha (2007, p. 38) sublinha que o equívoco maior na teoria revolucionária do PCB foi a generalização
do contexto revolucionário russo do começo do século XX e da III Internacional Comunista para a realidade
brasileira, redundando na política orientada pela “revolução democrático-burguesa e antifeudal”. Para Del
Roio (apud CUNHA, 2007) esta política se “refletiu decisivamente na inviabilização de uma alternativa
nacional-popular”.
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direção a uma política mais crítica se iniciou em princípios da década de 1960 e se
aprofundou nos anos posteriores, com a promoção de importantes discussões acerca do
papel social da Igreja. O Concílio Vaticano II (1961) e as Conferências Episcopais de
Medellín, Colômbia (1968) e Puebla, México (1979) lançaram as bases do que viria a
constituir a TdL (cf. CATÃO, 1985). Os adeptos dessa corrente teológica, a despeito de
constituírem uma minoria, assumiram publicamente a posição política de denúncia e de
contestação social, dando um rumo diferente daquele que vinha sendo adotado até então
para a atuação da Igreja entre a população mais pobre na América Latina.
Nesse contexto começaram a surgir as CEBs, que se organizavam em torno das
paróquias (urbanas) ou das capelas (rurais), por iniciativa de leigos, padres ou bispos. Seu
caráter popular era atribuído pela participação massiva de leigos, que faziam o trabalho
com a comunidade através de visitas, organização de reuniões e participação nas
celebrações. Segundo Frei Betto (1981), as comunidades eram chamadas “de base”
justamente por estarem integradas às classes populares, compreendendo donas-de-casa,
operários, subempregados, aposentados, jovens e empregados dos setores de serviços, na
periferia urbana; na zona rural: assalariados agrícolas, posseiros, pequenos proprietários,
arrendatários, peões e seus familiares. Essa constituição popular das CEBs as habilitou a
exercer um importante papel na organização dos movimentos populares no campo,
trabalhando ativamente nos anos finais da ditadura militar, de modo que entre o final da
década de 1970 e início de 1980, quando intensificaram-se as ocupações de terra pelo país
e surgiram inúmeros movimentos sociais no campo, a maioria contava com o apoio da
Igreja Católica (cf. ADRIANCE, 1996, FERNANDES, 1996).
Em grande medida isso ocorreu porque após 1964, quando se iniciou a ditadura
militar e os partidos e movimentos sociais foram duramente reprimidos, as CEBs foram
preservadas, visto que pareceram inofensivas à ordem estabelecida. Elas se tornaram,
assim, um dos poucos espaços de discussão política existentes durante os anos mais
fechados do regime militar. As comunidades de base, portanto, cumpriram o papel de
fomentadoras do debate político durante a ditadura, desempenhando papel fundamental
na formação intelectual e política de quadros que posteriormente se integrariam aos
partidos, sindicatos e demais organizações da sociedade civil no cenário nacional.
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2. Teologia da Libertação: marxismo, religião e efetividade
A TdL foi um dos importantes instrumentos de formação intelectual nas CEBs.
Fenômeno específico da América Latina, ela se constituiu como corrente minoritária da
Igreja Católica e de setores de algumas igrejas protestantes, em especial da Igreja
Evangélica de Confissão Luterana. Sua principal particularidade consistia na utilização
de um instrumental marxista para leitura da realidade social aliada a uma religiosidade
libertária. De fato, o marxismo foi uma das principais razões pelas quais, desde seu
surgimento, a TdL encontrou oposição das alas mais conservadoras dentro das igrejas
católicas, além, é claro, das incômodas relações mantidas com Cuba e União Soviética
(cf. BOFF, 1989).
Para Clodovis Boff (1980), o marxismo geraria uma prática histórica efetivamente
engajada e consciente e, por isso mesmo, dotada daquilo que a religião procura: a eficácia.
Além disso, a TdL valorizava o conhecimento científico da sociedade como instrumento
fundamental para a prática, por essa razão os clássicos da sociologia, em especial E.
Durkheim, K. Marx e M. Weber eram objeto de interesse e estudo (cf. MUELLER, 1996;
BOFF, 1989). A influência da TdL na organização política no campo foi maior entre 1960
e 1980, contudo, o acúmulo de conhecimento e um volume expressivo de publicações
datam dos anos 1980 e 1990. Nesse período a bibliografia produzida pela TdL apoiava-
se igualmente em fontes teológicas, documentos eclesiásticos e no texto bíblico, tanto
quanto em produções nas áreas de filosofia, história e sociologia, perpassadas por autores
marxistas, entre os quais se encontrava Antonio Gramsci (cf. MUELLER, 1996). Em
Teologia da Libertação e Marxismo, Enio Mueller constrói um excelente panorama das
conexões entre esses dois campos da práxis. Apoiando-se no trabalho de Enrique Dussel,
Mueller esclarece quais autores marxistas foram apropriados de modo mais significativo
pela TdL: K. Marx, Che Guevara, A. Gramsci, Escola de Frankfurt, G. Lukács, Ernst
Bloch, L. Althusser, Fidel Castro, J. C. Mariátegui e Sánches Vásquez (cf. MUELLER,
1996, p. 138).
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A apropriação desse conjunto de autores marxistas pela TdL com vistas à
efetividade da ação e, portanto, cujo interesse principal consistia especialmente na prática
concreta, favoreceu a difusão do pensamento de Gramsci no MST em seu nascedouro
como um importante fundamento para a organização. A TdL influiu na formação teórico-
política do MST por diferentes vias: por meio do contato com os padres da Comissão
Pastoral da Terra (CPT), que eram adeptos da TdL e organizaram o Movimento em seus
anos de formação; por meio da relação pessoal com agentes pastorais e nos cursos
ministrados pelas CEBs; e ainda por meio da “mística”, elemento fortemente presente no
MST ainda hoje (cf. ALIAGA, 2008).
A mística pode ser definida como uma tradução em linguagem simbólica e afetiva
da identidade do Movimento concebida pela direção, e é também uma forma de
comunicar suas concepções políticas à base, dito de outro modo, a mística é uma forma
pedagógica de traduzir a ideologia através de linguagem simbólica, de fácil acesso às
camadas laicas e aos estratos populares. É justamente essa “nova roupagem” de uma
mensagem que se relaciona intimamente aos conflitos mais imediatos dos sem-terra, que
se refere à própria condição de expropriados, ou de pobres conforme a TdL, que foi capaz
de revigorar, prover solidariedade e na conquista dos ideais, mudando a chave da
religião conservadora para a emancipadora. Voltaremos a esse tema adiante.
3. Gramsci no Brasil: difusão nas universidades, partidos e movimentos
Nos mesmos anos em que a TdL se difundia entre os movimentos sociais no
campo, as obras de Gramsci começaram a ser editadas no Brasil (a partir de 1966). Essa
recepção ocorreu por meio das traduções organizadas pelo PCB e publicadas pela Editora
Civilização Brasileira. Num primeiro momento, no entanto, a circulação das obras foi
dificultada pela ditadura militar, de modo que somente a partir da metade dos anos 1970,
com o surgimento de novos atores no movimento de resistência, o pensamento
gramsciano pode circular entre as diferentes organizações da sociedade civil (cf.
COUTINHO, 2007).
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De acordo com Lincoln Secco, até 1975 foram registrados 16 ensaios/ artigos
sobre Gramsci no Brasil, publicados no eixo São Paulo - Rio de Janeiro. No período entre
1975 e 1984, por outro lado, registrou-se mais de 200 títulos, expandindo-se da região
Sudeste, para região Sul e para o Nordeste (cf. SECCO, 2002). De fato, a partir de 1975,
Gramsci aumentou sua esfera de influência também nas universidades, tornando-se um
dos autores estrangeiros mais lidos e discutidos no Brasil, não apenas por marxistas.
Nesse período, nas Ciências Sociais encontravam-se pesquisas universitárias sob a
influência de categorias ou de problemáticas gramscianas, tanto na Antropologia, quanto
na Sociologia e na Ciência política (cf. COUTINHO, 1990; 2007).
Essa difusão se adensou após 1980, quando os intelectuais egressos do PCB
passaram a integrar diferentes partidos e movimentos sociais, entre os quais estão o
Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido do Movimento Democrático Brasileiro
(PMDB), do Partido Popular Socialista (PPS) e do Partido Democrático Trabalhista
(PDT), que então passaram a utilizar de diferentes formas o pensamento do autor, quase
sempre adequando-o aos seus objetivos políticos mais imediatos (cf. SECCO, 2002;
COUTINHO 2007).
Não obstante, nesse período o “conhecimento da obra de Gramsci progrediu de
maneira constante e significativa entre os intelectuais e cientistas sociais” na América
Latina (ARICÓ,1988, p. 83). Desse modo, os conceitos próprios de elaboração
gramsciana, “inclusive aqueles mais complexos e específicos como bloco histórico,
revolução passiva, guerra de posição e guerra de movimento, reforma intelectual e moral,
etc.” se transformaram numa “espécie de senso comum não do discurso mais
estritamente intelectual, mas também do discurso político da esquerda e não desta”
(idem), conformando um novo “léxico” político que passou a circular intensamente entre
as organizações de esquerda na América Latina, especialmente no Brasil e na Argentina,
os primeiros a traduzir as obras de Gramsci no continente. Evidentemente esse senso
comum gramsciano traduzia-se também em práticas concretas, ainda que de forma
mediada pelos diferentes objetivos de cada organização e de modo combinado com outras
concepções marxistas e não marxistas. Como procuraremos demonstrar, o processo de
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apropriação prática do senso comum gramsciano mostra-se presente no MST nos anos de
sua formação.
4. Gramsci no MST: a teoria em movimento
A formação oficial do MST aconteceu em seu Primeiro Encontro Nacional, em
Janeiro de 1984, em Cascavel (PR), entretanto a constituição do Movimento pode ser
datada a partir de sua primeira ocupação em setembro de 1979, em Ronda Alta (RS),
lideradas pelo Padre Arnildo Fritzen, ligado à CPT (cf. FERNANDES, 2000). O período
inicial da vida do MST, que compreendeu sua formação até o Primeiro Congresso
Nacional em 1985, foi marcado pela mediação dos agentes pastorais e contava com uma
estrutura organizativa embrionária. Neste período a forma de organização do Movimento
ia desde reuniões de base para formação de grupos de famílias a as práticas de
resistência como as ocupações de terra, isto é, não havia ainda uma estrutura organizativa
bem definida.
Entre os anos de 1985 e 1990, no entanto, o MST se consolidou em vinte e três
Estados da Federação, estabelecendo-se por todo o território nacional. Nesse período o
Movimento formalizou suas instâncias de decisão articuladas a uma estrutura
organizativa que se diferenciava das entidades que haviam contribuído para a sua
formação, deixando de ser uma corrente no interior do sindicato ou um braço da Igreja
Católica. Os setores progressistas eclesiásticos foram paulatinamente retirando-se das
atividades militantes dos sem-terra, permanecendo em grande medida como corpo de
apoio. As influências políticas e ideológicas da Igreja permaneceram, no entanto,
principalmente por meio da TdL (cf. ALIAGA, 2008).
O grande crescimento do MST, ao mesmo tempo em que trouxe a consolidação,
também se fez acompanhar por mudanças fundamentais em sua estrutura organizativa. O
movimento deixou de ser apenas um movimento de massa para tornar-se também uma
organização de quadros (NAVARRO, 2002, p. 204). Constituiu-se uma liderança que
consistia na “organização dos sem-terra”, que diferia, portanto das “famílias sem-terra”
ou do Movimento Sem-Terra. A “organização” compreendia o conjunto de seu corpo
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dirigente principal e seus militantes intermediários diretamente ligados à organização,
além do aparelho material constituído pelas secretarias que comportavam os funcionários
responsáveis pelo funcionamento burocrático. A preparação de quadros atendia à
necessidade de organização do movimento que tomara dimensões extraordinárias, tanto
em termos numéricos, quanto em termos das funções que se propunha e da influência nos
estados em que estava presente (cf. ALIAGA, 2008).
Na medida em que seu projeto de reforma agrária se expandiu, passando a
constituir-se também um projeto de sociedade, o Movimento extrapolou a luta setorial,
colocando-se em um campo especificamente político de relações de forças. Para isso foi
preciso incorporar os interesses de outros grupos no campo e na cidade, como os
desempregados urbanos, os pequenos agricultores, os atingidos por barragens, as
mulheres do campo, os indígenas, os estudantes (com quem o MST se articulou por meio
do Movimento secundarista). Com isso o Movimentou colocou-se num plano de pautas
universais, procurando criar assim a hegemonia de um grupo social fundamental sobre
uma série de grupos subordinados (cf. ALIAGA, 2008). De fato, segundo a coordenação
nacional do MST não havia mais “espaço para luta pela reforma agrária, [a luta] tem que
ter um caráter político. Ela faz parte de um processo de mudança de modelo social e uma
forma de desenvolvimentismo”, isso porque o projeto de sociedade do MST não está nos
marcos do capitalismo”
4
.
Destarte, embora o MST tenha se autonomizado, expandido e se estruturado
politicamente, conservou os elementos centrais da organização e dos princípios diretivos
das CEBs e da TdL, que foram somados às novas influências teórico-políticas elaboradas
na própria trajetória política do Movimento. Entre as principais influências recebidas dos
setores progressistas da Igreja Católica podemos elencar: experiência organizativa de
base igualitária, coletiva e colegiada, que admitia participação e envolvimento dos
membros nas decisões e atividades do grupo, isto é, o modelo parlamentar flexível, que
era a base das comunidades eclesiais; a preocupação com a formação política e com a
4
Adelar Pizeta, coordenador nacional do setor de formação, entrevista concedida na Escola Nacional
Florestan Fernandes (ENEFF) em 16/02/2007.
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criação da consciência de classe; os valores socialistas da TdL; bem como seu papel de
instituição educativa da sociedade civil (cf. FERNANDES, 1999; BOFF, 1980).
Ao longo de sua trajetória o MST, no entanto, alargou os princípios recebidos da
TdL. Como dissemos, isso se deu na medida em que a luta pela Reforma Agrária passou
a ser portadora de um combate por transformações sociais mais extensas, apoiada em
direções políticas que assimilaram um arcabouço teórico mais amplo, formado
majoritariamente por autores marxistas, mas também não marxistas. De acordo com João
Pedro Stédile, dirigente do MST:
Em suma, incorporamos dela [TdL] a disposição de estar abertos a todas as verdades e não
somente uma, porque esta única pode não ser verdadeira. Todos os que se abasteciam na Teologia
da Libertação o pessoal da CPT, os católicos, os luteranos nos ensinaram a prática de estar
abertos a todas as doutrinas em favor do povo (STEDILE & FERNANDES, 1999, p. 59).
O MST, assim, assimilou o marxismo de modo heterodoxo e híbrido, costurando
concepções marxistas, sociológicas e teológicas, entre outras, absorvendo desse modo a
utilização instrumental do marxismo já adotada pela TdL. Para Stédile (1999) não se deve
defender “uma ideia pela ideia em si”, mas na medida em que o movimento necessita
reorganizar-se ou que encontra algum problema, procura a solução nos mais diversos
autores. Este corpo teórico compreendia entre os pensadores clássicos: Marx, Engels,
Lênin, Mao Tse-Tung, Gramsci, Lukács e Rosa Luxemburg. Entre os pensadores
nacionais: Josué de Castro
5
, Manuel Correia de Andrade
6
, Celso Furtado, Florestan
Fernandes, Paulo Freire, Darcy Ribeiro, José de Souza Martins e Caio Prado Jr. Entre os
estrangeiros: James Petras
7
e Marta Harnecker
8
. Ainda, em termos de experiência, Stédile
citou: Luís Carlos Prestes, Ernesto Che Guevara e José Martí
9
. Entre os dirigentes
políticos estão: Fidel Castro, Sandino, Emiliano Zapata, Nelson Mandela, Gandhi,
5
(1908-1973), pernambucano, médico, biólogo e estudioso dos problemas da fome. Autor do livro
Geografia da Fome, em que revelou ao país e ao mundo as mazelas e as causas da fome no Brasil, em
especial no Nordeste.
6
Pernambucano, professor de Geografia, considerado um dos maiores especialistas sobre o Nordeste.
7
Sociólogo norte-americano, professor da Universidade de Nova York. Especialista em América Latina e
Movimentos sociais.
8
Socióloga e historiadora chilena. Escreveu de forma didática cadernos que explicaram a obra de Marx.
Tem várias pesquisas e ensaios sobre a esquerda latino-americana.
9
(1853-1895), líder da luta pela independência de Cuba. Poeta, jornalista, escritor.
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Samora Machel
10
, Amílcar Cabral
11
, Patrice Lumemba
12
, Agostinho Neto
13
e Martin
Luther King (cf. ALIAGA, 2008).
Essa miríade de autores e correntes teórico-práticas não refletia apenas o ecletismo
teórico-político do movimento, mas também o conjunto de tendências existentes no
interior do grupo dirigente. Isso quer dizer que a política efetiva do Movimento podia ser
mais ou menos influenciada por este ou aquele grupo de acordo com as relações de forças
internas. Por esse motivo o Movimento não concebia uma formulação de um sistema
ortodoxo baseado numa escola de pensamento específica. A linha política do Movimento,
portanto, era resultado da correlação de forças no âmbito da direção nacional entre
direções pragmáticas e socialistas:
Possivelmente existem dentro do MST divergências relevantes embora não sejam explicitadas
entre uma liderança mais pragmática, centrada na obtenção de concessões do governo, e outra mais
ideológica e rígida, cujo objetivo central é enfraquecer e denunciar o governo. Para esta última, os
sem-terra são parte da massa dos sem-teto, sem-educação, sem-emprego e sem-comida do país, e
a luta pela terra, parte da luta pela transformação da sociedade brasileira (SORJ, 1998, p. 31).
Diante disso, cremos, torna-se mais relevante investigar a apropriação concreta da
perspectiva socialista e organizativa de Gramsci pelo MST a partir do estudo de seus
princípios e estruturas concretas, que buscar uma interpretação do pensamento do autor
por parte dos dirigentes e militantes do Movimento, já que tal tarefa tornar-se-ia bastante
difícil e traria contribuição mais escassa para a compreensão da importância do autor para
a organização das classes subalternas no Brasil. Buscaremos a seguir analisar dois
importantes componentes da organização do MST à luz do pensamento político de A.
Gramsci, a saber: a mística e a estrutura organizativa.
Mística: a “religião laica”
10
(1933-1986), líder revolucionário, foi um dos fundadores da Frente de Libertação de Moçambique. Foi
eleito o primeiro presidente de Moçambique independente.
11
(1924-1973), líder revolucionário, foi um dos fundadores do Partido Africano da independência da Guiné
e Cabo Verde.
12
(1925-1961), líder revolucionário do Congo, foi um dos fundadores do Movimento Nacional Congolês,
em 1958.
13
(1922-1979), médico, poeta e líder revolucionário de Angola. Foi o primeiro presidente da República
Independente de Angola, em 1975.
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Como buscamos demonstrar até aqui, os princípios teórico-políticos e o modelo
de organização concebidos pelo MST são devedores em grande medida da TdL e das
CEBs, respectivamente. Suas influências se estendem às linhas políticas mais gerais, à
concepção do papel educativo dos movimentos populares, à utilização instrumental do
marxismo e especialmente à “mística”. A mística desempenha um papel fundamental de
cimento entre a teoria e a prática e é definida nos documentos internos do MST, entre
outros, por Leonardo Boff, um dos mais importantes expoentes da TdL.
Como já dissemos, ela consiste em uma forma pedagógica de traduzir a ideologia
através de linguagem simbólica, de fácil acesso às camadas laicas e aos estratos populares.
A stica é composta por atitudes que são desejáveis no interior do Movimento, entre
elas estão: dedicação, entusiasmo, ousadia, honestidade, simplicidade, disposição,
companheirismo, afetividade, disciplina e contribuição financeira para sustentação da
casa e do Movimento. Constituem também a mística algumas “situações” e elementos
advindos da criatividade e da espiritualidade dos militantes entre elas: a beleza do
ambiente, o clima de confiança, a alegria, a música, a poesia, as artes, os símbolos, os
gritos de guerra, “tudo deve exprimir os valores e as certezas que animam nossa
caminhada” (MST, 1998a, p. 10). A mística define, portanto, as liturgias” do
Movimento, por exemplo, cantar uma caão que remeta a luta sem-terra antes de
eventos, aulas ou reuniões, expor as fotos de personagens paradigmáticas na luta das
classes subalternas ou de teóricos importantes, produzir peças de teatro, entre outros.
A mística é também formada por valores. São eles (MST, 1998, p. 4): (1) a
solidariedade: o MST não quer apenas mudar o sistema explorador da sociedade
capitalista, quer, acima de tudo, mudar o ser humano; (2) a beleza: os assentamentos
devem ser “verdadeiros jardins”, e chamar atenção pela beleza física, com árvores, flores,
frutos, água limpa, casas bonitas, roças bem cuidadas, animais bem tratados e pessoas
saudáveis e bem alimentadas; (3) a valorização da vida: a defesa da vida deve estar acima
da defesa do lote, do crédito, da educação, etc.; (4) o gosto pelos símbolos: os símbolos
são as representações materiais das utopias, são o meio de comunicação mais eficiente
entre as pessoas que fazem parte de uma organização e garantem a unidade política entre
elas. São eles: a bandeira, as ferramentas de trabalho, materiais de estudo, o hino do MST,
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e todo símbolo que possa estar ligado à identidade do Movimento; (5) o gosto de ser povo:
são incentivadas as participações ativas em todas as manifestações populares, festas
religiosas em cada estado, Carnaval, eleições e lutas massivas, de forma a estar totalmente
integrados a “consciência popular”; (6) a defesa do trabalho e do estudo: estes são valores
fundamentais para o MST, através deles o Movimento acredita transformar as próprias
consciências e com isso, transformar o Brasil; (7) a capacidade de indignar-se: ou seja,
sentir profundamente qualquer injustiça cometida contra qualquer pessoa em qualquer
parte do mundo é qualidade do revolucionário.
Ademar Bogo, um dos importantes dirigentes do MST, a entendia como:
uma coisa do coração, do sentimento, alimentada por esta esperança de alcançar aquele sonho,
ideal objetivo seja o que se queira o que importe que isto se transforme em “uma causa”
consciente, que se passe a viver por ela e por causa dela (MST, 1998a, p. 15).
Para Leonardo Boff:
(...) não se trata de uma doutrina ou ideologia, mas de uma experiência fundante da realidade em
seu caráter incomensurável à razão analítica. A atitude que dela se deriva é a veneração, o
encantamento e a humildade diante da realidade. Exatamente esta atitude face ao mistério, vivida
em profundidade, chama-se mística (MST, 1998a, p. 27).
Temos aqui duas definições que a partir de linguagens diferentes, apresentam o
mesmo sentido geral, a saber, que a stica transcende o entendimento analítico e o
conteúdo especificamente religioso. Algo que se apresenta maior que o indivíduo e por
isso mesmo lhe desperta veneração e fé, ao mesmo tempo em que lhe força para
transpor obstáculos na medida em que se confia que o próprio “mistério”, que está contido
na mística, proverá forças e não apenas isso, trabalhará em favor daqueles que fazem o
bem. Esta noção resulta na potencialização da atividade militante:
Mística significa, então, o conjunto de convicções profundas, as visões grandiosas e as paixões
fortes que mobilizam as pessoas e movimentos na vontade de mudanças ou que inspiram práticas
capazes de afrontar quaisquer dificuldades ou sustentar a esperança face aos fracassos históricos
(MST, 1998a, p. 37).
O grande diferencial entre o MST e as outras organizações políticas da sociedade
civil é que neste Movimento as derrotas, os fracassos e as perdas são encarados como
fases de aprendizado. A dimensão religiosa se apropria com muita competência das
adversidades para delas retirar forças para continuar lutando. Neste sentido, os símbolos,
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os rituais, o apelo para a afetividade e a espiritualidade servem como potências
revigorantes para os militantes do MST. Entre as inúmeras passagens nos documentos
internos do MST que tratam deste assunto, citamos:
A mística é, pois, o motor secreto de todo o compromisso, aquele entusiasmo que anima
permanentemente o militante, aquele fogo interior que alenta as pessoas dentro da monotonia das
tarefas quotidianas, por fim, permite manter a soberania e a serenidade nos equívocos e nos
fracassos. É a mística que nos fez antes aceitar uma derrota com honra do que buscar uma vitória
com vergonha, porque fruto da traição aos valores éticos e resultado das manipulações e mentiras
(MST, 1998a, p. 38).
A mística consiste, portanto, na tradução em linguagem simbólica e afetiva da
identidade do Movimento concebida pela direção, e é também uma forma de comunicar
suas concepções políticas à base, dito de outra forma, a mística é um modo específico de
produzir organicidade entre intelectuais e simples, entre teoria e prática. É justamente
essa “nova roupagem” de uma mensagem que se relaciona intimamente aos conflitos mais
imediatos dos sem-terra, que se refere à própria condição de expropriados, ou de pobres
conforme a TdL, que revigora, provê solidariedade e fé na conquista dos ideais.
A mística, cada vez mais ligada à identidade e aos valores sem-terra, é mobilizada
pelo Movimento como motivação da ação e ao mesmo tempo como técnica para produzir
consciência de grupo econômico, ou, pode-se dizer, consciência de estar na mesma
situação de vida e trabalho, primeiro passo para a formação da consciência de classe. Por
essa razão, em todas as reuniões de núcleos a direção orienta que se pratique a mística
que “é uma forma de trazer presente aspectos da realidade e da utopia que todos possam
observar e sintonizar os sentidos em busca da unidade e da antecipação dos aspectos
estratégicos a alcançar” (SETOR DE FORMAÇÃO, 2005, p. 14). Os símbolos se referem
à história do Movimento: bandeira, o boné, os hinos, as ferramentas de trabalho e a lona
preta. A direção orienta que se mantenham “museus” nos assentamentos para guardar as
“relíquias que ajudaram a fazer a luta” (idem, p. 58).
A mística circula por todas as instâncias, desde os acampamentos até os encontros
nacionais. Ela potencializa a ação de duas maneiras principais. Em primeiro lugar porque
se configura em um tipo de linguagem simbólica que pretende gerar ação intuitiva, isto
é, antes mesmo de atingir a compreensão e se tornar norma de vida. As músicas, as
representações, a simbologia possuem uma forma própria de comunicação que perpassa
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a afetividade e a razão. A força revolucionária se reveste de paixão, reforçando desta
maneira fortemente o sentido de missão histórica. Em segundo lugar porque engendra o
sentimento de pertencimento ao grupo e de solidariedade. A solidariedade pode ser
considerada o ponto comum entre o universo religioso e o político, este elemento é
reivindicado tanto pela TdL como opção pelos pobres, quanto pelos valores socialistas do
Movimento, como sentido de justiça social e igualdade.
O conjunto de “convicções profundas, visões grandiosas e as paixões fortes”, que
define a mística (cf. MST, 1998a, p. 37) e que atua diretamente na produção de
comportamentos correspondentes, se aproxima da concepção de mito de Sorel. De acordo
com esse autor, o sindicalismo revolucionário deveria empregar “meios de expressão que
projetem sobre as coisas uma luz forte que as coloquem perfeitamente no lugar que lhes
cabe por natureza e revelem todo o valor das forças em jogo”. Para isso, contudo, a
linguagem não seria suficiente, o autor observou que seria “preciso recorrer a conjuntos
de imagens capazes de evocar em bloco e por mera intuição, antes de toda análise
reflexiva, a massa dos sentimentos que correspondem às diversas manifestações da guerra
travada pelo socialismo contra a sociedade moderna” (SOREL, 1992, p. 141, grifos do
autor).
Gramsci, ao dialogar criticamente com Sorel, constrói a figura do “mito príncipe”,
que consistiria no recurso à imagem de um condottiero ideal capaz de evocar em bloco e
por mera intuição um príncipe “realmente existente” (cf. Q. 13, § 1, p. 1556
14
),
concentrando em si a capacidade da reforma da vontade, elemento essencial para a
ativação intelectual e política das massas. Modernamente, contudo, segundo Gramsci, o
príncipe não pode mais ser uma pessoa real, individual, mas um organismo coletivo,
isto é, um partido político, o “moderno príncipe” (idem, p. 1558). Destarte, o recurso às
linguagens intuitivas, afetivas e estéticas e que remetem aos valores do MST são
fundamentais para a organização política das classes subalternas e por isso oferecem
condições concretas importantes, ainda que não suficientes em si mesmas, para tornar o
14
Adotamos aqui o padrão internacional de citação de A. Gramsci nos Quaderni del Cárcere na Edição
Crítica organizada por Valentino Gerratana, utilizando a letra «Q» para indicar o caderno, seguida do
parágrafo e da página de referência.
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Movimento um intelectual coletivo, o moderno príncipe ou, pode-se dizer, um partido
político das classes subalternas, na acepção gramsciana (voltaremos a este assunto
posteriormente).
Ao mesmo tempo, a mística faz referência àquilo que Gramsci chamou de religião
laica, a partir de uma apropriação crítica de Benedetto Croce. Religião laica define-se
como uma concepção de mundo que se transformou em norma de vida ou, dito de outra
forma, uma concepção de mundo realizada na vida prática (cf. Q. 10II, § 31, p. 1269).
Essa concepção de religião, como se percebe, deve ser compreendida fora de seu uso
original, pois em sua utilização corrente ela é um aspecto do senso comum. Religião aqui
não se refere a uma divindade ou a divindades, mas significa fundamentalmente no
grupo social.
Para Gramsci, no processo de difusão de novas concepções de mundo, o elemento
de maior peso político é a participação em uma organização. Isto porque, ao nível das
massas a filosofia pode ser vivida como no grupo social (cf. Q. 11, § 12). As
convicções fortes e a defesa dos interesses de grupo serão providas num primeiro
momento pelo grupo social. Essa seria a fase inicial de um processo educativo na
formação da consciência popular autônoma. Identificam-se, desta forma, religião,
ideologia, filosofia e política. Elos inseparáveis dos diferentes níveis de consciência e
ação no movimento de elaboração de uma visão de mundo.
Nesse sentido, a mística no MST, na medida em que colabora para a formação do
consenso e organicidade interna, está voltada para o projeto mais abrangente de
construção da hegemonia a partir do processo educativo e formativo da militância,
formando intelectuais orgânicos, elevando as consciências e capacitando o movimento a
interferir na estrutura a ponto de colocar a possibilidade real de transformação. Além
disso, a atuação da mística possui um papel educativo na medida em que sua linguagem
ritualística é capaz de repetir a mesma ideia de diferentes formas. Dado que as novas
concepções das massas populares, por sua debilidade, podem se perder quando
confrontadas com as convicções ortodoxas, socialmente conformistas, que obedecem aos
interesses das classes dominantes, a repetição se torna fundamental.
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De acordo com Gramsci, todo movimento cultural que pretenda substituir o senso
comum e as velhas concepções de mundo deve levar em conta a necessidade da repetição
dos próprios argumentos, variando literariamente a forma. A repetição, nesse sentido, é o
meio dialético mais eficaz para agir sobre a mentalidade popular (cf. idem). Destarte, a
religião laica que se concretiza no MST por meio da mística supre tanto a necessidade de
repetição quanto as novas linguagens por meio das quais se fazem essas repetições. Diante
disso pode-se afirmar que a stica possui funções tanto organizativas, quanto educativas
e formativas, de modo notavelmente próximo aos apontamentos de Gramsci sobre as
exigências para organização das classes subalternas.
Organização política: o “moderno príncipe”
Para a consecução de seu projeto de sociedade que, como já dissemos, superou a
demanda setorial pela reforma agrária, o MST construiu uma organização política capaz
de articular diferentes instâncias e de garantir, ao menos formalmente, a vinculação entre
direção e base. Essa estrutura organizativa, além de servir para definição da linha política,
das táticas de luta e dos meios de intervenção na conjuntura, atendia também a funções
formativas. A educação e a formação política respondiam a exigências práticas de curto
e longo prazo, fundamentais para garantir longevidade ao Movimento. A educação formal
e técnica nas mais diferentes áreas correlacionadas à agricultura, à pecuária, à
suinocultura, entre outros, tornou-se fundamental para a gestão e para a produção nos
assentamentos e, posteriormente, nas cooperativas. Do mesmo modo, a formação de
dirigentes políticos capazes e intelectualmente preparados era urgente não apenas para a
organização interna, mas também para que os sem-terra pudessem se inserir no debate
nacional, nas relações políticas de forças.
A criação de uma cadeia de estruturas organizativas voltadas para a formação de
militantes e quadros políticos, capazes de manter e difundir o patrimônio teórico-político
e garantir a existência da organização ao longo do tempo é, como observou Duverger
(1970), uma característica do partidos de massa, de criação externa ao parlamento, isto é,
que surgiram a partir de organizações ou instituições pré-existentes, como movimentos e
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associações. Os melhores exemplos históricos conhecidos são os partidos comunistas,
como o Partido Comunista Francês (PCF), por exemplo, que criou três categorias de
formação (escolas centrais, escolas federais e escolas elementares) (cf. DUVERGER,
1970).
De fato, desde as primeiras reuniões coordenadas pelas CEBs e ocupações de
terras organizadas pelos clérigos das pastorais da terra, o MST conseguiu construir uma
estrutura educacional muito desenvolvida, que funcionava em dois níveis principalmente:
educação (para ensino fundamental e médio) e formação (para educação política). Os
cursos de formação no período estudado ocorriam na Escola Nacional Florestan
Fernandes, sediada no estado de São Paulo, e nos acampamentos e assentamentos
espalhados por diferentes regiões do país. Para a formação dos dirigentes existiam
também convênios com universidades públicas. Havia, de fato, um “plano” de formação,
que contemplava desde a base até a liderança nacional. A formação política, por outro
lado, permanecia diretamente ligada aos acampamentos e assentamentos, pois deles
dependiam a emergência de novos intelectuais militantes (cf. ALIAGA, 2008).
A estrutura organizativa do MST até os anos 1990 era formada por instâncias de
base, intermediárias e superiores. Entre as instâncias superiores estava a direção nacional
e o órgão deliberativo central, o Encontro Nacional, que estabelecia as linhas políticas e
reformulava os princípios organizativos. Ele funcionava, portanto, como um “poder
legislativo”. As demais instâncias eram responsáveis por aplicar a linha política, ou seja,
eram estruturas executivas (cf. STEDILE & FERNANDES, 1999). Havia ainda um
complexo sistema jurídico responsável por cuidar dos problemas de ordem disciplinar,
que o Movimento tratava pormenorizadamente e extensamente em documento
especialmente elaborado para o tema (cf. MST, 1992).
As direções estaduais estavam entre as instâncias intermediárias, seus
representantes deviam ser escolhidos pela base, formada pelos núcleos, que se reuniam
pelo menos duas vezes por mês, congregando em média dez famílias que moravam
próximas. Essas reuniões não eram meramente burocráticas, ao contrário, elas possuíam
um forte caráter de motivação e identificação com o movimento, principalmente em
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virtude das celebrações da mística, bastante frequentes nas reuniões da base. Os objetivos
dos núcleos revelavam a necessidade de integrar a base à direção. Eram eles:
1. Organizar e articular os militantes do MST; 2. Ser um lugar de estudo, discussão e aplicação
das linhas políticas do MST; 3. Encaminhar as discussões do MST; 4. Encaminhar as tarefas
relacionadas às lutas do Movimento ou que estejam sendo desenvolvidas em conjunto com outros
trabalhadores e com a sociedade civil; 5. Contribuir para o crescimento político e formação
ideológica dos militantes e da massa organizada; 6. Ser um elo de ligação entre as direções de
massa; 7. Conhecer, discutir e contribuir na elaboração dos documentos e linhas políticas do MST;
8. Dar maior organicidade ao movimento de massa; 9. Disciplinar a participação efetiva dos
militantes do movimento; 10. Contribuir na sustentação econômica do MST (MST, 1990, p. 10).
Como se vê, a organização dos núcleos era fundamental para o contato entre a
direção e a base. O MST definia sua composição da seguinte forma: direção, militantes,
base e massa. Examinemos cada uma delas detidamente:
Direção: É o núcleo dirigente responsável pela direção, proposição, unidade e condução do
movimento. Deve existir: na base, no assentamento, regional, estado e nacional (CONCRAB,
[1995], p. 5).
Como se vê, a direção pretendia estar presente em todos os níveis e instâncias da
organização. De fato, em qualquer organização política, segundo Gramsci, a direção
constitui um elemento central, sem o qual não existiria organização. A ausência dessa
estrutura representa um limite decisivo para a formação da consciência de classe, função
essencial de uma organização política ou de um partido político. De acordo com Gramsci,
a direção consiste no elemento de coesão principal de um partido político e se constitui
num corpo dirigente, que centraliza no campo nacional e torna eficiente e poderoso o
conjunto de forças agregadas pela organização política. Esse elemento é dotado de força
coesiva, centralizadora, disciplinadora e inventiva. A direção por si não forma o
partido, mas tem maiores condições potenciais de formá-lo a partir de si própria que a
massa de homens comuns, pois:
uma massa humana não se ‘distingue’ e não se torna independente ‘para si’ sem organizar-se (em sentido
lato); e não existe organização sem intelectuais, isto é, sem organizadores e dirigentes, ou seja, sem que
o aspecto teórico da ligação teoria prática se distinga (...) (Q. 11, § 12, p. 138,6).
Essa massa de homens comuns a que Gramsci se refere consiste nos militantes
intermediários entre a base e a direção são um elemento de ligação no interior do partido.
O MST os incluía em sua composição:
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Militantes: São os que dão sustentação e organicidade. São os que estão construindo e fazendo
funcionar o organismo com suas várias partes. São as pessoas mais conscientes, que fazem o
vínculo entre os objetivos e as decisões que a organização toma com sua estruturação na base e no
meio da base (CONCRAB, [1995], p. 5).
O estrato de homens “médios” participa da organização política na medida em que
são disciplinados e fiéis ao corpo dirigente. O partido não existiria sem eles, mas também
não existiria somente com eles. Essa camada de militantes formada no interior da
organização constitui o elemento de articulação entre a base e a direção, e deve colocá-
los em contato físico, moral e intelectual (cf. Q. 14, § 50).
Base: São trabalhadores que se identificam com a organização e sentem-se parte dela. São os que
entendem os objetivos mais políticos da mesma. São os que mobilizam-se não apenas pelo
econômico. São os que dedicam parte do seu tempo em questões que não beneficiam apenas a si
próprios. O seu nível de consciência política é mais elevado. É com esta base organizada e
orientada pelos militantes e dirigentes é que vamos construir o corpo organizativo das instâncias
de base, nos acampamentos, assentamentos, nas cidades” (CONCRAB, [1995], p. 6).
Esse é o elemento que constitui para Gramsci uma massa de homens que sustenta
a direção a partir da confiança, lealdade e disciplina (cf. Q. 14, § 70, p. 1733). A base,
conforme expõe a direção do MST, consiste no elemento organizado que ainda não
atingiu a completa consciência de sua função histórica, é o elemento que reconhece a
importância da organização, contudo sua formação ainda se encontra nos níveis iniciais.
Por essa razão sua ligação ao movimento se dá por via da confiança e lealdade à direção,
mas também pela disciplina que a própria organização deve impor.
O MST ainda distingue um último elemento:
Massa: são todos os trabalhadores que se mobilizam em torno de objetivos comuns e que dão
sustentação ao movimento. É a população atingida pelas mensagens, que podem ou não se
mobilizar. A massa é diferente da base, no que motiva sua mobilização e no seu nível de
consciência. A principal motivação de sua mobilização para a luta, geralmente é econômica ou
outras questões que vão beneficiar a si próprios (CONCRAB, [1995], p. 6).
A massa está, portanto, no limiar entre a organização e a classe. Pode-se dizer que
é constituída pelos trabalhadores que se mobilizam pela terra, contudo ainda não fazem
parte da base do MST, dito de outra forma: participam do movimento sem participar da
organização, ou, sem assumir funções organizativas. Isto nos remete a discutir os nexos
entre a classe e o partido. O partido não se confunde com a classe, mas também não se
destaca dela, pois ele é sua expressão política, existe porque a classe existe e
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desaparecerá se as classes deixarem de existir (cf. Q. 14, § 51). É justamente por este
motivo que a história de um partido poderá ser satisfatoriamente contada se esta for
também a história do grupo social ao qual representa.
A natureza da participação entre direção, militantes, base e massa é diversa, isto
quer dizer que as diferenças na participação não são apenas de grau: “um militante não é
duas ou três vezes mais ligado ao partido do que um adepto: é ligado diferentemente”
(DUVERGER, 1970, p. 152). A ligação à organização caracteriza-se por sua qualidade e
não por sua intensidade. Ao longo desta análise acerca da composição da organização
política do MST, percebemos que o que diferenciava a militância de sua base eram os
níveis de consciência que cada uma alcançava acerca da luta econômica aliada à luta
política, bem como a medida em que são capazes de associar a teoria à prática, e assim
cumprir função intelectual e prática militante. A direção do MST classificava os níveis
de consciência em consciência social e consciência política:
Consciência social: é a consciência natural, é a que adquirimos na escola, na igreja, no trabalho,
na comunidade, na família, etc. Neste estágio as pessoas não tem uma visão crítica das coisas, não
conseguem enxergar as raízes de seus problemas, quem são nossos verdadeiros inimigos e da
classe trabalhadora. Consciência política: esta não adquire de forma natural, deve ser forjada nas
discussões, na formação, na luta. É pelo trabalho de conscientização com várias atividades é que
vamos adquirindo esta consciência. Neste estágio as pessoas tem clareza das causas reais de
seus problemas e sentem-se enquanto membro da classe trabalhadora e desenvolve os valores da
solidariedade, do companheirismo. Já se desprende da vontade de obter benefícios apenas para si
próprio (CONCRAB, [1995], p. 6).
Consciência social ou natural, de acordo com a descrição do documento,
corresponde a uma mentalidade acrítica, sem noção de sua própria historicidade,
características do senso comum. A consciência política, conforme podemos constatar,
consiste na consciência crítica, coerente, capaz da ação organizada em prol de interesses
de classe, justamente o que caracteriza o bom senso. Concluímos, portanto, que o MST
se propõe a tarefa de elevar a consciência de sua base
15
e essa função, a rigor, é
precisamente a função do partido político teorizado por Gramsci.
Destarte, embora o surgimento do MST se deva a uma demanda específica de um
setor da sociedade a reforma agrária em sua trajetória o Movimento expandiu seus
objetivos iniciais, colocando-se num plano de ação mais amplo, propondo-se à construção
15
“Precisamos elevar a consciência de nossa base” (Cf. CONCRAB, [1995], p. 6).
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da hegemonia de seu grupo fundamental os trabalhadores rurais na sociedade civil,
assumindo assim funções de partido. A forma política encontrada, adequada a essas
funções resultado das reflexões internas do Movimento, baseadas nas experiências
históricas e no referencial teórico marxista - foi a forma partido.
De acordo com Gramsci, o partido é a expressão da passagem do momento
meramente econômico à elaboração ético-política, cuja função consiste no equilíbrio e
arbitragem entre os interesses do grupo social fundamental e os outros grupos na medida
em que busca o consentimento do grupo representado, a direção dos grupos aliados e
muitas vezes também dos grupos inimigos (cf. Q. 13, § 33). Ao partido caberia, então,
resguardar os interesses da classe que representa, porém, simultaneamente, deve assimilar
em certa medida os interesses das classes subordinadas. Desse modo, difunde sua visão
de mundo de forma que os demais grupos sociais a tomam como sua própria visão. A
difusão por toda área social de sua visão de mundo e a aceitação desta pelos demais grupos
contribui para a construção da hegemonia do grupo social fundamental, assim:
determinando além da unicidade intelectual dos fins econômicos e políticos, também a unidade
intelectual e moral, pondo todas as questões em torno das quais ferve a luta não no plano
corporativo, mas num plano ‘universal’ criando assim a hegemonia de um grupo social
fundamental sobre uma série de grupos subordinados (cf. Q. 13, § 17, p. 1584).
A construção de uma organização política no interior do movimento de massas
tornou a luta política pela reforma agrária um aspecto importante mas não único de
um projeto político mais abrangente, que se propunha a pensar novas formas de
organização social, adequadas à participação política das classes subalternas, capazes de
prover melhores condições materiais de vida para amplos setores populares. A crítica
social do movimento não se destinava apenas aos setores do Estado que detinham o poder
sobre o bem demandado característica geral dos movimentos sociais evidenciada por
Gohn (1997) mas referia-se ao próprio Estado, que passava então a ser alvo das críticas
do MST. Num dos documentos preparatórios para o IX Encontro Nacional do
Movimento, sob o título: Diretrizes para o projeto nacional -se:
Os principais problemas do povo brasileiro são: a existência de milhões de pessoas abaixo da linha
de pobreza absoluta, de milhões de analfabetos, de trabalhadores sem carteira de trabalho, de
crianças fora da escola, de pessoas morando em favelas e cortiços, de jovens envolvidos com
drogas, prostituição e crime, de desempregados e subempregados. A este elenco acrescenta-se a
deterioração acelerada do nosso meio ambiente provocado pela exploração predatória dos nossos
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recursos naturais. Todos esses problemas são consequências de outros: concentração da
propriedade privada, desnacionalização da economia, monopólio dos terrenos urbanos,
concentração do acesso à terra, ineficiência do estado, subordinação das decisões nacionais às
exigências de poderes externos, corrupção do governo e da empresa privada, mentalidade
colonialista das classes dominantes e incapacidade do povo de articular seus próprios interesses
(MST, 1997a, p. 1).
A esse extrato segue-se uma análise da condição atual de dependência externa da
economia brasileira e da ausência de um projeto nacional entre as elites. Ao final da
análise o documento resume as tarefas políticas das lutas populares em temas que deverão
orientar uma “agenda nacional”, isto é, “uma pauta de problemas a serem resolvidos
prioritariamente a fim de promover o desenvolvimento”, formuladas a partir de três
grandes questões: “a questão democrática, a questão nacional e a questão cultural” (idem,
p. 4). Os temas norteadores da agenda nacional segundo o documento do MST eram:
(...) substituir o poder das classes dominantes pelo poder do povo na direção do processo de
construção da nação; eliminar qualquer traço de subordinação nas relações do Brasil com os países
desenvolvidos; ordenar as políticas econômicas aos objetivos da integração social e da unidade
nacional, a fim de eliminar as disparidades econômicas, sociais, culturais e políticas entre as
classes sociais e as regiões do país; defender intransigentemente a cultura brasileira (idem).
A construção da hegemonia das classes subalternas por meio de um projeto para
uma nova forma de organização social, cuja tônica consiste na educação das massas e
produção de intelectuais orgânicos constitui elemento fundamental para a formação de
uma vontade nacional-popular, e em decorrência, para a organização da reforma
intelectual e moral, que, a rigor, são funções do moderno príncipe, do partido político das
classes subalternas, de acordo com Gramsci.
Considerações Finais
Se a organização política do MST pode ser considerada uma tradução do
pensamento de Gramsci no âmbito da prática, ela torna-se, como dissemos, um campo de
prova para a teoria de Gramsci. Em nossa pesquisa pudemos comprovar que ao encontrar-
se com a realidade brasileira, o pensamento de Gramsci demonstrou tanto a acuidade
política do autor, capaz de desvelar processos de elevação cultural de massa, tanto quanto
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refletir com clareza sobre a organização das classes subalternas, fornecendo importantes
indicações para a formação de novas lideranças, ou, nos termos gramscianos, de
intelectuais orgânicos, quanto para construção de uma organização política a partir de
baixo, o novo príncipe, capaz de fomentar um movimento nacional-popular e uma nova
hegemonia. Ao mesmo tempo, esse campo de prova indica a necessidade de inovação
teórica e prática para superação dos entraves históricos no Brasil no sentido da elevação
da qualidade da educação popular e da constituição de uma sociedade menos desigual.
Para ambas é decisivo o combate à concentração de rendas e de terras, à permanência do
latifúndio e à violência urbana e rural no país.
A permanência do tema “reforma agrária” no cenário de debates políticos entre as
décadas de 1980 e 1990, o acesso à terra a um número significativo de famílias rurais
pobres, a democratização da vida política dos pequenos municípios, além das melhorias
econômicas proporcionadas pelos assentamentos, que dinamizaram econômica e
socialmente o seu entorno (cf. ALIAGA, 2008), consistem em avanços políticos e
econômicos concretos proporcionados pela ação política do MST, configurando, assim,
a efetiva representação dos interesses de sua base. Pode-se dizer, portanto, que o MST
assumiu concretamente as funções de um partido das classes subalternas na medida em
que efetivamente representou os interesses destas, alcançando ganhos políticos e
econômicos para o grupo como um todo, a partir de objetivos políticos amplos.
No que toca a função educativa, o MST encontrou enormes dificuldades de ordem
material, político-ideológica e sociocultural para alcançar toda a expressiva extensão de
sua base. O processo de formação da consciência crítica da realidade nos sujeitos
integrantes do Movimento ocorria de fato, contudo, numa proporção ainda pequena em
relação ao número de famílias sem-terra que o compunha (cf. ALIAGA 2008). Contudo,
a construção da Escola Nacional Florestan Fernandes, o esforço em suprir escolas para os
assentamentos e acampamentos, bem como os cursos técnicos implantados pelo MST,
revelam a centralidade da educação e da formação política para realização do projeto de
sociedade idealizado pelo MST, que consiste em “uma nova ordem social, cujos pilares
principais sejam, a justiça social, a radicalidade democrática e os valores humanistas e
socialistas” (CADERNO DE EDUCAÇÃO- MST, 1996, p. 6).
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Quanto à necessidade de articulação entre intelectuais e simples, a estrutura
organizativa do MST comportava instrumentos para a sua realização: mobilidade
contínua das estruturas e uma recente absorção em grande escala de elementos da base na
direção. Contudo, não é possível afirmar que havia coesão interna suficiente para
possibilitar a plena integração entre a maioria das famílias que compunham a base nos
acampamentos e assentamentos e a liderança. A relação entre base e liderança permanecia
fortemente marcada pelo conflito entre diferentes concepções acerca do significado e
dimensão da luta pela terra reflexo do alcance ainda restrito do processo educativo (cf.
ALIAGA, 2008). Portanto, ainda não havia “organicidade” suficiente para que a elevação
cultural de massa pudesse ocorrer.
Diante do exposto, pode-se dizer que o MST possuía uma estrutura cuja forma
partido lhe capacitava a exercer parte das funções organizativas e formativas que cabem
ao moderno príncipe. Contudo, as relações estabelecidas com os governos do PT seu
aliado histórico comprometeram efetivamente a radicalidade das críticas do
Movimento, redundando no estancamento da reforma agrária a partir de 2003 (cf.
ALIAGA; MARANHO, 2021).
De todo modo, não obstantes as dificuldades, pode-se afirmar que entre 1980 e
1990 as diretrizes educativo-formativas, as estruturas organizativas e as liturgias do MST
podiam ser concebidas como uma tradução no âmbito da prática do pensamento
gramsciano. Sabe-se, como dissemos acima, que nos anos de formação do MST, o
pensamento de Gramsci estava difundido entre os partidos e movimentos políticos e havia
se tornado um senso comum. Do mesmo modo, é sabido que a TdL havia se apropriado
do pensamento do autor com vistas a efetividade da ação e, por esta via, o próprio
Movimento em seu nascimento teve contato com o pensamento gramsciano. Não obstante
tudo isso, não é possível afirmar o nível de intencionalidade dessa apropriação prática, ou
pode-se dizer, não é possível saber até que ponto ela foi parte de um programa pré-
concebido e arquitetado. De todo modo, essa ideia não nos parece razoável. Nossa
hipótese é de que foram as experiências concretas de organização e a procura por
respostas os principais moventes para a busca teórica e, nesse caminho, o pensamento
gramsciano ganhou importância e protagonismo gradativamente ao longo dos anos. De
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todo modo, esse é ainda um campo a ser explorado teórica e politicamente pelos estudos
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SEÇÃO DOSSIÊ
https://doi.org/10.36311/2526-1843.2022.v7n11.p40-73
© Rev. Práxis e Heg Popular
Marília, SP
v.7
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Dez/2022
73
SETOR DE EDUCAÇÃO DO MST, Princípios da Educação no MST, Cadernos de
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ENTREVISTAS E CONFERÊNCIAS CITADAS:
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transcrição: Plínio José Feix).
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INCRA/CRUB/UNB. I Censo de Reforma Agrária. In Revista Estudos Avançados nº31,
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Recebido em 13 de janeiro de 2023
Aceito em 13 de janeiro de 2023
Editado em fevereiro de 2023